Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

As âncoras da direita

No início de junho observei que, na mídia colombina, as eleições de 2006 começaram durante o debate promovido pela Bandnews FM que, a pretexto de reunir os quatro governadores dos estados em que a emissora tem penetração, armaram um verdadeiro palco para atacar o governo federal. Lá estiveram Rosinha Matheus (PMDB-RJ), Aécio Neves (PSDB-MG), Geraldo Alckmin (PSDB-SP) e Germano Rigotto (PSDB-RS), na manhã de uma segunda-feira, 7 de junho. Ou seja, há dois meses e meio.

Na ocasião, um animado Carlos Nascimento foi o primeiro a comparar Lula a Collor e a aventar, pela primeira vez na mídia colombina, a hipótese de impedimento do presidente. Mas, rapidamente, Aécio Neves tratou de desconversar; disse que um presidente não era o outro e ponto final. Nascimento não voltou ao assunto – naquele dia. Aécio sabia que ainda não era o momento de apostar nessa ficha, não porque seu partido não quisesse, mas porque a manipulação precisa de tempo para se desenvolver.

Não demorou muito e a revista Veja publicou a matéria do flagra do Maurício Marinho recebendo 3 mil reais e dizendo agir em nome de Roberto Jefferson, então presidente do PTB. Esse é o ponto-chave, que parece ter sido esquecido pelos ‘especialistas’ de plantão. Nas últimas semanas Veja editou capas muito parecidas com as da campanha para derrubar Collor; até os verbos usados foram os mesmos: ‘O homem-bomba’ e ‘O livro-bomba’; ‘Ele sabia?’ e ‘Collor sabia’; ‘O elo se fecha’ e ‘O círculo se fecha’.

Coluna quebrada

Quem se beneficiou da repercussão das imagens do funcionário dos Correios recebendo propina, reproduzidas com deleite pela televisão? Quem teria armado o flagra? A reação de Jefferson era esperada? Ou ela foi uma surpresa? Não seria muita ingenuidade acreditar nisso, numa República controlada pelos mesmos coronéis de sempre? Até porque, numa época ou noutra, essas excelências sempre detiveram o domínio da informação, seja do paradeiro do cangaceiro adversário ou de quantos porcento o grama do ouro terá subido amanhã.

E, para manter esse controle, dependem de alianças com os barões da mídia. Não à toa que entre 20% e 30% dos integrantes do Congresso Nacional possuem concessões de rádio ou televisão. Esse é o grande acordo. Em alguns momentos, no entanto, alguns jornalistas nos fazem o favor de evidenciá-lo. É o caso de certos apresentadores da TV Bandeirantes, que no programa Canal Livre insistem em acusar o PT de estar construindo um ‘projeto de poder’. Ora, ora… Então quer dizer que o PSDB, quando no Planalto, não tinha um ‘projeto de poder’? Ou tinha, e esses mesmos jornalistas não haviam percebido? Se não tinha, então por que compraram a emenda da reeleição? Ou isso não é um ‘projeto de poder’?

No domingo (21/8), o convidado do Canal Livre foi o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM). O peessedebista disse que o presidente Lula está psicologicamente abalado, defendeu Palocci e o tal mercado e ainda se comparou, com regozijo, a Carlos Lacerda. E depois, para a direita, quem fala em golpismo é um lunático que acredita em teoria da conspiração.

Ocorre que um golpe pode assumir diferentes formas e jamais é assumido como tal pelos golpistas; caso contrário não seria um golpe. Ninguém sai por aí dizendo: ‘Olha, nós estamos articulando um golpe assim e assado’. O próprio processo de desgaste que espalham por toda a esquerda pode ser o golpe. Virgílio também fez questão de dizer que o caixa 2 do Eduardo Azeredo era diferente do caixa 2 do Delúbio Soares, embora ambos fossem operados pelo mesmo Marcos Valério. Ou seja, o senador está dizendo claramente que na República brasileira uns são mais diferentes do que outros. Uns podem ter projeto de poder, outros não. Uns podem comprar votos, outros não. Uns podem tudo, outros não.

Também foi marcante o clima de complacência entre Arthur Virgílio e os três jornalistas que o interpelavam (Fernando Mitre, Antonio Telles e Joelmir Betting), clima esse fechado com chave de ouro ao término do programa quando um deles nem esperou sair do ar para, entusiasmado, apertar a mão do líder do PSDB e dizer: ‘Muito obrigado’.

Em todo caso está quebrada a coluna vertebral do jornalismo da Bandeirantes, grupo que, aliás, não pára de investir na criação de novas emissoras de rádio e televisão, ainda que o tal mercado esteja em crise. Não custa lembrar da presença do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), na nababesca festa de inauguração da Bandnews FM e suas declarações a favor das iniciativas do grupo de Johnny Saad.

A trinca

Não há mídia colombina sem dramatização. Ou seja, não há mídia comercial sem espetacularização. Isto é básico. O estudante de jornalismo é adestrado desde cedo para este mercado hipócrita, que vive de meias verdades e se diz imparcial. Será que um redator publicitário acredita mesmo que entre escolher usar a palavra ‘golpe’ ou ‘revolução’ não há parcialidade? E o que dizer do âncora? O que a massa pobre brasileira diria se soubesse que aquela figura limita-se a ler o que está escrito num teleprompter pelo dono da emissora? E o que ele diria, então, se descobrisse que as nove famílias donas das emissoras costumam escrever a mesma coisa, sempre para resguardar seus interesses?

É nesse rumo que segue a República do espetáculo. As CPIs viraram atração, mas não propriamente as CPIs. Os depoimentos das CPIs viraram atração nacional, pois poucos são os que se ocupam em ler sobre o avanço das investigações ou em acompanhar os novos passos. E menos ainda são os que procuram informações fora dos veículos pertencentes à mídia corporativa.

Até as próximas eleições presidenciais essa mídia será muito bem paga pela direita tradicional para atacar o PT, até chegar mais incisivamente no Lula (e aqui pouco importa se de fato vão existir provas, pois no mundo da imagem manipulada tudo se fabrica). Paralelamente a tal cúpula do PT vai também pagar à mesma mídia para que atenue a crítica. Não é fabuloso? Anúncios pipocando por todos os lados, por dentro e por fora (de multinacionais à publicidade oficial).

E não adianta chorar, pois foi o PT quem escolheu fazer esse jogo. O jogo do capital financeiro aliado à imagem que encanta. Não à toa que no centro da crise estejam o tesoureiro do partido e dois publicitários.

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Editor do site FazendoMedia