‘O fim de semana foi de pressão, nas agências de notícia e jornais de economia, por avanço nas negociações de comércio.
O diretor da Organização Mundial de Comércio, francês Pascal Lamy, estava em toda parte lamentando o pouco que se andou até agora.
Não demorou e o primeiro-ministro britânico, Tony Blair, surgiu para abrir uma reunião multilateral pedindo concessões de todos.
Mas o negociador europeu, amigo de Blair, deu entrevista ao espanhol ‘El País’ e criticou só o Brasil. Peter Mandelson disse, já no título, que ‘a oferta da UE [de redução nos subsídios] é a mais generosa jamais feita’.
E cobrou ‘proposta séria do Brasil e do resto do G20’ para a abertura de seus mercados ‘aos nossos manufaturados’.
Nada de novo. Daí, talvez, os EUA terem apelado a Bono, o vocalista do U2.
Segundo reportagem do ‘Wall Street Journal’, o representante comercial Rob Portman, dos EUA, fez reunião com Bono no ‘esforço para levar o cantor a ajudar num acordo’.
O propósito é ‘pressionar a Europa a fazer cortes em tarifas agrícolas’ e evitar ‘o colapso das negociações’.
Mas talvez o mais marcante, da parte de Portman no ‘WSJ’ e de Mandelson no ‘El País’, seja que ambos saudaram os países ‘mais pobres’, em oposição aos ‘pobres’ Brasil e Índia, como ‘uma nova influência’. São a nova aposta contra o G20, que tanto resiste.
E é a estratégia usada pelos mesmos EUA na América do Sul para vencer a resistência do Mercosul à Alca.
No hemisfério, não tem dado certo, como destacou o ‘Valor’ no final da semana. Na ironia do blog de Sergio Leo, voltado ao comércio exterior, sob o título ‘O cerco ao Brasil furou’:
– Você lembra de ter ouvido que o Brasil iria ficar isolado, porque recusou a Alca e os EUA decidiram sair à cata de acordos na vizinhança? Pois é, talvez não tenha visto o que saiu escondido nos jornais: acaba de fracassar retumbantemente a negociação para o acordo de livre comércio dos EUA com Colômbia, Peru e Equador.
E mais à frente:
– O que pegou? Os subsídios americanos à agricultura.
Do argentino ‘Clarín’ ao site brasileiro ‘Vermelho’, do PC do B de Aldo Rebelo, anuncia-se para a cúpula em Puerto Iguazu, depois de amanhã com Lula e Néstor Kirchner, dezenas de acordos ‘os mais variados’ -até ‘cláusula para defender a indústria argentina’.
Mas o Brasil não é o tema que ocupa Buenos Aires, por ora. No ‘La Nación’, ontem, a notícia era que o presidente e seu ministro da economia ‘não se falam’ desde que o segundo denunciou ‘manobras de corrupção em obras públicas’.
Para ‘analistas políticos’, sua ‘saída não provocaria crise’. Soa familiar?
ÀS VEZES
Direto de Brasília, Larry Rohter noticiou ontem no ‘New York Times’ que ‘Chávez almeja programa de energia nuclear’. Diz o correspondente que o presidente venezuelano ‘raramente causou tanto espanto quanto ao anunciar planos para um programa de energia nuclear com ajuda de Brasil e Argentina’. Lá pelo meio do texto, ‘um funcionário do Departamento de Estado’ pareceu discordar da avaliação:
– Estamos vigilantes, mas não preocupados. Chávez fala muitas coisas. Às vezes faz, às vezes, não.
Mais significativa, até para o Brasil, é a confirmação, noticiada ontem pelo ‘Financial Times’, da compra de equipamento militar da Espanha por Chávez, ‘apesar da objeção americana’. O ministro espanhol da Defesa vai hoje a Caracas para assinar o contrato que abrange aviões, barcos e armamentos diversos.
Em queda
Do blog de Josias de Souza na Folha Online, sobre a pesquisa Miséria em Queda, da FGV, a ser divulgada hoje:
– Os primeiros dados trazem mais uma boa notícia para Lula: a miséria atingiu o nível mais baixo desde o lançamento da nova PNAD em 92.
