Leia abaixo a seleção de terça-feira para a seção Entre Aspas.
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Folha de S. Paulo
Terça-feira, 4 de novembro de 2008
ELEIÇÕES NOS EUA
EUA na encruzilhada
‘OS ESTADOS UNIDOS chegam divididos à eleição de seu 44º presidente. O cisma profundo que perpassa a sociedade americana fica muito evidente nos mapas com projeções de votação.
Estados azuis -pró-Obama, candidato democrata- se concentram no nordeste, na Costa Oeste e nos Grande Lagos, regiões mais abertas ao mundo e às novas idéias. Os Estados vermelhos -pró-McCain, republicano- tendem a localizar-se no Sul e no coração do Oeste, a parte dos EUA voltada para si mesma e suas tradições, marcadamente religiosas.
A polarização não separa apenas adeptos e adversários do republicano George W. Bush, cuja administração termina numa violenta crise econômica, batendo recordes de impopularidade. São duas mentalidades que se opõem. O entrechoque de poderosas correntes subterrâneas não permite excluir de todo uma vitória de John McCain.
Já por suas biografias e trajetórias, os dois candidatos personificam a antinomia que divide os EUA -e inquieta todas as nações que aprenderam a respeitá-los.
Barack Hussein Obama, 47, compõe uma síntese de cultuadas tradições americanas. Filho de um casamento birracial incomum -pai queniano, mãe americana- que passou a infância e a adolescência longe da América, no Havaí e na Indonésia, Obama galgou o topo da elite dos Estados Unidos pela escada do mérito, que o levou às universidades Columbia e Harvard.
A porta de entrada para a política foi o serviço comunitário em Chicago e o trabalho como advogado de direitos civis. A militância o levaria ao Senado estadual e, depois, ao federal. Obama atribui sua atenção para problemas sociais ao período que passou em Jacarta, seu contato mais próximo com a pobreza.
John Sidney McCain, 72, filho e neto de almirantes, nasceu na Zona do Canal do Panamá, símbolo do imperialismo americano. Herói da Guerra do Vietnã, caiu prisioneiro em 1967. Recusou uma oferta de libertação, porque não incluía seus subordinados, e por isso amargou cinco anos e meio de cativeiro. Em 1982 elegeu-se deputado e depois chegou ao Senado, onde nem sempre acompanhou o conservadorismo republicano, como ao votar sobre imigração.
Ao longo da campanha eleitoral, entretanto, McCain enterrou tais veleidades. Apelou aos EUA profundos, tementes a Deus e ao terrorismo sobre todas as coisas, como única chance de derrotar a perturbadora mudança prometida por Obama. Passou a tachar o oponente de ‘socialista’, secundado pela obscura governadora do Alasca que escolheu para vice.
Se McCain representa, ainda que a contragosto, a herança do governo Bush, Obama se encaixa a cada dia menos no figurino do candidato que corre por fora e atropela o establishment. A imprensa americana em peso, os cardeais do Partido Democrata (a começar pelos Clinton) e até republicanos célebres como o ex-secretário de Defesa Colin Powell se alinharam com ele.
As pesquisas, hoje, apontam para uma vitória democrata, triunfo esse que em seguida poderá até parecer fácil, favorecido como foi Obama pela crise financeira. Difícil será unir o país em torno de um projeto de mudança, em meio à recessão e ao desemprego que se espraiam.’
Clóvis Rossi
Duplamente extraordinária
‘SÃO PAULO – Olhando para trás, é impossível discordar do presidente Luiz Inácio Lula da Silva quando ele diz que é ‘extraordinário’ o fato de os Estados Unidos elegerem, eventualmente, um presidente negro.
Afinal, há meio século, pouco mais ou menos, um Barack Obama nem poderia sentar-se no mesmo banco de um branco, imagine então ter assento na Casa Branca. Mas, olhando para a frente, o ‘extraordinário’ é insuficiente. A cor da pele do presidente -branca ou negra- não vai estabilizar a economia (norte-americana ou do resto do mundo), não vai devolver um mínimo de civilização ao Iraque ao Afeganistão ou a Darfur, não vai reduzir nadica o aquecimento global, não vai, enfim, resolver um só dos problemas do planeta.
Sei que é óbvio tudo o que está escrito antes, mas o entusiasmo que despertou Barack Obama na maioria da mídia norte-americana (e do resto do mundo) tende a sepultar o óbvio e, por extensão, a fazer crer que o importante é o resultado eleitoral em si, não a ação que o governante adotará depois dele. Nesse ponto, fico com o presidente Hugo Chávez, da Venezuela: ‘Que um negro chegue à Presidência dos Estados Unidos não é pouco; que esteja à altura da história é outra coisa’.
Podem apostar à vontade no declínio do império, mas, hoje por hoje, os EUA são a única superpotência do planeta, e, por extensão, seu presidente é o único capaz de liderar a tal de ‘change’ (‘mudança’) de que tanto fala Obama.
Nenhuma mudança, boa ou ruim, se fará sem os Estados Unidos ou contra os Estados Unidos.
O problema é que ‘os EUA aparentemente estão para eleger o mais inexperiente, menos testado e menos conhecido candidato que jamais concorreu ao cargo’, como escreveu ontem Janet Daley, do ‘Daily Telegraph’.
A eventual eleição de Obama é, pois, duplamente extraordinária.’
Eliane Cantanhêde
Ninguém é perfeito
‘BRASÍLIA – Ao vencer as primárias democratas em Iowa, onde tudo começou, Barack Obama comemorou: ‘A esperança venceu o medo’. Onde você já ouviu isso? Pois é, Obama nos EUA, como Lula no Brasil, fez a campanha da ‘esperança’, da ‘mudança’.
Uma guinada pró-John McCain hoje não é impossível, mas é improvável. Em dando Obama, os democratas terão a Casa Branca e uma maioria, tanto na Câmara como no Senado, provavelmente impermeável às manobras obstrucionistas dos republicanos.
Obama terá, assim, legitimidade eleitoral, segurança no Congresso e uma imensa simpatia internacional, aliadas a um imenso carisma pessoal e a um poderoso discurso de ‘transformação’.
Para dentro dos EUA, espera-se que ele interrompa o ‘ladeira abaixo’ da maior economia do planeta, que atropela a Europa e causa engarrafamento no mundo.
Para fora, espera-se que Obama faça um mea-culpa pelos erros dos EUA e adote uma política externa aberta, dialogando com amigos e com ‘inimigos’, inclusive Chávez, forçado a rever a retórica: como chamar Obama de ‘diabo’, como faz com Bush?
O mundo precisava dos EUA. Agora, os EUA não mandam mais sozinhos e precisam do mundo. Até para sair da própria crise.
Com a expectativa ‘para dentro’ e ‘para fora’, Obama deve manter a tradição democrata de subsidiar a produção interna em detrimento da importação de países como o Brasil, mas deve fortalecer o ansiado ‘multilateralismo’. E os ‘emergentes’, novamente como Brasil, terão cada vez mais voz e respeito.
Em outras palavras: Obama pode não agradar os exportadores brasileiros, mas deve investir num equilíbrio melhor entre as nações. O preço compensa. E, afinal, ninguém é perfeito.’
Carlos Heitor Cony
O poeta das Gálias
‘RIO DE JANEIRO – Comparado ao Império Romano em seus tempos de glória, os Estados Unidos mudam hoje o comando da guarda e o resto do mundo acompanha com interesse (ou preocupação) o novo esquema de poder que de certa forma contaminará a economia mundial. Tal como no tempo dos imperadores de Roma, havia e há províncias esparsas que contestavam e contestam o poder e a glória dos Césares de plantão.
Albert Uderzo e René Goscinny criaram em 1959 uma história em quadrinhos na qual uma aldeia gaulesa se rebela contra a globalização romana. São personagens engraçados. O meu preferido é Chatotorix, ‘o poeta mais chato das Gálias’. Após cada episódio, ninguém pode evitar que ele tome a palavra e comente o que se passou.
Hoje é dia importante na vida do império, e haverá Chatotorixes em todos os quadrantes da Terra para louvar ou chorar a vitória ou a derrota de Obama ou McCain. Pensando bem, do ponto de vista internacional, o resultado não mudará em muita coisa a atual situação. Os Estados Unidos continuarão fazendo o possível e o impossível para manter a hegemonia militar e econômica, tendo inclusive o argumento da sua segurança ameaçada pelo terrorismo. Já se teme desde já um atentado de morte contra um dos candidatos, não por suas idéias, mas pelo fato de ser negro.
A mídia mundial, em sua quase compacta maioria, futebolizou a disputa entre democratas e republicanos, na base de uma batalha do bem contra o mal em termos absolutos. Se Obama vencer, o poeta fará odes retumbantes à vitória do bem, cantará a nova era que se abre não apenas para os Estados Unidos mas para o mundo todo.
Em caso contrário, Chatotorix chorará amargamente, atribuindo a derrota à Ku Klux Klan, à CIA e ao papa Bento 16.’
Marcos Nobre
Obama e as circunstâncias
‘A VELHINHA de Milwaukee e João Pereira Coutinho acreditam que John McCain vencerá as eleições de hoje nos EUA. Sem desmerecer a torcida de ninguém, junto-me ao Eremildo na certeza de que Obama será o próximo presidente.
Obama pode ser vago, mas não esconde o tamanho que pretende ter. Ainda durante a disputa pela indicação, declarou que Ronald Reagan ‘alterou a trajetória dos EUA de um modo que Richard Nixon não fez e de um modo que Bill Clinton não fez’.
Quis dizer que um presidente é essencialmente as suas circunstâncias. Sob Ronald Reagan, afirmou, havia uma disposição das pessoas para a mudança. Ou seja: não é acaso que seu slogan de campanha seja ‘a mudança de que precisamos’. Obama quer ser um ‘Reagan democrata’.
