Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Obama é “Reagan democrata”, diz blogueiro

O presidente Barack Obama diz que o lê diariamente. Assim como milhares de republicanos e democratas que não perdem as polêmicas do The Dish, blog pioneiro de política americana criado há 13 anos pelo jornalista Andrew Sullivan, de 49 anos, britânico radicado nos EUA desde 1984.

Sullivan se declara conservador, apesar de ser fervorosamente pró-Obama, “o melhor presidente conservador desde [Bill] Clinton”.

Fã de Ronald Reagan e de Margaret Thatcher, homossexual e católico praticante que apoiou a invasão do Iraque (mas depois se arrependeu), diz que Obama já é o “Reagan dos democratas”, pelo impacto duradouro na “mudança de curso” que instituiu na Casa Branca, e que o país vive uma revolução cultural. A seguir, trechos da entrevista.

Obama menos austero

“Obama evitou que os EUA entrassem na segunda Grande Depressão. É só comparar com a Europa, ainda atolada. Obama foi menos austero, o déficit está em queda, o desemprego também. Ele protegeu os bancos, que poderiam ter caído e derrubado a economia toda. Os bancos já pagaram boa parte do que deviam.

Aprovou um sistema de saúde universal, adiado por décadas. Salvou a indústria automobilística, terminou as guerras do Afeganistão e do Iraque, terminou com a tortura e acabou com o cérebro da al-Qaida.”

Segundo mandato

“É bem provável que ele consiga a reforma imigratória e a reforma tributária. Os cortes na Defesa e no Pentágono são bem claros. Para os gays, Obama será o que Lyndon Johnson [presidente no período 1963-9] foi para os negros neste país. Em dois mandatos, é uma enorme mudança de rumo para os EUA.”

Obama e Reagan

“Acho que Obama é o Reagan dos democratas.

Mas isso não significa que ele será muito diferente no segundo mandato ou mais à esquerda. Ele nunca foi um esquerdista – é o melhor presidente conservador desde Clinton. Um progressista moderado. Ele não seria presidente se não tivéssemos tido [George W.] Bush e a Guerra do Iraque. Sem a internet, ele não teria derrotado a máquina dos Clinton no partido.”

Republicano “tóxico”

“Os republicanos perderam três gerações. Toda a ofensiva contra Clinton em razão de [Monica] Lewinsky, os oito anos de guerras de Bush-Cheney e agora os cinco anos do superstar Obama. Eles perderam as mulheres, as minorias étnicas e os gays. Essas gerações acham que republicano é algo tóxico.

Fundamentalistas católicos, evangélicos, islâmicos e judeus querem impor suas crenças e seus estilos de vida, por isso têm tanta dificuldade em aceitar os diferentes. E esse é o desafio dos republicanos hoje: ter tantos fundamentalistas que não entendem que mulheres, latinos, negros e gays decidiram uma eleição.”

Passado conservador

“Eu usava um button do Reagan no colegial e acho que Thatcher e Reagan foram muito importantes. Não temos mais uma superpotência comunista nos ameaçando nem inflação ou depressão, como no Reino Unido daquela época. O mundo mudou, os conservadores tinham as grandes ideias naquela época.

Ser conservador não é apoiar tortura ou mentir para invadir países. Mas eu continuo um conservador fiscal: acho que os impostos deveriam ser os mais baixos possíveis e que governos deveriam viver de acordo com seus meios.”

Maconha

“A ‘Lei Seca’ contra a maconha está perto do fim. A maconha é uma bandeira libertária, não da esquerda. Vários conservadores aqui defenderam a descriminalização. Quando é legal, você sabe onde as pessoas vão comprar. Dizer que algo que cresce da terra é ilegal é como dizer que a lua é ilegal.

É algo de geração. Quanto mais jovem, mais o eleitor dos EUA diz ‘é só maconha, é relaxante, é menos prejudicial que álcool, é usada no tratamento de tantas doenças’.”

Gays e aceitação

“As lutas dos gays na última década, como estratégia de aceitação, foram poder se alistar nas Forças Armadas e poder casar. Não é uma agenda de esquerda. Você vai a Massachusetts, o primeiro estado do país a aprovar o casamento gay, e vê que nada mudou. Mas tem o menor índice de divórcios do país e fez milhares de casais gays mais felizes.”

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Blog ultrapassa US$ 500 mil em assinaturas em menos de um mês

“Se você não paga pelo produto na internet, você é o produto que alguém está vendendo”, diz Andrew Sullivan sobre seu novo modelo de negócios, o de blog que cobra pela assinatura (http://dish.andrewsullivan.com). Ele cobra dos internautas assinatura de US$ 19,99 por ano, sem nenhuma publicidade (“cada vez mais intrusiva e irritante e ainda vendem dados dos usuários”, critica).

Em menos de um mês, Sullivan ultrapassou a marca de US$ 500 mil em assinaturas digitais. Da mídia tradicional a blogueiros famosos, há enorme interesse em como o experimento funciona. “Me sinto como um daqueles barcos cortadores de gelo que passam pelo Ártico, com uma fila de navios e barcos pequenos atrás”, compara. “Se qualquer um tem uma audiência online disposta a pagar pelo conteúdo, deve fazê-lo. Hoje já se paga por música e filmes online. Há um software novo para medir audiência e fazer a cobrança.”

O blog tem uma média de 1,3 milhão de visitantes únicos por mês; na campanha de 2012, chegou a 3 milhões.

“Como nunca pensei viver tanto tempo [ele soube que tinha HIV em 1993], posso me dar ao luxo de fazer o que gosto. É liberador”, diz.

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[Raul Juste Lores é correspondente da Folha de S.Paulo em Nova York]