Autor da frase “toda unanimidade é burra”, Nelson Rodrigues (1912-1980) virou uma unanimidade depois de sua morte, sendo considerado o maior dramaturgo do Brasil, segundo a crítica teatral francesa Monique Le Roux, da prestigiada revista Quinzaine Littéraire. Em agosto, o jornalista e teatrólogo faria cem anos, e uma das maneiras de lembrar a efeméride é indagando como o país, na atualidade, se relaciona com a ideia e a prática da unanimidade.
De acordo com dicionários, totalidade é sinônimo para unanimidade. A segunda palavra, substantivo feminino, vem do latim – unanimitate – e significa acordo geral, uma mesma visão sobre determinado assunto. É quando todos pensam a mesma coisa e agem em conjunto, sem discrepância de opinião. No Brasil, o vocábulo é costumeiramente usado no lugar de amplo consenso em torno de algo ou de alguém.
Nesse sentido, a frase de Nelson Rodrigues também se tornou unanimidade entre os brasileiros quando desejam criticar alguma postura unânime que os incomoda. “É claro que é uma frase provocativa, polêmica, em especial no uso do adjetivo”, comenta o psicanalista Benilton Bezerra Junior, vinculado ao Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. “Olhando de outra maneira, ela poderia dizer que a inteligência exige diversidade, conflito, controvérsia.”
Consenso amplo e positivo
O compositor e escritor Chico Buarque transformou-se em exemplo de como as percepções sobre o que é unânime podem sofrer abalos. Era visto como o herói cultural admirado pelo trabalho intelectual, reverenciado por suas atitudes e amado pelos olhos verdes. Até que a polêmica pelo fato de ele ter ganhado o Prêmio Jabuti (edição 2010), embora não fosse o primeiro colocado entre os finalistas, exibiu discursos críticos contrários a ele na internet, inclusive ataques pessoais, que surpreenderam o escritor. Seis mil pessoas assinaram a petição online pedindo que ele devolvesse o prêmio. Instalou-se o dissenso na imagem daquele que, nas palavras de Millôr Fernandes, era “a única unanimidade nacional”.
“A ideia de unanimidade é impossível, a partir das novas mídias”, afirma Wander Melo Miranda, professor titular de teoria literária da Universidade Federal de Minas Gerais. “Novas visões, novas possibilidades e novos produtos estão continuamente sendo apresentados”, diz ele, acrescentando que isso torna mais difícil a possibilidade de um autor ser considerado unânime. Para Miranda, o fenômeno da globalização apresenta um movimento dual em relação à unanimidade: “Ao mesmo tempo em que busca a uniformização de padrões de comportamento, coloca em relevo questões locais, apresenta novos atores e novas opiniões.”
No rol de autores contemporâneos brasileiros, Miranda, que também é diretor da editora da mesma universidade, não aponta o nome de qualquer escritor que possa ocupar o posto de unânime. Mesmo em relação ao passado, o conceito, para ele, apresenta questionamentos. “Críticos canônicos consideram que são unânimes autores como Machado de Assis, Guimarães Rosa, Clarice Lispector e Graciliano Ramos”, comenta. “Mas isso não significa que todos os críticos são unânimes nessa opinião.” Nesse caso, a ideia de unanimidade vincula-se a um conjunto de fatores que levam à canonização de um escritor, a um consenso amplo, positivo, em torno de sua produção.
Vozes numerosas e contraditórias
Antes de tornar-se unânime, Nelson Rodrigues passou por períodos de ampla aceitação, outros de imensa rejeição. E essa última se deu porque ele enfrentou três grandes questões de seu tempo. A moral, que reagiu com a censura aos seus textos, sendo a mais notória a da peça Álbum de Família (1945), que permaneceu por muito tempo proibida. A estética, expressa no espanto que suas obras causaram na sociedade e no cânone teatral, a ponto de ele mesmo vir a designar seu teatro com o termo “desagradável”. E a política, ao ser contrário à esquerda durante a ditadura militar que controlou o país por 20 anos, a partir de 1964, o que o levou a cunhar outra de suas famosas frases: “Não ando em comissão, nem em manifesto, nem em maioria, nem em unanimidade.”
