O mundo brasileiro da política se move em 3 dimensões paralelas, que não têm contato nem relação entre si. E mesmo esses universos se movem em várias pequenas constelações que também não se comunicam.
Para ficar nos 3 universos principais:
1) O do eleitor real, aquele que vive o seu dia a dia de preocupações, sua rotina diária de vida, suas relações de emprego, sua luta pela subsistência. É um dos 8% que já ouviram falar, por exemplo, que existe um Eduardo Campos na vida e que é político e que provavelmente um dia disputará seu voto. Nada mais sabe nem lhe interessa.
2) O do eleitor medianamente informado, que faz parte do mainstream, se informa pela mídia tradicional, lê algum jornal alguma vez por semana e conhece a superfície dos fatos – ou pelo menos as manchetes que tentam descrevê-los.
3) O do militante partidário ou do frequentador das redes sociais, que acaba de descobrir um mundo novo e se sente inteiramente apto a emitir juízos de valor sobre qualquer fato político, considerando-se um conhecedor profundo das suas entranhas e das grandes e pequenas teias que formam a rede de interesses que envolvem o mundo desde que o conhecemos como tal.
Esta última categoria envolve desde os lúcidos, os sábios, os ponderados, até os adeptos de todas as teorias conspiratórias e no extremo os cretinos fundamentais que embalavam a ácida ironia de Nelson Rodrigues.
Debate raso
Pois é exatamente neste momento de florescimento das redes sociais que os debates se multiplicam e provocam mais calor do que luz.
Com quase um século de defasagem em relação aos grandes debates ideológicos da primeira metade do século passado, estamos descobrindo a dicotomia esquerda/direita exatamente quando no resto da Humanidade desenvolvida essa conversa caiu em exercício findo. Pelo menos no formato em que aqui se apresenta como novo.
Nesta semana [passada], a entrevista que Lobão,um músico popular, um roqueiro que o Wikipedia descreve como um cantor, compositor, escritor, multi-instrumentista, editor de revista e apresentador de televisão, deu uma entrevista ao Roda Viva [2/12], produziu um efeito de cachoeira nas redes sociais: muita espuma, muito barulho e pouca substância.
Lobão, um ex-petista desiludido, tornou-se herói dos que estão em busca de uma oposição e vilão dos governistas, que evidentemente não tinham nada de mais concreto para classificá-lo do que o multisignificativo “fascista”.
Nem Lobão é um gênio político (como músico não saberia julgá-lo) nem é um fascista. É apenas um artista popular que se atreveu a trafegar na contramão do consenso oficialista e resolveu exercer seu senso crítico, fugindo do espírito de rebanho da “classe”.
Que o incensem ou que o apedrejem é apenas um sintoma de como anda raso o nosso debate político. Enquanto o mundo perde Mandela, o Brasil discute mensaleiros e cançonetistas.
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Sandro Vaia é jornalista, autor de A Ilha Roubada (editora Barcarolla), sobre a blogueira cubana Yoani Sanchez. e Armênio Guedes, Sereno Guerreito da Liberdade (Barcarolla)