Clóvis Rossi pergunta a Fernando Rodrigues, na sua coluna de quinta-feira [17/09/09], agora que o Senado ‘liberou geral ou quase’ a internet para a campanha eleitoral, como ele faz para ‘defender a minha liberdade da liberdade da internet?’
Em si, a pergunta é descabida e vinda de um jornalista, classe por excelência e dever de ofício defensora profissional da ‘liberdade’ (de expressão, no caso), anacrônica. Espero que Fernando Rodrigues ajude seu colega a recuperar a lucidez, mas não resisto a também dar umas ideias.
Primeiramente, diria que de liberdade a gente não se defende. Convive-se com ela. Se algo é livre, é, a princípio, bom. Internet é espaço público, como tal sujeito a regras de boa convivência, não de cerceamento e onde as liberdades individuais se ajustam mutuamente. Não seria diferente para Clóvis só porque ele é jornalista e se aborrece igualmente como todos nós com o lixo que entra pela caixa eletrônica sem pedir licença. Dá mais trabalho, mas Clóvis vai continuar tendo que limpar a sua caixa. Existe uma regrinha básica de convivência que crianças urbanas aprendem bem cedinho: não sabe brincar, não desce no play.
Um solene insulto
E sobre a ‘praga dos blogs’, aí o buraco é mais embaixo porque na verdade a irritação do jornalista é com outra coisa. Clóvis começa se dando uma importância que obviamente não tem, pois só ele mesmo para imaginar que ‘todo blogueiro parece achar que eu não consigo começar o dia (ou terminá-lo) sem ler seu imperdível blog’. Clóvis, diferentemente de sua coluna, que todo dia me é empurrada com a Folha (sou assinante) e que, portanto, não posso escolher não receber, sob pena de perder o resto que é relativamente aproveitável, os blogs a gente escolhe acessar. Logo, basta não acessar. Mas se a sua imaculada caixa recebeu um spam com o link, caímos apenas no problema acima: limpe sua caixa, não precisa ler o blog correspondente ou clicar no link já que você já decidiu previamente que é uma praga. Delete. Simples assim.
E sobre seu surto legislador, só tenho a agradecer a Deus que você seja apenas jornalista. Dos males, o menor. Se deputado ou senador fosse, provavelmente encaminharia seu megalômano projeto de lei, que tipificaria como crime de lesa-humanidade (!), equiparado a Auschwitz, aos extermínios de Ruanda e de Darfur, uma suposta ‘imposição de blogs à caixa postal alheia e cerceamento de escolha de blogs que o cidadão quer ler por vontade própria’. Fala com o senador Azeredo, vocês parecem comungar devaneios.
Mas sobre a nova ‘lei eleitoral’ (entre aspas porque o que foi aprovado é um solene insulto ao eleitor), nenhuma linha tratando das doações ocultas, do verdadeiro ‘liberou geral’ para toda e qualquer ficha suja que queira concorrer, da esculhambação total com a necessária prestação de contas e suas consequencias, inclusive ineligibilidade em eleições futuras, nada…
Um admirável artigo
Rossi se ateve apenas ao seu corporativismo de classe. No fundo, o incomoda a concorrência que uma internet livre impôs aos figurões do jornalismo, alguns caminhando céleres para a irrelevância. E ele se entrega totalmente na sua coluna de sábado: ‘Qualquer um cria sua página e, a partir dela, sente-se livre para alvejar quem quer que seja.’ Aí, sugiro ao Clóvis que inclua um artigo em sua legislação dos sonhos que somente portadores de carteirinha de jornalista possam criar páginas na internet. Assim, ele preserva o necessário filtro para que apenas pessoas qualificadas, como ele, possam ‘alvejar quem quer que seja’.
Apesar de esquecer que hoje isto já é livre: todos nós somos livres para alvejar, inclusive fisicamente, quem quer que seja. A legislação apenas se limita a prescrever as penalidades. Seu comentário me faz lembrar daquele outro, do presidente Lula sobre Sarney, que não seria um cidadão qualquer. E seu surto é do mesmo quilate da lei recente que um deputado qualquer resolveu criar proibindo a venda de bananas em dúzias, apesar de ser hábito secular e totalmente contrário ao interesse da população.
Lamentável. Ainda bem que o Carlos Eduardo lava a alma do leitor na sua coluna de domingo e expõe as mazelas da sua classe. Espero que o Clóvis tenha lido. Já havia comentado sobre o papel irrelevante que o Clovis Rossi se compraz em representar em sua coluna. E o comparei com o Janio de Freitas. Pois bem, no mesmo dia [17/09/09], este nos brinda com um admirável artigo sobre o mesmo tema da lei eleitoral. Fala o que deve ser dito. Não se prende em seu interesse mesquinho de classe, tarefa a que Clovis se esmera em cumprir cotidianamente.
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Administrador de empresas, Rio de Janeiro, RJ