Seja lá o que isso queira dizer (não parece boa coisa de qualquer forma), oportunidade não faltará. A crise econômica atual não é a de 1929, nem de longe e ainda bem.
Mas é muito grave. E, pela primeira vez em 70 anos quase ininterruptos, as duas Casas do Congresso devem ter maioria democrata. A distância histórica que separa do 1980 de Reagan é imensa. Não apenas pelo desaparecimento da União Soviética e pela revolução da informática. Todo o aparato teórico da economia que governa até hoje já tinha sido produzido e dominava a academia e instituições como o FMI e o Banco Mundial.
Para estender esse domínio também para a política faltava-lhe apenas desenvolver as técnicas de governo correspondentes. Reagan e Margareth Thatcher abriram seus governos a esse experimento. Hoje, ao contrário, não há nenhum arsenal científico e técnico alternativo à disposição. São tempos de mercado financeiro globalizado e de política econômica única.
Veja-se o exemplo dos ideólogos do mercadismo. Resolveram sumir por uns tempos, virar analistas imparciais que não têm nada com isso, reclamar da falta de moralidade dos agentes econômicos. Voltam a passar sermão assim que a crise amainar. Como se nada houvesse.
Além disso, uma mudança do tamanho que parece querer Obama é difícil por ele pertencer a uma geração emparedada entre o fantasma da ‘imaginação no poder’ dos anos 1960 -quando nasceu- e a mentalidade ‘só quero saber do que pode dar certo’ que guiou sua formação nos anos 1980. Em política, é uma geração (também no Brasil) marcada por poucas idéias e muito realismo político.
Talvez seu lugar na história não seja mais do que o de administrar os conflitos em fogo brando e de passar o bastão adiante. Mas pelo menos deve passar um bastão sem guerras nem obscurantismo. Não é pouca coisa.’
Janio de Freitas
A democracia em dia
‘BARACK OBAMA é um homem de coragem. Se por natureza, por desprendimento em razão de ideais ou por ambição desmedida, não faz diferença para a condição sem igual que viveu nos últimos dez meses, no longo percurso da disputa sucessória. Barack Obama é a única pessoa, dentro e fora dos Estados Unidos, que nestes meses não esteve sob a expectativa receosa, e tantas vezes posta em público, de que sua ousadia negra fosse punida com outro dos balaços determinantes na democracia americana.
Mais fortes do que a soma dos votos, é verdade que essas balas não escolhem seus alvos só pela cor da pele. Desde o século 19, a espécie tipicamente americana dos votos letais, sob a forma de projéteis, tem reajustado aos interesses e ideologias dos seus usuários também vitórias eleitorais de brancos, ou sua provável ocorrência.
Ainda que tenham finalidade menos insana, John McCain e Sarah Palin incitaram os ânimos que ativam contra Barack Obama a solução letal. Os comícios em que apontam a proposta de ‘distribuição menos injusta da renda’, constante do programa de Obama, como ‘propósito encoberto de instalar o socialismo na América’, McCain e sua caçadora decidiram explorar o que há de mais primário na mentalidade americana. A grande trincheira de onde sai toda a ferocidade que tanto se abate sobre o Vietnã como sobre dois Kennedy, Barry Goldwater, Martin Luther King, por exemplo.
Não há como prever se a esperada vitória de Obama, com a habilidade política que lhe é atribuída, atenuará ou encrespará o risco que o circunda. De certo, só isso: a expectativa receosa o seguirá, dentro e fora dos Estados Unidos, na (provável) Presidência. Com motivo para tanto, porque não há sistema de proteção que possa defendê-lo sempre, ou a qualquer pessoa, na população mais armada do mundo e mais afeita ao uso de suas armas. Armas e usos pessoais, não as que vão ao Iraque, ao Afeganistão e se espalham entre bases incontáveis, porque há as secretas, por todo o planeta.
Mesmo se surpreendido no resultado, Barack Obama exibiu uma experiência política e existencial extraordinária. Negro, independente dos círculos dominantes, oponente hábil das idéias tradicionais ‘da América’, impôs sua aceitação como possível ocupante da Presidência. Não seria o caso, porém, de dividir seu feito com um avanço político e cultural, alegado por muitos comentaristas, da sociedade americana.
A campanha do negro Obama precisou evitar, ao limite do possível, referências aos de sua cor. Foi para não despertar, aparentando-o como candidato dos negros, o racismo latente em muitos dos que admitiam dar-lhe o voto. Pelos Estados Unidos afora, áreas com concentrações negras foram levadas a conter suas manifestações de apoio a Obama, porque o prejudicariam com a esperança e o entusiasmo da cidadania negra. Comunidades muçulmanas, densidades caribenhas e centro-americanas e até artistas negros foram levados à mesma contenção. A travessia feita pela candidatura de Barack Obama foi, portanto, a maior evidência da extensão do racismo na democracia americana.
Ah, que linda é a democracia que os Estados Unidos hoje vão afirmar em casa, e todos os dias querem levar a outros povos, por todos os meios, como benfeitores da civilização.’
Sérgio Dávila
No último dia da campanha, Obama perde avó que o criou
‘Madelyn Dunham, a avó materna de Barack Obama -a quem ele chamava de mentora, apontada como principal responsável por sua educação e a quem dedicou a vitória nas prévias democratas-, morreu. Ela tinha 86 anos e sofria de câncer.
Segundo Jen Psaki, assessora de imprensa de Obama, Dunham morreu na noite de anteontem em Honolulu, no Havaí, onde morou por quase quatro décadas. O candidato soube na manhã de ontem, quando se preparava para seu último dia de comícios em Jacksonville, na Flórida. Ao longo do dia, participou dos eventos programados sem citar o ocorrido.
Após os primeiros rumores chegarem à imprensa, no entanto, a campanha confirmou o fato e soltou declaração conjunta de Obama e sua meia-irmã, a indonésia Maya Soetoro-Ng, na qual se referia à avó como ‘o pilar de nossa família’.
Foi só à noite que ele a citou em um comício, em Charlotte (Carolina do Norte). ‘Ela morreu placidamente enquanto dormia com minha irmã a seu lado, então há alegria assim como lágrimas. Não falarei muito, pois é difícil’, disse. Mas lembrou que ela viveu a Grande Depressão e a Segunda Guerra, que trabalhou em uma linha de montagem tendo um bebê de quem cuidar e o marido servindo nas Forças Armadas, e que ela era franca e humilde, uma das ‘heroínas discretas que há pelo país’, trabalhando duro para que filhos e netos vencessem. ‘É por isso que lutamos.’
Madelyn Lee Payne Dunham nasceu em Peru, Kansas, em 26 de outubro de 1922. Naquele Estado, conheceu e se casou com Stanley Dunham, já morto, com quem teria Ann. Os três se mudaram para o Havaí, onde Ann conheceu o queniano Barack Hussein Obama, sênior, numa aula de russo. Com ele, aos 18, teve Barack Obama. Os dois se separaram logo, e ele só veria o filho uma vez depois.
Os avós do candidato passaram a criar Obama quando ele voltou da Indonésia, aonde tinha ido morar com a mãe e o padrasto e onde nasceu sua meia-irmã. Mas o papel principal coube à avó, que ascendeu de secretária a vice-presidente de um banco local, a primeira mulher a ocupar o cargo.
Desde que o neto começou a corrida à Presidência, já por conta da saúde precária, Madelyn diminuiu suas aparições em público.
‘Civis’
Foi o momento delicado de um dia em que o democrata percorreu três Estados-pêndulo fazendo os últimos discursos de sua campanha. Pela manhã, em Jacksonvile, na Flórida; à tarde, em Charlotte; e, à noite, estava previsto um megaevento em Manassas, na Virgínia. Nos dois primeiros, as pesquisas dão empate; no último, que não vota em democrata desde 1964, Obama está pouco à frente.
Pela manhã, em entrevistas a TVs, o candidato reclamou do tratamento dado a sua mulher, Michelle, no começo da campanha. ‘Acredito que há um grupo de veículos republicanos ou de direita que perseguiu minha mulher de uma forma que eu considero imprópria’, disse à âncora Katie Couric, para afirmar que via seus familiares como ‘civis’ na guerra eleitoral.
Ao longo do dia, o comando da campanha republicana colocou no ar comerciais que voltam ao caso do polêmico pastor Jeremiah Wright, mentor religioso de Obama por vários anos e que no começo do ano causou constrangimento ao candidato depois de vir a público uma série de discursos seus em que atacava o que considerava racismo dos brancos dos EUA.
Um dos trechos do comercial repete a polêmica frase: ‘Deus salve a América? Deus amaldiçoe a América!’. Logo após, a locutora afirma: ‘Barack Obama. Muito radical. Muito arriscado’. Até a semana passada, McCain resistia a pressões do partido para voltar ao tema do líder religioso. Ontem, analistas republicanos ponderavam que ele cedeu tarde demais.
Na noite de ontem, os dois candidatos dariam entrevistas no intervalo de um importante jogo de futebol americano, na emissora ESPN, com transmissão para o Brasil. As campanhas disseram que eles falariam só de esportes. Obama deve votar hoje em Chicago, onde mora. Antes, era prevista uma parada em Indiana, Estado vizinho.
Em Jacksonville, falando a 9.000 pessoas, criticou John McCain: ‘Lembra-se do que ele disse, aqui, em 15 de setembro? Naquele dia, mais de 5.000 empregos foram perdidos, e mais de 7.000 hipotecas entraram em concordata. Na véspera, Alan Greenspan dissera que estávamos numa crise que ocorre uma vez a cada século. Ainda assim, John McCain disse aqui que ‘os fundamentos da economia são sólidos’.
Os presentes vaiaram, e Obama respondeu: ‘Vocês não têm de vaiar. Vocês têm de votar’.’
