Tenho procurado demonstrar que o engano (inconsciente) ou mentira (consciente) é comum aos nossos jornalistas, como o é em qualquer ser humano, sendo, ora fruto de nossa malignidade intrínseca, ora de nossa inexperiência natural. O difícil mesmo é separar uma coisa da outra, coisa que nem de longe passa por minha cabeça.
Felizmente, um ouvidor da Agência Brasil reconhece que 40% das notícias por ela produzidas possuem erros e luta para reduzi-los, coisa que não é cogitada seriamente na mídia comercial, cujo negócio prioritário é a manipulação para atender ao propósito político de seus proprietários e anunciantes.
É bom ressaltar que, em minha visão de mundo, somos também dotados de uma bondade intrínseca, usando uma ou outra, dependendo de nossa formação ética (moral ou deontológica) e de nossa determinação na busca do ideal em seu conflito com necessidades reais e mais imediatas.
Tanto os jornalistas que se dizem ou parecem ser de esquerda, e não o são, quanto os que não se dizem de direita, mas o são, vem cometendo várias desconformidades, especialmente em termos de afirmar que estamos em um Estado Democrático de Direito, como se ele já fosse a concretização atual da possibilidade incomensuravelmente distante de um Estado Democrático de fato. [Mais detalhe em ‘Análise dos Tipos de Poder: www.midiaindependente.org/pt/red/2008/05/419423.shtml e ‘O que é e o que não é, realmente, uma democracia?’ http://www.midiaindependente.org/pt/red/2009/04/444078.shtml]
O documentário da TV do governo
Venho procurando demonstrar que a visão do mundo de expoentes mais visíveis na mídia não tem como princípio a ética e a qualidade da informação, conforme defende a Fenaj – Federação dos Jornalistas, ser uma condição inexistente dentre aqueles que não possuem diploma, esquecendo que as escolas de comunicação são uma novidade recente e posterior à existência do jornalismo e que não existe ética jornalística para o empregado, mas apenas ética patronal.
Mas, mesmo dentre aqueles que trabalham de forma independente, muitos vêm agindo analogamente, reproduzindo o senso comum, a opinião pública ou a opinião publicada de sempre. Não têm interesse, não querem ou não são capazes de avaliar uma informação, antes de reproduzi-la para o público. Ou, pior: manipulam a notícia propositalmente.
Assim, analisei um ou outro aspecto da produção de alguns, que me chamaram a atenção, dentre eles Silvio Caccia Bava, Luiz Carlos Azenha, Celso Schroder, José Carlos Torves, Vinícius Mansur, Joelmir Beting, Ricardo Boechat, José Luiz Datena, André Trigueiro, Luiz Carlos Sardemberg, Evaldo Magalhães e Hugo Studart.
Assisti, estes dias, a um delicado, gracioso, criativo e aparentemente educativo, porém deturpado, documentário sobre o Estado, na NBR – a TV do governo federal. Nele se afirma que os ricos é que mandavam no Estado e que a democracia não era muito simpática séculos atrás, sendo que, nos dias atuais, vivemos sob esta forma de governo.
Leilão ou eleição?
Neste ponto, podemos perceber nitidamente a diferença entre uma mídia privada, outra estatal (não uma República, mas uma Reparticular) e uma terceira, verdadeiramente pública.
Na concessão dita pública, mas de gestão privada, este assunto jamais seria pautado. Na estatal, ele é veiculado, mas de forma a não ferir com os interesses dos senhores do Estado, a classe com maior poder econômico e que financia a campanha de seus lacaios no governo.
Numa mídia estatal verdadeiramente pública seria, no mínimo, explicado o que é uma democracia de verdade, uma apenas de direito, e feita uma comparação se é o povo quem governa realmente o Estado ou aquela mesma classe privilegiada economicamente que foi criticada anteriormente. Seriam apresentadas também outras formas de governo como plutocracia, cleptocracia e corporocracia, afirmando que é assim que funciona atualmente o Estado brasileiro e tantos outros, ou permitindo que o telespectador se decida a respeito com os dados fornecidos.
De uma forma absoluta, na prática, se procura convencer a grande massa ignara, através do sistema de ensino e da mídia, que vivemos numa democracia plena, que as instituições funcionam etc. E, naturalmente, o conseguem!
Também seria mencionado que os mais ricos são financiadores da campanha política de seus legítimos representantes, usufruindo de uma condição com a qual é impossível aos trabalhadores competir, fazendo com que aqueles sejam mais iguais perante a lei que os demais. Ou seja, os legítimos representantes dos ricos se fazem passar por legítimos representantes dos pobres através de uma propaganda enganosa, sustentada com investimentos feitos em seu caixa um e dois. Eleitos, vão governar prioritariamente para quem lhes proporcionou o acesso ao poder, e não para quem lhes deu apenas um voto. Os legítimos representantes dos pobres raramente são eleitos, em função desta injustiça. É leilão ou eleição?
Otimismo ingênuo dos petistas
Não seria sonegado ao público, o que é muito comum, que parlamentares, juízes, desembargadores e outros funcionários públicos são aliciados num processo em que disputam, no mercado, os lances dos interessados em direcionar seus poderes, a exemplo da reeleição de FHC e vendas de sentenças na justiça, uma caixa-preta, do ponto de vista de Lula.
Por outro lado, a classe trabalhadora ainda não tem consciência da manipulação da informação de que é vítima, por parte da maior inimiga do verdadeiro jornalismo e do povo brasileiro: a grande imprensa (Perseu Abramo). E os movimentos sociais muito pouco fazem para que as emissoras público-estatais, bem como as público-privadas sejam realmente públicas, merecendo matematicamente tudo que recebem da mídia em geral. Mera lei de causa e efeito.
Mas, nesta Conferência Nacional de Comunicação, caso Lula supere sua relutância para assinar o decreto que dizem nossos amigos petistas que está em sua mesa, talvez ainda haja tempo para fazê-la este ano, conforme sua promessa no Fórum Social Mundial, em janeiro deste ano, há mais de dois meses. Após confraternizar com a Abert – Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária esta semana, num evento em parceria com o Ministério da Cultura, esta possibilidade fica cada vez mais remota, apesar do otimismo ingênuo dos petistas.
O pior de tudo isto é que o evento intitulado Encontro Nacional de Comunicadores MEC-Abert-Unesco excluiu comunicadores de emissoras comunitárias. Também não tenho notícias de que tenham dele participado representantes de emissoras universitárias, educativas e legislativas, tanto de rádio quanto de TV, ficando a dúvida sobre as reais intenções do governo neste mister e o motivo pelo qual teria se concentrado apenas no interesse das concessões teoricamente públicas, cuja gestão busca apenas o interesse particular.
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Engenheiro civil, militante do movimento pela democratização da comunicação e em defesa dos Direitos Humanos, membro do Conselho Consultor da CMQV – Câmara Multidisciplinar de Qualidade de Vida (www.cmqv.org) e articulista