‘De tanto ouvir, até a grama do jardim da TV Cultura sabe que televisão é hábito. Os arbustos mais atentos sabem também que o hábito se alimenta das rotinas diárias e, estas, de horários nas atividades cotidianas. Alguns coqueiros especialmente argutos até gostariam de acertar seus relógios pela entrada no ar de programas da emissora, mas desistiram. A Cultura não consegue ser pontual.
A pontualidade na grade é importante para criar os hábitos e as rotinas que favorecem a audiência e, inversamente, a ausência da pontualidade estimula o efeito zap, ou seja, o uso do controle remoto – e, aí, babau audiência. Não entendo por que a TV Cultura trata esse item, tão precioso, de maneira tão negligente.
Fiquemos por enquanto no exemplo do Boletim Cultura. Foi criado para entrar no ar de hora em hora, das 16 às 19 horas, cumprindo duas finalidades. A primeira, de conferir à emissora um perfil de dinamismo e atualidade, tornando-a permanentemente sintonizada com os acontecimentos do dia. A segunda, de criar uma nova rotina (e o hábito) para o público que busca informação no período vespertino.
Para vingar, um novo hábito leva tempo. Meses, anos. Se uma TV está realmente interessada nisso, deve transformar seus horários em dogmas. Qualquer alteração só mesmo em circunstâncias muito especiais. Mexer no horário de um programa deveria receber status de exceção e, como tal, apoiada em sólidas justificativas. E mais: muitas chamadas na tela, alertando o distinto público para a necessária, inevitável mudança. No jargão militar isso se chama assunto de Estado Maior.
Voltando ao Boletim Cultura, soube pelo informativo interno que a partir da semana que vem os três primeiros da tarde serão antecipados 15 minutos e, o que é pior, o das 19 horas nem está previsto. Enviei um pedido de informações a respeito e não tive resposta. Não tenho a menor idéia de como essas coisas são decididas, e por quem, na emissora. Indaguei à direção de jornalismo se ela havia participado da decisão, mas não tive igualmente resposta alguma.
A grama está desolada, os arbustos confusos, e os coqueiros acertam seus relógios pela Globo.’