Thursday, 14 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

Terra Magazine


QUADRINHOS
Claudio Martini


FIQ – Outro como esse só daqui a dois anos, 25/10/07


‘Na semana passada, o 5º FIQ (Festival Internacional de Quadrinhos) de Belo Horizonte, mostrou a quem se dispôs a ir até a capital mineira, um panorama excepcional das HQs que foi ou está sendo realizada em diversas partes do mundo.


Com esta edição, que este ano homenageou o Japão, o festival confirma seu status como o mais importante evento dos quadrinhos no Brasil. A qualidade, diversidade e quantidade de exposições, palestras, autores presentes e lançamentos garantiram que muitas vertentes, interesses e pontos-de-vista estivessem ali representados, mostrando o vigor e poder dos quadrinhos: os super-heróis, a escola argentina, os quadrinhos europeus e africanos, os mangás e animês, os brasileiros (consagrados e independentes).


Começando pelos autores presentes, nacionais e internacionais, que participaram de palestras bate-papos, entrevistas e oficinas: os franceses Pascal Rabaté e Benoît Sokal, os argentinos Eduardo Risso, Domingo Mandrafina, Juan Sáenz Valiente e Carlos Sampayo, o italiano Giancarlo Berardi, a japonesa Kan Takahama, os brasileiros Sergio Macedo, Orlando, Fábio Moon, Gabriel Bá, Antonio Cedraz, Lelis, Renato Guedes, Marcatti, Bira, Santiago, dezenas de independentes (Quarto Mundo e outros).


As exposições também foram um dos pontos principais, distribuídas pelo belo espaço da Serraria Souza Pinto, no centro de BH. Além das mostras dedicadas aos artistas convidados e que estavam presentes, tivemos o prazer de conhecer os originais do brasileiro Julio Shimamoto e do japonês Yoshihiro Tatsumi. Pudemos ver a bela exposição de desenhos de super-heróis da coleção de Ivan Freitas, a retrospectiva de revistas mineiras alternativas e da argentina Fierro, uma homenagem a Oscar Niemeyer por artistas do mundo todo, e um trabalho realizado pelos maiores desenhistas brasileiros explicando o Brasil através dos quadrinhos.


A participação de pesquisadores e artistas, como Sonia Luyten, Gazy Andraus, Paulo Ramos, Eloar Guazzelli, João Marcos, aprofundaram a discussão sobre as HQs, em temas como Educação e Quadrinhos, Quadrinhos e Inclusão, Pesquisa e HQs.


A biblioteca de quadrinhos independentes franceses, organizada pelo desenhista brasileiro Túlio Caetano e patrocinada pelo Consulado da França, também foi uma das grandes atrações do evento. Túlio, que viveu e trabalhou muitos anos na França, realizou um incrível trabalho de pesquisa, selecionando cerca de 400 livros, para crianças e adultos, de grandes e pequenas editoras, que enfatizavam o trabalho autoral e inovador dos autores. A coleção, que agora vai viajar por várias cidades brasileiras, é imperdível.


As oficinas de Pascal Rabaté (de técnica de lavis, utilizando acrílico e nanquim), de Berardi (de roteiro) e de Zimbres (de fanzines para crianças) foram um privilégio único para quem estava lá e participou.


Enfim, um festival de gente grande para todas as idades, realizado pela editora Casa 21 e pela Fundação Municipal de Cultura de BH, que não deve nada aos grandes eventos (principalmente os realizados na Europa e Estados Unidos) dedicados às histórias em quadrinhos. Só resta agora os fãs de todo o Brasil que ainda não o conhecem, tomarem consciência da importância e excelência desse evento e comparecerem em peso, daqui a dois anos, em Belo Horizonte.’



