Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

A crise dos arapongas

Os jornais estão cobrindo a crise gerada com a investigação das ações da Polícia Federal contra o banqueiro Daniel Dantas como se não tivessem nada a ver com o vazamento de informações sigilosas.


Desde a semana passada, o delegado Protógenes Queiroz disputa com o presidente eleito dos Estados Unidos Barack Obama a preferência dos editores pela primeira página.


Sabe-se agora que o delegado usou funcionários da Agência Brasileira de Inteligência para monitorar telefonemas e comunicações pela internet, e o noticiário dá um tom de ilegalidade a essa iniciativa.


A imprensa também informa que a investigação está produzindo uma crise institucional entre a Abin e a Polícia Federal, e não faltam personagens de grosso calibre para assoprar o princípio de incêndio.


O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, é o protagonista predileto da imprensa.


O professor de Filosofia Marcos Nobre lembra em artigo na Folha de S.Paulo (11/11) que os magistrados são proibidos, pela Lei Orgânica da Magistratura, de manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente, seu ou de outro, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças. O magistrado deve se manifestar nos autos e pode opinar em obras técnicas. Mas a própria Folha tem especial predileção por reproduzir as declarações do presidente do Supremo sobre todo tipo de assunto.


Edição responsável


O leitor tem direito de conhecer como as autoridades policiais se conduzem em suas ações profissionais, e o acompanhamento das investigações sobre o procedimento do delegado Protógenes Queiroz tem o sentido de esclarecer se o inquérito montado contra o banqueiro Daniel Dantas tem fundamento ou se tudo não passou de pura maquinação da polícia.


Claro que existem evidências por todo lado de que o controlador do Banco Opportunity tem muitas contas a acertar com a Justiça. Mas o modo como o noticiário vem esmiuçando a chamada Operação Satiagraha induz o leitor a confundir supostos abusos da polícia com a hipótese de que o banqueiro possa ser inocente.


A imprensa tem a obrigação de manter o público informado sobre todos os lados da questão, mas deve manter em equilíbrio entre as partes. A profusão de detalhes sobre a investigação que desaba sobre o delegado, e que também atinge o juiz Fausto De Sanctis, responsável pelo processo contra Dantas, pode gerar a desconfiança de que outra vez esteja em andamento o jogo da manipulação de vazamentos com objetivo definido.


Os jornais têm a obrigação da transparência, mas não podem fugir da responsabilidade da edição. Nem tudo que vaza é informação.


 


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