O Senado aprovou na quinta-feira (5/5) um relatório que altera várias regras que a Casa adota para análise de processos de outorga e concessão de rádio e TV. Entre elas, fica criada a partir de agora a possiblidade de ouvintes e telespectadores encaminharem denúncias sobre o mal uso de determinado canal, aumentando o controle social sobre os veículos. O documento foi fruto de um Grupo de Trabalho coordenado pelo senador Walter Pinheiro (PT-BA) e foi aprovado pela Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT).
O relatório prevê a abertura de um prazo de dez dias para recebimento de denúncias ou manifestações acerca de cada processo de outorga e renovação em tramitação na CCT. A sociedade poderá denunciar possíveis irregularidades na composição societária das empresa (como a presença de ‘laranjas’), problemas fiscais e também opinar sobre a programação dos canais. O Congresso não fará a fiscalização direta sobre os concessionários. Apenas receberá contribuições dos cidadãos.
As denúncias, segundo o relatório, serão examinadas por um senador relator, a quem caberá a adoção de medidas cabíveis, como solicitação de informações às emissoras e requerimento de audiências públicas. Depois de avaliado o caso, o relator elabora um parecer sobre o mérito da denúncia.
Outra providência que será adotada será a realização de audiências públicas para ‘examinar casos excepcionais de outorga e renovação, levando-se em consideração fatores tais como o interesse público envolvido, a abrangência do serviço prestado e a existência de fatos ou indícios que justifiquem discussão mais aprofundada’. Embora pareça medida simples, os parlamentares tanto da Câmara quanto do Senado têm forte resistência em realizar esses métodos de avaliação dos concessionários.
Como nem sempre uma audiência pública consegue dirimir dúvidas e apurar irregularidades, o relatório da CCT também pede uma atuação mais forte do Tribunal de Contas da União (TCU) para realização de auditorias periódicas no Ministério das Comunicações (Minicom), Casa Civil e Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) relativos aos processos de outorga e renovação de radiodifusão.
Recomendações
Além de alterar os procedimentos internos do Senado, o relatório também faz recomendações ao Ministério das Comunicações para que aperfeiçoe sua atuação e suas normas referentes ao tema. Algumas das propostas geram mudanças significativas na forma como são concedidas as outorgas.
O Minicom vai ter de prever, no edital de licitação de um canal, percentuais mínimos de regionalização da produção cultural, artística e jornalística e de produção independente a serem cumpridos pela emissora vencedora. É uma tentativa de fazer valer o Artigo 221 da Constituição, que dispõe sobre a descentralização da produção de conteúdo, porém, sem propor a regulamentação do citado artigo, que demandaria de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC).
Quando mais de uma empresa concorre, em licitação, a um canal, geralmente a vencedora é a que faz a maior oferta financeira pelo espaço no espectro. O relatório recomenda que o Minicom aumente o peso relativo nesse processos de questões de conteúdo, como tempo destinado a programas jornalísticos, educativos e informativos gerados na localidade da outorga. Ao mesmo tempo, deverá ser refeito o sistema de pontos para que se diminua o peso relativo do valor da oferta para outorga na disputa.
Além disso, os senadores recomendam que o Governo Federal revise as normas que regem as transferências de outorgas. Atualmente, elas podem ser feitas após cinco anos de funcionamento do canal. No entanto, precisam passar pelo aval do Ministério das Comunicações. O senador Walter Pinheiro acredita que uma medida importante seria a exigência de que os donos das empresas que vendem os canais apresentem informações do seus impostos de renda dos últimos dois anos.
O petista Walter Pinheiro espera que esse conjunto de recomendações não vire letra morta dentro do Governo Dilma. ‘Não é uma simples recomendação. Não cumprindo, não votamos’, promete o senador baiano.
Marco legal
Excetuando-se as recomendações ao Ministério, nenhuma dessas mudanças contidas no relatório altera alguma lei que rege o setor. Elas basicamente revisam uma resolução interna do Senado (nº32, de 2009). Por isso, alguns problemas estruturais relacionados ao tema ficaram de fora do relatório, como a outorga para políticos, o combate a oligopolização do setor e estabelecimento de penas mais rígidas para empresas que fazem mal uso da concessão pública. Essas teriam de passar por mudanças legais mais profundas, várias constitucionais.
No entanto, a vantagem da estratégia escolhida pelos senadores é que as propostas aprovadas no relatório são autoaplicáveis pelo Senado. E não foi por acaso essa escolha. O senador Pinheiro lembra do relatório produzido por um grupo da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara aprovado em 2008 que fez uma série de propostas de revisão legal das normas de concessão, permissão e autorização de serviços de radiodifusão. ‘Não conseguimos aprovar nada do que propomos’, constata. Por isso, o parlamentar espera que a proposta de revisão do marco regulatório, que ainda está sendo construída pelo Governo Federal, dê conta de discutir outras deficiências do nosso sitema de comunicação.
Nesta quarta-feira (11/5) a CCT do Senado volta a apreciar pedidos de autorização de funcionamento de emissoras. Só que apenas rádios comunitárias. Para análise de outorgas de veículos comerciais e educativos ainda é necessário acordos mínimos entre a Casa e o Minicom. As novas regras contidas no relatório aprovado na quinta (5), porém, só começam a ser aplicadas nos processos que ainda não tramitam na CCT. Isso se realmente saírem do papel, já que várias dessas propostas estão presentes no relatório de 2008 da subcomissão da CCTCI, presidida pela deputada Luiz Erundina (PSB-SP), e nunca foram implementadas pelo antigo Legislativo e pelo governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.