Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Sucursal de interesses

O rádio cearense já teve seus tempos áureos. Os ouvintes eram extremamente valorizados, com uma programação de qualidade que discutia de forma concreta os problemas de sua comunidade. Hoje, este processo está findando. É cada vez mais rara a programação que valoriza o ouvinte e o respeita. Ficamos à mercê dos interesses econômicos da emissora e do humor dos locutores. O rádio-cidadão que presta serviços, que tira dúvidas ou que estimula a cidadania está cada vez mais voltado para os desejos dos que têm dinheiro ou poder.

Alguns programas se caracterizam pelo humor chulo, que agride os ouvintes com palavrões e os desrespeita com opiniões agressivas que transformam simples torcedores em inimigos mortais. A prática dos programas e das transmissões esportivas tem sido exclusivamente de torcer por times de forma explícita, colocando a neutralidade de lado e não se preocupando com a informação clara e precisa.

Alguns programas políticos são utilizados para defender os interesses de grupos de poder, exagerando na crítica de forma puramente partidária e parcial. Não temos comentários abalizados e seguros, temos discursos que beneficiam este ou outro político.

Os programas de estímulo à cidadania estão desaparecendo ou sendo reduzidos cada vez mais, com a invasão das grandes redes de rádio do sul do país, que não valorizam os interesses locais nem permitem ao ouvinte uma leitura clara dos acontecimentos de seu cotidiano. Estamos cada vez mais à mercê dos interesses econômicos em detrimento do sagrado direito do ouvinte, que é participar, criticar e formar conhecimento.

Os radialistas identificados com a comunidade estão perdendo seus locais de trabalho n uma programação pasteurizada e repetitiva que não leva a nada; profissionais do rádio perdem o emprego para o poder de uma mídia gravada e sem nenhuma interatividade. Em função desta ação tresloucada, alguns hoje estão doentes e abandonados.

O valor da participação

As mudanças estão buscando o lado errado, pois o rádio está sendo transformado em sucursal de meros interesses capitalistas que esquecem a participação popular, o interesse público e a cidadania.

O rádio cearense precisa mudar, deve valorizar seu cliente maior: o ouvinte que teima em ser ouvido e muitas vezes é desrespeitado com termos pejorativos de ‘mala’, ‘chato’ ou outras denominações dadas nos bastidores. Os grandes programas de audiência maior têm se transformado num gigantesco espaço de anúncios populares, pois valorizam o comercial em detrimento da informação e da participação dos cidadãos. Essa relação precisa ser transformada, pois ouvinte é cliente, e no mundo econômico o cliente tem sempre razão.

Alguns locutores insistem em agredir ouvintes no ar e criticam iniciativas de união dos ouvintes em prol de um rádio cidadão e de qualidade. Vivemos uma época de crise que só poderá mudar se os grandes grupos que dominam o rádio aprenderem a valorizar seu cliente que teima em amar o rádio e só recebe incompreensões e críticas destrutivas.

Acreditamos num rádio-cidadão que valorize o valor da opinião, da participação e da construção de um processo de inter-relação entre todos aqueles que fazem do rádio um meio de comunicação que teima em resistir diante dos ataques dos que só pensam em dinheiro e fama.

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Presidente da Associação de Ouvintes de Rádio do Ceará, Fortaleza