Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Campanha feroz, falas claras

A explicação da presidente Dilma Rousseff na segunda-feira (22/9) a respeito da sua declaração na sexta-feira anterior foi cabal. Se não o fizesse imediatamente teria criado um confronto numa esfera onde seu desempenho é nota dez. Ao contrário do antecessor.

Jornalismo é, por natureza, investigativo, mas a matéria publicada não pode ser considerada prova, no máximo é evidência. O que antes a presidente pretendia dizer, mas não conseguiu, é que a imprensa não tem poder de polícia, só as autoridades policiais, judiciais ou o Ministério Público podem iniciar processo penal.

A presidente julgou que o seu raciocínio fora plenamente compreendido pelos repórteres. Não foi. Em parte por que foi mal articulado. Mal-entendidos ocorrem geralmente por conta desse tipo de desajuste: a frase incompleta, quebrada, quando não flagrantemente equívoca, resulta com frequência em entendimento truncado.

Sintaxe e prosódia

Em eleições presidenciais, sobretudo quando disputadas com a ferocidade da atual, a veemência importa menos do que a clareza. Por outro lado, na cobertura política, sobretudo em pronunciamentos improvisados dos presidenciáveis, imperioso esclarecer cada sentença. Entrevistados não se importam em ser reperguntados, detestam é ser confrontados antes de entendidos.

O brasilês empregado por nossos políticos e pela maioria dos seus eleitores está longe de assemelhar-se ao português falado por um taxista lisboeta. Lá se fala como se escreve, aqui a sintaxe é tão desrespeitada quanto os pedestres. Ou ciclistas.

Antes de fazer o imprescindível media training conviria que os candidatos tivessem aulas de sintaxe. Alguma prosódia também não lhes faria mal. No tocante aos jornalistas, recomendável que fossem escolhidos pelo domínio da sua ferramenta elementar – engana-se quem acha que a prioridade é o idioma. É a segunda: escrever bem é, antes de tudo, pensar direito.

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Escrever, falar, pensar – A.D.

 

PALANQUES & AMBIGUIDADES (II)

Tolerância religiosa é pouco. Isonomia seria suficiente

O debate sobre o preconceito racial abriu caminho para outro: o preconceito religioso.

Bem-vindos ao pleno Estado de Direito!

Começou a emergir o vasto acervo de questões suscitadas por um Estado vagamente laico e extremamente ambíguo em questões de fé. É evidente que não haverá tempo útil para ampliá-lo, mesmo considerando a inevitabilidade do segundo turno eleitoral. É uma questão a ser incorporada à agenda de mudanças defendida pela maioria dos candidatos.

A 7ª Caminhada em Defesa da Liberdade Religiosa realizada no domingo (21/9), no Rio de Janeiro, produziu opiniões, pronunciamentos, promessas e razoável repercussão na imprensa. Generosamente pregam a tolerância religiosa, clamam contra a intolerância, assumem-se como favoráveis ao movimento LGBT. Mas a questão não se situa no âmbito subjetivo ou comportamental.

Admitir que cidadãos se reúnam em sessões espíritas, de candomblé, em mesquitas ou sinagogas não pode ficar na esfera da consciência, boa vontade ou arbítrio pessoal. É uma questão de Estado; cabe ao Estado e aos governos que o gerem levar às últimas consequências o princípio de que todos são iguais perante a lei.

O Estado brasileiro pretende-se secular – não é, nunca foi. O poder político imagina que a recente bipolaridade entre católicos e protestantes prova uma grande compreensão e indulgência em matéria de fé. Não prova.

A noção republicana de isonomia precisa ser transferida do espaço trabalhista e ingressar rapidamente na pauta das reivindicações pelos direitos humanos. Católicos e protestantes são majoritários porque nossos governantes os veem como um mero ativo eleitoral. Por isso oferecem-lhes vantagens e privilégios. Os demais são os demais. Contam pouco, ou nada.