A imprensa tem abordado o tema do aumento dos servidores da Polícia Federal. Recentemente, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, em entrevista coletiva após participar de evento sobre segurança pública para a Copa e a Olimpíada, em São Paulo, disse que o governo federal não tem condições de reajustar os salários dos policiais federais devido ao agravamento da crise econômica mundial.
Acontece que a Polícia Federal vem sendo esquecida pelas autoridades federais há muito tempo. Embora suas operações de combate à corrupção, ao crime organizado, aos grandes sonegadores e aos traficantes internacionais de drogas e armas sejam louvadas e usadas como bandeira, para falar de um Brasil melhor e mais justo, quando o assunto é a remuneração da categoria o que se verifica é outra coisa. Por parte das autoridades, o que se tem é muita retórica, além de promessas que não se concretizam nunca.
Fazendo um levantamento estatístico dos últimos 10 anos, de 2001 a 2010, são encontrados números muito positivos sobre o desempenho da economia do país: o PIB cresceu 212,32% e a receita tributária, 264,49%, no período. Já a inflação na década alcançou índices de 89,84% (IPCA) e de 129,93% (IGP-M).
Analisando-se somente exemplos de carreiras do Executivo, o que se verifica é uma grande diferença entre as correções proporcionadas às remunerações dos servidores. Vejamos alguns números, começando pelos ocupantes dos cargos mais importantes. Em 2001, a remuneração do presidente da República era de R$ 8.885,48, enquanto a dos ministros de Estado era de R$ 8.362,80. Hoje, tanto a presidenta Dilma como seus ministros recebem R$ 26.723,13. Isso representa um aumento de 200,75% e de 219,55% em seus contracheques, respectivamente.
Nem a reposição da inflação
A tabela abaixo apresenta outros exemplos:
INSTITUIÇÃO | CARGO |
REMUNERAÇÃO EM 2001 (R$) |
REMUNERAÇÃO EM 2010 (R$) |
VARIAÇÃO |
AGU | Procurador Federal | 4.406,11 | 14.549,53 | 230,21% |
MRE | Terceiro Secretário | 4.555,98 | 12.962,12 | 184,51% |
Abin | Oficial de Inteligência | 3.229,84 | 10.216,12 | 216,30% |
SRF | Auditor Fiscal | 4.268,12 | 13.067,00 | 206,15% |
DPF | Agente de Polícia Federal | 3.960,26 | 7.514,33 | 89,74% |
Uma análise rápida dos números apresentados é suficiente para se verificar a disparidade dos índices concedidos pelo governo. Principalmente, deixa claro que houve uma grande discriminação contra os policiais federais.
Destaco que utilizei o período de 10 anos como referência porque sou agente de Polícia Federal aprovado no concurso público realizado em 2001. Nesse período de exercício no cargo, com a perda de poder aquisitivo, fruto do desalinhamento nas correções salariais, confesso que não tenho muito o que comemorar. Somente como mais um exemplo da situação atual da categoria, há mais de três anos os policiais federais não recebem qualquer reajuste em seus vencimentos. Isso mesmo, nem a reposição da inflação foi concedida pelas autoridades federais.
Reajustes são fundamentais
Usando uma expressão que era bastante empregada pelo ex-presidente Lula, afirmo que nunca antes na minha história na Polícia Federal encontrei tantos profissionais desmotivados e insatisfeitos no trabalho. Muitos estão deixando o órgão e outros estão se preparando para deixá-lo. É uma pena ver tamanho desperdício de investimento em recursos humanos.
A pergunta que mais me incomoda é: a quem interessa uma Polícia Federal desmotivada e desprestigiada? De uma coisa tenho certeza: não interessa ao povo brasileiro e às instituições democráticas. Porque a missão da Polícia Federal não pode ser enfraquecida por razões conjunturais ou por sentimentos e valores menores. A PF não quer nenhuma vantagem especial. O que a Polícia Federal republicana quer é receber um tratamento republicano por parte dos governantes. Só isso.
Espero que a presidenta Dilma e o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, promovam os ajustes necessários para que a simetria salarial entre as carreiras seja restabelecida. Isso é fundamental para que as investigações e os serviços prestados pela PF à população (emissão de passaportes, de certidão de antecedentes criminais, campanha do desarmamento etc.) possam contar com servidores reconhecidos e verdadeiramente motivados.
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[Carlos Alberto de Mello é agente de Polícia Federal]