O caso Waldomiro Diniz tem produzido elevadas doses de hipocrisia e cinismo e a imprensa tem se prestado à divulgação de espetáculo deprimente, para se dizer o mínimo.
O PT, campeão de iniciativas de CPI, quando estilingue, não quer nem ouvir falar no assunto agora que é vidraça. Quer fazer crer que o fato de Waldomiro Diniz pedir exoneração – pois é, ele não foi demitido – colocou tudo nos seus devidos lugares. Não colocou.
Há muito o que explicar, mas antes é preciso deixar tudo ser investigado quer no âmbito administrativo, quer no âmbito penal. E, por favor, não conclua a investigação na esfera do governo com o descarado argumento que nada foi descoberto. Se não tiverem coragem de investigar não impeçam que o Ministério Público o faça, brandindo mais uma vez o projeto da ‘lei da mordaça’ recentemente invocado pelo superministro José Zé Dirceu.
O PSDB parece se divertir, achando que a falta de lisura do PT apaga seus pecados passados, estimulando o ex-secretário da presidência da República na gestão FHC, Eduardo Jorge Caldas Pereira, a vir desfilar em camarote carnavalesco como se o ex-assessor do ministro Dirceu o tivesse redimido de faltas anteriores – conferindo-lhe, assim, atestado de boa conduta.
As situações diferem em um único ponto: um está sendo investigado, o outro sequer chegou a sê-lo graças a decisões judiciais que obstaram qualquer investigação pelo Ministério Público. Vamos esperar e ver se Waldomiro Diniz também não consegue uma liminarzinha, apesar do documento com imagem e som da prática delituosa.
Gesto de grandeza
No meio de tanta hipocrisia e cinismo chegou-se até a ensaiar um questionamento sobre quem teria filmado o encontro quando foi perpetrada a ação delituosa, a realização da corrupção. Quem teria pego o vídeo e entregue à revista Época? Por que não divulgaram antes? Por que isso, por que aquilo? Parecia uma tentativa de desviar o foco. Ora, ainda que a gravação e utilização posterior tenham motivações espúrias, o fato é que a conduta do Sr. Waldomiro e de seu interlocutor, naquele momento, não deixam de configurar um delito. Assim sendo, vamos evitar diversionismos baratos.
Ainda que os integrantes da direção do PT se esforcem em continuar se mostrando como vestais da moralidade, o fato é que não conseguem mais enganar ninguém. Nem a eles mesmos, pois se noticiou que o ministro Dirceu teria passado o fim de semana anterior ao carnaval mais aliviado, depois de ver que as edições das revistas semanais não traziam mais novidades. Isto quer dizer que haveria muito mais a noticiar e só ainda não veio à tona? Enfim: o ministro Dirceu vai ficar no governo dependendo do que vier a ser publicado na imprensa?
E pensar que por muito menos, em outros países com experiência democrática mais consolidada, renuncia-se quando não se opta pelo suicídio. Não se está esperando a segunda alternativa para o superministro. Mas que a primeira seria boa até para o governo, lá isto seria. Não significaria confissão de nada, tão-somente um gesto de grandeza pessoal e política.
Talvez estejamos esperando muito de nossos políticos.
Capacidade produtiva
E como se não bastasse isso tudo, ainda assistimos deprimentes cenas de afagos do PT em figuras anteriormente execradas quando estavam no confortável papel de oposição: os senadores José Sarney e Antonio Carlos Magalhães como bombeiros e conselheiros!!!
O episódio, mais uma vez, vem demonstrar que nossa combalida democracia e seu fraquíssimo espírito republicano não resistem à legalidade, sempre apontada como o grande óbice a que governos cumpram com sua obrigação, e à moralidade.
De tudo o que foi exibido até o presente, já era para o governo ter percebido que, se na economia não vai dar para fazer o que prometeu – não se perca de vista que em muitos momentos na história recente os ganhos econômicos foram usados para minimizar a ilegalidade –, poderia tratar de preservar a moralidade, contribuindo para a melhoria da auto-estima nacional e, quem sabe, com essa mudança de paradigma, mostrar que um outro padrão ético poderá nos conduzir a melhores caminhos.
Há estudos demonstrando que a corrupção traz prejuízos incalculáveis, ao longo do tempo, para qualquer economia. Vale dizer: se sem a ética a economia pode ir bem por algum tempo, não continuará mantendo o mesmo padrão se a corrupção crescer devorando recursos públicos até a exaustão da capacidade de produtiva do povo honesto.
Trocando em miúdos: se a economia não tem chances de melhorar tão cedo, restaure-se, ao menos, a moralidade, a dignidade, o respeito dos cidadãos a si próprios e ao governo que elegeu. E o caso Waldomiro pode ser a única oportunidade do governo do PT entrar de forma digna para a História do país.
******
Procuradora regional da República, associada do IEDC – Instituto de Estudos Direito e Cidadania