Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Uma nova redação à emenda das concessões

Nos últimos 10 anos, mais especificamente desde o fim da rádio Fluminense FM, a ‘maldita’ Niterói (RJ) vive uma pobreza de veículos de informação, sobretudo os eletrônicos. Jornais de bairro, como o tradicional LIG, por exemplo, fecharam as portas. Outras, como as rádios Pop Goiaba e Preventório, foram lacradas à força pela Polícia Federal. A primeira, no ano passado, uma semana depois que o Araribóia Rock estreou seu programa. A segunda, no ano 2000, e nunca mais reabriu.

Com expectativa, surgiram, anos atrás, o canal 36 e a Unitevê (canal comunitário 14 e universitário 17), porém em TV fechada, exclusiva para assinantes da NET. Ou seja, ainda não foi daquela vez que teríamos o NitTV, versão araribóia do global RJTV.

Porém, mudanças significativas poderão mudar este triste cenário a partir do dia 1o de julho, quando entra em vigor um ato normativo da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara. O objetivo principal é barrar as concessões e as renovações de rádios e TVs de propriedade dos deputados e senadores. Por lei, as emissoras devem divulgar conteúdo cultural e de utilidade pública, além de ter ‘uma programação pluralista, sem qualquer tipo de censura ou de cunho político-partidário’.

Licença temporária de 10 anos

O que acontece, segundo o presidente da Associação Brasileira de Radiofusão Comunitária, José Guilherme Castro, é que ‘das 3.000 emissoras comunitárias, só 10% têm, de fato, fins sociais. O restante tem uso político’. Isso é possível porque, por trás de associações e fundações, estão parlamentares. Ou seja, quem está à frente da emissora é apenas um escudo. Pior: as poucas rádios comunitárias que cumprem a lei é que acabam sendo punidas, afirma Carlito Vieira, integrante da Federação das Rádios Comunitárias do Estado do Rio de Janeiro (Farc).

O artigo 5o da Constituição Federal garante o exercício pleno do direito à comunicação. Mas o serviço de radiodifusão comunitária (Lei 9.612 de 1998) impõe dificuldades como a destinação de apenas um canal e freqüência por região. Além disso, o raio de atuação pode chegar a, no máximo, quatro quilômetros. Logo, torna-se difícil também viabilizar economicamente a emissora para investimentos em equipamento, despesas humanas e estruturais, como pagar aluguel do estúdio e o salário dos funcionários. Por lei, as rádios comunitárias podem conseguir patrocínio para custear as operações desde que citem o nome das empresas apenas a título de apoio cultural.

Outro fator desanimador chama-se burocracia. No ano passado, a comissão recebeu 466 pedidos de outorga e concessão de rádios e TVs. Apenas na primeira quinzena deste mês, enfim, a comissão liberou a lista de 57 aprovações, sendo cinco emissoras de TV. A expectativa é de que, até o final do ano, mais 28 TVs e 153 rádios sejam outorgadas. As concessões públicas são uma licença temporária concedida pelo governo com validade de 10 anos para rádios e 15 para TVs.

Recentemente, a grande imprensa colocou as rádios comunitárias na boca do sapo, enfiando todas no mesmo saco e chamando-as, sem distinção, de rádios piratas. Jogou nelas a culpa pela interferência na comunicação entre pilotos de avião e controladores de vôo. Quando uma rádio comunitária interfere no sinal de uma rádio comercial, ela é punida. Em caso contrário, a lei não é válida. Mesmo com tantas, digamos, desvantagens e obstáculos em se fazer rádio comunitária no Brasil, há quem mostre interesse.

Conteúdo abaixo da crítica

A deputada Luiza Erundina (PSB-SP), presidente da Subcomissão Especial de Comunicação da Câmara, enfatiza a criação de uma emenda constitucional que dará nova redação ao artigo 54 da Constituição – cujo item A proíbe contrato de deputados e senadores com ‘pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes’. A lei dá brechas para que políticos utilizem parentes como testas-de-ferro. A deputada alerta para a urgência em rever também toda a Constituição sobre as telecomunicações, que é de 1962. Ou seja, bem antes da TV a cabo, internet e celular, por exemplo.

Os deputados, por sua vez, parecem estar mais preocupados com a transparência no trâmite dos processos entre a Casa Civil e o Ministério das Comunicações, a fim de evitar influência política na agilidade de alguns processos e lentidão em outros. Para abrir uma rádio ou TV, o interessado passa por um pente-fino no Ministério, uma licitação (no caso das comerciais) e pode esperar até quatro anos pela concessão.

Por fim, gostaria de lembrar que de nada adianta ter o canal, o espaço no dial, se o conteúdo for abaixo da crítica. Programação de péssima qualidade, jabá, má administração e outras mazelas afundaram a TV aberta, a decadente MTV, as rádios Cidade FM (RJ) e a Brasil 2000 (SP), entre outras. Aí, fica fácil entender por que, cada vez mais, sobretudo os jovens, oferecem a sua audiência para sites como YouTube, rádios e programas de TV online. Em nossa terra de Araribóia a lacuna continua aberta, esperando algum comunicador antenado preenchê-la.

******

Jornalista, produtor cultural e cartunista