Monday, 04 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1312

O fortalecimento das emissoras

O padrão universal de concentração de propriedade e a presença dos global players encontram no Brasil um ambiente historicamente acolhedor. Nossos mass media se estabeleceram oligopolisticamente. A televisão continua basicamente regida por um código do início da década de 1960 (lei 4.117, de agosto de 1962), totalmente desatualizado, e constituem um sistema organizado em torno de poucas redes sobre as quais não existe nenhuma regulamentação legal (LIMA, 2006). Trata-se, portanto, de uma oligopolização que se produz dentro de uma mesma área; o melhor exemplo desse tipo de concentração no Brasil continua a ser a televisão.

Nosso sistema televisivo de comunicação já nasceu comercial. A história da TV em nosso país dá grande destaque ao pioneirismo de Assis Chateaubriand, mas é extremamente evasiva no que se refere aos interesses econômicos que motivaram a iniciativa. Muito se tem dito sobre o sistema de comunicação no Brasil como seguidor do modelo norte-americano, baseado no financiamento da programação a partir do capital privado e seus anúncios comerciais. Porém ressaltamos que os mesmos Estados Unidos possuem um sistema público operante em dissonância com a nossa realidade onde a comunicação pública encontra-se incipiente.

No entanto, se há uma pluralidade que se sobressai do sistema privado de comunicação, o sistema público caminha em ritmo bem diferente. Um maior equilíbrio entre os sistemas, previsto inclusive na Constituição federal de 1988, como tentativa de fortalecer o sistema público de televisão, faz emergir um conjunto de expectativas em torno desse sistema, como sendo capaz de compensar ou superar os déficits democráticos presentes na visibilidade pública política comercial, determinado pelas mídias privadas.

Baixa qualidade democrática

Dentro do conjunto de pesquisas acerca da TV Pública no Brasil, é possível observar, desde o início do debate, uma miríade de perspectivas epistemológicas. No entanto, parece que, num primeiro momento, sobressaiu-se um sotaque mais ‘triunfalista’ sobre os diversos potenciais cíveis e democráticos de sua cobertura, que pela sua economia política diferenciada, seria mais propícia a estabelecer uma programação democraticamente mais qualificada do que a mídia comercial.

A maioria das chamadas TVs educativas e culturais no Brasil foram criadas nas três últimas décadas, período que coincide com o período de redemocratização do país. Apesar disso e dos propósitos de ênfase na educação, cultura e cidadania, essas emissoras ainda estão longe de poder cumprir as propostas que lhe deram origem. Ainda que imersas em problemas caráter estruturais e sociais, ela é considerada, como uma solução para muitas das patologias ou insuficiências que poderiam ser identificadas sobre a qualidade democrática da cobertura do telejornalismo brasileiro.

Na esteira dessa realidade, três questões têm sido apontadas como fontes fundamentais de uma parca qualidade democrática dos meios massivos das TVs comerciais: (1) pouca atenção aos temas e assuntos de interesse público e mais atenção a questões de interesse do público; (2) sistemática invisibilidade da sociedade civil, incorrendo, então, num problema de justiça política e (3) ausência de níveis democraticamente densos de discussão pública.

Um alerta às camadas sociais interessadas

Diante desses diagnósticos acerca da comunicação de massa, nos perguntamos se eles não estão fortemente sedimentados no padrão privado de comunicação. Desse modo, torna-se mister pensar como a depreciação dos valores democráticos não poderiam ser compensados ou mesmo superado pela emergência e expansão de um sistema pública de comunicação. Tal horizonte de possibilidades se torna extremamente vívido quando nos deparamos no atual processo de expansão do sistema público de comunicação no Brasil, o qual ganhou especial impulso com a criação da TV Brasil.

Nesse sentido, vale destaca que a TV pública seria pautada por todas aquelas demandas informativas não contempladas pelos veículos comerciais, constituindo alternativas a estes. ‘Está aí a abordagem presente na gênese do Public Broadcasting Service (PBC) dos Estados Unidos, bem como na recente criação da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) em nosso país’ (Intervozes, 2009, p. 32). Não por acaso o contexto dessa perspectiva é o cenário de hegemonia dos meios de comunicação comerciais e o enviesamento do conteúdo transmitido por este, que sabemos, segue a lógica da produção de audiência para a venda de anúncios publicitários em detrimento de uma informação mais pautada no interesse público.

A distinção entre um campo e outro tem por fundamento a relação que cada um deles estabelece com seu receptor. Os meios com fins lucrativos tratam da audiência como massa e, portanto, buscam o gosto médio para que seus conteúdos possam atingir a atenção do maior número possível de pessoas, a televisão pública, como alternativa, deveria mirar na multiplicidade de públicos e dialogar com as demandas informativas e culturais de cada um deles. Assim, a diversidade aparece como um dos pilares dessa concepção.

A criação da EBC e de seu serviço televisivo, a TV Brasil, significa uma tentativa de superação do passado de atrelamento dos canais públicos aos governos e autoridades para apontar na direção da construção de iniciativas efetivamente pública.

Nesse contexto, uma reflexão sobre os caminhos percorridos por essa implementação, bem como as condutas governamentais e/ou sociais ligadas a ela, são fundamentais nesse período de ampliação do investimento no sistema público de comunicação. Levando-se, então, em conta que o sistema público de comunicação se pauta por princípios da publicidade e alternativos aos empreendidos pelo sistema privado, nossa argumentação visa, pois, um alerta às camadas sociais interessadas na comunicação como ferramenta social em busca de valores democráticos, para o acompanhamento do desenrolar desses meandros da TV pública em nosso país.

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Doutorando em Comunicação e Informação pela UFRGS e mestre em Comunicação Social pela PUC Minas