E, mais uma vez, vou votar sem qualquer entusiasmo. Nenhum dos candidatos à presidência me representa sequer minimamente. Suas plataformas são amontoados de lugares-comuns, evasivas de gente covarde que não tem coragem de dizer o que pensa ou de fazer o que deve; suas falas são colchas de platitudes mal enunciadas que, na melhor das hipóteses, não significam nada.
Não suporto mais o discurso dos governistas, que insistem em pintar um país que não existe, como se fôssemos todos idiotas ou desmemoriados – e que, quando forçados a contemplar os erros da atual administração, agem como se o PT já não tivesse tido tempo de sobra de mostrar a que veio; mas também não aguento mais o discurso da oposição, que só se lembra de que é contra o governo em época de eleição.
Oposição não existe só para faturar os votos dos descontentes; oposição é parte integrante e essencial de qualquer democracia. O PSDB traiu o país e a confiança dos seus mais de 30 milhões de eleitores quando, sem coragem de confrontar a popularidade de Lula, optou por se fazer de morto e não defender as suas posições.
Eu não quero um país eternamente governado por tipos cordiais, que se entendem por baixo dos panos. Eu não quero um país de canalhas festejados em palácio, de criminosos tratados como heróis, de ditadores recebidos como irmãos. Não quero um país em que ex-presidentes bajulam foragidos da Interpol. Não quero um país em que a presidente mente sobre as suas qualificações acadêmicas e fica por isso mesmo, como se falsificar currículo Lattes fosse coisa normal. Não quero um país sem valores morais.
Também não quero um país onde presidentes possam ser reeleitos. Quero presidentes – e governadores, e prefeitos – que se dediquem ao trabalho durante todo o mandato; quero candidatos que não possam usar a máquina do estado, paga por todos nós, para defender os seus interesses e os interesses mesquinhos da sua curriola.
Acho obscena a divisão do tempo da propaganda eleitoral gratuita, até por saber o que ela implica. Não é assim que se constrói um bom país.
Problema maior
Não sei o que acho pior: uma candidata que é abertamente contra o aborto, uma candidata que não tem coragem de dizer que não é ou um candidato que se diz satisfeito com a nossa legislação obscurantista. As três posições se equivalem. Estamos em pleno ano de 2014, Constantinopla caiu em 1453 e, não obstante, continuamos gastando tempo e energia com essa discussão bizantina.
Fazer ou não fazer aborto é questão de foro íntimo. Quem for contra aborto que não aborte, mas não queira impor as suas convicções ao resto da sociedade. Sabemos onde isso vai dar: aí está essa pobre moça sumida, obrigada pela excelente legislação em vigor a procurar criminosos para se livrar da gravidez indesejada.
Na televisão os candidatos falam em educação como se tivéssemos um sistema educativo de verdade, que precisa apenas de alguns ajustes: todos dizem que vão investir mais em educação, que vão aumentar o salário dos professores e o número de vagas nas escolas e universidades. Mas de que adianta aumentar o número de vagas em estabelecimentos onde não se aprende nada? Qual é o sentido de formar profissionais sem a mínima empregabilidade?
A educação brasileira está agonizante. Não há dinheiro que resolva se ela não for repensada de alto a baixo, com o comprometimento efetivo da sociedade e de todos os partidos, independentemente de pseudoideologias ou de alianças de ocasião.
O Brasil nunca esteve tão ignorante, tão boçal, tão despreparado. Quando é que vamos parar de fazer de conta que os nossos professores ensinam e que os nossos alunos aprendem? A quem estamos querendo enganar com isso?
Não há problema mais urgente no país do que a educação. Todo o resto, inclusive saúde e segurança, se resolve naturalmente a partir do momento em que o sistema educacional formar pessoas completas, com um bom conjunto de habilidades e a consciência da sua cidadania.
Só depois…
Não são só os candidatos que me desanimam. Está difícil frequentar as redes sociais, que em geral tanto me divertem. Política, religião e futebol trazem à tona o que as pessoas têm de pior; consigo manter a timeline razoavelmente livre de futebol e de religião, mas de política não tenho como fugir, já que somos todos eleitores.
Sou tomada por uma enorme sensação de cansaço diante dos xingamentos agressivos, da falta de argumentação, da cegueira de todas as partes; não entendo como gente adulta ainda pode achar graça em trocadilhos fracos como “presidanta” ou “Aécio Never”.
Vontade de desligar o computador, comprar uma passagem para bem longe e só voltar depois da apuração do segundo turno.
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Cora Rónai é colunista do Globo