Para o coordenador da GV, ‘houve uma queda espetacular’ na pobreza em 2004, movida por mais ocupação e ‘transferências focalizadas do Estado’, além da ‘redução da desigualdade’.
Sem resistência
O ‘Financial Times’ acordou e saiu avisando que ‘a resistência da economia pode finalmente estar chegando ao fim’ no país. Além dos juros e do real muito valorizado, ‘um dos acusados é o escândalo político’.
E não faz diferença o ‘Miami Herald’ sublinhar, como fez na edição de ontem, que, ‘após seis meses de investigação sobre o escândalo, principais denúncias seguem sem provas’.’
FSP
CONTESTADAPainel do Leitor, FSP
‘Maranhão’, copyright Folha de S. Paulo, 28/11/05
‘‘A respeito da reportagem ‘TV de Sarney não põe no ar propaganda do governo do MA’ (Brasil, 27/11), solicitamos a gentileza de publicar os esclarecimentos abaixo: 1. Desde o dia 30 de abril de 2004, o governo do Maranhão retirou toda a propaganda oficial da TV Mirante e suspendeu o pagamento do material que já havia sido exibido; 2. A alegação para o rompimento do contrato comercial foi que o governador não concordava com a linha editorial de total imparcialidade da emissora; 3. Tal imposição é incompatível com a ética jornalística e a ela nenhum veículo deve se submeter; 4. Sem sucesso em suas tentativas de negociação amigável da dívida, o Sistema Mirante resolveu, no final do ano passado, ajuizar ação de execução contra a agência de publicidade que detinha a conta do governo. Referida ação, que compreende apenas uma parte da dívida, foi julgada procedente na primeira instância e está em fase de recurso no Tribunal de Justiça do Maranhão; 5. Quanto ao fato de a Secretária de Comunicação do Estado não confirmar nem negar a dívida, como afirma a reportagem, é uma inverdade. Há pouco mais de 15 dias, o publicitário Carlos Malmann, proprietário da Malmann Marketing, agência que, atualmente, é responsável pela propaganda do governo, procurou a emissora, em nome da secretária Flávia Regina, para que fosse feito um levantamento da dívida, pois a área de comunicação tinha interesse em voltar a anunciar nos veículos do Sistema Mirante. Via ofício, esta direção comercial solicitou à Secom que designasse representante oficial para discutir o assunto, o que, até agora, não foi feito; 6. Assim, a referência a uma propaganda não veiculada, sabendo que ainda existe a demanda judicial, foi apenas um álibi de marketing, produzido pela empresa pública, contratada pelo governador José Reinaldo para uma mudança de imagem de seu governo e para ensejar reportagens como a divulgada pela Folha -com vistas a incompatibilizar nossa emissora com a direção nacional da Rede Globo; 7. O caso dos morcegos transmissores de raiva foi furo jornalístico da TV Mirante, que identificou o problema, divulgou-o em nível nacional e nos telejornais locais e tem dispensado ao tema tratamento rigorosamente jornalístico, ouvindo, em todas as reportagens, as autoridades do governo ligadas ao assunto.’ Francisco Alexandre de Mello Franco, diretor comercial da Rede Mirante (São Luís, MA)’
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‘Empréstimo consignado’, copyright Folha de S. Paulo, 26/11/05
‘‘A respeito de música, que é a área de Nelson Motta, e não a minha, não tenho nada a declarar. Mas sobre crédito consignado temos a informar ao colunista, já que essa não é a sua especialidade, que ele foi, no mínimo, primário na sua citação sobre a Caixa Econômica Federal em seu artigo de ontem (‘Altos lucros, golpe baixo’, Opinião, pág. A2). 1) O empréstimo consignado beneficiou até agora 1.163.420 aposentados e pensionistas do INSS, com R$ 2,8 bilhões já emprestados pela Caixa a juros de 2% (nada ‘escorchantes’ em relação ao que se cobra no mercado de financeiras e agiotas). A Caixa, aliás, ao contrário do que disse o articulista, foi pioneira na concessão desse tipo de crédito -e só por iniciativa dela é que os juros foram reduzidos a esse patamar nunca imaginado pelo mercado. Depois da Caixa, outros bancos passaram a oferecer o crédito consignado e até o comércio baixou suas taxas por causa da concorrência. Deu-se acesso a crédito para muitas pessoas que não tinham condições de obter um empréstimo. Isso é o que há de mais importante nessa iniciativa e o que nos dá a garantia de que estamos cumprindo o nosso papel social enquanto principal agente de fomento e operador das políticas públicas do governo. 