Embora Nelson Rodrigues gostasse de dizer “para minha sensibilidade de autor, a verdadeira apoteose são as vaias”, conta a história que ele escrevia resenhas para suas peças – elogiosas – e as publicava em jornais sob pseudônimo. O que configura, em última instância, forma de anonimato, prática comum hoje na internet. Pedia, ainda, a amigos que escrevessem (bem) sobre suas produções e ficava preocupado com as reações da crítica. “Você ainda gosta de Vestido de Noiva? Ainda acha que sou bom?”, indagou a Sábato Magaldi, quando o crítico retornou de Paris, onde fora estudar estética, na década de 1950. Só se tranquilizou, segundo Ruy Castro na biografia O Anjo Pornográfico, quando ouviu que “ainda era o maior”.
Estudioso da obra do autor desde o mestrado, o professor Fernando Marques, do Departamento de Artes Cênicas da Universidade de Brasília (UnB), diz que Rodrigues renegava o consenso, exercendo o dissenso, mas, quando se tratava de suas peças, queria o aplauso da crítica. “No passado podia haver essa tendência ou aspiração à unanimidade, pois o país era menor, as turmas também eram menos numerosas e as certezas sobre valores, mais definidas”, afirma Marques. “Havia a existência das chamadas grandes vozes, críticos que representavam certo conjunto de valores e emitiam julgamentos praticamente definitivos”, pondera. “Os valores mudaram, as vozes se fragmentaram e se tornaram numerosas e contraditórias.”
Obra no papel
No livro Razões da Crítica, o doutor em filosofia e curador do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro Luiz Camillo Osorio, já analisava que, quando se trabalha com a crítica e a formação do gosto contemporâneo, “julga-se graças ao dissenso, que dá passagem para a diferença, e não em nome do consenso, que tende a congelar o juízo”. O dissenso daria dinamismo à obra, tornando-a passível a novas interpretações.
“A frase de Nelson é justamente a de um autor lidando o tempo todo com a instabilidade da recepção, sabendo que ela é sempre mutável”, diz Osorio. “Achar que existe unanimidade é achar que o olhar sobre a obra não pode mudar”, afirma. Mas, reitera, pode haver consenso, entendido como a constatação de uma obra como referência, desde que aberta a novas interpretações. Segundo o que ele escreveu, “de algum modo, o gosto busca o consenso, mas ele prefere, ou melhor, ele habita o dissenso”.
A questão, diz Osorio, é que, na realidade atual, o apelo à opinião, o dissenso, é irrecusável, provocando muitas vezes excesso, ruído, por falta de potência, o que só se depurará com o tempo. No meio dessa tempestade de comentários e juízos, “é necessário ir separando o que é um conjunto de opinião mais abalizado de outro menos abalizado, o que é mais ruidoso daquilo que é mais preciso”.
Essa instabilidade da recepção fez rombos na percepção de outra das mais famosas “unanimidades” brasileiras, Oscar Niemeyer. Desde a época da construção de Brasília, inclusive durante o período militar, o arquiteto sempre foi contratado para projetar edifícios na capital federal sem que houvesse questionamentos. Em 2009, no entanto, ao propor uma praça de concreto, a ser construída nos gramados da Esplanada dos Ministérios, a cidade reagiu negativamente. As críticas ao arquiteto-mor começaram contundentes, porém tímidas, em artigo da arquiteta Sylvia Fischer, professora da UnB, conquistaram a internet – com comentários precisos e imprecisos –, se espalharam em veículos tradicionais de comunicação e, depois da posição contrária do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), o improvável ocorreu: a obra permanece no papel.
Longo e raivoso
Embora ao longo de sua trajetória Nelson Rodrigues já expressasse preocupações com o tema da opinião pública, é em Beijo no Asfalto, encenada pela primeira vez em 1961, que ele questiona com mais veemência verdades compartilhadas pelo senso comum. Nela, um homem é atropelado e pede o último beijo a outro que presenciara o acidente. Aceito o pedido, o fato vira manchete de jornal sensacionalista, se transforma em escândalo, e inúmeros preconceitos se voltam contra aquele que deu o beijo misericordioso no moribundo.
