Em artigo publicado neste Observatório da Imprensa, em 12 de junho passado (‘O jornalismo vale-tudo‘), Gilson Caroni Filho investe contra o que chama de ‘jornalismo vale-tudo’. E, com a mesma veemência com que o critica, o pratica. Sou mencionado levianamente no texto, a propósito de comentário que fiz, publicado no Blog do Noblat, no dia 9 de junho, a respeito da não renovação da concessão da RCTV, da Venezuela.
Não vou entrar no mérito das considerações do articulista, que considera legítima a não renovação daquela concessão, rejeitando-lhe o rótulo de cassação. Está, quanto a isso, de pleno acordo com a nota do PT e as declarações de Lula, de apoio ao governo da Venezuela.
Penso diferente, mas, como disse, o que está em pauta aqui não é minha opinião, nem a dele. Felizmente, a democracia permite que ambos nos expressemos. Trata-se de examinar a difusão irresponsável de informações falsas, o tal ‘jornalismo vale-tudo’, título do artigo com que Caroni pretendeu passar um pito geral no jornalismo brasileiro – mas, por ironia, acabou por praticá-lo.
Injúria, calúnia e difamação
Acusou-me de nada menos que ‘empregado’ e ‘porta-voz do Sistema Globo’, sem se dar ao trabalho de apurar a afirmação. Se o fizesse – procedimento elementar do jornalismo –, constataria que não trabalho em empresa alguma do Sistema Globo.
Não haveria qualquer problema em fazê-lo. Lá estão alguns dos melhores jornalistas brasileiros. Mas o fato é que não trabalho, nem mantenho com aquelas empresas qualquer tipo de vínculo.
Em meu artigo, para dimensionar o gesto autoritário de Hugo Chávez, fiz uma transposição hipotética daquela iniciativa para o cenário do Brasil. E disse que tal procedimento aqui equivaleria à cassação da TV Globo, já que a RCTV era a principal TV da Venezuela. E considerei que o processo de concessão deve ser rigoroso, mas a supressão (ou, eufemisticamente, ‘não renovação’) deve obedecer a critérios objetivos. À lei. Não a idiossincrasias.
Caroni Filho, possivelmente acostumado a associar opinião a interesses, cometeu, a partir daí, uma sucessão de equívocos. Entendeu que, ao mencionar a TV Globo, estava a defendê-la. Pior: estava sendo pago para fazê-lo. Já aí enveredou por aquela tríade capitulada no Código Penal: injúria, calúnia e difamação.
Sem disfarce
Escreveu, então, que ‘o jornalista Ruy Fabiano não titubeou em sair em defesa de quem o emprega’. E ainda: ‘Fabiano, ao se tornar porta-voz do monopólio, esqueceu que, no Brasil, tal decisão teria que contar com o consentimento do Senado (…).’
Esclareço que minha colaboração ao jornalista Ricardo Noblat, velho companheiro de redação no Correio Braziliense, dá-se de maneira absolutamente graciosa e é anterior à inserção de seu blog no Portal Globo On-Line. Se Caroni (que se apresenta como professor da Faculdade Hélio Alonso, do Rio de Janeiro, onde me formei, em 1975) procurasse conhecer os temas e as pessoas de que trata, teria evitado a armadilha e os dissabores do ‘jornalismo vale-tudo’.
Mais: se tivesse lido com atenção o meu artigo, não teria dito que me ‘esqueci’ que no Brasil a concessão passa pelo Senado. Está lá, na segunda frase do sexto parágrafo do meu artigo: ‘A legislação brasileira submete a concessão ao Senado, que, no entanto, faz dessa prerrogativa rito meramente burocrático.’ E descrevo a liturgia com que o Senado ‘cumpre’ protocolarmente atribuições como aquela – procedimento que tem merecido críticas constantes deste Observatório da Imprensa.
O texto em pauta não consegue disfarçar seu vezo autoritário, condenando o jornalismo opinativo e, contraditoriamente, exercendo-o o tempo inteiro, mesmo à custa, como vimos, da verdade.
Para Caroni, jornalismo opinativo só é bom quando coincide com sua opinião.
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Jornalista