2) A compra dos créditos do BMG foi feita por outros bancos antes da Caixa. A Febraban emitiu nota sobre o assunto na qual conclui que a operação ‘conforma-se à prática do mercado amplamente seguida pelos agentes financeiros’. Segundo a nota, ‘tais operações de cessão de crédito entre instituições financeiras têm sido utilizada há décadas no Sistema Financeiro Nacional’. Além disso, o próprio senador Álvaro Dias, que denunciou supostas irregularidades nessa operação, recuou anteontem ao solicitar a retirada do seu requerimento de auditoria ao TCU. 3) Diante disso, sugiro que o senhor Motta, antes de atacar instituições sem ter conhecimento de causa e para não escrever leviandades, entre em contato com a assessoria de imprensa da instituição para se informar melhor, como manda o ‘Manual da Redação’ da Folha. Sugiro que o senhor Nelson Motta continue na crítica musical.’ Gabriel Nogueira, assessor de imprensa da Caixa Econômica Federal (Brasília, DF)
‘Repudiamos com veemência as ofensivas e desinformadas afirmações contidas no texto de Nelson Motta de 25/11. O crédito consignado permite a um grande número de pessoas obter recursos no sistema bancário com taxas bastante inferiores àquelas cobradas em outras operações de crédito. Vale lembrar que, enquanto no crédito consignado as taxas de juros são, em média, de 2,7% ao mês, a modalidade de crédito mais utilizada, o cheque especial, tem juros médios de 8,5% ao mês. Não há que falar em ‘juros escorchantes’ ou em ‘exploração’. Diferentemente do que afirma o colunista, o crédito consignado, por ser mais barato, permite ao tomador equilibrar sua situação financeira. Pesquisa do Ibope atestou que mais de 50% dos tomadores de empréstimos pelo crédito consignado o utilizam para amortizar empréstimos a juros mais altos. A atuação do BMG no setor do crédito consignado remonta ao ano de 1998, sendo desde 2001 o líder nesse segmento, conforme a revista ‘Conjuntura Econômica’, da Fundação Getúlio Vargas. Assim, é totalmente despropositada a afirmação de que teria recebido uma ‘mãozinha de Marcos Valério e Delúbio’. A cessão parcial de sua carteira, operação absolutamente normal no mercado e realizada com mais de 20 outras instituições bancárias, também não apresenta nenhuma irregularidade. Repudiamos o tratamento dado aos tomadores dos empréstimos no crédito consignado, classificados como ‘pobres coitados’ entre outras menções desrespeitosas a pessoas que trabalharam a vida toda e que lutam para dar dignidade a suas famílias. O banco BMG lamenta que pessoas mal-informadas insistam em apresentar acusações injustas e equivocadas.’ Márcio Alaor de Araújo, vice-presidente do banco BMG (Belo Horizonte, MG)
Resposta do colunista Nelson Motta – Não questionei a legalidade das transações entre a Caixa e o BMG. Disse que são indecentes os injustificáveis juros cobrados por todos, autorizados pelo governo, apoiados por sindicatos sanguessugas, para esses empréstimos. São clientes, literalmente, cativos. Descontados em folha, até pagar tudo. Risco zero no caso dos aposentados e funcionários públicos. Sou privatista convicto e quem acompanha minhas crônicas sabe disso. Acho que o Estado deve interferir o mínimo possível, e em poucos campos. Um dos raros seria este: empréstimos populares em consignação. Só bancos sociais a lucro zero poderiam e deveriam fazê-lo. Isto é, se a idéia é mesmo, digamos, ‘social’. Se é de um novo produto-filé do mercado bancário… ofende a nossa inteligência e compostura dizer que é ‘social’. A 2,5% ao mês! Em um ano o banco lucra um terço do valor do empréstimo.
