A corrida desenfreada atrás da audiência tem provocado volta e meia tragédias que poderiam ser evitadas, se as empresas de comunicação obedecessem minimamente às condições de segurança adequadas para profissionais de imprensa. Muitos são os casos que nem chegam ao conhecimento público em função do silêncio dos próprios envolvidos e, o que é pior, até das representações sindicais que deveriam defender os interesses de quem representam, na prática ficando ao lado de patrões inescrupulosos. O silêncio nesses casos significa uma prática pelega e, portanto, condenada.
Pois bem, um fato ocorrido na Argentina deve merecer a atenção e a reflexão de todos os profissionais de imprensa. O repórter da Rádio del Plata Martin Canay foi suspenso por dois dias por ter se recusado a cumprir uma pauta. Ele tinha sido designado para ir à Ilha do Tigre, onde se encontrava o empresário Omar Chabán, figura obscura envolvida em denúncias de corrupção no governo de Carlos Menem. O repórter negou-se a viajar porque se deslocaria numa barca sem as mínimas condições de segurança. Preferiu não cumprir a pauta a ter que arriscar a vida. Ou seja, defendeu-se.
Agora, a União dos Trabalhadores da Imprensa de Buenos Aires (UTPBA), segundo informa a agência de notícias Argenpress, enviou nota de protesto à direção da emissora, assinada pela maioria dos trabalhadores da imprensa argentina, condenando a sanção ‘arbitrária, injusta e improcedente’ imposta ao repórter Martin Canay.
O secretário da UTPBA, Edgardo Miranda, assinalou que a entidade não poderia deixar de denunciar que empresários da área de comunicação não obedecem à lei e deixam de cumprir o estatuto e os convênios de imprensa para o exercício da atividade profissional de jornalistas.
O episódio em questão ocorre com freqüência em vários quadrantes deste continente latino-americano e de um modo geral só há pronunciamentos contrários a essa prática depois de algum fato grave. Há casos em que os próprios responsáveis – empresários que correm atrás do lucro fácil e desrespeitam seus trabalhadores – tentam posar como vítimas. Não raramente mentem, e nem são cobrados. Contam com a impunidade.
O emprego ou a vida
O melhor antídoto para isso é, sem dúvida, a mobilização dos profissionais de imprensa e uma atitude mais combativa das representações sindicais, como fez a UTPBA. Os jornalistas envolvidos em episódios dessa natureza não podem silenciar, sob pena de se tornarem também responsáveis por essa prática inescrupulosa. Em outros termos, quem cala consente. É preciso mudar também a mentalidade ainda existente de que a notícia é uma mercadoria como outra qualquer e vale tudo para vencer a concorrência, inclusive colocar em risco a vida de profissionais de imprensa.
Por aqui mesmo, vidas de jornalistas poderiam ter sido poupadas se empresários, e mesmo chefias do gênero mais realista do que o rei, agissem de forma a pensar primeiramente na segurança dos jornalistas.
Por estas e outras, principalmente em matéria de coberturas perigosas em áreas de risco, e o Rio de Janeiro está cheio delas, não se deve aceitar sem mais nem menos pautas com o visível intento sensacionalista.
Em suma: é preferível até correr risco de perder o emprego do que perder a vida.
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Jornalista