Fernando Rodrigues
Imagem do republicano muda com campanha
‘Há evidências de sobra indicando um possível fracasso de John Sidney McCain 3º, 72, na eleição de hoje. Se ele contrariar as previsões e se tornar o 44º presidente dos Estados Unidos, será mais uma história de superação na vida desse que pode ser o mais idoso americano a ocupar a Casa Branca num primeiro mandato.
McCain é filho e neto de militares, ambos almirantes. Acabou seguindo carreira na Marinha. Piloto, serviu no Vietnã. A partir daí sua vida mudou.
Em 26 de outubro de 1967, McCain foi abatido. Um míssil atingiu seu caça Skyhawk. Sobreviveu à queda, mas ficou muito ferido. Capturado pelos vietnamitas, foi encarcerado numa prisão em Hanói. Entrou na cela com 31 anos. Quando saiu, estava com 36.
Ao se lançar na política, em 1982, escolheu o Arizona para se candidatar a deputado. Conquistou o eleitorado, foi eleito e nunca mais saiu de Washington pelos 26 anos seguintes.
Com a credibilidade de seu passado na Marinha, McCain percebeu ter uma certa carta-branca como político. No Partido Republicano, é considerado um desgarrado, o mais progressista dos conservadores.
Depois de sua tentativa frustrada de se candidatar à Casa Branca em 2000, porém, resignou-se à escolha do partido. Apoiou George W. Bush. Paga um preço alto hoje. Na atual campanha, teve de ser direto ao debater com Barack Obama, procurando exorcizar a imagem de governista: ‘Eu não sou o presidente Bush’.
A publicidade de McCain martela as expressões ‘experiência’, ‘capacidade de liderar’, ‘testado em momentos de crise’. Apela diretamente ao patriotismo dos americanos. Compara-se ao adversário democrata ‘que nunca dirigiu nada’ e só vai para a Casa Branca para ‘redistribuir riqueza’.
McCain surpreendeu ao escolher para vice Sarah Palin, então desconhecida governadora do Alasca. Conservadora e hábil sobre o palanque, compensava dois predicados que o candidato republicano não possui para o público interno.
As pesquisas rapidamente captaram o momento. McCain empatou com o democrata Barack Obama na primeira quinzena de setembro. Mas um raio vindo de Wall Street abalou sua campanha. O estouro da bolha imobiliária e a iminência de uma das piores recessões desde a Segunda Guerra Mundial trouxeram novamente McCain e Bush, juntos, para o centro do palco político como responsáveis associados pela derrocada.
O republicano tentou reagir. Lançou um novo personagem na campanha, ‘Joe, o encanador’ -a síntese do cidadão americano médio, empreendedor, que sofre quando o governo aumenta impostos. McCain tentou colar em Obama a pecha de ‘socialista’. Em princípio, a estratégia ecoou apenas entre os que já estavam propensos a eleger o senador pelo Arizona.
Se conseguir superar as dificuldades hoje nas urnas, será uma das histórias mais extraordinárias do ex-piloto de caça McCain. Se perder, certamente sua carreira política entrará em uma fase crepuscular.
No caso de derrota, amargará uma inversão de sinais sobre seu legado. Entrou na campanha como um político flexível, conservador moderado. No espectro ideológico, está à esquerda dos últimos três presidentes eleitos pelo seu partido (Ronald Reagan e os dois Bush). Por conta de uma campanha errática, sairá do processo como alguém que cedeu aos ataques de baixo nível e foi responsável pelo lançamento nacional de Palin, sua antípoda em quase todos os aspectos.’
TELES
Contrato de compra da BrT pela Oi pode ser revisto, diz Previ
‘O presidente da Previ (Caixa de Previdência dos Empregados do Banco do Brasil), Sérgio Rosa, disse ontem que o contrato de compra da Brasil Telecom pode ser alterado para evitar que a Oi/Telemar pague a multa por atraso, de R$ 490 milhões.
A Previ é acionista controladora da Brasil Telecom com o Citibank e também da Oi. O contrato assinado entre os controladores da Oi e da BrT, no fim de abril, estabeleceu a data de 21 de dezembro para a conclusão do negócio. Caso contrário, incidiria a multa.
Na semana passada, Otávio Azevedo, presidente do grupo Andrade Gutierrez -um dos acionistas controladores da Oi-, afirmou que não haveria interesse dos controladores das duas teles em modificar o contrato.
Sérgio Rosa contradisse Azevedo ontem. Segundo ele, os acionistas podem modificar o contrato. ‘Se o negócio continuar fazendo sentido para compradores e vendedores, acredito que é possível prolongar a data de validade do contrato’, disse.
Para Rosa, a queda das Bolsas não diminui o interesse em concluir o negócio, porque suas condições foram acertadas a partir de uma estratégia de longo prazo. ‘Ninguém colocou a multa no contrato pensando em receber. É uma cláusula habitual, para que as partes não chutem o contrato para cima, sem conseqüências.’
O conselho consultivo da Anatel aprovou ontem parecer favorável ao novo Plano Geral de Outorgas.
Colaborou a Folha Online, em Brasília’
FUTEBOL NA JUSTIÇA
Materazzi ganha ação contra jornal
‘O ‘Daily Mail’, que acusou o italiano de proferir palavras racistas no lance em que Zidane o atingiu com uma cabeçada, foi condenado pelo Tribunal Superior de Londres. O valor da multa não foi divulgado.’
Felipe Seligman
Pelé processa ‘Eterno’ e pode ganhar R$ 10 mi
‘A Universal Pictures, gigante norte-americana do mercado cinematográfico, foi condenada na primeira instância da Justiça brasileira por descumprir contrato de distribuição de ‘Pelé Eterno’ (2004), longa-metragem que conta a trajetória de Edson Arantes do Nascimento, o Pelé.
Os advogados do ex-jogador afirmam que ele e a Anima, produtora responsável pelo filme, deverão receber da Universal mais de R$ 10 milhões. Isso porque a sentença da 19ª Vara Cível de São Paulo inclui no cálculo da punição o descumprimento do contrato, juros e correção monetária, além do lucro que teria deixado de ser acumulado com a falta da distribuição do longa-metragem.
A empresa ainda poderá recorrer da decisão, mas, se a sentença for confirmada nas instâncias superiores, o valor a ser pago deverá ser ainda maior.
A defesa de Pelé alegou que a Universal não distribuiu o filme no exterior, onde poderia divulgar a imagem dele, e, no Brasil, teria retirado rapidamente a produção de cartaz.
O filme, lançado em 2004, custou pouco mais de R$ 5 milhões, sendo R$ 1,7 milhão pago pela Universal Pictures, que teve como contrapartida a isenção de impostos prevista na Lei do Audiovisual (Lei 8.685 de 1993), além de 5% de todas as receitas líquidas obtidas com a exibição, distribuição e comercialização do filme durante todo o prazo do contrato.
O acordo entre Pelé, a produtora brasileira e a Universal foi firmado em 2002, prevendo que a empresa norte-americana teria a exclusividade da distribuição por 70 anos.
Na decisão, o juiz responsável pelo caso, Clóvis Ricardo de Toledo Júnior, relata que a defesa da Universal argumentou não ter descumprido o contrato, já que o prazo de distribuição não acabara.
A empresa também afirmou que ‘em razão do baixo público junto ao filme, exerceu o direito contratual de não lançá-lo nos demais mercados’. A Folha não conseguiu falar com os advogados da empresa até o fechamento desta edição. Na internet, o site da companhia no Brasil estava fora do ar.
Na decisão, Toledo afirma que ‘o potencial do filme no exterior não foi explorado plenamente’ e que essa ‘ausência de exploração da obra no exterior é injustificável perante a figura do Pelé, reconhecido ‘Atleta do Século’ passado e ilustre personagem do mundo moderno’.’
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Após lançamento, filme ficou apenas um mês em cartaz
‘O longa-metragem ‘Pelé Eterno’ (2004) foi lançado no dia 18 de junho de 2004, mas ficou pouco mais de um mês em cartaz, em 150 cinemas brasileiros. Na ocasião, de acordo com o advogado Gabriel Dias, responsável pela defesa do ex-jogador, tanto Pelé como a produtora Anima esperavam que o filme atingisse seu ‘ápice de divulgação e comercialização no mercado internacional’ exatamente durante a Copa do Mundo de 2006, na Alemanha, por conseqüência da parceria com a Universal Pictures.’
TELEVISÃO
Record
‘‘Em resposta à coluna ‘Outro Canal’ de ontem (Ilustrada), esclareço que a Record mantém um programa de visitas exclusivamente voltado aos estudantes universitários em seus centros de produção em São Paulo e no Rio de Janeiro.
Atendendo a pedidos do público infantil, a Record está cadastrando escolas para que conheçam os estúdios da novela ‘Os Mutantes’ no Rec-Nov, no Rio.
Representantes da área de comunicação e do próprio elenco recepcionam a escola, e a visita é realizada em horário que não prejudique o ritmo das gravações.
O programa não é ‘obra de um diretor’, e sim da empresa.’
RICARDO FROTA , gerente nacional de comunicação da Rede Record (São Paulo, SP)
Resposta do jornalista Daniel Castro – Ainda não existe programa de visitação infantil aos estúdios da Record no Rio. As visitas da última sexta-feira foram uma exceção.’
Daniel Castro
Novo seriado da Globo irrita evangélicos
‘Nova série da Globo, ‘Ó Paí, Ó’ irritou evangélicos. O episódio de estréia, ‘Mercado Branco’, mostrou um pastor guloso e sedento por dinheiro em pleno Pelourinho, em Salvador, capital do candomblé.
No programa da última sexta, cujas temáticas eram a falta de dinheiro e a pirataria, o pastor (Lázaro Machado) cobrava o dízimo de uma fiel, o que desencadeava uma série de cobranças de R$ 50. Da casa da fiel, ele levou frutas. No final, em um bar, tentou levar embora um prato com amendoins.