Ruy Castro observa que a famosa frase que relaciona a unanimidade à burrice é diretamente oriunda desse trabalho. “Não que ela esteja nos diálogos – não está. Mas toda a ideia da peça leva à frase, donde acho que ele a cunhou naquela época”, conta o biógrafo, explicando que “geralmente as frases do Nelson são difíceis de datar”.
Talvez a relação beligerante de Nelson Rodrigues para com a ideia de unanimidade tenha a mesma origem que Monique Le Roux, no célebre artigo do fim da década de 1990, apontou como sendo “a fonte dolorosa de sua relação com o teatro”, o assassinato de seu irmão mais velho, Roberto. O episódio levou os Rodrigues a empreender aquela que Ruy Castro chama de uma das campanhas mais duras que um jornal já desencadeou na história da imprensa brasileira. Durante 267 dias, o jornal dos Rodrigues, Crítica, publicou a foto da mulher que assassinou o artista plástico, sob o título de “Justiça! Justiça! Meretriz! Assassina” e um longo e raivoso texto contra ela. Tentativa, segundo Castro, de tornar unânime a crueldade de Sylvia Seraphim e influenciar seu julgamento. Vários jornais e rádios cariocas, por motivos diversos, posicionaram-se a favor dela, que teve seu processo de separação judicial exposto com tintas marrons pelos Rodrigues e se vingou com o tiro. A opinião pública, em coro, a apoiou e ela terminou sendo absolvida pela Justiça.
Atitude impulsiva
Antes disso, ainda muito jovem, Nelson Rodrigues já produzia ruídos em torno de personalidades supostamente inatacáveis. Aos 15 anos, escreveu artigo em que pela primeira vez na história do país – a frase talvez tenha se tornado uma unanimidade nos últimos anos a partir da entoação repetitiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva – questionou uma das maiores unanimidades de então. Ninguém menos que o baiano Rui Barbosa. Ruy Castro conta que Nelson Rodrigues contava que, desde os cinco anos, crescera ouvindo falar que Rui Barbosa era um gênio e acreditou nessa regra geral. Depois, chegou à conclusão de que ninguém havia lido o escritor e político e, portanto, estavam todos iludidos como ele aos cinco anos. Não deixou por menos: vaticinou que o endeusado Rui não deixara uma obra, no sentido de criação com qualidade, e sim, volumes, de “discursos ocos e quinquilharias verbais”.
Diante do perfil provocador do dramaturgo, o professor da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia e pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico André Lemos brinca que, talvez, Nelson Rodrigues viesse a gostar da internet. “A rede tornou a ideia de unanimidade mais difícil, mais conflituosa”, argumenta. “Ampliou as possibilidades de expressão e recepção, pulverizando opiniões, curadores, críticos, obras e públicos.”
Isso poderia configurar um problema, reflete o estudioso das novas mídias, se a rede funcionasse sozinha, mas, como o sistema de comunicação de massa tradicional, com seus mediadores clássicos (críticos, analistas, jornalistas), continua em ação, “ocorre uma transversalidade, que é benéfica”. E acrescenta: “Costumo dizer que blogs, Twitter e software livre liberaram a emissão, ampliaram a conexão e reconfiguraram a indústria cultural.”
Há quem defenda, entretanto, que, mesmo na internet, existem nichos em que a possibilidade de consenso amplo tende a preponderar sobre o dissenso e eles se encontram nas redes sociais, como Facebook e Twitter. Elas propõem “modalidades canalizadas de participação”, os famosos curtir e compartilhar, como observa o cientista político Leonardo Barreto, sócio da BGA Associados, sediada em Brasília, que nos últimos anos coordenou pesquisas de opinião pública para institutos de pesquisa e partidos políticos. A internet é um espaço, segundo o pesquisador, que apela à atitude impulsiva, portanto, mais frágil na reflexão e, nas modalidades canalizadas, isso se acentua.
