Apesar de o padrão japonês de modulação ser considerado o mais completo para o Brasil, os gestores públicos responsáveis pela implementação do Sistema Brasileiro de Televisão Digital (SBTVD) não querem simplesmente copiar o modelo estrangeiro. A estratégia é ter como base uma tecnologia consagrada para criar um novo sistema que se adapte à realidade nacional.
‘Estamos pegando todo o acervo tecnológico acumulado mundialmente no setor e criando melhorias que beneficiem a inclusão social por meio da interatividade digital’, disse César Augusto Gadelha Vieira, secretário de Política de Informática (Sepin) do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).
Gadelha Vieira participou do simpósio ‘Impactos sociais e tecnológicos da implantação de TV Digital Aberta no Brasil’, na segunda-feira (17/7), durante a Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Florianópolis.
‘Em nenhum lugar do mundo se pensou em utilizar a tecnologia digital para fins sociais. Essa é uma iniciativa pioneira do Brasil e queremos aproveitar a predileção do brasileiro pela televisão para transmitir serviços e conceitos de cidadania. Mais de 98% dos lares brasileiros têm aparelho de TV’, destacou o representante do MCT.
Canal da Cidadania
O sistema digital deverá levar sete anos para chegar a todo o país e o sinal analógico continuará sendo transmitido nos próximos dez anos. Durante o período de transição, o governo federal concederá um canal paralelo a cada emissora comercial – os sinais digitais abertos começarão a ser transmitidos dentro de seis meses. Depois de dez anos, os canais analógicos serão devolvidos ao governo.
‘Os sinais digitais serão transmitidos primeiro nas grandes capitais, como São Paulo e Rio de Janeiro. A transição do analógico para o digital será feita de maneira suave, para que a população não se sinta prejudicada com os impactos tecnológicos’, disse Gadelha Vieira.
O secretário anunciou que o governo pretende criar quatro novos canais, que deverão ser veiculados em todas as regiões do país. A Anatel já está realizando um amplo estudo de viabilidade técnica para a implementação desses canais nos grandes centros urbanos. Um problema em praças onde existem muitas transmissões é a questão da interferência dos sinais.
No primeiro canal serão transmitidos programas, trabalhos e eventos do poder executivo federal. O segundo será voltado ao desenvolvimento de ferramentas de ensino a distância, por meio do Ministério da Educação. Outro será destinado à divulgação de manifestações culturais e regionais e o quarto, o Canal da Cidadania, dará espaço à transmissão de projetos dos poderes estaduais e municipais para as comunidades locais.
Seis minutos de jogo
Marcelo Knörich Zuffo, professor do Departamento de Sistemas Eletrônicos da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), lembrou que o Brasil está se configurando como o quarto mercado consumidor de TV digital do mundo.
‘Ainda estamos nos seis minutos do primeiro tempo do jogo. Não adiantará nada termos 2 mil pesquisadores para estudar o melhor padrão se nossas competências não transformarem todo o conhecimento acumulado em inovações que gerem emprego e renda para a população’, disse.
Zuffo, que é também coordenador do Projeto Terminal de Acesso de Referência, um dos consórcios para o desenvolvimento do SBTVD, sinalizou a necessidade de novas parcerias com os japoneses com relação à interoperabilidade do sistema nacional.
O pesquisador da Poli/USP explicou que o Brasil está avançando no desenvolvimento de softwares e, por sua vez, os japoneses dominam os sistemas de modulação. ‘Existe uma possibilidade concreta de trabalharmos em parceria. E, se conseguirmos vencer as barreiras da interoperabilidade, poderemos ter o melhor sistema de TV digital do mundo’, disse.
Zuffo vai mais longe: se as inovações tecnológicas brasileiras emplacarem, o Brasil terá até problemas de formação de capital intelectual. ‘Temos hoje mais de 2 mil pesquisadores envolvidos na primeira fase do SBTVD e poderemos precisar de mais de 25 mil técnicos e especialistas. Essa é uma grande preocupação’, disse.
Apesar da visão otimista sobre o processo, o pesquisador aponta que os primeiros anos de implementação do sistema digital não serão fáceis.
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Repórter da Agência Fapesp