Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

“Cara, roubei teu Corão”

O repúdio da maior parte dos norte-americanos aos cristãos extremistas teve um personagem inesperado. Enquanto a islamofobia alcança proporções de fogueira das vaidades – envolvendo inúmeros ‘âncoras’ de televisão, políticos do Partido Republicano, gente do ‘Movimento Tea Party’ e pregadores ensandecidos – cidadãos ativos e preocupados em todo o mundo precisam saber que, no sábado (11/9), o festival de ódio marcado para a praça onde se espera que seja construído a Cordoba House, o centro comunitário islâmico a alguns quarteirões de distância do Marco Zero, em NY, foi absoluto fracasso; testemunhas disseram que havia mais jornalistas e câmeras de televisão do que islamófobos doidos.


Mas, em matéria de ilustração da derrota da islamofobia, nada se compara ao que aconteceu em Amarillo, Texas, naquele mesmo sábado. David Grisham, outro desses pregadores doidos que dirige uma daquelas organizações de islamófobos doidos, ‘Repent Amarillo’ [Arrependa-se, Amarillo], planejava fazer sua própria sessão televisionada de queimar-Corão, como apoio ao doido de Gainesville, Florida, pastor e celebridade global instantânea Terry Jones. E estava a um segundo de cometer o gesto tresloucado frente a 200 pessoas, quando, saído do nada, de repente, aparece…


…o mais improvável dos heróis, magro, de óculos, Jacob Isom, 23 anos, armado só com suas costelas à vista, seus óculos e seu skate. O próprio Isom conta o que fez, ao repórter do Amarillo-Globe News: ‘Vim por trás dele, passei a mão do Corão do cara e disse alguma coisa como ‘Cara, roubei seu Corão!’ e dei no pé.’


O skatista-herói ainda disse, a um Grisham de olhos esbugalhados: ‘Você só quer iniciar guerras santas’. Em seguida, entregou o Corão, intacto, sem queimaduras, a um líder muçulmano local.


Manobras radicais


A organização Repent Amarillo é mais uma dessas típicas organizações de doidos norte-americanos, cujo material publicitário a identifica como ‘Exército de Deus’, formatado como os formulários de divulgação do alistamento militar. Cada um dos folhetos visa a um público definido: gays, muçulmanos, anarquistas, ambientalistas, militantes pró-aborto, Halloween, ‘eventos de primavera’ e publicidade de lojas de pornografia. O pessoal de Repent Amarillo chegou a liderar um boicote contra a prefeita eleita de Houston, Annise Parker, que é lésbica. O motto do grupo é ‘Somos as forças especiais da guerra espiritual. Aliste-se!’


Um grupo de pessoas dos que acorreram ao local previsto para a queima de livros em Amarillo cercou a ‘pira incendiária’ para impedir que fosse acesa. Portanto, o que aconteceu em Amarillo não foi ato de um sujeito sozinho, agindo como cidadão exemplar.


Viu-se em Amarillo, Texas, o que também se viu (embora não pela televisão) no Festival pró Ódio próximo do Marco Zero: havia milhares de pessoas dispostas a impedir a queima de livros. Um dos cartazes dizia: ‘Bons americanos não queimam Corão’. De fato, no centro dessa reação está apenas o respeito à Constituição dos EUA – que garante pleno direito de cada um praticar a religião que escolha.


Cairo, Kabul, Kashmir, Peshawar deveriam ser informados de que a vasta maioria dos norte-americanos também não é dominada pelo ódio e pelo medo e não se renderá a uma nova cruzada religiosa politicamente arquitetada.


Manobras radicais de skatistas ateus estão indicando o caminho: nenhum fascista paramilitar sobrevive ao ridículo.


Bom seria que os norte-americanos começassem a lutar com seus skates libertários também contra a guerra de aviões-robôs que o Pentágono faz contra civis afegãos.

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Jornalista