Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Proposta a revisão das regras para concessões

A discussão sobre mudanças na forma como o Estado brasileiro outorga e renova as concessões de rádio e televisão ganhou novo fôlego no Congresso Nacional com a aprovação do relatório final da Subcomissão Especial presidida pela deputada Luiza Erundina (PSB-SP) e vinculada à Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara (CCTCI). O relatório, de autoria da deputada Maria do Carmo Lara (PT-MG), é resultado de dez meses de análise da forma como os processos são conduzidos atualmente, tanto em âmbito Legislativo quanto na esfera do Executivo Federal.

O relatório parcial da subcomissão já havia sido referendado pela CCTCI em junho, com aprovação do Ato Normativo nº 1 de 2007, que estabeleceu novas normas e procedimentos para a tramitação dos processos de outorga e renovação das concessões na Câmara. Determinou-se, também, a realização de uma auditoria sobre a tramitação dos processos no Executivo, com o auxílio do Tribunal de Contas da União (TCU), e a disponibilização, no sítio da Câmara na internet, das informações sobre os processos em curso no Parlamento. Além disso, para promover maior participação da sociedade civil nos processos, foi aprovada a possibilidade de realização de audiências públicas na CCTCI para discutir a outorga ou renovação das concessões.

O relatório final, divulgado oficialmente na última quarta-feira (12), avança tanto na formulação de propostas que dêem transparência à tramitação dos processos quanto na proposição de recomendações ao Ministério das Comunicações. Constam no texto três novas propostas de emendas constitucionais e uma de projeto de lei, além de uma síntese de projetos já apresentados na Câmara que, segundo a subcomissão, devem ter sua apreciação pelo Congresso agilizada.

Emendas à Constituição

O relatório da deputada Maria do Carmo Lara propõe três alterações no texto constitucional. A primeira proposta diz respeito à proibição à participação de parlamentares e detentores de cargos públicos em empresas de radiodifusão. A propositura é baseada em levantamentos que revelam que, na última legislatura, 51 deputados federais e 28 senadores eleitos detinham controle direto sobre emissoras de rádio e TV.

Apesar da Constituição Federal (CF) já impedir em seu artigo 54 esse tipo de situação, o relatório aponta que ‘esse não tem sido o entendimento das autoridades constituídas’ e propõe a proibição expressa que parlamentares, ou cidadãos investidos de cargos públicos, sejam proprietários, controladores, diretores ou gerentes de empresas de radiodifusão.

A segunda PEC propõe a revogação do inciso 4º do artigo 223 da CF, que estabelece que o cancelamento dos contratos de concessão ou permissão para prestação de serviços de rádio e televisão, antes do vencimento do prazo, seja atribuição exclusiva da Justiça. A preocupação da relatora, nesse caso, diz respeito à impossibilidade conferida hoje ao Poder Concedente – o Executivo – de, mesmo na hipótese de grave irregularidade na prestação do serviço, poder reaver uma concessão. Segundo o relatório, ‘o caráter público da atividade de radiodifusão não justifica a preservação dessa norma, sobretudo porque nenhuma outra espécie de prestador de serviço público dispõe dessa prerrogativa’. Na prática, a PEC repõe ao Executivo o poder de revogar a outorga, reservando ao ‘ex-outorgado’, caso se sinta lesado, a possibilidade de recorrer à Justiça.

A terceira PEC propõe revogar o inciso 2º do mesmo artigo, que determina que a não renovação da outorga dependa da aprovação de, no mínimo, 2/5 do Congresso Nacional em votação nominal. Caso a alteração no texto constitucional venha a acontecer, a renovação das concessões seguirá o mesmo trâmite pelo qual passam as outorgas no momento de sua aprovação.

Critérios para a outorga de serviços de radiodifusão

O novo Projeto de Lei apresentado pela subcomissão diz respeito ao estabelecimento de critérios para a expedição de outorgas de serviços de rádio e televisão. Embora o processo de expedição de outorgas já esteja submetido à Lei nº 8.666/1993, a subcomissão entende ser necessário aperfeiçoar alguns instrumentos relativos às licitações das outorgas de rádio e TV.

Os principais pontos da proposição são a necessidade de consulta pública prévia ao processo de licitação para prestação de serviço de radiodifusão; a previsão de percentuais mínimos de regionalização da produção cultural, artística e jornalística e de produção independente a serem cumpridos pela emissora; o aumento do peso relativo do tempo destinado a programas jornalísticos, educativos e informativos, assim como dos programas culturais, artísticos e jornalísticos a serem produzidos e gerados na própria localidade da outorga e; a redução do peso relativo do prazo para início da execução do serviço objeto da outorga em caráter definitivo e do valor da oferta para a outorga. Em outras palavras, com o PL a subcomissão pretende que no momento da licitação sejam valorizadas as obrigações constitucionais em vez do valor pago pelo futuro radiodifusor, hoje o fator preponderante nas licitações.

