Todos contra a BBC. A rede britânica de comunicação financiada com dinheiro público vem sendo alvo de uma campanha liderada por empresários da indústria da mídia e políticos. Todos protestam contra o acelerado crescimento da companhia, alegando que ele prejudica e distorce os mercados local e nacional.
Qualquer cidadão que possua um aparelho de TV no Reino Unido deve pagar uma taxa anual para a BBC. Esta taxa, que atualmente é de 131,50 libras para televisores coloridos, é definida pelo Departamento da Cultura, Mídia e Esporte em intervalos de sete anos. O órgão governamental analisa o desempenho da rede pública e decide se ela deve ou não continuar a receber financiamento do público – e de quanto deve ser este pagamento. Nos próximos meses, o departamento irá anunciar sua decisão para o próximo período de sete anos, e ela passará a vigorar em abril de 2007. O diretor-geral da BBC, Mark Thompson, apresentou proposta para que a taxa suba mais rapidamente, com a justificativa de que mais dinheiro ajudaria a rede no processo de mudança para o padrão de televisão digital e nos serviços on-demand.
Concorrência desleal
É aí que tem início a confusão. A expansão agressiva dos negócios da BBC passou a assustar as companhias comerciais rivais, que consideram o crescimento uma espécie de concorrência desleal. Além dos canais de TV maiores, a BBC passou a investir em canais locais em diferentes regiões da Inglaterra, que ameaçam as pequenas emissoras comerciais locais. O mesmo aconteceu no rádio. A rede investe também em emissoras internacionais, revistas, sítios de internet e até download de músicas.
‘Se a BBC seguir adiante com sua expansão nacional de estações de TV locais irá distorcer o mercado. Seria mais ou menos como se abrissem um [hipermercado] Tesco ao lado do mercadinho local’, diz Kevin Stewart, executivo-chefe da Tindle Radio, que possui pequenas estações nas regiões de Essex, Norfolk e Suffolk.
‘Nós temos investido muito no desenvolvimento de serviços digitais locais. Nossa habilidade em fazê-lo depende dos nossos anunciantes. Isso poderia estar em risco se a BBC entrar neste espaço como um grande gorila, armada com uma grande quantidade de dinheiro e imune a pressões comerciais’, reclama Tim Bowdler, executivo-chefe da Johnston Press, dona de jornais locais e sítios de internet.
A decisão da rede em, no ano passado, oferecer o download gratuito das sinfonias de Beethoven em seu sítio desagradou bastante as gravadoras de música clássica. Críticos alegam que as gordas fontes de renda da BBC permitiram que sua parcela no mercado de rádio no Reino Unido chegassem a 55% e possibilitaram o pagamento de salários gigantes para apresentadores renomados.
O BBC World, que tem anúncios comerciais e é transmitido para a Europa continental, sofreu grande perda de receita nos dois últimos anos. Analistas explicam que o tempo necessário para que o investimento inicial na emissora seja recuperado seria grande demais para um operador do setor privado. ‘Nossa opinião é que a BBC faria melhor para seu público pagante se fizesse parceria com o Euro News, em vez de tentar continuar a desenvolver o BBC World, especialmente na Europa. Seria muito mais barato, e evitaria competição desnecessária’, afirma Philippe Cayla, presidente do canal Euro News.
Campanha privada
Grupos de empresários enviaram cartas para a secretária de Cultura, Tessa Jowell, listando suas preocupações sobre as ambições da BBC e sobre o modo como a rede usa a receita proveniente da taxa pública. O objetivo é aumentar a pressão sobre a decisão do governo sobre o futuro do financiamento. Eles argumentam que a BBC procura novos projetos para implementar porque recebe dinheiro demais. O professor da escola de administração de Warwick Martin Cave aponta outro fator. ‘A motivação da BBC é que, se ela expandir, talvez possa também conseguir uma taxa maior’.
Esta semana, grandes grupos de mídia como News International, Associated Newspapers e Telegraph Group se uniram nesta mesma campanha. Em uma petição ao governo, Murdoch MacLennan, executivo-chefe do Telegraph, Les Hinton, presidente-executivo do News International, e Paul Dacre, que comanda o Associated Newspapers, assinaram uma petição pedindo que o governo garanta que a taxa que financia a BBC não seja usada também para subsidiar o crescimento da rede na arena digital. O grupo pede que a taxa seja mantida compatível ou menor ao índice inflacionário para que a expansão digital da BBC não ameace o crescimento das companhias comerciais rivais.
Posição privilegiada
Segue nesta mesma linha o discurso de políticos conservadores, como David Cameron e George Osborne, que pontuaram que é preciso haver maneiras de garantir que a BBC não abuse de sua posição privilegiada para esmagar concorrentes menores.
A BBC nega as acusações dos concorrentes, e afirma que precisa inovar para acompanhar as mudanças do público. Sobre os novos serviços, a rede defende que só terão continuidade se os benefícios para o consumidor forem maiores que o impacto no mercado. Com informações do Sunday Times [14/5/06], David Charter [The Times, 15/5/06] e Stephen Brook [The Guardian, 18/5/06].