Bahia
‘A conta-fantasma do governo da Bahia assusta e mostra que, diante de dificuldades, o senador Antonio Carlos Magalhães tem dois tipos de reação: ou foge, como ocorreu na violação do painel eletrônico do Senado, quando renunciou para não ser cassado; ou exercita a leviandade na tentativa de desqualificar os críticos. Em lugar de atacar ‘CartaCapital’, ACM poderia responder ao teor do relatório do conselheiro Pedro Lino, do TCE da Bahia, tornado público pela revista. E, é claro, acabar com o bloqueio ao movimento da oposição de fazer uma CPI para a Bahiatursa.’ Mino Carta, diretor de Redação da revista ‘CartaCapital’ (São Paulo, SP)’
DANO MORAL
‘História de morte’, copyright Consultor Jurídico (www.conjur.com.br), 26/11/05
‘O Tribunal de Justiça de São Paulo livrou o Jornal da Cidade de Bauru de pagar indenização ao casal Reinaldo Mateus Pires e Selma Aparecida de Oliveira Pires. O casal moveu ação de indenização por danos morais por se sentir ofendido em reportagem publicada no jornal.
Na edição de 17 de agosto de 1988 o jornal publicou notícia intitulada ‘Mãe provoca a morte de filho sem querer’. A reportagem conta que, enquanto dormia Selma deitou-se involuntariamente sobre o filho de um mês e meio de idade e a criança acabou morrendo asfixiada.
O texto segue relatando a chegada da criança ao hospital, já sem vida, e, reproduz declaração do pai, Reinaldo Pires, hoje falecido, que afirmou ao jornal ser costume da mãe da criança colocá-la para dormir na cama do casal, porque o bairro onde moravam teria muitos pernilongos.
O TJ entendeu que, ao contrário do que afirma a inicial, inexiste notícia falsa sobre o acidente. Para a turma julgadora, o jornal limitou-se a narrar os fatos que foram constatados, posteriormente, pela perícia e não desmentidos na época pelo pai da criança.
‘Trata-se de circunstância suficiente para revelar que, exercendo regularmente um direito seu, agiu a apelada com animus narrandi, o que, nos termos da lei, não configura ato ilícito’, afirmou o relator do apelo, desembargador André Augusto Salvador Bezerra.’
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‘Liberdade de crença’, copyright Consultor Jurídico (www.conjur.com.br), 23/11/05
‘O Tribunal Regional Federal da 3ª Região decidiu que as religiões de origem africana têm direito de resposta na Rede Record e Rede Mulher de Televisão. O TRF-3 manteve decisão de primeira instância. O recurso das emissoras foi negado.
Em maior deste ano, a juíza federal Marisa Cláudia Gonçalves Cucio condenou as emissoras a exibir um programa com duração de uma hora durante sete dias, além de três chamadas diárias na grade de programação. Estabeleceu multa de R$ 10 mil reais em caso de descumprimento.
O programa de resposta já foi gravado e conta com a participação de sacerdotes e sacerdotisas das religiões afros, como umbanda e candomblé. O programa foi produzido em formato de debate com outras entidades religiosas e organizações do movimento negro, além de contar com as presenças do advogado Dalmo Dallari e do arcebispo de São Paulo, Dom Cláudio Hummes.
De acordo com Daniel Teixeira, assessor jurídico do Ceert – Centro de Estudos das Relações do Trabalho e da Desigualdade, um dos patrocinadores da ação foi Hédio Silva Júnior, atual Secretário de Justiça e Cidadania do Estado de São Paulo. ‘Ele e todos nós da organização esperamos que a sociedade possa ter a chance de assistir ao programa, conhecer melhor as religiões de matriz africana e compartilhar do diálogo pela liberdade de crença e contra a intolerância religiosa’.’
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‘Publicação de fotos após demissão gera indenização’, copyright Consultor Jurídico (www.conjur.com.br), 17/11/05
‘Republicação de fotografias por empresa jornalística depois da demissão do fotógrafo gera indenização. O entendimento é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que condenou a Jayme Câmara Irmãos – editora do Jornal de Brasília – a pagar indenização por danos morais no valor de R$ 26 mil ao repórter fotográfico Cláudio Alves Pereira. Os danos materiais serão apurados na fase de liquidação da sentença.