‘Esta é a moral que a TV Globo sempre ensina: pastor é ladrão!’, escreveu em seu blog o pastor Derville de Souza Jr., de Curitiba. Para o religioso, a série mostrou ‘uma deturpação dos verdadeiros pastores’.
Já o pastor Artur Moraes da Costa, também na internet, fez uma análise mais mercadológica. Para ele, a Globo ‘debochou’ dos evangélicos porque ‘sua liderança foi seriamente abalada pelo crescimento da TV do bispo Macedo’ e ‘também pela mudança geopolítica nos Estados brasileiros, antes dominados pela direita’.
Segundo a Globo, é precipitado considerar o pastor ladrão. ‘O pastor é supercorreto, tem uma relação próxima com os fiéis’, afirma a emissora em nota. De acordo com a TV Globo, seu único ‘pecado é a gula, assim como aqueles padres que sempre aparecem em frente a um prato de macarronada ou devorando bolos’.
FOI MASSA
O GP do Brasil de Fórmula 1 rendeu à Globo 32,7 pontos no Ibope da Grande São Paulo, anteontem. Foram 5,2 pontos à mais do que a mesma corrida em 2007 (27,5). Exibido na seqüência, o futebol, que vinha marcando menos de 20 pontos aos domingos, cravou 23.
CURRAL 1
A Record comprou da Sony os direitos do reality show ‘The Farm’, sobre celebridades confinadas em uma fazenda. Mas nega que esteja produzindo o programa em sigilo para estrear em janeiro, junto com ‘Big Brother Brasil’, da Globo.
CURRAL 2
‘Ainda não existe escalação de elenco, nem apresentador, diretor e previsão de exibição’, afirma o porta-voz da Record, Ricardo Frota.
PESOS E…
Em despacho publicado ontem no ‘Diário Oficial’ da União, o Ministério da Justiça confirmou a reclassificação de ‘Mulheres Apaixonadas’ como imprópria para menores de 10 anos, como a Globo queria.
…MEDIDAS
No mesmo ‘Diário Oficial’, o ministério negou classificação livre para o ‘Programa da Tarde’, da Record. E reclassificou o ‘Show do Tom’ como impróprio para menores de 14 anos.
CABEÇADA
Ao contrário do que o Ministério Público Federal diz, o secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Jr., afirma que não recebeu recomendação para voltar atrás de decisão que autorizou as TVs a descumprirem a classificação indicativa onde não há horário de verão.’
Laura Mattos
‘George, o Curioso’ busca ensinar crianças
‘Protagonista de uma popular série de livros, um longa-metragem e um seriado infantil, o macaquinho George é um astro conhecido internacionalmente, mas seu DNA é brasileiro.
O personagem foi criado por um casal de alemães que viveu no Brasil na primeira metade do século passado. Hans Augusto Rey e sua mulher, Margret, que migrou ao país fugindo do nazismo, se inspiraram nas florestas brasileiras para esboçar o personagem que cativaria crianças no mundo todo.
‘George, o Curioso’ é o nome dos livros que começaram a ser distribuídos nos anos 40, do longa-metragem de animação lançado em 2006 e do desenho para a televisão, do mesmo ano, que estreou ontem no Brasil, no canal Discovery Kids.
Tanto na literatura como no cinema e na TV, o macaquinho, de certa forma, faz o papel de uma criança pequena, ora aprontando suas confusões ora buscando aprender algo. O desenho tenta passar, sobretudo, conceitos de matemática e ciências. Carismático, o personagem tem tudo para ser sucesso com as crianças em idades pré-escolar e inserir no país outra onda de licenciamento.
Por fim, um recado ao Discovery Kids: ontem, em pleno dia de estréia, o site do canal no Brasil trazia informações sobre o novo desenho em espanhol.
GEORGE, O CURIOSO
Onde: Discovery Kids
Quando: seg. a sex., às 7h e às 13h30; sáb. e dom., às 8h30
Classificação: livre’
Caio Jobim
Crise entre irmãos marca volta de série
‘Dar continuidade a ‘Filhos do Carnaval’ sem a presença de seu personagem principal foi uma maneira que os roteiristas Elena Soarez e Cao Hamburger -que também assina a direção geral- encontraram para prestar homenagem a Jece Valadão (1930-2006). Na pele do contraventor Anésio Gebara, o ator, mesmo depois de converter-se ao cristianismo, aceitara voltar aos sets de filmagem interpretando o patriarca de uma família de contraventores, na série em seis episódios exibida no canal HBO há dois anos.
Com produção da O2 e orçamento de R$ 8 milhões, a segunda temporada de ‘Filhos do Carnaval’ terá sete episódios e deve estrear no segundo semestre de 2009. Nela, Gebara morre obrigando seus três filhos -um oficial e dois bastardos- a levar adiante os negócios escusos da família.
‘Nessa temporada falamos muito sobre heranças -psicológicas, os traumas, as maldições e as heranças físicas’, diz Hamburger. O universo da contravenção segue como pano de fundo na composição dos dramas dos personagens.
‘A primeira temporada era com eles querendo ser filhos, querendo a qualquer custo o amor desse pai, que lhes é negado. Na segunda temporada, a gente tem como guia uma questão: eles vão conseguir ser irmãos, mesmo com tanto interesse no meio, com tanto recalque, com tanta diferença de classe?’, diz Soarez em entrevista num dos camarotes da quadra da escola de samba Mocidade Independente de Padre Miguel, na zona oeste do Rio.
A uni-los, o aparecimento de um inimigo do passado que tem ‘um grau de parentesco estranho e surpreendente com a família’, nas palavras da roteirista. Comodoro ‘é um homem que cultivou a vingança por 20 anos e por isso tem muitas doenças: deficiência renal, diabetes, pressão alta, labirintite e um câncer linfático’, diz seu intérprete, Walmor Chagas.
A separá-los, as mulheres. Utilizando-se de ‘uma liberdade que o Nelson [Rodrigues] nos deu’, diz Soarez, ‘nós vamos ter adultério, incesto e troca de casais. Mas, as mulheres, como os homens, vão se complicando, ficando numa situação realmente difícil. Elas também vão subindo na hierarquia da organização criminosa’.
‘Fiquei contente com essas viradas das mulheres na segunda temporada, porque eu acho que é assim mesmo, a mulher é que é forte’, diz Shirley Cruz, que interpreta Glória, amante de Claudinho, um dos filhos de Anésio. ‘Não é uma série violenta no sentido em que a gente está acostumado, mas é uma série que tem uma violência psicológica muito forte’, diz Hamburger.’
LIVRO
‘Revista do Lalau’ relembra Sérgio Porto
‘Sérgio Porto (1923-1968) trabalhava por dois -e sem tirar férias. Às atividades que atribuía a si próprio (‘jornalista, radialista, televisista, teatrólogo, humorista, publicista e bancário’) pode-se acrescentar ainda as de ficcionista, crítico e historiador musical, roteirista de cinema, compositor e ‘mulherólogo’. Parte dessa produção, ora assinada por Sérgio Porto, ora por Stanislaw Ponte Preta, está em ‘A Revista do Lalau’, livro organizado pelo jornalista Luís Pimentel.
Porto criou o pseudônimo Stanislaw Ponte Preta para escrever com mais liberdade e acabou refém de seu próprio personagem. Ponte Preta se transformou num personagem popular do Brasil da metade do século 20 e roubou parte da notoriedade que cabia ao criador.
‘Gosto mais do Sérgio porque ele é muito mais gente, né? Mas é tudo muito natural. O que acontece é que o Stanislaw é popular e vende tudo muito bem: livro, disco, show, piada.
Aí, ele parece existir mais. Antigamente, por exemplo, muita gente não sabia quem era Stanislaw. […] Hoje todo mundo sabe que um é o outro, não tem mais aquele mistério. Quer dizer, o Stanislaw resiste ao Sérgio, entende? Mas não acaba com ele não’, disse Porto em entrevista reproduzida no livro, concedida em 1968, pouco antes de sua morte.
O primeiro capítulo retrocede a 1949, anterior à invenção do personagem. Trata-se da reedição de ‘Pequena História do Jazz’, um breve compêndio sobre o gênero, acrescido do artigo ‘O Jazz no Brasil’, em que ele conclui que o sucesso do samba não deu margem para que o jazz conquistasse aqui o mesmo êxito que obtivera nos Estados Unidos e na Europa. Não que houvesse uma crítica ou uma preferência pela música estrangeira em tal constatação. Pelo contrário. Porto era igualmente apaixonado pela música brasileira e rejeitava a sua contaminação por modismos importados.
Em crítica a Gilberto Gil e Caetano Veloso, referiu-se à tropicália como ‘música de laboratório’. Sobre o disco que Tom Jobim dividiu com Frank Sinatra, escreveu que se tratava da confirmação de que ‘a indústria fonográfica norte-americana procura fazer com o samba o que fez com a música italiana, ou seja, despersonalizá-lo a ponto de transformar o samba numa canção de agrado dos fãs de Frank Sinatra’.
Sua militância não se resumia aos textos. Em 1968, o compositor do ‘Samba do Crioulo Doido’ criou um show de humor e música no qual se apresentava ao lado do Quarteto em Cy. O roteiro do espetáculo está no livro. Ponte Preta comparece com notas e notícias que guardam parentesco com aquelas editadas nos três volumes dos ‘Febeapás’ (Festival de Besteira que Assola o País), já relançados pela Agir.
Mulheres
Contribuição fundamental de Ponte Preta resgatada pelo livro é a ‘mulherologia’. Nem ciência nem doutrina, ‘a arte de admirar a mulher, respeitando-a sempre’ remete-nos às Certinhas do Lalau. As fotos reproduzidas no livro comprovam: era uma verdadeira seleção brasileira de mulheres.
