Na terça-feira (23/8), o Observatório da Imprensa na TV vai apresentar um programa especial comemorativo dos 70 anos da publicação do livro Brasil, país do futuro, obra central de Stefan Zweig (1881-1942). Conversamos com Alberto Dines, autor da biografia Morte no paraíso – A tragédia de Stefan Zweig.
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O que o livro Brasil, país do futuro tem a ver com a imprensa?
Alberto Dines – Tem tudo a ver. Nós não estamos apenas comemorando os 70 anos de publicação do livro mais conhecido sobre o Brasil no exterior. Estamos examinando, também, além disso, um episódio que caracteriza os vícios quase institucionais da nossa imprensa. Quando o livro saiu, em agosto de 1941, portanto, há 70 anos exatos, o Stefan Zweig estava chegando de Nova York – onde ele tinha acabado a revisão do livro –, vindo para o Rio de Janeiro, para passar mais uma temporada no Brasil, esperando o fim da guerra. E quando ele chega ao Brasil, certo de que, como das outras vezes, seria muito bem recebido e só teria boas notícias, encontra um ambiente muito desagradável.
O livro havia sido publicado no início de agosto e tinha sido muito mal recebido, sobretudo pelo Correio da Manhã, talvez o mais importante jornal da então capital federal, Rio de Janeiro – o jornal mais desinibido, mais corajoso e também mais arrogante. E o livro não tinha apenas recebido uma resenha desfavorável. O diretor do jornal, [Pedro] Costa Rego, durante cinco dias sucessivos, na página 2 (lugar mais nobre do jornal), atacou o livro de uma forma solerte – eu diria até torpe, muito pessoal. Os artigos do Costa Rego insinuavam que o Stefan Zweig tinha sido comprado para falar bem do Brasil. Isso precisa ser examinado à luz da história.
Costa Rego conseguiu parar a sua fúria para acabar com Stefan Zweig. Um dos principais redatores do Correio da Manhã então (que depois substituiu o Costa Rego), o grande Antonio Callado, me contou que os redatores mais importantes, mais próximos da casa, se reuniram e pediram para Costa Rego parar, porque era uma coisa muito feia, que prejudicava a imagem do jornal, porque ele estava se apegando a coisas irrisórias.
Projeção internacional
Isso nos leva uma questão. O que é que o famoso livro do Stefan Zweig, Brasil, país do futuro tem a dizer? Não é um livro que elogia o governo brasileiro. Ele elogia o povo brasileiro; mostra que o país é maravilhoso por causa de seu povo. E esse povo conseguiu harmonizar culturalmente e criar uma coisa nova, em contraste com o que se passava na Europa, dominada pelo ódio racial. Ele viu que essa ideia precisava ser vendida ao mundo, que estava, naquele momento, sangrando, em uma guerra catastrófica.
O mais irônico de tudo é que Stefan Zweig fez, sim, um negócio com o governo. Mas ele não vendeu o livro em troca de dinheiro ou de vantagens materiais; ele escreveu o livro para conseguir um visto de residência no Brasil. Porque ele era um refugiado, vivia na Inglaterra, e estava com medo de que os nazistas, depois de conquistarem a França, atravessariam o canal da Mancha e dominariam a Inglaterra. Escolheu o Brasil, onde ele já tinha estado, e pelo qual já havia se encantado. Ele fez, sim, um negócio. Não houve um contrato formal, mas um entendimento tácito de que ele viria ao Brasil para escrever um livro sobre o país – porque ele era um utopista, um idealista, queria um mundo melhor. Ele fez um negócio para mostrar um país que pretendia se libertar do preconceito racial.
O livro foi muito importante para a imagem do Brasil. Logo depois, o Orson Welles veio para o Brasil para fazer seu filme. Toda a projeção internacional do Brasil segue-se ao lançamento em seis idiomas de Brasil, país do futuro.
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