Friday, 15 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Paradoxos e contradições

Falta de verba inviabiliza a realização da 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) em Brasília. Essa certamente seria uma das notícias mais cobiçadas para a publicação pelos empresários da comunicação. Seria também, possivelmente, uma situação ideal para o ministro das Comunicações, Hélio Costa, equilibrar-se entre a recomendação do presidente Lula de organizar a Confecom e suas declarações anteriores que defendiam que ‘o Brasil não precisa de Conferência para democratizar as comunicações porque já há democracia no setor’.

No entanto, esse é, por incrível que parece, um dos mais improváveis empecilhos ao evento que deverá realizar, pela primeira vez, um amplo debate sobre o controle público dos meios de comunicação, a inclusão digital, a auto-regulamentação da publicidade, os oligopólios de rádio e televisão, o software livre, as mídias comunitárias, a Lei da Imprensa, a regulamentação das profissões de comunicação e a verba publicitária dos governos, entre outros temas.

Os empresários da comunicação querem restringir o debate às mídias digitais. Descaradamente, defendem uma ‘luta’ contra os oligopólios das telecomunicações que, com a convergência digital, apontam como novos produtores de conteúdo. Uma forma de reproduzir, nessas tecnologias, a mesma conjuntura de concentração das analógicas. Conforme a agência Pulsar Brasil (http://www.brasil.agenciapulsar.org/nota.php?id=4775), o vice-presidente de relações institucionais das Organizações Globo e representante da Associação Brasileira de Rádio e TV (Abert) na Comissão Organizadora, Evandro Guimarães, está ‘absolutamente convencido de que o tema central da Confecom tem que começar e terminar pela internet’. Segundo Guimarães, o debate proposto pela Abert visa ao ‘interesse nacional’.

Uma nova militância

As contradições da Confecom não ficam por aí. Outra barreira é a organização estatal do evento, que pode ser um marco para a democratização da comunicação. Os órgãos públicos historicamente utilizam a comunicação de forma instrumental para no máximo atingir objetivos de marketing político. A comunicação dificilmente é pensada com um fim para a participação democrática, o exercício da cidadania e a expressão da liberdade criativa.

Como exemplo, observa-se as políticas de comunicação da Prefeitura de Fortaleza, que possui em seus quadros um número recorde de jornalistas e estagiários, a começar pela prefeita Luizianne Lins, jornalista e engajada nos movimentos sociais e populares. Além de uma contribuição mensal (quase dois salários mínimos) às rádios comunitárias do município e de realizar uma Conferência Municipal há quase quatro anos, o que mais foi realizado na área? Responder a denúncias da grande mídia, tentar timidamente pautá-la e investir em propaganda. Essas foram as ações apresentadas por assessores e estagiários contatados. Não muito diferente tem agido o governo federal que, por exemplo, produz uma TV Pública direcionada principalmente para a elite intelectual.

Esses, infelizmente, não são os únicos paradoxos que desafiam o compromisso de democratização da comunicação da Confecom. Outra dificuldade é promover a participação popular na discussão da temática. Como levar esses assuntos para o debate público, se a grande mídia não tem interesse nisso? Do outro lado do planeta, podemos encontrar saídas para isso. As mobilizações das manifestações dos iranianos pelos blogs, twitter e celulares podem apontar uma nova militância pela democratização das comunicações quando os espectadores podem transformar-se em protagonistas. Esse protagonismo, ao mesmo tempo em que pode levar o assunto para a discussão popular, pode também desde já iniciar a democratização da comunicação, dado que a inclusão digital como exercício da cidadania depende da capacidade de produção e pró-atividade para publicação.

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Jornalista, mestre em Comunicação pela UFPE e professor universitário da Católica, Fa7 e UFC