Em Pasárgada tem tudo/ É outra civilização/ Tem um processo seguro/ De impedir a concepção/ Tem telefone automático/ Tem alcalóide à vontade/ Tem prostitutas bonitas/ Para a gente namorar. (Vou-me embora pra Pasárgada, Manuel Bandeira)
O poeta pernambucano e brasileiro Manuel Bandeira quando fez esse poema com certeza não estava pensando no guia eleitoral. Falava de um mundo ideal, uma espécie de paraíso, Pasárgada, onde ele era amigo do rei. Perdoe-me o poeta, mas, quando ligo a tevê e assisto ao horário eleitoral gratuito, Pasárgada me vem logo à cabeça. É claro que de uma forma irônica. Desconfio que isso nem passou pela cabeça de Bandeira. Ele nem estava em campanha e, com certeza, homem ético e de princípios não estava a vender promessas e ilusões. O poeta, como é permitido aos poetas, navegava pelas utopias, pelo imaginário de homens e mulheres que querem e têm o direito de ser felizes.
O guia eleitoral também é um paraíso. Um convite a viajar por um outro Pernambuco e um outro Brasil longe, muito longe, daquele que percorremos diariamente pelas ruas no caminho do trabalho, quando conversamos com os amigos e amigas, na sala de aula, rotina diária de milhões e milhões de brasileiros. No guia assistimos a um outro Brasil. Lá, tudo é bonito e funciona. Já o país, o estado e a cidade em que vivemos cotidianamente têm muitos problemas a serem resolvidos: saúde, educação, habitação, emprego e lazer. Estou vendo um outro Brasil na tevê, no guia.
Por isso, primeiro um recado aos candidatos que querem se reeleger: deveriam ficar quietos porque foram eleitos para fazer, para cumprirem o que prometeram. Se fizeram, ótimo, serão reeleitos. Não fizeram nada além do que a obrigação de qualquer homem público que é propor leis e executar programas que atendam às necessidades básicas da população. Aos novos candidatos um recado também: não prometam o que não podem cumprir. Não traiam os sonhos de pernambucanos e brasileiros que querem simplesmente o direito a uma vida digna.
Compromisso central
Fora os abutres da miséria do seu povo, os vendedores de ilusões. Esses, tenho certeza, ano a ano, na consolidação da democracia neste país, estão sendo varridos. Serão varridos. Os milhões e milhões de pernambucanos e brasileiros que irão às urnas vão dar a resposta aos corruptos; aos parlamentares do mensalão; aos sanguessugas da saúde do nosso povo; e ao discurso de palanque daqueles que querem se reeleger, mas quando estavam no Executivo e no Legislativo, viraram as costas para as reivindicações dos movimentos sociais, da sociedade sem, pelo menos, ficarem constrangidos.
Aos novos, um alerta. Estamos mudando. Já não somos mais aqueles, homens e mulheres, que a cada eleição depositam o voto na urna, depois vão para casa tocar a vida e cumprir o mesmo ritual numa nova eleição. Começamos a descobrir o véu que encobria a realidade.
Se alguns políticos contaminaram e continuam contaminando a política, não é a política que acabou. A política é a forma como compartilhamos, participamos e intervimos na sociedade. É básica para nossa vida e para os nossos sonhos. Por isso, não queremos mais ficar só no papel de contempladores e de ficar criticando o que acontece. É muito fácil.
Estamos saindo da apatia. Política é ação e intervenção. Por isso, não queremos mais só votar – é muito importante –, queremos participar, tomar o destino nas nossas mãos e lutar contra aos comerciantes de promessas, os corruptos e os vendilhões do país. O compromisso com a democracia é central para a vida em sociedade. Isso depende de nós. Como dizia o poeta, “quem sabe faz a hora não espera acontecer”. A Pasárgada de Bandeira é uma utopia a ser perseguida. Para virar realidade, homens e mulheres, temos e estamos construindo-a diariamente, respeitando as diferenças e as diversidades, de uma forma fraterna, solidária e democrática.
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Professor do Departamento de Comunicação Social da UFPE e jornalista