A proposta do 3º Plano Geral de Metas e Universalização (PGMU III) é baseada no barateamento do Serviço de Telefonia Fixa Comutada (STFC), mas as metas da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) também atingem o acesso à internet. No entanto, o efeito não será necessariamente positivo. Pelo contrário, ele pode servir como uma trava ao Programa Nacional de Banda Larga (PNBL).
O PGMU III mantém sob controle das operadoras de telefonia fixa as redes secundárias de transmissão de dados (backhauls), responsáveis pela conexão entre o usuário final e as redes primárias (backbones). Assim, caberá a Telebrás pagar às operadoras para utilizar os serviços dos backhauls, já que ela deve precisar da infraestrutura privada para complementar sua rede própria, estatal, e chegar a mais municípios. Para Guilherme Varella, advogado o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), ‘não há como implementar a banda larga sem passar pelo backhaul. É preciso uma atitude pró-ativa da Telebrás para antecipar essas lacunas’.
Como está no papel, as empresas de telefonia fixa, responsáveis por 68% da oferta de banda larga no país, podem inviabilizar a envergadura da estatal reativada – a Telebrás – que pretende levar internet a velocidade de 512Kbps por até R$ 35 ao usuário, bem como da gratuidade para instituições públicas, metas prometidas pelo governo federal para o PNBL.
Subsídio cruzado está na essência do Plano
Atualmente, as empresas que controlam a rede de troncos (backhaul e backbone) já dificultam a concorrência na oferta da internet, ao cobrar valores altos pela utilização das centrais de transmissão de dados (voz, vídeo, teleconferência etc). No PGMU III, o valor a ser pago pela Telebrás e demais interessadas só será regulamentado após a renovação dos contratos, marcada para o fim de 2010. No entanto, a Anatel não fixou uma data para edição desse novo regulamento. Nas negociações, a Associação Brasileira de Concessionárias de Serviço Telefônico Fixo Comutado (Abrafix) já ameaça barrar a tentativa da Anatel de regulamentar a tarifação do backhaul.
Por enquanto, não há garantia que a Telebrás terá algum tipo de desoneração ou prioridade pelo uso da infraestrutura das teles. Varella defende que a utilização das redes secundárias de transmissão pela Telebrás parte de definição política e que é preciso rever a lógica do PGMU III, na qual se reserva primeiro as áreas que mais interessam ao mercado e depois libera-se o restante para o governo atender.
O Acesso Individual Classe Especial (Aice) também não garante que as empresas privadas vão acoplar internet a preços acessíveis para as classes C e D, ao alegar a prática ilegal do subsídio cruzado – transferência nos benefícios de um serviço. Porém, a advogada Flávia Lefèvre Guimarães, da Proteste, (Associação Brasileira de Defesa do Consumidor) afirma que o subsídio cruzado está na essência do PGMU, nesse caso, na obrigatoriedade de expandir os backhauls, bem como aumentar sua velocidade.
Mais pobres continuarão a preferir o pré-pago móvel
Outra irregularidade apontada por Flávia é que as operadoras não podem acumular dois serviços, segundo o artigo 86 da Lei Geral de Telecomunicações (LGT), de 1997. Por isso, parcela significativa dos backhauls foi repassada para empresas de telecomunicações sem qualquer licitação e cobrança específica, ou melhor, de graça, e retornam para posse do poder público em 2025, já sem a mesma validade, devido ao crescimento da internet via 3G e TV por assinatura, por exemplo. ‘Vamos insistir que a inclusão das metas de backhaul são ilegais’, sintetiza a advogada.
A Proteste entende que, se as redes privadas permanecerem nos contratos de concessão, elas devem ser bens da União e não das concessionárias. Caso contrário, estaria ocorrendo uma apropriação de um bem público, que é a rede de acesso à internet. A Associação levou a questão à Justiça, por meio de uma Ação Civil Pública, em maio de 2008.
A proposta contida no PGMU para baixar o valor da tarifa básica do telefone fixo também foi criticada pela Proteste. ‘O Aice valerá só para os inscritos no Cadastro Único do governo federal. Isto, além de ser discriminatório e, portanto, ilegal, economicamente não é interessante para os mais pobres, que continuarão a preferir o pré-pago móvel, onde pagam apenas pelos minutos utilizados’, diz a nota pública emitida pela Associação.
Outras metas
O secretário geral da Federação Interestadual dos Trabalhadores em Telecomunicações (Fittel), João de Moura Neto, acredita que as metas propostas pelo PGMU III são ousadas. O desafio, segundo ele, é o cumprimento delas por parte das concessionárias. ‘Se a Anatel permitir que as operadoras usem formas de burlar, não vai adiantar nada’, critica.
A preocupação do sindicalista vem das críticas que a Anatel sofre por não fiscalizar a contento os serviços de telecomunicações como um todo. Ele lembra, por exemplo, que as reclamações dos usuários sobre os serviços de telefonia são recebidas pelas próprias empresas. ‘É a raposa tomando conta do galinheiro’, diz João de Moura Neto, que, assim como a Proteste, defende que a internet deve ser entendida como um serviço em regime público e não privado como é hoje.
Além das metas de ampliação da rede das operadoras, o PGMU III também propõe o aumento da capacidade das redes. A proposta é que as novas taxas de velocidade sejam quatro vezes maiores do que as que foram fixadas no PGMU II, que está em vigor até o fim deste ano. No entanto, as operadoras concessionárias só precisariam oferecer a capacidade quando houver demanda local.
A partir de janeiro de 2011 as sedes municipais devem ter disponível backhaul instalado pelas concessionárias de telefone fixo na modalidade local, observadas as seguintes capacidades: 1) Em todos os municípios até 20 mil habitantes, a meta é 32 Mbps (era 8 Mbps e 16 Mbps na consulta anterior, em função do tamanho da cidade); 2) Entre 20 mil e 40 mil habitantes, 64 Mbps (era 32 Mbps); 3) Entre 40 mil a 60 mil, 128 Mbps (era 64 Mbps); 4) e em municípios com mais de de 60 mil habitantes, a meta é de 256 Mbps (contra 128 Mbps anteriormente proposto).
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Da Redação do Observatório do Direito à Comunicação