Por fim, o PL propõe que a exploração da radiodifusão educativa seja feita somente pela União, estados, municípios ou por universidades. No caso de desinteresse destes, a autorização poderá ser outorgada para fundação privada, desde que seja demonstrada vinculação da entidade com a instituição de ensino.

Agilização de PLs em tramitação

Parte substancial do relatório é reservada à seleção de projetos de lei já apresentados na Câmara que mereceriam, por parte da CCTCI, atenção especial. Tais PLs envolvem desde a radiodifusão comunitária até questões ligadas à convergência tecnológica. Na questão das rádios comunitárias, o relatório sugere a aprovação do PL 4.186/98, de autoria do deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) e que prevê o aumento da potência de transmissão e o do número de canais reservados às rádios comunitárias, e ainda o PL 4.549/98, do ex-deputado Salvador Zimbaldi, que concede anistia para os acusados de operar ilegalmente o serviço até a entrada em vigor da Lei das Comunitárias (Lei 9.612/98).

O relatório também propõe a aprovação do PL 256/91, da então deputada Jandira Feghali, que estabelece critérios para a regionalização da produção e percentuais mínimos de tempo destinado à veiculação de produções independentes. Aprovado pela Câmara dos Deputados em 2003, o PL encontra-se até hoje parado no Senado.

Sobre a regulação dos serviços de TV por assinatura, o relatório sugere apoio à proposta do deputado Jorge Bittar (PT-RJ), recém apresentada na CCTCI, que estabelece cotas para a produção nacional na TV por Assinatura. Em relação à digitalização da TV aberta, a relatora propõe a aprovação dos PL 6525/06, do deputado Walter Pinheiro (PT-BA), e do PL 277/07, do deputado Inocêncio Oliveira (PR-PE). O primeiro propõe a adoção da figura do operador de rede, e o segundo visa garantir espaço no espectro digital para as TVs Senado, Câmara, Justiça, e para as TVs da Radiobrás e dos legislativos municipais e estaduais.

O relatório aponta também a necessidade de deter a concentração da audiência e, portanto, a oligopolização do setor. Por isso, sugere a aprovação do PL 4.026/04, de autoria do deputado Cláudio Magrão (PPS-SP), que limita a 50% a audiência nacional de veículos de radiodifusão. Outra iniciativa, de autoria de José Aníbal (PSDB-SP) visa oxigenar o Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional abrindo espaço para representantes das emissoras educativas e comunitárias.

Fiscalização e recomendações

O Ato Normativo nº 1 de 2007 determinou a realização, com o auxílio do TCU, de auditoria periódica sobre os procedimentos adotados pelo Poder Executivo para a análise dos processos de outorga e renovação das concessões de radiodifusão. O relatório final, com o intuito de dar efetividade ao que já havia sido aprovado anteriormente, propõe à instalação imediata da auditoria.

Outra novidade do relatório aprovado pela subcomissão na última semana é a proposição de novas indicações ao Ministério das Comunicações. No relatório parcial aprovado em junho já haviam sido sugeridos ao Minicom diferentes procedimentos para dar transparência e celeridade à tramitação dos processos, como o aperfeiçoamento dos instrumentos para acompanhamento pelo cidadão, a fixação de prazos para o cumprimento das exigências pelas emissoras e para a tramitação no Minicom, a reabertura das delegacias regionais do ministério e a instituição de mecanismos de aferição do cumprimento pelas emissoras da legislação em vigor e, em especial, da Constituição Federal.

No relatório final, além do reforço destas primeiras indicações, a subcomissão sugere ao Ministério das Comunicações a criação de uma comissão descentralizada com a participação de entidades da sociedade civil para acompanhar a prestação dos serviços de radiodifusão, e o estabelecimento de um canal multimídia do Poder Executivo para que o cidadão possa encaminhar denúncias de irregularidades na prestação dos serviços e apresentar sugestões para o aperfeiçoamento dos procedimentos e atividades de radiodifusão.

Futuro

Aprovado na Subcomissão Especial no último dia 12/12, o relatório ainda precisa ser aprovado pela CCTCI, o que não deve acontecer em 2007. Sua aprovação, entretanto, não será tarefa fácil, uma vez que parte substancial da comissão é composta por radiodifusores. Para tornar o quadro ainda mais complexo, nos primeiros meses do ano haverá nova eleição para a Presidência da CCTCI, e Júlio Semeghini, historicamente ligado ao setor de telecomunicações e que vinha dando apoio aos trabalhos da subcomissão, pode ser substituído por um aliado dos radiodifusores. Caso isso aconteça, a aprovação do relatório na Comissão de Ciência e Tecnologia encontrará resistências ainda mais fortes.

Clique aqui para ter acesso ao relatório.

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Do Observatório do Direito à Comunicação