Saturday, 02 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1312

Telebrás, o retorno

A Telebrás, futura operadora do PNBL – programa de inclusão digital que visa a levar a internet de alta velocidade a milhares de municípios – segundo querem alguns, mesmo na época de seu esplendor, a empresa jamais instalou sequer um telefone público; jamais foi uma operadora, sempre foi uma holding, que talvez nem fosse nascer, não houvesse uma briguinha entre os altos níveis da Embratel e o ministro Corsetti (era o que se dizia no século passado).

A estrutura atual da Telebrás nada tem a ver com uma operadora – não custa repetir – de qualquer coisa. Depois da privatização, sobrou um punhado de pessoas que tentam resolver pendências trabalhistas – ou estão perdidos/cedidos e à disposição da anêmica (por culpa de quem?) Anatel. Logo, para haver operação, serão necessárias contratações, com meu, teu, nosso dinheiro. No edital, um possível requisito necessário: carteirinha do PT. Se os critérios forem técnicos, tanto melhor. A Telebrás entrará apenas com uma razão social (e com os objetivos alterados) – Telebrás, Telebaby (em homenagem às Baby Bell), Telesalvaçãodapátria – à vontade do freguês. Não será reativada a Telebrás, será criada uma nova empresa e, por falta de imaginação, ela receberá essa razão social preexistente. Pronto, foi encontrada a solução do problema da exclusão digital.

Para que se inventaram os precatórios?

Existe essa tão falada rede da Eletronet, cuja extensão (16.000 km) representa algo como uns 10% das redes das concessionárias. Essa rede não possui capilaridade – a famosa last mile. Com a desculpa pelo palavrão, não passa de um backbone. Não tem acesso aos pequenos usuários finais. De onde surgirá esse acesso? De acordos operacionais com as teles, ou vamos reinventar tudo? Tudo wireless? Existe uma outra objeção, vinda de técnicos: essa rede está ultrapassada tecnicamente, mas tudo bem. O discurso político passa por cima dessas chatices.

O dinheiro parece não interessar. A Furukawa e a Lucent não pensam assim, talvez pelo fato de terem uns 600 milhões a receber. Se há quem opere, haja quem pague. Agora, informam que a rede é da Eletrobrás. E a dívida? 800 milhões, já que há mais credores além desses principais? Tudo bem. O governo injeta para quem desmaia só de pensar em seringa, pesadelo total.

Injeta de onde? Vai pegar dinheiro no Santander? Não, será meu, teu, nosso que estará numa rubrica orçamentária. Se não estiver, crie-se. Afinal tem o Fust… Por onde andarão os quase 10 bi do Fust? Não me atrevo a dizer porque não tenho a mais vaga idéia, e não sou o único a não saber. Será que contribui para o nosso superávit primário?

Já se disse que a Eletronet tinha apenas o direito ao uso… mas alguém contratou a Furukawa, a Alcatel e as empreiteiras, que apelarão à nossa justiça. Momento, preciso dar risada! Para que foram inventados os precatórios?

Os ‘entreguistas’ e os ‘patriotas’

Essa grande empresa que atenderá os desvalidos será rentável? Sim! Daqui a dez anos. (se for daqui a sete, peço desculpas) Até lá, dá-lhe dinheiro pelo ralo. Já sabe: meu, teu, nosso. Será essa a maneira melhor?

Não é mais prático impor metas às teles? Nãããããoooo. Claro que não. É preciso encher de gente aquele prédio amarelo de Brasília (era amarelo no meu tempo, agora não sei, nem me interessa). Mas por que não colocar as teles no colo e impor metas? Acham que se furtarão, com o risco de perder as concessões? A ‘privataria’ funciona assim. Anatel manda, negocia-se e cumpre-se. Pelo menos era essa a idéia original. Não se culpe o modelo se a execução for ruim!

Uma empresa subsidiada, para quem o dinheiro não conta porque sai do cofre da viúva, pode fazer uma concorrência honesta (fair)? Imagine os ‘menos favorecidos’ indo com a canequinha apanhar bits baratinhos na tubulação master! Comovente! Agora, num rasgo de lucidez e sinceridade, afirma-se que, por enquanto, haverá apenas discussões em torno de uma ‘mesa digital’. Discutam, senhores representantes de todos os setores. Da discussão nasce a luz ou uma decisão de cima para baixo. Algo no estilo: pode ser qualquer cor, desde que seja o vermelho!

Não é o caso de entrar nos meandros das transações, do tal real simbólico que comprou uma dívida, nem falo da especulação com as ações porque muita gente vai quebrar a cara, mas eles são maiores de idade. Quem entra na chuva é para se queimar, já dizia o saudoso Vicente Matheus. Se houve vazamento de informações beneficiando X,Y ou Z, será praticamente impossível descobrir.

Obrigado pelo minuto concedido. Essa conversa poderia levar horas. Na prática, levará meses. O desenho do projeto passará por crivo técnico e pela costumeira discurseira, opondo ‘os entreguistas’ aos ‘verdadeiros patriotas’. Haja paciência!

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Formado pelo ITA em Engenharia Eletrônica e mestrado em Finanças na Fundação Getúlio Vargas, autor de Almanaque Anacrônico, Versos Anacrônicos, Apetite Famélico, Mãos Outonais, Sessão da Tarde, Desespero Provisório, Não basta sonhar, Um Triângulo de Bermudas e O Desmonte de Vênus (ed. Totalidade)