Segundo os autos, Cláudio Alves ocupou o cargo de editor de fotografia do Jornal de Brasília. Em julho de 1990, o jornalista foi demitido. Desde então, vários de seus trabalhos fotográficos foram republicados pelo jornal, sem os devidos créditos e o pagamento pelos direitos autorais. A empresa jornalística afirmou que republicou todas as fotos com os créditos, como determina a norma legal.
A primeira instância negou o pedido de indenização por danos morais e materiais. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal negou os pedidos de danos materiais e morais, mas entenderam que o jornal utilizou indevidamente as fotos. Por isso, condenaram o jornal a indenizar o fotógrafo em quantia equivalente a mil exemplares do jornal, a preço do dia.
Cláudio Alves Pereira apresentou Recurso Especial no STJ. Alegou ofensa aos dispositivos legais que protegem a exclusividade do direito de utilização, de publicação e de reprodução da obra artística, estando, dessa forma, protegida pelo direito à propriedade intelectual.
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, com base em voto do relator do processo à época, ministro Antônio de Pádua Ribeiro, concedeu indenização por danos morais e materiais ao repórter fotográfico. A Turma considerou ter havido utilização indevida da obra do fotógrafo.
Os ministros condenaram o jornal a pagar ao ex-empregado R$ 26 mil por danos morais, corrigidos a partir da data do julgamento. Sobre o valor deverá incidir juros de mora de 0,5% ao mês, desde a data da primeira publicação indevida no jornal, nos termos do enunciado da Súmula 54 do Tribunal.
O jornal também foi condenado ao pagamento de danos materiais, a serem apurados em fase de liquidação, nos termos do artigo 1.553 do antigo Código Civil. Por fim, a indenização referente aos direitos autorais foi aumentada do valor de mil para dois mil exemplares, pela publicação indevida de cada uma das fotos.
Leia a decisão
Dcl no RECURSO ESPECIAL Nº 617.130 – DF (2003/0208381-6)
RELATÓRIO
EXMO. SR. MINISTRO ARI PARGENDLER (Relator):
Os embargos de declaração atacam o acórdão da lavra do eminente Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, assim ementado, in verbis:
‘DIREITO CIVIL. DIREITO AUTORAL. FOTOGRAFIA. PUBLICAÇÃO SEM AUTORIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. OBRA CRIADA NA CONSTÂNCIA DO CONTRATO DE TRABALHO. DIREITO DE CESSÃO EXCLUSIVO DO AUTOR. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 30 DA LEI 5.988/73 E 28 DA LEI 9.610/98. DANO MORAL. VIOLAÇÃO DO DIREITO. PARCELA DEVIDA.
DIREITOS AUTORAIS. INDENIZAÇÃO.
I – A fotografia, na qual presente técnica e inspiração, e por vezes oportunidade, tem natureza jurídica de obra intelectual, por demandar atividade típica de criação, uma vez que ao autor cumpre escolher o ângulo correto, o melhor filme, lente apropriada, a posição da luz, a melhor localização, da composição da imagem, etc.
II – A propriedade exclusiva da obra artística a que se refere o art. 30 da Lei 5.988/73, com a redação dada ao art. 8 da 9.610/98, impede a cessão não-expressa dos direitos do autor advinda pela simples existência do contrato de trabalho, havendo necessidade, assim, de autorização explícita por parte do criador da obra.
III – O dano moral, tido como lesão à personalidade, à honra de pessoa, mostra-se às vezes de difícil constatação, por atingir os seus reflexos parte muito íntima do indivíduo – o seu interior. Foi visando, então, a uma ampla reparação que o sistema jurídico chegou à conclusão de não se cogitar da prova do prejuízo para demonstrar a violação do moral humano.
IV – Evidenciada a violação aos direitos autorais, devida é a indenização, que, no caso, é majorada.
V – Recurso especial conhecido e parcialmente provido’ (fl. 878).
A teor das razões do recurso:
‘Do cotejo do aqui transcrito com o que se contém na peça de interposição do próprio recurso especial julgado pela colenda 3ª Turma do STJ, resta suficientemente comprovado que, lamentavelmente, com todas as vênias cabíveis aos eminentes Ministros, os votos proferidos não se esquadrinharam totalmente a matéria posta em julgamento. Antes, enveredando por questões outras também relevantes, omitiram-se e deixaram de enfrentar a nítida ofensa ao direito federal, perpetrada pelo acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal. E note-se que o aqui embargante teve o cuidado de, no momento oportuno, também denunciar omissão perante o tribunal a quo.