Norma Bengell fez parte desse time. Nascidas como ‘As Mais Bem Despidas do Ano’ na revista ‘Manchete’, em 1954, as ‘certinhas’ se tornaram uma ‘coqueluche’ nacional, uma expressão da época.
A rara produção ficcional de Ponte Preta aparece em dois contos: ‘O Elefante’ e ‘Garota de Ipanema’. A de Porto está nos primeiros capítulos de um romance interrompido. Com traços autobiográficos, ‘O Transplante’ conta a história de um homem de meia-idade que, após sofrer um enfarte, recapitula momentos de sua vida. Porto deixou-o inacabado ao morrer. De coração.
A REVISTA DO LALAU
Autor: Sérgio Porto
Organizador: Luís Pimentel
Editora: Agir
Quanto: R$ 89,90 (267 págs)
TRECHOS
‘Boite’ é influência da vida noturna de Paris ecoando na noite do Rio. Noutra oportunidade o mais vivo dos Ponte Preta definiu de forma muito feliz uma ‘boite’, explicando que esses inferninhos não passam de botequins de luzes apagadas, onde você se intoxica por preços exorbitantes.
[…] Em Nova Iorque, Geni da Silva, uma brasileira de 23 anos, anunciou a primeira exibição autêntica de macumba numa boate de Village Gate. Diz ela que invocará os espíritos de Xangô e Ogum, mas Primo Altamirando, que soube de suas intenções, afirmou, enfático: ‘Com o dólar ao preço que está, duvido que algum santo baixe em Nova York.’
[…] Tarado por calcinha: Depois de se livrar das correntes que o prendiam à gaiola, um macaco chamado Chico, há dois dias, era dado como desaparecido pelo seu dono. À noite reapareceu, invadindo residências de Bonsucesso e furtando calcinhas das moças para ir rasgá-las em cima dos telhados.
[…] Agostinho dos Santos foi cantar num programa de televisão, e quando parou de cantar, foi cantado por uma linda sueca que estava no auditório. O animador, quando viu o monumento de mulher, pediu para ganhar uma colher-de-chá. Resposta de Agostinho: ‘Bem feito, quem mandou ser branco’.
Extraído de ‘A Revista do Lalau’, de Sérgio Porto’
TODA MÍDIA
Nas mãos do Itaú
‘No enunciado dos despachos das duas maiores agências de notícias financeiras, Reuters e Bloomberg, ‘Itaú adquire Unibanco, formando o maior banco latino-americano’ e ‘Itaú vai comprar Unibanco’. Avalia a Bloomberg que ‘a tomada é sinal de que o Unibanco teve perdas’. Segundo uma nota de analista, no Market Watch, foi o que ‘jogou o Unibanco nas mãos do Itaú’. Sem chegar a tanto, a Reuters afirma que o negócio põe em foco o setor financeiro no país, ‘com analistas especulando que alguns bancos menores podem precisar ser comprados’.
Por outro lado, sob o título ‘Unibanco junta forças com Itaú’, o ‘Financial Times’ sublinhou que ‘não se questiona a saúde financeira de ambos’.
O MAIOR 1
Por aqui, nos sites e portais desde a manhã até a noite, avançando pela escalada de ‘Jornal Nacional’ e outros, as manchetes ecoaram que se trata de uma ‘fusão’, como anunciado oficialmente pelo site do Itaú. E que ela vai criar, aliás, ‘o maior banco privado do hemisfério sul’.
O MAIOR 2
Até o fechamento, o site do ‘Wall Street Journal’ ainda não havia noticiado ‘compra’ ou ‘fusão’. E destacava antes uma reportagem sobre os investimentos do Santander, com o ‘objetivo de se tornar o maior banco privado do país em lucro’, segundo Emilio Botín, seu presidente.
O MAIS MANCO
‘New York Times’ e ‘Financial Times’ publicaram editoriais esperançosos sobre a cúpula do G20 financeiro, no próximo dia 15, em Washington.
O primeiro lamenta que George W. Bush participe como ‘o mais manco dos patos’, com ‘sua absoluta falta de credibilidade’. Mas avalia que o encontro pode ser útil se for visto como um ponto de partida. ‘Se preparar o palco para colaboração de verdade, será um sucesso.’ O segundo também vê ‘um importante papel’ para a reunião, desde que confirme o ‘compromisso por uma solução coordenada e cooperativa para a crise global’.
E SE?
No site Gawker e outros, um pôster pergunta ‘E se Obama fosse um cara branco e John McCain, um senhor negro?’. Registre-se que, ao menos para Pedro Bial, ontem no ‘JN’, Obama não seria ‘nem branco nem negro’
ALLEN SOBE
Mike Allen, criador e maior estrela do site Politico, é perfilado na nova ‘Newsweek’ sob o título ‘O homem que nunca dorme’, com elogios à sua ‘dedicação sobre-humana’ e às ‘fontes impressionantes’. Ele começa a produzir seu Playbook às 3h30 e, postado às 8h30, é referência para toda a cobertura política que se segue.
Mais importante, é um ‘insider’ que ‘conhece a família de todo mundo’ e trata a capital, Washington, como uma comunidade. Ontem, um dia antes da eleição, abriu agradecendo aos ‘trabalhadores’ das duas campanhas, eles que ‘tiveram a aventura de suas vidas’.
DRUDGE CAI
As últimas semanas de campanha, com Matt Drudge mais e mais engajado, tiraram o brilho do Drudge Report, que influencia a cobertura americana desde que adiantou reportagem da ‘Newsweek’ sobre o caso Monica Lewinsky.
Desta vez, apostou em ‘notícias’ como a jovem que denunciou ter sido marcada na face com um ‘B’, o que depois se mostrou fraude. O ‘FT’ escreveu ironizando como Drudge havia decaído. E ontem até o Gawker, outro site de grande repercussão, reclamou que ‘Matt se perdeu’. O Drudge Report mostrava então um vídeo de Obama supostamente ofendendo John McCain, com um gesto.
MÃO PESADA
A Fórmula 1 foi a 33 pontos, contra média de 17 até então, segundo a Veja.com. Mas foi após uma semana de ‘mão pesada’ na divulgação global, que culminou sábado com a extensão dos direitos até 2014, notou o Blue Bus.
SÓ GLOBO
Até em Nova York a Fórmula 1 acabou por esconder a vitória de Marilson dos Santos na maratona. Foi o que deu o ‘NYT’, citando ‘expatriados’ que se fixaram na Globo Internacional, para futebol, e só queriam falar de F1.’
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O Estado de S. Paulo
Terça-feira, 4 de novembro de 2008
ELEIÇÕES NOS EUA
Obama chega à eleição como favorito
‘Após mais de um ano de campanha e sob os olhos de todo o mundo, 130 milhões de americanos estão habilitados para decidir se o próximo presidente do país será o primeiro negro a assumir a Casa Branca ou o candidato mais velho a vencer uma eleição presidencial. Além do presidente e do vice, os eleitores também renovarão a Câmara dos Representantes, pouco mais de um terço do Senado e também escolherão 11 novos governadores.
Acompanhe em tempo real a cobertura da votação
Obama chega ao dia decisivo como favorito em todas as pesquisas para alcançar a Casa Branca. O apoio ao democrata disparou após a crise financeira no país porque suas políticas econômicas pareceram agradar mais aos eleitores preocupados com uma possível recessão.
A dinâmica do processo eleitoral, porém, recomenda cautela. O voto nos EUA não é obrigatório – e o comparecimento maior de eleitores de um candidato pode alterar o resultado previsto nas pesquisas.
Além disso, a eleição presidencial nos EUA é definida pelo Colégio Eleitoral e não pelo voto direto. O colégio é formado por 538 representantes dos 50 Estados e da capital do país, Washington. O candidato mais votado num Estado leva os votos de todos os delegados desse Estado no colégio. Para ser eleito, ele precisa ter 270 votos. Dessa forma, é possível que um candidato vença a eleição no Colégio Eleitoral, mas perca a apuração nacional.
Uma projeção com base em média de pesquisas feita pelo Real Clear Politics dá a Obama os 252 votos do Colégio Eleitoral dos 20 Estados que votaram pelo democrata John Kerry, em 2004. Para conquistar a presidência, Obama precisa de mais 18 votos e, se ganhar os 20 votos de Ohio ou os 27 votos da Flórida, a eleição estará encerrada – nos dois Estados, a disputa está acirrada. O mesmo estudo indica que o democrata estaria na frente em Nevada, Colorado, Novo México e Iowa – o que, somado aos Estados vencidos por Kerry, totalizariam 278 votos no Colégio Eleitoral. Já McCain precisaria vencer em todos os 30 Estados que votaram no presidente George W. Bush em 2004 para ter uma chance. Desses, ele tem a liderança em apenas 17 – o que lhe dá 132 votos no Colégio Eleitoral. Para vencer, McCain ainda teria de conquistar 128 votos no Colégio Eleitoral (o equivalente a outros dez Estados que ainda estão indecisos) e ‘roubar’ mais 10 votos de Obama.
Os resultados preliminares divulgados hoje após o encerramento da votação podem dar grandes pistas de qual será o resultado final. A direção a ser tomada – seja por uma vitória de Obama ou de McCain – ficará mais clara logo depois que as primeiras urnas começarem a fechar às 21h (horário de Brasília), em Indiana.
Uma grande vitória de Obama no Estado ou até mesmo uma luta acirrada por seus 11 votos no Colégio Eleitoral pavimentaria seu caminho para a Casa Branca. No entanto, uma vitória fácil de McCain pode ser um indício de problemas para seu rival. O Real Clear Politics dá a McCain uma liderança apertada de 1,4 ponto (47,6% a 46,2%) em Indiana.