SIC
Sírio Possenti


Incrível! Ninguém acerta uma!, 25/10


‘A edição de 15/10/200 da revista Época publica uma nota engraçada na página 36. O título é ‘Conjugação verbal’, em vermelho, como outros do mesmo tipo na mesma página. O texto introduz citações de partes do segundo balanço do PAC. O tal balanço menciona que o PIB cresce a 22 meses, o consumo, a 15 trimestres e o investimento, a 14 trimestres. Os três ‘a’ são adequadamente seguidos de ‘sic’, porque são erros do original.


O final da nota é irônico: ‘bem que o governo poderia usar parte dessa verba para chamar uns revisores’. Posição adequada da revista, já que os três ‘a’ são ‘erros’, pois a redação adequada é há 22 meses, há 15 trimestres, há 14 trimestres. Ou seja, trata-se de um verbo, não de uma preposição.


Por que a nota é engraçada? Porque também a revista precisa de revisores. Ou melhor, de editores de texto, pois o problema em questão não é de conjugação verbal, mas de escolha lexical: indo na direção da nota de levar a escrita ao pé da letra, trata-se de escolher entre uma preposição (a) e um verbo (há), e não de acertar a conjugação do verbo. A questão seria de conjugação se a alternativa fosse, por exemplo, entre há e houve ou haverá (curiosamente, muitos ‘erram’ escrevendo ou dizendo haviam por havia, mas nunca alguém errou por escrever hão no lugar de há).


Se o texto tivesse sido apenas falado, provavelmente a diferença não seria percebida (os analistas ‘sabem’ que o que distingue ‘a’ e ‘há’ é que a forma verbal é tônica e a preposição, átona, mas isso é mais verdade em condições ‘neutras’ de enunciação do que um fato indiscutível). Assim, talvez um erro do texto do ‘orador’ passasse desapercebido. Mas escrita, a nota ‘ufanista’ fica de fato capenga do ponto de vista das regras vigentes.


Certamente os redatores devem ter ouvido mil vezes o macete que se repete nas aulas para evitar esse erro: quanto se trata de futuro, usa-se ‘a’ (como em daqui a dois anos); quando se trata de passado, usa-se ‘há’ (como em há dois anos… ou seja: faz dois anos que…, passaram dois anos desde que…). Adianta? Parece que não muito. Quem sabe mesmo o que é futuro e o que é passado?


É incrível que tais críticos (ia dizer ‘analistas’, mas seria exagero), mesmo quando acertam o diagnóstico, erram sempre o remédio.


Mas esse não é o erro da semana. O mais impressionante foi ler ‘Minha posição quanto à conveniência ou não de unificar o português falado no mundo (sic!) é um destemido ‘não sei’ na coluna de Luiz Fernando Veríssimo (Correio Popular, 18/10/2007).


Faz tempo que vejo manchetes que incluem equivocadamente o discurso da ‘unificação do português’ quando as notícias se referem à reforma ortográfica. Uma pesquisa que recuperasse as manchetes desde que o affaire começou, nos tempos do Itamar, salvo engano, mostrará que, eventualmente, as matérias têm sido até razoáveis, porque acabam dizendo que se trata de alguma mudança nas regras de escrita, mas as manchetes são quase sempre um desastre. Sempre falam de unificação da língua, quando se trata apenas de unificação da escrita oficial da língua.


Ver essa posição absolutamente torta encampada por Veríssimo é espantoso, porque ele dificilmente erra. Suas posições ideológicas podem ser discutíveis, claro. Mas ele é conhecido por dizer coisas interessantes ou por encontrar formas interessantíssimas de dizer coisas comuns. Mas errou feio na leitura ou na escuta das notícias sobre reforma ortográfica. Escreveu o que não se admite nem em textos de Jô Soares.


E a seqüência do texto é ainda mais incrivelmente equivocada: ‘Talvez não valha o trabalho que dará para mudar regras e hábitos – sem falar em dicionários – e pode-se prever que mudanças, se vierem, levarão tempo para ‘pegar’. (…) ‘E mesmo com a unificação da gramática e do vocabulário restaria a questão da pronúncia’.