É que os art. 21, 25, e 126 da Lei Federal nº 5.988, de 14 de dezembro de 1973, expressamente referidos e transcritos na petição do recurso especial interposto pelo aqui embargante, dispõe, verbis:
‘Art. 21 – O autor é titular de direito morais e patrimoniais sobre a obra intelectual que produziu.’
‘Art. 25 – São direitos morais do autor: I – o de reivindicar, a qualquer tempo, a paternidade da obra; II – o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anunciado, como sendo o do autor, na utilização da sua obra;’
‘Art. 126 – Quem, na utilização, por qualquer meio ou processo, de obra intelectual, deixar de indicar ou de anunciar, como tal, o nome, pseudônimo, ou sinal convencional do autor, intérprete ou executante, além de responder por danos morais, está obrigado a divulgar-lhe a identidade:
a) (…)
b) em se tratando de publicação gráfica ou fonográfica, mediante inclusão de errata nos exemplares ainda não distribuídos, sem prejuízo de comunicação, com destaque, por três vezes consecutivas, em jornal, de grande circulação, do domicílio do autor, do editor ou do produtor;’
(…)
Sobre a aplicação de tal norma, vejam, nobres julgadores, que a exemplo do que ocorre com a condenação a pagamento dos honorários advocatícios, que decorrem da mera sucumbência da parte e não depende de pedido expresso, o art. 108 da vigente Lei Federal nº 9.610/98, supra, se impõe no caso dos autos, ainda que não houvesse sido apresentado, como foi (tanto que está aqui transcrito) expresso pedido de condenação da parte vencida, a ‘também publicar as fotografias com o crédito (nome do autor) como pedido na inicial; e impondo, também, ao réu, o ônus da sucumbência, tudo por questão de justiça’ (Apud – pedido-página 28 do presente recurso especial).
Registre-se, por oportuno, que repetidas vezes o acórdão proferido no recurso especial reconhece que as nove (9) fotografias do aqui embargante (único proprietário delas) foram publicadas pela recorrida, deixando de divulgar o nome (crédito) do autor das fotografias. E essa é a única exigência da lei. Condenada a recorrida a indenizar, com foi, impõe-se, por força de lei, que a condenação se estenda, também, à republicação de todas as referidas fotos, por três (3) vezes, com o nome do aqui embargante, como determina a referida norma legal. É o que se impõe ser julgado.
(…)
A simples leitura do acórdão faz prova bastante do manifesto equívoco/contradição cometido por ocasião do julgamento, no que pertine à condenação da recorrida ao pagamento de dano material, representado pela remuneração não percebida pelo autor das fotografias (embargante), que teve sua obra repetidamente veiculada pela embargada, para fins comerciais, sem sua autorização e sem perceber pagamento.
É que, com relação a essa parte do recurso especial, o eminente Ministro Humberto Gomes de Barros (voto-vista), transcrevendo material que cita, deu provimento ao recurso, tendo por evidenciado o dano material suportado pelo aqui embargante, determinando, inclusive, que a apuração se faça na liquidação de sentença, por arbitramento.
(…)
Ora, a leitura do que se contém no referido voto-vista faz prova inconteste de que, no que se refere ao pedido de condenação da recorrida a pagamento de danos materiais, o voto-vista julgou procedente o pedido. E mais, os demais Ministros que votaram a matéria podem também assim haverem entendido que, ao aderirem ao relator (como fez o voto-vista), estavam condenando a recorrida a pagamento de danos materiais; considerando, ainda, que ao que consta do acórdão e sua respectiva certidão, o acórdão foi unânime, resta evidenciado o equívoco/contradição em que ocorreu o julgado. Uma coisa é certa, e absolutamente certa: pelo menos o eminente Ministro Humberto Gomes de Barros acolheu, também neste ponto, o recurso especial interposto.
