Nas últimas semanas, parece que se tornou maior o risco de a Terra ser atingida por um asteroide de tamanho suficiente para provocar uma catástrofe como aquela que há cerca de 65 milhões de anos provocou a extinção dos dinossauros. Na verdade, não houve aumento da presença dessas enormes rochas espaciais. O que houve foi o aumento de notícias sobre esses objetos. E esse aumento foi promovido na imprensa internacional pela Nasa, a agência espacial dos Estados Unidos. O motivo é dinheiro.
Em fevereiro, dois asteroides estiveram nas imediações de nosso planeta, um deles com cerca de 100 metros de comprimento, tamanho insuficiente para ser considerado ameaçador. Nas quarta-feira (5/3) outro, ainda menor, de 30 metros, virou notícia. E hoje três especialistas da agência espacial estarão disponíveis a partir das 16h00 (horário de Brasília) para responder pela internet perguntas do público sobre o que são essas rochas que viajam pelo espaço, qual é a ameaça que elas trazem e o que pode ser feito para impedir que elas se colidam com a Terra. E o que pode ser feito cabe à Nasa, que está empenhada em conseguir com o governo mais recursos para seus programas bilionários.
Estratégia de comunicação
A proposta de orçamento para 2015 apresentada pela Nasa para o governo é US$ 17,5 bilhões, quantia 0,5% menor que os US$ 17,6 bilhões de 2014. A agência solicitou especificamente US$ 133 milhões para sua Missão de Redirecionamento de Asteroides. No entanto, a Casa Branca sabe que essa iniciativa implica despesas diluídas em outros programas, e com aumentos para os anos seguintes. É o caso do Ciência Planetária, que prevê US$ 1,280 bilhão no ano que vem com acréscimos anuais que chegam a US$ 1,374 bilhão em 2019, assim como o programa Desenvolvimento de Sistemas de Exploração, orçado em US$ 2,784 bilhões para 2015, chegando a US$ 3,107 bilhões em 2019.
A estratégia de comunicação da Nasa para sensibilizar os cidadãos dos Estados Unidos não se restringe à missão de prevenção de asteroides. A preocupação da agência se estende a todo o seu orçamento, como mostra o vídeo a seguir.
A Missão de Redirecionamento de Asteroides se baseia na mesma estratégia mostrada no filme Armageddon, de 1998, no qual uma equipe comandada por Bruce Willis coloca uma bomba atômica em um cometa que rumava em direção a Terra para explodi-lo em pedaços menores que se desviariam de nosso planeta ou se desintegrariam ao penetrar na atmosfera. (Para mais detalhes, recomendo a leitura de “Bombas atômicas contra asteroides“, do blog Mensageiro Sideral, de Salvador Nogueira.)
Passagens frequentes
As passagens de asteroides pelas imediações da Terra não são acontecimentos extraordinários. “Esses eventos ocorrem frequentemente. E o acompanhamento deles se tornou mais preciso nos últimos anos com o desenvolvimento da tecnologia”, afirmou a este blog o astrônomo Othon Winter, professor do campus de Guaratinguetá da Unesp.
Também chamado pela sigla NEO (near Earth object, que em inglês significa objeto próximo da Terra), um asteroide ou cometa é considerado potencialmente perigoso pela Nasa se tem mais de 150 metros de diâmetro ou de comprimento. Isso significa que, para sensibilizar a opinião pública para a necessidade de investir em seu programa de prevenção de NEOs, os exemplos usados na divulgação recentemente realizada pela agência espacial foi algo semelhante a noticiar a ação de ladrões de galinhas para justificar a compra de armamentos pesados para a polícia.
Sensacionalismo
Para complicar, a Nasa tem um histórico recente de sensacionalismo na divulgação de notícias de seus feitos para dar a eles maior impacto na opinião puública. Em 1996 a agência exagerou as expectativas de alguns de seus cientistas sobre a possibilidade de haver vestígios de supostas bactérias em um meteorito marciano que caíra na Antártida há cerca de 13 mil anos. Em dezembro do ano seguinte, um estudo publicado na revista Nature desmentiu a notícia. Em 2000, foi a vez de outro desmentido, o da descoberta de água em Marte. Nas duas ocasiões a agência estava em campanha para conseguir mais recursos do governo.
Apesar de todos esses exageros, é preciso investir os recursos que forem realmente necessários para garantir uma iniciativa como a Missão de Redirecionamento de Asteroides, seja ela realizada só pelos Estados Unidos ou em parceria com outros países. Até o final de fevereiro deste ano, foram identificados 10.759 NEOs pela Nasa. Desse total, 1.456 foram classificados como potencialmente perigosos, sendo que 866 deles com mais de um quilômetro de diâmetro ou comprimento.
Enfim, o risco de um cometa ou um asteroide se chocar contra nosso planeta e acabar conosco não está maior do que já estava. Mas não é nada razoável não temosr um aparato de defesa para ameaças contra toda a população terrestre. Difícil vai ser convencer muita gente de não investir a parte que cabe a esse programa em saúde, educação ou assistência social.
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Maurício Tuffani é jornalista