A Agência Brasil, departamento noticioso da Empresa Brasil de Comunicação, EBC, divulgou nota no último dia 2 para confessar que “errou no processo de apuração, edição e publicação da notícia ‘OAB de São José dos Campos diz que houve mortos em operação no Pinheirinho’, no dia 23 de janeiro”. É louvável a decisão de reconhecer a falha. O erro foi grave, na verdade, pois não foi levada em conta pelos repórteres e editores da agência a precaução elementar de checar denúncia de tal gravidade com pelo menos mais uma fonte confiável. Ao fazer a necessária penitência, portanto, a direção da EBC comportou-se de modo condigno com a responsabilidade que tem sobre os ombros. Não reconhecer o mérito dessa atitude seria assumir uma posição de intolerância que é mais própria das pessoas que preferiam que a falsa notícia fosse verdadeira.
Descartada, portanto, a hipótese de que a direção da EBC se tenha envolvido numa conspiração contra os governos tucanos do estado e de São José dos Campos, só resta a possibilidade de comportamento jornalístico negligente ou mal-intencionado. Pode acontecer em qualquer lugar. Mas, por ter ocorrido numa empresa pública, entra em foco uma questão que, além de relacionada à ética jornalística, é de natureza republicana: a que vem exatamente a EBC, empresa pública criada há pouco mais de quatro anos para dar à luz a TV Brasil, tocar algumas emissoras de rádio e prestar serviços de comunicação, principalmente ao governo federal?
Haverá quem imagine que tudo o que a EBC faz hoje já era feito pela Radiobrás, sua antecessora. Ledo engano. Em seu sítio na internet, a EBC afirma que foi criada para “suprir uma lacuna no sistema de radiodifusão com o objetivo de implantar e gerir os canais públicos, aqueles que, por sua independência editorial, se distinguem dos canais estatais ou governamentais”. Vai mais longe: “No Brasil, embora o regime militar tenha instituído a Radiobrás e um conjunto de emissoras educativas estaduais, nunca houve um sistema público de comunicação que buscasse complementar o sistema privado, dando-lhe mais pluralidade (…).” E esclarece: “A Radiobrás sempre foi uma empresa de comunicação governamental, assim como as TVs educativas são emissoras controladas pelos governos estaduais.”
Entende a EBC, portanto, que a Radiobrás nunca foi, como as TVs educativas estaduais continuam sendo, independente. De fato, nunca houve muita dúvida sobre isso. A primeira era rigidamente controlada pelo governo federal – e o melhor que se pode dizer de sua sucessora é que vive um drama existencial. As demais permanecem sob o controle administrativo dos governos estaduais, tendo, no entanto, o cuidado de preservar a independência editorial. A Fundação Padre Anchieta, em São Paulo, tem sido um bom exemplo disso.
O sítio oficial da EBC nos deixa saber ainda que “a TV Brasil veio atender à antiga aspiração da sociedade brasileira por uma televisão pública nacional, independente e democrática”. Ora, como essa afirmação não se sustenta em nenhuma fonte, só pode pertencer às categorias do dogma ou da retórica. Mais provavelmente a ambas. É muito útil, de qualquer modo, para se descobrir o DNA da empresa que jura não ter o rabo preso com ninguém.
Tão preocupada com sua independência, a EBC cometeu um ato falho na nota oficial em que admite ter errado no episódio de São José dos Campos. Sem que ninguém tenha perguntado ou levantado formalmente a acusação, a nota se preocupa em esclarecer: “Faz-se necessário assegurar aos nossos leitores que não houve má-fé da Agência Brasil ao publicar a matéria. Tampouco houve submissão desta agência a qualquer interesse de natureza política.” Ah, bom! Afinal, a que tipo de “interesse de natureza política” a EBC poderia estar submissa? Só porque foi gestada e embalada por Lula e Franklin Martins, os dois cavaleiros andantes do “controle social da mídia”? Não é por acaso que, por meio de documento oficial, o PT acaba de anunciar que “avançará em 2012 (a campanha pela) democratização dos meios de comunicação”.