Mas o equívoco do acórdão não fica nisso. O equívoco/contradição também se faz presente, explicitamente, no voto do douto Ministro Relator, condutor dos demais quanto a isso (e tratando-se de acórdão unânime, o equívoco se faz presente em todos os votos), na matéria pertinente à tiragem das fotografias. É que, data venia, pelo menos com relação a uma delas, é matéria pacífica nos autos de que a tiragem do jornal foi de 89.000 (oitenta e nove mil) exemplares. E o exemplar (ao vivo) do jornal encontra-se nos autos, com a fotografia indevidamente publicada, e com a confessada tiragem de 89.000 exemplares.
Poder-se-ia, ainda, dizer que a hipótese não é bem contradição, ou de equívoco, mas de pura omissão do julgado em analisar a tiragem (incontroversa nos autos) de uma das fotos (a do menor abandonado). De qualquer sorte, vale a reprodução do que foi dito a respeito no recurso especial julgado, verbis:
(…)
‘Este princípio, deve ser desprezado quanto à fotografia ‘menor abandonado’ publicada em suplemento especial do ‘Jornal de Brasília’ e do Jornal ‘O Popular’. É que nos autos se encontra um exemplar do referido encarte no qual consta, claramente (fls. 56, 57 e 58) que tal edição foi de 89.000 (oitenta e nove mil) exemplares. Assim, com relação a tal publicação ilícita, a base de cálculo da condenação deve ser 89.000 exemplares, e não 1.000 como consta na sentença’ (fls. 890/896).
Em contra-razões sustenta a embargada:
‘Primeiramente, não procede o pedido pela ‘republicação de todas as referidas fotos, por três (3) vezes, como o nome do aqui embargante, como determina a referida norma legal’ no jornal da embargada visto que os artigos 21, 25 e 126 da Lei n. 5.988/73 e artigo 108 da Lei n. 9.610/98 não foram objeto de análise pela parte do v. acórdão proferido pelo e. TJDF e sequer ventilados no v. acórdão proferido por esse e. STJ, originário dos embargos de declaração aqui combatido, causa da ausência do necessário prequestionamento.
(…)
Contudo, ainda que não fosse o caso, padece também de plausibilidade o pedido de publicação formulado pelo embargante visto que a embargada foi condenada a indenizar os danos morais causados à parte (parcela fixa e parcela a ser liquidada quando da execução da sentença), não havendo que se falar em complementação/majoração de indenização.
(…)
E mais, de nada adiantaria a determinação da republicação das fotografias inquinadas pelo embargante em razão do tempo decorrido, cuja medida seria inócua, não parecendo lógico a ressurreição de fatos caídos no esquecimento que de nada aproveitaria a quaisquer dos litigantes, além de também ir em sentido contrário ao paradigma utilizado na fundamentação do v. acórdão hostilizado (REsp n. 121.757).
(…)
Ora, se o v. acórdão embargado aplicou corretamente a lei da época do caso concreto (Lei n. 5.988/73), consoante as provas constantes dos autos, não há que se falar em majoração da indenização para a fotografia intitulada ‘menor abandonado’, ainda que alegadamente veiculada em 89.000 edição de encarte jornalístico.
A Lei Federal n. 5.988/73, aplicável à época, orientava em seu artigo 61 que, ‘no silêncio do contrato, considera-se que cada edição constitui dois mil exemplares’ (fls. 908/909).
VOTO
EXMO. SR. MINISTRO ARI PARGENDLER (Relator):
Os embargos de declaração, que têm propósito declaradamente modificativo, apontam, em suma, os seguintes vícios no acórdão embargado:
a) omissão quanto ao pedido de republicação das fotos por três vezes, agora constando adequadamente o nome do embargante como seu autor;
b) contradição entre o voto do relator e o voto-vista proferido pelo eminente Ministro Humberto Gomes de Barros quanto à condenação ao pagamento de danos materiais;
c) contradição quanto ao valor da indenização pela publicação da foto ‘menor abandonado’, cuja tiragem, comprovada nos autos, foi de 89.000 exemplares. Com razão, em parte.
A omissão do acórdão embargado, quanto ao pedido de republicação das obras fotográficas, por três vezes, com o nome de seu autor, é justificada pela ausência de prequestionamento da matéria. O voto condutor proferido no tribunal a quo deixou de apreciar o aludido pedido, sem que o recorrente tenha oportunamente tentado suprir a omissão por meio de embargos de declaração.