Juntamente com Indiana, o Estado de Kentucky também deve servir como termômetro para o resultado da eleição no Senado. ‘Indiana oferece uma dica antecipada da corrida presidencial e Kentucky faz o mesmo pelo Senado’, disse o diretor-assistente do centro de pesquisas da Universidade Quinnipiac, Peter Brown. ‘Nós vamos saber de duas coisas cedo: se temos uma vitória presidencial esmagadora e se os democratas têm chance de conseguir 60 cadeiras no Senado.’
A eleição de hoje deve ter um comparecimento recorde e servirá como um teste do sistema de votação americano. Problemas como longas filas e possibilidade de fraude estão sendo acompanhados de perto pelas autoridades.’
Cheney é usado para atacar McCain
‘Em um dos últimos anúncios da campanha democrata, os estrategistas do senador Barack Obama usaram uma imagem do vice-presidente Dick Cheney, que declarou na semana passada o seu apoio ao republicano John McCain e elogiou a vice da chapa, Sarah Palin, por sua ‘força e bom senso’. No comercial, um narrador afirma que ‘esta não é a mudança os americanos precisam’.’
Ferdinando Casagrande
Assédio da imprensa obriga matriarca a enclausurar-se
‘Aos 86 anos, Sarah não pode mais cuidar das galinhas, do milho no quintal, da vaca que pasta nos fundos da casa. Arremessada ao mundo das celebridades pelas chances de seu neto adotivo tornar-se presidente dos Estados Unidos, Sarah Obama está blindada, presa em sua própria casa, rodeada por policiais e por um portão de ferro que ela jamais imaginaria na paisagem da vila de Kogelo, a 60 quilômetros de Kisumu.
Sarah está na clausura porque o Partido Democrata teme que republicanos tentem arrancar alguma declaração que possa abalar a campanha de Obama na reta final. Mas como essa senhora que nem fala inglês poderia atrapalhar? ‘Nunca se sabe’, responde Otiemo Obama, de 38 anos, meio-irmão do senador americano. ‘Não se pode confiar nos jornalistas.’
Sarah ficou famosa porque se uniu, no terceiro casamento, a Hussein Onyango Obama, já falecido. Hussein, avô do democrata, teve três mulheres. Barack Hussein Obama pai nasceu do segundo casamento, mas foi criado por Sarah como se fosse seu. Crescido, trocou os campos verdes de Kogelo pelos bancos universitários dos EUA. Quando voltou, trouxe um diploma de economista, mas deixou um filho de 2 anos, que nasceu da união com a antropóloga Ann Dunham, no Havaí.
Sarah só conheceu o seu neto adotivo em 1988, quando ele visitou a vila pela primeira vez. Otiemo o conheceu também no final dos anos 80, quando o ajudava a se comunicar com a avó no idioma luo. Casado, pai de um filho, Otiemo vive em Nairóbi, onde tem uma imobiliária. Visita Kogelo em feriados e ocasiões especiais, como esta em que a família se reuniu para administrar a crise gerada pelo estrelato. ‘Entendemos que é o trabalho de vocês, mas temos nossas ocupações também’, queixou-se. O irmão mais velho foi mais impaciente. ‘Não tenho nada a lhe dizer, e se quiser meu nome completo, basta olhar na internet.’
Para satisfazer o apetite dos jornalistas, a família organiza, todas as manhãs, uma conferência de imprensa onde dá sempre a mesma informação: Sarah está recolhida, orando para que o neto vença a eleição; ela precisa descansar; não, ela não vai falar com ninguém. Talvez amanhã, quando o mundo todo souber se o neto será presidente.
Otiemo conta que a família cria alguns poucos animais e planta milho, feijão, mandioca e mangas para consumo próprio e para venda em mercados locais. Não são ricos, mas estão longe da pobreza. ‘Todas essas terras em torno destas casas são nossas.’ Muitos familiares já se mudaram. ‘A família é muito numerosa.’
Ele acha que a vida da família vai mudar se o meio-irmão americano virar presidente dos Estados Unidos? ‘Já mudou completamente.’ Mas o assédio acaba depois da eleição. E ele, possivelmente, terá o meio-irmão à frente dos Estados Unidos. Não muda nada? ‘Nós vivemos no Quênia, ninguém aqui quer ir morar nos Estados Unidos. Só queremos retomar o curso normal de nossas vidas, criar nossos filhos e voltar à paz que tínhamos antes.’’
Adriana Carranca
Britânicos experimentam onda da ‘Obamania’
‘Se pudessem votar, os britânicos elegeriam Barack Obama presidente dos EUA com folga. Os principais motivos para o apoio são sua posição em assuntos como aquecimento global e guerras. A expectativa é de que, com sua vitória, a Grã-Bretanha, maior aliado do governo americano no Iraque, sofra menos pressões da Casa Branca para manter suas tropas no país – a maioria da população britânica é contra guerra.
Os britânicos também acreditam que o diálogo entre nações e religiões prometido por Obama poderá reduzir tensões internas, acirradas depois dos atentados de 7 de julho de 2005. Os terroristas eram ingleses de origem muçulmana.
A preferência pelo candidato democrata despertou uma verdadeira ‘Obamania’ no país. As duas biografias de Obama, A Audácia da Esperança e A Origem dos meus Sonhos, venderam 130 mil cópias na Grã-Bretanha, de acordo com a Nielsen BookScan. As de McCain não chegaram a 2 mil – e a biografia de sua vice, Sarah Palin, só vendeu seis cópias até outubro.
A imprensa local também apóia o democrata. Ele está na capa da última edição da revista The Economist; os maiores jornais britânicos, Guardian e Independent, expressaram apoio a Obama. O esquema de cobertura das eleições não tem precedente. A BBC enviou 125 correspondentes aos Estados Unidos, além dos 50 que já trabalham no país.’
Arnaldo Jabor
Vai dar Obama na cabeça
‘Hoje é a hora H. Hoje é dia de rock. Hoje o pau vai comer na casa de Noca. Não tem mais lero-lero nem lesco-lesco. O mundo vai mudar. É o segundo acontecimento real desde o 11 de Setembro. Obama ou McCain? Quem dá mais? A inteligência que resiste à estupidez ou aqueles 59 milhões de idiotas que elegeram o Bush na fraude do século, na Flórida. Será que vão repetir a fraude? Estranha herança da democracia fundada – furos propositais no sistema eleitoral, zebras programadas. Será que ganha o racismo oculto, recôndito, a KKK na alma de ‘wasps’?
Se McCain ganhar, o mundo vai piorar. Mas, sem medo de errar, aposto no Obama. Obama é um político jovem que respeita a razão, o progresso, a ciência e a cultura. McCain não é nada. Nem é lobista de grandes corporações, se bem que amado por elas, nem é empregado do petróleo como Bush. McCain é um fenômeno ‘paparazzi’: a celebridade em busca de si mesmo. McCain luta por sua vaidade de velho que não quer brochar e morrer. Ah, sim… ele era bonito e heróico quando jovem. Um Gregory Peck em aviões de combate, comendo as mulheres. Agora, quer coroar seu narcisismo como um presidente machinho, com aquela senhora loura, infeliz e plastificada atrás dele. Só isso. Seu orgulho é ter sido prisioneiro na Guerra do Vietnã e, segundo afirma, torturado pelos comunistas. Só não diz que era ele que estava massacrando, bombardeando os miseráveis vietcongues que lutavam na lama. Ele era o criminoso abatido – não a vítima. McCain luta por sua fama. Como está velho, caído, finge uma desenvoltura de caubói ligeiro que não cola e, como teve câncer que pode voltar, pode acabar nos legando aquele pit bull de batom, a perua careta e despreparada Sarah Palin, que seria a ‘boceta de Pandora’ final para o mundo, a mulher de onde sairiam todos os males. McCain é prosa e Obama é poesia. Bush foi o macaco na loja de louças do Ocidente. McCain finge ser uma evolução da espécie dos símios, mas é macaco também. E não me venham os fascistinhas chamá-lo de ‘sensato conservador’…
Obama é o novo. Obama é o negro sem rancor, o negro pós-moderno, que passou por Malcolm X, pelo Luther King e que atingiu uma espécie de síntese de virtudes políticas que almejamos: tolerância, a ecologia, a inteligência contra a mentira, é antiguerra, pela superação do bipartidarismo numa busca de ‘entente cordiale’, contra os ‘lobbies’, contra a tirania do petróleo, contra o efeito estufa. E não me venham os fascistinhas chamá-lo de ‘esquerdinha sem programa’…
Obama parece pairar ‘acima’ da política, com um ‘honesto’ messianismo, pois seu programa é quase abstrato. E não faz mal, pois, como dizia Valery: ‘Que seria de nós sem o socorro das coisas que não existem?’ Ele dá aos brancos que o apóiam a oportunidade de se absolverem por séculos de discriminação racial. Ele é sexy, um JFK negro, ele é a retomada do presidente que transa, sua mulher tem corpaço, bumbum. Ele diz: ‘Eu não falo o que vocês querem ouvir; eu falo o que vocês precisam saber!’ Doce mentira: ele fala o que todos querem ouvir sim – a magia da mudança, a esperança não se sabe bem de que, alguma coisa pela qual valha a pena viver.
Obama é uma utopia crível, num tempo de tanto horror.
Obama é um trocadilho com Osama… Assim como Osama mudou a América pelo Mal, Obama quer mudar para o bem.
McCain representa a pior face da América: o mundo psíquico dos republicanos. Já morei no interior da Flórida, nos ‘gloriosos’ anos do racismo, e sei do que falo. O imbecil republicano é diferente dos nossos cretinos fundamentais. Lá, eles têm certezas absolutas; aqui, nossos idiotas se escondem pelos cantos, babando de humilhação. O republicano típico acha que sabe tudo. São filhos de um deus duro e implacável. As caras, as fuças típicas dos republicanos parecem dizer: ‘Não tenho dúvidas, não quero ouvir, já sei tudo, Deus me disse…!!’
