Encerrada a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, com um debate ainda inconcluso sobre seus resultados reais, a imprensa brasileira se volta para a velha economia em crise. Mas já se pode notar uma mudança sutil na linguagem do jornalismo especializado em economia.
O destaque do Estado de S.Paulo e do Globo nessa área, nas edições de segunda-feira (25/6), é a análise do relatório do Banco de Compensações Internacionais (BIS), que alerta para o risco do crédito excessivo nos mercados emergentes. A novidade é o ingresso da palavra sustentabilidade nessas análises econômicas, junto a expressões típicas como crédito, endividamento, volatilidade.
Um reparo: ao contrário do título alarmista do Estadão, o relatório do BIS coloca o Brasil, junto com Estados Unidos e Japão, no grupo dos países relativamente imunes à crise global.
Movimento importante
Observando o ingresso da expressão “sustentabilidade” no noticiário econômico, deve-se registrar que no balanço da Rio+20, feito nas edições de domingo (24/6), a questão já se infiltrava em notícias econômicas, apesar do tom pessimista que acompanhou o documento final da conferência.
No Estado de S. Paulo, a última edição do caderno especial criado para acompanhar o evento traz um balanço mais favorável, que contrasta com a interpretação pessimista predominante na imprensa em geral. Segundo o jornal paulista, o Brasil pode ser considerado vitorioso ao final da conferência, mesmo que o documento conclusivo seja considerado pouco ambicioso.
De acordo com a análise publicada no domingo, a Rio+20 marcou uma importante mudança de paradigma nas relações Norte-Sul, tradicionalmente definidas pelo compromisso de os países ricos financiarem as iniciativas dos mais pobres no combate aos problemas ambientais e sociais.
Os relatórios indicam, por exemplo, que os países que buscaram soluções próprias sem esperar ajuda internacional, como o Brasil e a China, apresentaram melhores resultados ambientais, sociais e econômicos. Trata-se da avaliação mais equilibrada e, curiosamente, mais positiva entre todas as análises publicadas desde a abertura do evento.
Embora registrando a frustração geral de militantes e representantes de organizações não governamentais com a falta de compromissos no documento final, o jornal destaca que a declaração satisfaz o Brasil e seus principais parceiros entre os emergentes, como a China e a Índia, cuja estratégia não era definir metas, mas assegurar a aceitação do conceito de desenvolvimento sustentável associado à proteção ambiental e combate à pobreza.
Além disso, observa o Estadão, no último dia da conferência foi anunciado um balanço de 700 compromissos voluntários de ONGs, empresas, governos e universidades que representam um investimento de US$ 513 bilhões em ações para o desenvolvimento sustentável nos próximos anos.
Esse talvez seja o indicador mais importante da relevância histórica da Rio+20: uma mudança na forma tradicional das relações multilaterais, que passam a depender menos dos representantes de governos e consolidam os novos paradigmas econômicos, políticos e sociais por meio do protagonismo de cidadãos, empresas e instituições acadêmicas para o avanço de pesquisas e projetos reais voltados para a sustentabilidade.
Esse olhar diferente, que buscou informações relevantes fora do círculo das declarações oficiais de intenções, traz o leitor para mais perto da realidade desse que representa o maior e mais importante movimento da geopolítica internacional neste início de século.
Algumas novidades
Paralelamente à consolidação da nova cultura do protagonismo individual que se transforma em voz poderosa entre as instituições tradicionais – condição criada, em parte, pelas tecnologias digitais de informação e comunicação –, a imprensa em geral soube registrar os andamentos descompassados das grandes estruturas de Estado e das iniciativas originadas na sociedade civil.
Embora a maioria dos jornais tenha se demorado no registro das cenas quase folclóricas que costumam marcar eventos desse tipo, como as poses de indígenas reais ou fantasiados e as celebrações exibicionistas e circenses de todos os tipos, não faltou a análise dos acontecimentos mais importantes.
É certo que muito esforço foi dirigido aos impasses das negociações diplomáticas, enquanto a vida real se desenrolava em encontros menos solenes, mas no fim das contas pode-se dizer que a imprensa começa a entender algumas novidades.
Uma delas: a questão da sustentabilidade vai muito além da preservação ambiental e não se trata apenas de mais uma utopia.
Outra lição: as mudanças para valer não dependem mais de acordos entre governantes, mas da vontade da sociedade.
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