Mas tem razão o embargante no que diz respeito à contradição havida entre o voto proferido pelo eminente Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, que não teria reconhecido o direito à indenização por danos materiais, e o voto-vista proferido pelo eminente Ministro Humberto Gomes de Barros, que transcreveu em sua fundamentação ementa da lavra do eminente relator, em que fora acolhido o pedido de danos materiais, cuja apuração inclusive fora remetida para liquidação de sentença.
Da consulta às notas taquigráficas relativas à sessão de julgamento do recurso especial, que passam a integrar este voto, verifica-se que realmente o voto e a ementa do relator juntados aos autos não refletem o que ficou decidido pela egrégia Terceira Turma.
Delas constaram como parte dispositiva do julgado, in ‘Conheço do recurso especial e dou-lhe provimento para acolher em parte o pedido e condenar a recorrida a pagar ao recorrente, a título de danos morais, a importância de vinte e seis mil reais, corrigidos a partir desta data, sob a qual incidirão juros de mora de 0,5% ao mês, desde a data da primeira publicação indevida no jornal da recorrida, nos termos do enunciado da Súmula 54 deste Tribunal, condenando-a, ainda, ao pagamento de danos materiais, a ser apurado em fase de liquidação por arbitramento, nos termos do art. 1.553 do antigo Código Civil, bem como majorar a indenização referente aos direitos autorais para dois mil exemplares, pela publicação indevida de cada uma das fotos. Tendo em vista a sucumbência mínima do autor, condeno a ré a pagar as custas processuais e a verba advocatícia, que fixo em 10% sobre o valor da condenação.’
Ao passo que do voto juntado aos autos constou como parte dispositiva: ‘Em face do exposto, conheço do recurso especial e dou-lhe provimento para acolher, em parte, o pedido inicial e condenar a recorrida a pagar ao recorrente, a título de danos morais, a importância de R$ 26.000,00 (vinte e seis mil reais), corrigida a partir desta data e sobre o qual incidirão juros de mora de meio por cento ao mês desde a data da primeira publicação indevida no jornal da recorrida, nos termos do enunciado n. 54 da Súmula do STJ, bem como para majorar a indenização referente aos direitos autorais para 2.000 (dois mil) exemplares pela publicação indevida de cada uma das fotos. Tendo em vista a sucumbência mínima do autor, condeno a ré a pagar as custas processuais e a verba advocatícia que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação’ (fl. 873).
Tendo em vista que todos os demais integrantes da Terceira Turma acompanharam o relator também no que diz respeito à procedência do pedido de condenação à indenização por danos materiais, bem como à sua apuração por meio de liquidação, deve valer o que foi julgado pela Turma, e não o que erroneamente constou do voto e ementa juntados aos autos.
O que, finalmente, o embargante chama de contradição não tem essa natureza. Com efeito, não obstante as razões de apelação tenham procurado demonstrar que a foto do menor abandonado, cuja publicação teve tiragem certa de 89.000 exemplares, merecia tratamento diferente daquele dado às demais fotos (fl. 610), o tribunal a quo nada decidiu a respeito, embora tivesse sido provocado por embargos de declaração (fls. 799/800 e fls. 806/807). À míngua de indicação de contrariedade ao artigo 535, inciso II, do Código de Processo Civil, já não há o que fazer nesta instância.
Voto, por isso, no sentido de acolher os embargos de declaração em parte, para dar ao voto condutor do acórdão embargado a seguinte parte dispositiva:
Conheço do recurso especial e dou-lhe provimento para acolher, em parte, o pedido e condenar a recorrida a pagar ao recorrente, a título de danos morais, a importância de R$ 26.000,00 (vinte e seis mil reais), corrigidos a partir desta data, sobre as quais incidirão juros de mora de 0,5% ao mês, desde a data da primeira publicação indevida no jornal da recorrida, nos termos do enunciado da Súmula 54 deste Tribunal, condenando-a, ainda, ao pagamento de danos materiais, a ser apurado em fase de liquidação por arbitramento, nos termos do art. 1.553 do antigo Código Civil, bem como para majorar a indenização referente aos direitos autorais para dois mil exemplares, pela publicação indevida de cada uma das fotos. Tendo em vista a sucumbência mínima do autor, condeno a ré a pagar as custas processuais e a verba advocatícia, que fixo em 10% sobre o valor da condenação.’