Se Obama ganhar, teremos a felicidade de não ver mais as famílias gordinhas dos boçais da direita, os psicopatas sorridentes de dogmas, seus hambúrgueres malditos, seus churrascos nos jardins e nas cadeiras elétricas, não veremos mais os meninos mortos voltando do Iraque como sanduíches embrulhados para a viagem, a crueldade em nome da bondade, a fé contra a razão, a santidade da burrice, tudo sob um inferno de cânticos evangélicos e música country. McCain é Nashville; Obama é jazz.
Os eleitores de McCain são paranóicos e precisam de inimigos para viver. Valorizam o martírio, como os boçais radicais do Islã. Em geral, dividem-se em reprimidos sexuais ou sadomasoquistas. Eles odeiam a diferença: os negros, os estranhos, os livres. É patético ver o McCain fingindo de republicano light, de democrata sem ginga. Quando ele declarou: ‘Eu não sou o Bush!’ – mentiu. Ele é o Bush sim; eles são produzidos em série no útero puritano da América, forjados na velha religião do século 17, falando nas ‘forças do mal’, que são eles mesmos, sem espelho.
McCain fala do horror de torturas que teve no Vietnã, mas esquece de dizer que ele não era a vítima; ele era o assassino que bombardeava os vietnamitas pobres na lama.
O legado de Bush é nossa miséria. O Iraque destruído, milhares de homens-bomba disputando a honra de nos matar, o Irã nas mãos de um ‘Chávez’ islâmico , o Paquistão povoado por milhões de fundamentalistas com bomba atômica, embalando o Bin Laden, o desalento da arte, da cultura e do pensamento filosófico, o déficit público da maior nação e, agora, a maravilhosa depressão que assola o mundo, criada pelos vorazes rapazes dos derivativos de Wall Street.
Mas, na qualidade de profetinha autoproclamado, em verdade vos digo: ‘Chegou a hora deste homem bronzeado mostrar seu valor.
Deus é pai. Obama vai ganhar!’’
FUSÃO
De bom humor, Moreira Salles rouba a cena
‘O Itaú e o Unibanco escolheram o auditório do Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo, no Parque do Ibirapuera, para explicar à imprensa a fusão.
A entrevista, que começou com cerca de 40 minutos de atraso, foi marcada por um clima amistoso entre os presidentes dos dois grupos, Roberto Setubal e Pedro Moreira Salles. Assim que tomaram seus lugares na bancada, Setubal e Salles se abraçaram, para alegria dos dezenas de fotógrafos e cinegrafistas que registravam o evento.
Após rápidas palavras iniciais de ambos, começou a sessão de perguntas. Salles, então, mostrou ótimo humor e, por vezes, roubou a cena. Arrancou risos da platéia e chegou a ser aplaudido após uma brincadeira com o slogan ‘O Itaú foi feito para você’, do ex-rival.
Salles comentava a estratégia de crescimento orgânico adotada pelo Unibanco nos últimos anos. Segundo ele, a marca de 1.000 agências foi atingida apenas recentemente. ‘Levamos 84 anos para abrir 1.000 agências. Agora, como o Itaú foi feito para mim, eu tô trazendo 3.000 agências com esse negócio’, brincou.
Pouco antes, havia dito que o objetivo do Unibanco era ‘ultrapassar o Itaú em rentabilidade até 2010’. ‘Estávamos caminhando muito bem nesse sentido’, disse, sorrindo.
Quando uma jornalista perguntou sobre o futuro das atividades culturais do Itaú e do Unibanco, Moreira Salles fez nova piada. ‘Os (temas) mais graves são os cinemas, um assunto realmente complexo que ainda não discutimos’, disse.
O presidente do Unibanco também disse que tinha – e tem – muito respeito pelo Itaú e por Roberto Setubal, ‘que era um concorrente’. ‘Ao longo desse processo (de 15 meses), descobri que poderia ter um amigo. Hoje deixamos de ser concorrentes, ficamos só amigos e acho que viramos sócios.’’
PUBLICIDADE
Publicitários vêem oportunidades na crise
‘Tão perdidos quanto qualquer outro empresário no atual cenário de crise, seis presidentes de grandes conglomerados da propaganda mundial falaram ontem, em São Paulo, sobre o futuro da publicidade. A luz que eles vêem no fim do túnel remonta ao que se poderia chamar de ‘alma da propaganda’: as boas idéias, essenciais em tempos normais, tornam-se vitais na hora da crise.
Andrew Robertson, presidente da BBDO Worldwide, não relativizou a gravidade do momento, mas insistiu que os profissionais devem mesmo arregaçar as mangas. ‘Não há ninguém hoje que esteja melhor do que há seis semanas’, disse. ‘Temos de olhar para os nossos clientes individualmente. Alguns vão ficar fora do mercado. Outros terão oportunidades para crescer.’
Na mesma linha, Tom Carroll, presidente da TBWA Worldwide, acrescentou ainda que ‘nas duas últimas crises econômicas, o espírito piorou por um tempo, mas as pessoas também aprenderam com elas e já sabem que vão sobreviver’. ‘Talvez não viajem por um bom período, mas, com certeza, vão beber mais. Logo, a intensidade da crise pega de maneira diferente os anunciantes’, disse.
‘Estamos na era do marketing em tempo real’, disse Laurence Boschetto, presidente da DraftFCB. As mudanças, com a rapidez da internet, são constantes e exigem dos profissionais flexibilidade para criar oportunidades de inserir mensagens capazes de persuadir os consumidores também em tempo real. ‘Temos de nos engajar na tecnologia e ver o que ela pode fazer de bom por nós. Temos de saber mostrar para as marcas como participar desse mundo interconectado em constante mudança. Afinal, se tudo mudou, o que não mudou foi a emoção. É com a emoção que temos de nos relacionar.’
Entre todos os presentes havia um consenso sobre o inevitável avanço da comunicação digital. Nem mesmo a crise vai, na opinião desses profissionais, arrefecer o ímpeto de crescimento da presença da web e da portabilidade na vida das pessoas. Bob Greenberg, presidente da R/GA, uma agência nascida no ambiente online, não tem dúvidas sobre esse futuro. Sua rede ainda não é representada no Brasil, mas seus planos são de viabilizar isso em breve.
O mundo, como reconheceu Robertson, da BBDO, muda com uma rapidez que impede os planejamentos de médio prazo. Ele citou como exemplo o fato de, por exemplo, na reunião da cúpula do seu grupo, em 2004, ainda não existir a rede social Facebook, que atualmente tem mais de 200 milhões de usuários. ‘É a população da Alemanha’, disse. Por isso mesmo, o presidente da DDH, Simon Sheerwood, acredita que o atual modelo das agências não responde às novas necessidades. ‘A integração é o futuro. E o futuro é digital’, disse.
Todos concordam que as agências de publicidade têm de parar de pensar em mídia apenas como forma de distribuir os anúncios. As mensagens publicitárias vão cada vez mais se relacionar com os consumidores. O evento de ontem comemorava os 30 anos do grupo Meio & Mensagem.’
TELES
Previ admite mudança em data da fusão entre Oi e BrT
‘O presidente da Previ, fundo de pensão do Banco do Brasil, Sérgio Rosa, admitiu ontem, pela primeira vez, a possibilidade de um adiamento na data limite para a conclusão do acordo de compra da Brasil Telecom (BrT) pela Oi. A mudança na data de 21 de dezembro, disse, poderia ser feita mesmo sem o pagamento da multa de R$ 490 milhões. Para o contrato sair do papel, é preciso que a regulamentação do setor seja mudada, permitindo a união entre duas concessionárias de serviços de telefonia fixa.
‘Se o negócio continuar fazendo sentido para todo mundo, como eu acho que continua fazendo, tem a possibilidade de prorrogar essa data de validade dos contratos. Essa é uma possibilidade sempre, desde que as duas partes queiram’, afirmou o executivo, após participar do 29º Congresso brasileiro de Fundos de Pensão. Segundo ele, a multa foi estabelecida no contrato apenas para evitar que alguma das partes voltasse atrás no negócio. ‘Ninguém colocou a cláusula de multa pensando em receber aquele dinheiro. Continuamos focados no negócio, e não em receber a multa’, disse.
A discussão em relação à data limite foi suscitada pela demora da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) em aprovar as mudanças no Plano Geral de Outorgas (PGO), o decreto que regulamenta o setor. O PGO foi aprovado pelo conselho diretor da agência no mês passado e, ontem, passou também pelo conselho consultivo. A proposta agora seguirá para o governo, que editará um decreto presidencial com as novas regras, eliminando as restrições ao negócio. Mas, depois disso, a Anatel ainda terá de analisar o negócio em si.
Rosa observa que a Anatel, como órgão regulador, tem uma agenda de trabalho de interesse público a cumprir. Mas acredita que o órgão também precisa levar em consideração temas de urgência para o segmento. ‘Ninguém que regula um mercado de comunicações como esse trabalha sem ter noção das urgências que o próprio mercado coloca. Mas acho que dentro disso, ela vai cumprir suas responsabilidades da melhor maneira possível e acho que faremos o negócio dentro do prazo adequado para as empresas’, explicou. O executivo aproveitou para descartar uma renegociação nos termos do acordo.’
F-1
Pai de Hamilton ironiza provocações no Brasil
‘Não foi só Lewis Hamilton quem acordou campeão do mundo, ontem, após o GP do Brasil de Fórmula 1. Pai e empresário do piloto da McLaren, Anthony Hamilton foi tão assediado quanto o filho. Afinal, a carreira do prodígio é um projeto familiar – modesto funcionário da Companhia Britânica de Trens, Anthony chegou a ter três empregos para tornar o sonho de Lewis em realidade.