Discurso limitado
Como nessas redes não há marcadores para a diferença ou a discordância, a tendência, ele defende, é que quase todos falem a mesma língua sobre determinado fato ou tema. Ele continua: “Nas redes, preponderam julgamentos instantâneos, por isso elas são ideais para serem usadas na arrecadação de doações, caso da campanha de Barack Obama.” O motivo é simples. “Lança-se um novo vídeo da campanha e, se as pessoas gostam, em poucos minutos, milhões são doados.”
Também é essa facilidade para compartilhar em bloco que faz com que episódios pueris, como o da “Luiza, que está no Canadá”, façam tanto sucesso. E quem os critica, caso do jornalista Carlos Nascimento, âncora do SBT, receba tanto repúdio. Em reação parecida com as de Nelson Rodrigues, o jornalista ironizou a força midiática do vídeo, e sua suposta unanimidade, dizendo: “Nós já fomos mais inteligentes.”
“As redes sociais servem para as pessoas potencializarem a imagem, aumentarem a adesão em torno de si, então aquele que polemiza quebra essa corrente e pode terminar não sendo bem-vindo”, afirma Barreto. A grande reação nas redes sociais às declarações de Nascimento a partir dessa ótica seria explicável: “Ao criticar, ele rompe com o consenso que se formara em torno do tema”, reflete Barreto.
André Lemos concorda que nas redes as pessoas tendam a procurar seus nichos, falar para o mesmo grupo, buscar o parecido. Mas entende que, como a possibilidade de circulação de ideias e a existência dos nichos são muito grandes, isso limita a chance de um discurso se tornar unânime. “Com a rede, há mais pessoas produzindo discursos, vozes marginalizadas podem se expressar, tornando difícil a existência de um pensamento unânime.”
Decisões unânimes
Para além do cenário sociocultural, o conceito de unanimidade provoca outros questionamentos no Brasil. Hoje, uma das polêmicas envolvendo a reivindicada reforma tributária passa pela discussão em torno da palavra e de seu uso no sentido estrito. No Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), quando as decisões dizem respeito à concessão dos benefícios fiscais relativos ao Imposto Sobre Circulação de Mercadorias (ICMS), elas precisam ser adotadas pela totalidade de todos os membros, representantes dos 26 Estados brasileiros.
Projeto de lei do senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA) deseja alterar o quórum dessas votações para a maioria qualificada de três quintos, sob o argumento de que a regra da unanimidade é uma “ditadura da minoria”. Mas, na opinião do ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel, no caso do ICMS, a decisão por unanimidade “não é boa nem ruim; ela é indispensável”.
Ele argumenta que só com o reconhecimento unânime de todos os estados é possível definir a concessão dos benefícios, pois, se a concessão não for aceita por todos, significa dizer que algum Estado poderia conseguir o benefício e deixar a fatura para outro pagar. “Se isso ocorresse, pareceria uma espécie de competição desleal”, nas palavras do hoje consultor de empresas. Pernambucano como Nelson Rodrigues, ele diz que o conterrâneo era “um ótimo frasista”. “Mas não se pode concluir que seja um grande filósofo, pois, em torno dessa frase, aplicando a regra dele, podemos dizer que não há unanimidade quando se diz que toda unanimidade é burra, há discordâncias.”
Decisões baseadas no critério da unanimidade não são privilégio dos brasileiros. Nos Estados Unidos, em alguns estados, as decisões do corpo de jurados em um Tribunal do Júri necessitam ser adotadas por todos os seus membros. Se alguém for processado por haver cometido um crime, e apenas um dos jurados não o considerar culpado, ele será absolvido.
Consenso nas decisões
É o princípio de que se o Estado não convenceu todos os jurados da culpa do réu, restam dúvidas a favor dele que, dependendo do tipo de ação, poderia ser condenado à prisão perpétua ou à pena de morte. No filme Doze Homens e uma Sentença, dirigido por Sidney Lumet (1957), a discussão da regra da unanimidade é o tema por trás da película, pois apenas um dos jurados, personagem de Henry Fonda, acredita na inocência do réu.
