Jornalismo é um serviço de utilidade pública que deve defender, acima de tudo, os interesses dos leitores. E para isso é preciso que os jornalistas escrevam sem medo e contem o que sabem, principalmente, sobre o que se passa nos bastidores do poder. Pois é lá que são forjadas as ações e decisões que influenciam diretamente na vida socioeconômica e cultural dos cidadãos. Mas percebo que muitos colegas fazem um jornalismo apenas declaratório. Ou seja, simplesmente reproduzem o que dizem seus entrevistados sem nenhum espírito crítico. Parecem ter medo de relatar em seus textos o que vêem, ouvem ou constatam por meio de investigação. Tudo para não se comprometer.
Um dos maiores jornalistas investigativos da atualidade, o bom baiano Bob Fernandes, ex-revista Carta Capital, diz que ‘o jornalista não precisa ouvir do entrevistado que uma parede é azul para escrever que aquela parede é azul’. Não sei se reproduzo aqui a afirmação do jornalista ao pé da letra, mas é mais ou menos isso. Faço essas considerações porque ontem fui criticado por um colega jornalista de que tenho o hábito de descrever em meus textos situações, diálogos e acontecimentos de bastidores que colocariam os personagens em maus lençóis.
Conteúdo descartável
Minha resposta a ele foi a seguinte: é exatamente nos bastidores que se desenrolam as jogadas mais audaciosas dos ocupantes do poder. Disse-lhe que, muitas vezes, o que escrevemos apenas com base nas declarações prestadas pelos entrevistados quase sempre são meias verdades ou, quando não, escamoteações da verdade em defesa de interesses inconfessáveis. Mas o jornalismo declaratório ainda é o que vigora na imprensa graúda do país. Com base em declarações criam-se crises que abalam reputações e instituições. Com elas criam-se factóides supervalorizados pela imprensa. Lamentavelmente.
Não acredito em jornalismo medroso ou feito apenas com base em fontes oficiais ou oficialescas. Defendo intransigentemente o respeito aos princípios éticos que regem a profissão de jornalista e a atividade da imprensa, mas que estes não sirvam para justificar uma posição de subserviência ao poder ou de biombo para abrigo dos medrosos. Ou se escreve com destemor e com respeito à verdade e aos leitores ou não se escreve.
Não vale a pena gastar tinta e papel com declarações descartáveis, sem conteúdo e que acrescentam pouco à busca da verdade. Os leitores merecem um jornalismo mais ousado, inteligente e comprometido com seus interesses. Para finalizar, cito outra reflexão sobre o fazer jornalístico, desta feita contida no livro A arte de fazer um jornal diário, do grande jornalista Ricardo Noblat: ‘O jornalismo serve para satisfazer os aflitos e afligir os satisfeitos’. E tenho dito.
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Jornalista, Boa Vista, RR (jornal Brasil Norte e Blog Repórter)