Com o filho no lugar mais alto do pódio, Anthony pôde, enfim, falar sobre o que considerou uma indelicadeza. Em Interlagos, o empresário deu poucas entrevistas. Mas, ontem, ao conversar com repórteres britânicos, em entrevista na qual o Estado também esteve presente, Anthony disse não ter se abalado com as provocações da última semana. Pelo contrário.
‘Sabemos que não é pessoal, mas são aspectos negativos do esporte. Foi o que aconteceu com aquela história idiota do gato preto. Foi uma atitude antiprofissional. O pior é que nem sequer sabiam que temos um gato preto em casa – e, ao que parece, o efeito é bastante positivo.’
A resposta, claro, causou risadas aos repórteres britânicos que, na quinta-feira, não entenderam o significado da brincadeira do programa Pânico. O gato preto de pelúcia atirado em Hamilton, considerado um sinal de má sorte no Brasil, tem significado oposto no Reino Unido. Mas ficou o constrangimento – jornais ingleses chegaram a questionar se o ato era uma manifestação racista ao primeiro negro a correr na F-1.
A família Hamilton deixou o Brasil ontem – não se sabe exatamente para onde. Mas há grande expectativa, por parte de Anthony, no retorno à Inglaterra. ‘Não temos a mínima idéia do que vamos encontrar.’ Lewis, que namora Nicole Scherzinger, do grupo Pussycat Dolls, agora é astro. ‘Provavelmente nossa vida vai mudar. Mas não tenho certeza de como acontecerá. Quero que ele tenha uma vida normal – ou o mais próximo disso’, comentou o pai.
Anthony também foi questionado se, como empresário do filho, será agora mais rico. Ele nega. ‘O dinheiro é dele e eu só o ajudo a lidar com isso. Lewis nem sequer tem uma casa. Ele nunca comprou nada muito caro.’ Um dos projetos da família é criar uma entidade de auxílio – Lewis, neto de imigrantes da ilha de Granada, já expressou a vontade de realizar um trabalho social na África. ‘Acho que podemos fazer algo no Brasil, na Espanha, no Reino Unido… em qualquer lugar em que a Fórmula 1 estiver’, disse Anthony. ‘Não queremos apenas dar dinheiro. Queremos saber o que as pessoas precisam, comprar isso para elas ou dar meios para que elas façam isso sozinhas.’’
TELEVISÃO
Bentinho atormentado
‘Dom Casmurro fez o já magro Michel Melamed perder 21 quilos em três meses apenas. O diretor Luiz Fernando Carvalho queria que o personagem-título e narrador do romance de Machado de Assis tivesse aspecto precário e mais envelhecido do que o ator, que tem 35 anos. Melamed, também apresentador, escritor, dramaturgo e músico, será o Bentinho da próxima minissérie da TV Globo, Capitu, com estréia em dezembro.
Ao vê-lo quase esquálido no hoje extinto Corte Cultural, seu ex-programa na TV Brasil, o público levou um susto. ‘Um monte de gente perguntava se eu estava doente. Não deixava de ser uma doença, mas não era mortal, era vital’, diz, revelando a intensidade com que abraçou seu primeiro trabalho como ator na TV.
Passados dois meses do fim das gravações, no Rio, o peso já foi quase todo recuperado, mas Bentinho continua em Melamed. Assim como o entusiasmo de estar levando ‘um dos livros mais importantes do mundo’ a pessoas que não necessariamente o leram ou lhe deram a atenção devida.
‘Um dos estímulos para estar envolvido nesse projeto é, quem sabe, participar de uma nova imagética para esse clássico’, conta o ator, que o conheceu na escola, o releu várias vezes e, depois de ser convidado por Carvalho, a quem não conhecia – mas muito admirava – foi tomado por ele de forma avassaladora (Melamed se diz um ‘apaixonado’, para quem vale sempre o ‘tudo ou nada’).
Neste mergulho, ele teve o auxílio de um treinador tarimbado, o mineiro Rodolfo Vaz, prêmio Shell de melhor ator de teatro do ano passado por Salmo 91 e que, na TV, já tinha trabalho com Carvalho no elenco de Hoje É Dia de Maria. Vaz ajudou Melamed a se transformar em Dom Casmurro – a ponto de o jovem ator ter-se pego fazendo a voz de Bentinho e praticando sua fina ironia até fora das gravações. ‘Nosso trabalho foi o de encher a mochila dele de vocabulário; não foi o de preparação de ator, como se faz normalmente’, explica Rodolfo Vaz. ‘Fizemos muitos exercícios para chegar às intenções, às colorações das cenas.’
A dupla passou três meses e meio grudada, por vezes durante dias inteiros, o que foi muito importante, diz Vaz, em se tratando de um ator como Melamed, que tem trabalhado, no teatro, em textos próprios (ele vem da muito comentada Trilogia Brasileira, composta pelas peças Regurgitofagia, de 2004, Dinheiro Grátis, de 2006, e Homemúsica, de 2007).
A Capitu que aflige Melamed é Maria Fernanda Cândido, que já emprestou seu olhar a ela no filme Dom (2003), de Moacyr Góes. Ela é o único rosto conhecido do ‘triângulo’. Já a Capitu pela qual Bentinho se apaixona é encarnada por Leticia Persiles, uma das estreantes do elenco, assim como Pierre Baitelli, o Escobar, e César Cardadeiro, o Bentinho jovem. ‘Ensaiamos e preparamos tudo juntos, como se fosse teatro’, lembra Letícia, escolhida pelo diretor quando este leu uma reportagem sobre sua banda, a Manacá. Em seguida, ele foi conhecê-la ao vivo, num show do grupo, e, no palco, o que viu foi uma atriz.
Dona de olhos verdes tão encantadores quanto os de Maria Fernanda, a jovem Letícia, que tem 25 anos e faz uma menina de 14, vasculhou seus guardados para reviver as sensações de garota. ‘Capitu tem uma sensibilidade muito aflorada. Essa coisa animal nela, de fêmea, vem desde a adolescência da personagem.’’
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Diretor diz que quis fazer um ‘ensaio sobre a dúvida’
‘Homenagem ao centenário de morte de Machado, Capitu entra no ar no dia 9 de dezembro e tem cinco capítulos. É a segunda série do projeto Quadrante, de Luiz Fernando Carvalho, que leva a literatura brasileira para a TV e que começou com A Pedra do Reino, no ano passado. Como no caso da minissérie baseada na obra de Ariano Suassuna, a estética é não-naturalista.
Antes de se iniciarem as gravações, foram três meses de preparação dos atores, o que incluiu palestras sobre o universo de Machado e conversas com um psicanalista e um historiador. A trama é dividida em duas fases, sendo a primeira até a ida de Bento para a faculdade de Direito e a segunda marcada pelo ciúme e a dúvida sobre a suposta traição de Capitu. A maior parte das cenas foi ambientada no prédio do Automóvel Clube, no centro do Rio, na mesma região da antiga Rua de Matacavalos, onde, no romance, morava Bentinho. Carvalho falou sobre Capitu por e-mail:
Como você fez para transpor para a TV uma história permeada pela dúvida e a ambigüidade de caráter dos personagens?
Estou trabalhando em cima da dúvida, que é um grande tema. Além disso, não acredito em adaptação, no sentido ortodoxo do termo, como injetar num romance novos personagens, palavras, tramas paralelas ou finais que não existem. Sou completamente contra esse tipo de assassinato. Em Capitu, não há uma única palavra ou vírgula que não seja de Machado. Procuro entrar no livro como um leitor e extrair uma resposta criativa a essa leitura. Por isso também optei por outro título, Capitu, onde a idéia de aproximação ficaria ainda mais clara, revelando assim não se tratar apenas de uma tentativa de transposição de um suporte para outro, mas sim de um diálogo com a obra original. E, por sua vez, nasce daí também uma outra tentativa: o diálogo com a personagem Capitu, que no próprio texto do Machado é tão enigmática. Portanto, essa minha aproximação com Machado é um ensaio sobre a dúvida, não absolvo Capitu e não a condeno. Acho que Capitu é um personagem que pertence ao mistério e pertence a essa interação de cada leitor, cada um vai decidir de acordo com suas coordenadas, se ela é ou não culpada, se a fruta já estava dentro da casca.
Como descreveria a sua Capitu?
Capitu, tão repleta de mistérios e enigmas, soava-me desde sempre como uma anunciação. No início, era uma borboleta. Saiu cedo do casulo para assumir sua forma exuberante de mulher. Colorida, refrescante, ondulante, alegre, adoravelmente maliciosa. Já adulta, traz consigo o espírito de uma esfinge. O Feminino que exala o perfume de seus labirintos por onde passa.’
Julia Contier
Francês vê novela
‘Como os franceses não são exatamente grandes consumidores de novelas, foi justamente um acordo com um novo canal francês um dos negócios que a Globo mais valorizou nessa última edição da MipCom, feira que reúne produtores e exibidores audiovisuais do mundo todo, em Cannes. De plataforma digital, o IDF 1 pode ser assistido em uma das 26 regiões administrativas da França, a Ilê de France.
A novela Da Cor do Pecado inaugurou o pacote exportado e a expectativa é ampliar a parceria, já que as plataformas digitais vêm ganhando mais importância no mercado.
A Globo International também estendeu sua presença na Albânia. O canal TV Klan, aberto e nacional, exibirá Duas Caras. O país exibe hoje, além de Páginas da Vida na faixa nobre, as produções Sete Pecados e Paraíso Tropical nos canais DigitalB e Top Channel, respectivamente.
DRAMALHÃO NIPÔNICO
Ainda em Cannes, a La Tele, canal especializado em telenovelas e voltado à comunidade hispânica no Japão, fechou contrato com a Globo para a exibição de mais de 700 horas por ano de produções brasileiras.’
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