Na França, por exemplo, as decisões da Corte Constitucional são anunciadas como sendo unânimes. As discussões entre os ministros se exaurem, em reuniões fechadas ao público, até que seja formulado o documento contendo o consenso total. No caso do Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro, as votações são decididas por maioria simples, como ocorre também na Corte Suprema dos Estados Unidos. Mas, a depender do grau de consenso entre os seus ministros, as decisões, tanto aqui como lá, podem vir a ser adotadas por unanimidade.
Nos últimos tempos, as mais famosas decisões unânimes do STF foram três: a que liberou a marcha da maconha, a do reconhecimento da união estável homoafetiva e, a última, que aprovou as cotas raciais. “Nos temas sociais, nos quais a composição do Tribunal já tem uma tradição de garantia, a unanimidade é mais tranquila de ser obtida”, explica um assessor de ministro, que prefere permanecer no anonimato.
Levantamento realizado no Supremo Tribunal demonstra que entre 2008 e 2011, nas chamadas decisões finais, quando ocorre o julgamento do mérito da ação, 644 foram adotadas pela totalidade do plenário da casa, contra 458 julgados pela maioria dos votos do colegiado. Em média, a cada ano, o consenso total nas decisões finais representa cerca de 25% do total dessas votações.
Sinal de inteligência
“Levando-se em conta a diversidade da composição, a estrutura do órgão, as diferentes visões jurídicas e o fato de que são julgamentos expostos ao público, pela televisão, é razoável o número de ações aprovadas por unanimidade”, avalia o assessor do STF. De acordo com suas observações, como as chamadas decisões finais são transmitidas ao vivo, em muitos julgamentos que poderiam ser unânimes “a dissidência acaba aparecendo”.
Na opinião do diretor da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas Oscar Vilhena e de seu colega da área de direito constitucional Dimitri Dimouls, a questão que chama a atenção hoje no STF não é o critério das votações, mas o encaminhamento dado aos julgamentos e a falta de consenso quanto às razões da Corte para definir a aceitação ou a rejeição de uma ação. “Não há o voto da Corte”, argumenta Vilhena. “O que existe são 11 votos somados”, reforça Dimouls, completando: “Como se fossem 11 votos dissidentes.”
Vilhena pondera que, se a cada julgamento houver um relatório sucinto explicando as razões da Corte para definir aquele julgamento, “todos os tribunais do país vão ter aonde mirar para saber qual é a lógica que levou àquela decisão”. Esse procedimento é utilizando em cortes de diferentes países, como Alemanha, Hungria, na vizinha Colômbia e nos Estados Unidos – onde, eventualmente, também se produz um relatório com as razões da minoria. “No Supremo brasileiro, muitas decisões são unânimes”, afirma, “mas resultam de uma quantidade de votos concorrentes e não de uma opinião lavrada pelo consenso geral.”
Em fóruns pequenos, como no caso do Confaz e do STF, é fácil definir o que é unanimidade, embora a experiência demonstre a dificuldade em exercê-la. E, quando nos referimos ao todo de um país com uma população tão grande como o Brasil, o que seria unânime para todos os seus cidadãos? Márcia Cavallari, diretora-executiva do Ibope Inteligência, diz não conhecer pesquisas que indiquem haver um tema que seja aceito, rejeitado ou reivindicado por todos os brasileiros – salve, Nelson! – em uníssono. No entanto, na última grande pesquisa nacional, quantitativa, realizada no segundo semestre de 2011, feita pelo instituto indagando aos brasileiros quais os problemas do país, foi identificada uma unanimidade, que surpreendeu as analistas.
Em todos os segmentos investigados (idade, sexo, renda familiar, grau de escolaridade) e, em todo o país, o que significa em todos os municípios e todos os estados, um único tema é a preocupação nacional em primeiro lugar: a saúde. Nesse caso – perdão, Nelson – a unanimidade da reclamação é sinal de inteligência dos cidadãos. Sob outro viés, o descaso geral com a saúde é burrice dos governantes.
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[Graça Ramos, para o Valor, de Brasília]