Se um corrupto desejar minimizar os efeitos do acompanhamento da imprensa de suas falcatruas, uma vez que elas tenham sido denunciadas ou descobertas, deve tentar levar as investigações sobre o crime para Estados periféricos do Brasil. Quanto mais distante dos grandes centros, menor a cobertura dos jornais de alcance nacional. É o que revela uma análise mais detida do noticiário sobre os episódios de corrupção no País, iniciada na última edição deste Observatório.
Nesta semana, comparamos a cobertura de dois jornais de Estados diferentes — a Folha de S. Paulo e O Globo. A primeira constatação possível a partir da análise comparativa é justamente o peso que o regionalismo tem na cobertura. Como seria de se esperar, o jornal carioca cobre melhor e mais extensivamente os casos de corrupção que grassaram nas terras fluminenses. Na semana passada (entre os dias 20 e 28/6), de acordo com o banco de dados organizado pela Transparência Brasil sobre matérias, artigos e editoriais relacionados à corrupção, o Globo publicou 59 textos sobre o assunto. No mesmo período, foram 53 matérias na Folha.
No diário carioca, o caso da Máfica do Propinoduto — nesta semana vários envolvidos foram soltos por decisão judicial — ganhou destaque muito superior ao concedido pelo jornal produzido a partir da Barão de Limeira. Como se sabe, o esquema das propinas, supostamente comandado por um ex-subsecretário de Administração Tributária do governo do Estado durante a gestão Garotinho, é genuinamente carioca. Rodrigo Silveirinha, o protagonista, pôde sair da cadeia após um ano e dois meses e, naturalmente, essa notícia teve impacto muito maior para os cariocas do que em São Paulo. No Globo, foram 7 matérias ou artigos sobre o caso, ao passo que a Folha publicou uma única reportagem e uma carta de leitor.
Silveirinha, porém, já não é mais um personagem de alcance regional: a Folha poderia ter investido mais no caso, até pelas implicações que traz para o hoje secretário de Segurança Pública do rio, Anthony Garotinho (PMDB), que também vem sendo apontado desde já como presidenciável em 2006.
Outro caso em que a cobertura do Globo vem sendo mais extensiva do que a da Folha é o do ex-assessor da Casa Civil da Presidência da República, Waldomiro Diniz. O jornal paulistano está acompanhando as investigações com reportagens menores do que as do seu concorrente carioca, talvez porque Waldomiro seja o centro de uma CPI instalada na Assembléia Legislativa do Estado do Rio. Assim, o Globo vem abrindo mais espaço e publicando reportagens mais alentadas do que as da Folha sobre o caso. Na semana passada, porém, pode-se dizer que houve um empate neste caso: os dois jornais deram exatamente duas matérias cada um sobre Waldomiro — uma bastante semelhante em termos de conteúdo e espaço (sobre a acareação entre Diniz e Carlinhos Cachoeira). As outras duas matérias são diferentes: o Globo noticiou o pedido da CPI da Loterj da quebra dos sigilos do ex-assessor; a Folha destacou a rejeição de denúncia contra ele pela Justiça Federal.
Da mesma maneira que o Globo deu melhor os últimos passos de Silveirinha e Waldomiro, a Folha apresentou uma cobertura muito mais ampla sobre as últimas peripécias do ex-prefeito paulistano Paulo Salim Maluf. Em termos de espaço, Maluf obteve quatro vezes mais holofotes no jornal de São Paulo do que no do Rio. O Globo noticiou apenas a quebra de sigilo bancário do ex-prefeito na Inglaterra (embora ele negue ter contas no exterior, o que não deixa de ser um paradoxo). No mesmo período, a Folha trouxe para seus leitores quatro reportagens, uma delas abrindo uma página ímpar do primeiro caderno. Maluf, como se sabe, é candidato a prefeitura paulistana neste ano e está mais uma vez no centro do cenário político da cidade.