Deus! Quais regras e hábitos estão na mira da reforma? Nenhuma! Nenhum!! Os dicionários, previsivelmente, deverão adaptar a grafia das palavras, mas apenas a grafia das palavras (leia isso como se eu tivesse gritado!). Por exemplo, a palavra vôo vai perder o acento gráfico, vai ser escrita voo, se a reforma for mesmo implantada. Mas nada mais vai mudar, nem o sentido ou os sentidos da palavra, nem sua pronúncia ou suas pronúncias. É completamente absurdo pensar nessas hipóteses!


De onde Veríssimo tirou as bobagens? Tenho uma hipótese: há algum tempo, li que havia textos circulando na Internet atribuídos a ele e que ele garantiu não serem de sua autoria. Estou achando que, por excesso de compromissos, desta vez foi ele que acreditou que um desses textos que circulam na Internet que lhe são atribuído seria dele mesmo. Apertado, sem tempo, foi lá, copiou e enviou para o jornal. É a única explicação plausível!’


 


TELEVISÃO
Márcio Alemão


O Fantástico está um bom programa, 22/10


‘Acreditem. O Fantástico está bom de se ver. Se não de cabo a rabo, alguns quadros muito especiais.


Central da Periferia, com Regina Casé visitando as periferias do mundo, é de uma alegria emocionante.


É Muita História, com o historiador Eduardo Bueno e Pedro Bial, em breve, espero, deverá se transformar em DVD. É para se ter. E sem a desculpa de ter para mostrar aos filhos. Ter para diminuir nossa ignorância a respeito da história de nosso país.


Outro quadro, O Valor do Amanhã, apresentado pelo economista Eduardo Gianetti, no dia 13 de outubro teve dois momentos inspiradíssimos. Matheus Nachtergaele declamou o poema ‘Tecendo a Manhã’, de João Cabral de Melo Neto e Tom Zé, em um cenário todo de concreto, performou um alerta delicioso aos pássaros todos ‘falando’ um trecho da música ‘Passaredo’, de Chico Buarque.


No mesmo horário, na emissora do bispo Edir Macedo, Paulo Henrique Amorim e seu patrão refaziam a via sacra do citado bispo. Paulo Henrique Amorim, absolutamente tocado por tudo o que o patrão dizia, franzia testa, boca e balançava a cabeça seguidas vezes, cruzando os braços, calçando o queixo caído com as mãos diante do monumental sofrimento e da injustiça imposta ao Bispo durante seus tempos de cárcere. Mas ele, magnanimamente, revelou que perdoou a todos.


Adotando um critério simples de nota no horário; 100 para a Globo; 1,32 para Record.


Tem ficado fácil partir sempre para o ataque à Globo. E não é nem um pouco difícil encontrar motivos. Galvão, Faustão, novelas que, ao contrário do que tenta fazer o Fantástico, principalmente através dos quadros citados, em nada contribuem para a educação e produzem, ao meu ver, um entretenimento pífio, por vezes nocivo, que ainda goza de certa audiência porque se beneficia do hábito. Ainda assim, a diferença entre a qualidade da dramaturgia Global para as demais grita.


De volta ao Fantástico, também é possível ter certas reservas com relação aos apresentadores e afirmar que as locuções de Cid Moreira são deprimentes e dispensáveis. Mas a qualidade dos quadros que citei está muito acima de qualquer tentativa de outra emissora, excetuando a TV Cultura, que muitas vezes acerta em cheio. Pena não dispor de numerário expressivo.


Sobre vice-lideranças, assunto sempre na pauta na TV brasileira, continuo acreditando que a elas, como disse um jornalista, se empresta um rótulo muito grande para um produto muito pequeno.


O bispo, em entrevista, revelou que não assiste à Globo há muitos anos. Deveria. Aprenderia. Preste mais atenção ao Fantástico. E pense a respeito de um dado preocupante: a audiência não anda boa.’



