Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

As rádios suspeitas de Renan

O filho do senador Renan Calheiros (PMDB-AL), o deputado federal Renan Filho (PMDB-AL), diz ser sócio de uma rádio que, oficialmente, nos registros do Ministério das Comunicações, nunca o teve como cotista e está em nome de um funcionário do gabinete de seu pai, Carlos Ricardo Nascimento Santa Ritta. Além disso, o parlamentar se apresenta como cotista da Rádio Correio de Alagoas. No entanto, essa emissora não existe no cadastro do ministério, que está atualizado até 14 de janeiro deste ano e cujo conteúdo foi confirmado pela assessoria da pasta. O deputado informou, por meio de sua assessoria, que todas suas emissoras estão registradas em seu Imposto de Renda.

Em 2007, no auge da crise no Senado, quando corria o risco de perder o mandato, o senador Renan Calheiros veio a público negar que utilizasse laranjas para esconder uma suposta sociedade em rádios em Alagoas. Porém, passados cinco anos, a situação continua a mesma: o Sistema Alagoano de Radiodifusão, que aparece na declaração de bens entregue por Renan Filho à Justiça Eleitoral em 2010, está registrado oficialmente em nome de Santa Ritta e de José Carlos Pacheco Paes.

Em 2008, quando concorreu à reeleição à prefeitura de Murici, o filho do senador informou que detinha apenas 40 mil cotas, no valor de R$ 40 mil, do Sistema Costa Dourada de Radiodifusão. Em dois anos, passou a ser sócio, juntamente com o primo do senador, Ildefonso Tito Uchoa, de mais duas rádios com retransmissoras em cidades do interior – além do Sistema Alagoano, no qual possui participação de R$ 25 mil, há também a Rádio Correio de Alagoas Ltda, com R$ 49.709.

Santa Ritta está no Senado desde 2008

O assistente técnico Carlos Ricardo Nascimento Santa Ritta está no Senado desde 22 de outubro de 2008. Santa Ritta, na verdade, voltou ao posto que já ocupava depois de ser derrotado para a prefeitura de Jequiá da Praia (AL). Embora ele apareça como sócio do Sistema Alagoano de Rádio, Santa Ritta não informou à Justiça Eleitoral esse vínculo.

O Sistema de Acompanhamento de Controle Societário informou que Renan Filho e Tito Uchoa são sócios na Costa Dourada nos municípios de Coqueiro Seco, Delmiro Gouveia e Matriz de Camaragibe. Outra retransmissora, em Maragogi, está em nome do ex-secretário de Educação de Maceió Nilton Tadeu Lira Neto (PSD) e de um funcionário da prefeitura de Ibateguara, Francisco Lopes Alves Pinto.

De acordo com o Ministério das Comunicações, Renan Filho e Tito Uchoa pagaram R$ 788.232 pelas concessões. Ainda falta uma parcela, de R$ 110.561, a ser paga em 16 de março deste ano. O ministério informou que não é possível saber o valor da comercialização depois que a concessão foi outorgada.

Em julho de 2011, um site de Maceió noticiou que passaria a transmitir com exclusividade toda a programação da Rádio Correio, de Renan Filho e Tito Uchoa, aquela que não consta nos registros do Ministério das Comunicações. O primo de Renan, classificado como diretor-geral da emissora, adiantava que a potência da rádio iria dobrar e que seria possível ouvi-la não apenas em Alagoas, mas em estados vizinhos. Para o Ministério das Comunicações, a única emissora do grupo que ainda não está no ar fica em Delmiro Gouveia.

Deputado: cotas são anteriores ao mandato

O deputado Renan Filho informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que todas as rádios dele estão declaradas no Imposto de Renda – não disse quais. De acordo com a assessoria, Renan Filho não é fundador das rádios, mas tornou-se sócio delas depois. Ele também não especificou quando. O parlamentar disse que já entrou com um processo no Ministério das Comunicações para regularizar a sociedade, mas o processo não andou. O deputado afirmou, ainda, que comprou as cotas das rádios “muito antes” de ser deputado.

O Globo procurou falar com o senador Renan Calheiros, mas sua assessoria disse que não fazia contato com ele havia alguns dias e sugeriu que o jornal tentasse contato por celular, o que não foi possível. Carlos Ricardo Nascimento Santa Ritta, funcionário de Renan que aparece como sócio do Sistema Alagoano, atendeu a um telefonema do GLOBO, mas, ao ser informado do que se tratava, a ligação caiu e não foi possível novo contato.

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Assessor do gabinete conseguiu quatro concessões em Alagoas

Carlos Ricardo Nascimento Santa Ritta, funcionário de Renan Calheiros (PMDB-AL) no Senado, adquiriu as quatro concessões de rádio nas cidades de Água Branca, Joaquim Gomes, Murici e Porto Real do Colégio, em 2007. Na época, a empresa vencedora da licitação era a JR Radiodifusão, que tinha o servidor como sócio. Depois, passou a integrar o Sistema Alagoano de Radiodifusão.

A JR ofereceu R$ 1,005 milhão pela outorga. A empresa, no entanto, havia sido criada anteriormente e era uma sociedade entre Renan e o deputado João Lyra (PSD-GO). Os dois depois brigaram e, por causa desse rompimento, os negócios do senador vieram a público.

Lyra colocou na sociedade o corretor de imóveis José Carlos Pacheco Paes, e Renan, por sua vez, colocou Santa Ritta. Depois, o assessor do senador deu lugar ao filho do parlamentar, Renan Filho, e Paes cedeu sua parte na sociedade para o primo de Renan, Tito Uchoa.

Quando a oposição tomou conhecimento desses fatos, tentou derrubar Renan no Senado. Na época, o senador já se via em maus lençóis por causa da relação que manteve com a jornalista Mônica Velloso, da qual resultou uma filha, reconhecida por ele. O pagamento da pensão alimentícia, segundo denúncias, era feito por um lobista ligado a uma construtora – o que o senador negou, argumentando que tinha bens e recursos suficientes para honrar o pagamento.

Mas a revelação de que ele poderia ter omitido rendimentos de sua declaração de bens e utilizado laranjas para esconder patrimônio pôs mais lenha na fogueira.

Renan negou que se valesse de tais práticas. No final, teve de renunciar à presidência do Senado para preservar o mandato. Reeleito para mais oito anos, agora é o candidato favorito a presidir novamente a Casa.

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[Chico de Gois é repórter de O Globo]