As principais estatais federais direcionaram, de 2004 a 2012, R$ 1,3 milhão para veiculação de propaganda em jornais do interior de São Paulo que na prática não existem.
Petrobras, Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil, Correios e BNDES fizeram os pagamentos à Laujar Empresa Jornalística LTDA, que desde 2012 é investigada pela Polícia Federal e pela CGU (Controladoria-Geral da União) por suspeita de fraude.
Após uma vitória em ação judicial contra o governo, a Folha e o UOL (empresa do Grupo Folha) detalharam nesta quarta (17/12) a aplicação da verba de propaganda das estatais, com dados mantidos até então sob sigilo.
A Laujar recebia os valores por supostamente veicular publicidade nos jornais Diário de Cubatão, Jornal do ABC Paulista, Jornal Paulistano, O Dia de Guarulhos e Tribuna de Osasco.
Como a Folha revelou em 2012, porém, todos esses títulos eram desconhecidos no ABC Paulista, região onde supostamente eram editados.
Naquele ano, o jornal mostrou que a Laujar havia recebido R$ 135,6 mil da Presidência a título de publicidade.
A Folha constatou que a empresa tinha sede em um imóvel fechado e vazio em São Bernardo do Campo (SP), que seus títulos não eram vendidos em bancas de jornal, não eram cadastrados em nenhum sindicato editorial, além de serem completamente desconhecidos de jornalistas e jornaleiros da região.
Exemplares enviados à Presidência na época continham sinais de serem forjados, como textos copiados da internet e anúncio de uma empresa privada (Unimed) que negou ter veiculado propaganda nesses órgãos.
Sem comentários
Também em 2012 a Folha revelou que o governo de São Paulo gastou, entre 2008 e 2010, durante a gestão de José Serra (PSDB), pelo menos R$ 309,1 mil para pagar anúncios nos jornais da Laujar.
A Secom (Secretaria de Comunicação da Presidência) disse nesta quarta-feira (17) que desabilitou os títulos da Laujar em maio de 2012 por irregularidades, tendo pedido a instauração de processo administrativo na CGU e investigação na Polícia Federal.
“O processo está em andamento aguardando o parecer de perícia técnica da PF sobre os comprovantes de veiculação entregues pelas agências de publicidade.”
A Secom ressalta que tem implantado “uma série de medidas para aperfeiçoar as informações do seu cadastro de veículos e mitigar riscos, entre elas a solicitação de envio periódico de exemplares, em datas aleatórias” e “comprovantes de impressão gráfica”. Com isso só “1.060 títulos, entre os 2.780 jornais cadastrados, estão aptos a participar de ações do governo”.
As estatais enviaram resposta similar, afirmando que os veículos estavam regulares na época do repasse e que aguardam a conclusão da apuração da Polícia Federal.
Uma pessoa que atendeu a ligação ontem [quarta, 17/12] na sede informada da Laujar disse que não poderia falar pela empresa e que dificilmente Wilson Nascimento, o dono, se pronunciaria. Em 2012, Wilson negou que seus jornais fossem fantasmas e afirmou que eles circulavam normalmente. Ele não apontou onde a reportagem poderia comprá-los.
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Ação da Folha obrigou o governo a revelar gastos
A decisão judicial que obrigou as estatais a detalhar seus gastos com publicidade foi tomada depois que o governo federal negou à Folha o pedido de obtenção desses dados.
A requisição foi feita e negada em 2011. O jornalista Fernando Rodrigues, hoje do UOL – empresa do Grupo Folha –, e o jornal, representado pela advogada Taís Gasparian, entraram então com uma ação na Justiça.
Após decisão dando ganho de causa à Folha, o governo propôs, primeiro, fornecer apenas os gastos feitos até 2011, afirmando que esse era o ano do pedido.
Depois forneceu dados, mas sem detalhar os valores despendidos por cada um dos órgãos em cada veículo de comunicação, nem os gastos das estatais.
A Secom alegou que tornar esses detalhes públicos poderia prejudicar sua capacidade de negociar preços com os veículos. Após vários recursos, o caso teve decisão final no Superior Tribunal de Justiça em novembro, cumprida nesta semana.
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Ranier Bragon e João Carlos Magalhães, da Folha de S.Paulo