TROPA DE ELITE
José Pedro Goulart


Tropa da Elite, 26/10


‘Ok, você está cheio desse assunto; já leu a respeito, discutiu com os amigos, debateu no trabalho, na sala de aula, enfim. Bom, se é o seu caso, procure outras matérias, eu não vou me importar. Eu vou é botar a minha colher torta nesse bolo que, aliás, vem recheado com muita coisa, menos farinha.


Estou no shopping (onde mais poderia estar?), assistindo ao filme em questão. Há fúria na tela. Na platéia, setenta por cento de adolescentes estão imersos nessa fúria. A música urra: TROPA DE ELITE PEGA UM, PEGA GERAL, TAMBÉM VAI PEGAR VOCÊ – é punk, voz metaleira; o som dolby estéreo amplifica os tiros, os gritos. Atrás de mim um garoto de 16 repete alguns diálogos do filme – quantas vezes terá ele visto o filme para isso? O capitão Nascimento, o mocinho do filme, se culpa, se justifica, se purifica. Nessa ordem. O nome do capitão é Nascimento, veja só, e no filme ele espera o nascimento de um filho. E também torce para que nasça um novo capitão Nascimento. E o ‘Tropa de Elite’ vê ‘nascer’ um ideário de força e repressão que andava latente – mas contido – junto à população.


No Rio, um grupamento do BOPE passa em treinamento perto da praia. A galera pára o que está fazendo e se vira para aplaudir. No cinema, em várias sessões, foram testemunhadas verdadeiras ovações no final. Gritos de ‘caveira!!’ foram ouvidos em outras. Parte da população vê no filme um modo de desatar o nó da questão da insegurança no país: é isso, é preciso reagir com força. O capitão Nascimento tem métodos discutíveis? Ok, mas o próprio filme inicia dizendo que a ação das pessoas depende das circunstâncias. E as circunstâncias no filme estão sempre justificando o arbítrio, a esquematização simplória entre um lado e outro. Os autores do filme avisam que o filme apenas coloca a problemática nas telas, e que o personagem vivido pelo Wagner Moura não é herói.


Mas é mentira.


É evidente que o filme glorifica o capitão Nascimento. Sujeito leal à corporação, incorruptível, que chega a brigar com a mulher quando se viu tomando uma decisão errada – por influência dela – e um companheiro morreu. Sujeito capaz de se enternecer diante de uma mãe que não pode velar o filho morto (então invade a favela e, em troca de alguns sopapos, desenterra o corpo). Nascimento ‘é’ o filme, sua alma, sua justificativa. É por causa dele que o BOPE é aplaudido na rua. E é por causa dele que a polícia se sente liberada de atirar em bandidos correndo em um descampado de dentro de um helicóptero. É por causa dele, pela admiração que provoca, que o menino de 16 anos, atrás de mim no cinema, repete os diálogos do filme. A população baba, esbraveja, acompanha: Caveira!!


‘Tropa de Elite’ aponta: A culpa é do sistema! O sistema que cria policiais corruptos, o sistema que amordaça e impede que se saia dele. ONGs de mentira, passeatas pacifistas fajutas, jovens de classe média alta sustentando o tráfico. É o sistema. Contra ele a farda, a lógica da repressão e da tortura, a elite da tropa – só a elite é incorruptível. Já vimos esse filme nesse país. Será preciso reprisá-lo?


Aliás, os produtores do filme reclamam que o filme foi pirateado antes de chegar aos cinemas. Ótimo. A pirataria é um furo no sistema, ué. Só que num outro sistema – esse outro que o filme aparentemente desconsidera. Um sistema que cria sub-sistemas, como o da corrupção da polícia. Um sistema permanentemente cioso de suas razões. Um sistema, do qual eu e você fazemos parte, aliás; que precisa, necessita, torce e luta por uma Tropa de Elite que o proteja. E o mantenha.’


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Clique nos links abaixo para acessar os textos do final de semana selecionados para a seção Entre Aspas.


Folha de S. Paulo – 1


Folha de S. Paulo – 2


O Estado de S. Paulo – 1


O Estado de S. Paulo – 2


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