Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Comércio na web cresce
35% em relação a 2007


Leia abaixo a seleção de segunda-feira para a seção Entre Aspas.


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O Estado de S. Paulo


Segunda-feira, 18 de agosto de 2008


 INTERNET
Alberto Komatsu e Alessandra Saraiva


Varejo eletrônico prevê faturamento recorde de R$ 8,5 bi


‘Com apenas 13 anos de existência, o varejo eletrônico deve alcançar faturamento digno de empresas do mundo real: R$ 8,5 bilhões, um aumento de 35% em relação a 2007. A estimativa é da empresa de informações de comércio eletrônico E-bit, ligada à Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico, principal entidade multissetorial da economia digital na América Latina.


O resultado histórico é fruto da mudança de hábito do consumidor, que aumentou seu gasto médio, com a queda de 12% nos preços dos produtos vendidos pela internet, gerada pela desvalorização do dólar. Amanhã o E-bit, que acompanha semestralmente o setor, divulgará o balanço da primeira metade do ano. Estudo da E-bit mostra que a média de gasto individual dos consumidores do varejo virtual foi de R$ 324 no primeiro semestre. Em igual período de 2007 era de R$ 298.


‘Só compro pela internet. Sou internauta desde 1998. Já tive problemas, como produtos com defeito, mas nem no mundo físico as coisas são 100%’, diz o designer Alexandre Grand, de 35 anos. CDs e DVDs foram os primeiros produtos. Agora, até camisa ele compra. ‘Nem sempre tenho tempo para ir à loja do mundo real.’


A deflação de dois dígitos no comércio eletrônico foi apurada pelo Programa de Administração de Varejo da Fundação Instituto de Administração (Provar- Fia), da USP, no período de 12 meses até junho. Já o custo de vida medido pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) foi de 6,06%.


‘O aumento do gasto médio do consumidor na internet ocorre porque eles passaram a comprar produtos de maior valor, não se limitando aos CDs, livros ou DVDs’, afirma o diretor-geral da E-bit, Pedro Guasti. Com esse cenário, duas gigantes do varejo, Casas Bahia e Wal-Mart confirmam planos de criar portal de vendas ainda este ano.


Segundo Guasti, 11,5 milhões de consumidores compraram pelo menos um item na internet até junho. Isso representa em torno de 25% do total de internautas no País, afirma o diretor da E-bit. ‘Há quatro anos tenho hábito de comprar pela internet, normalmente CDs, DVDs e livros, mas já comprei TV e até um canhão de efeitos especiais que solta papel picado’, conta o analista de marketing da Claro, Luiz Fernando Martins.


O plano das Casas Bahia foi anunciado em setembro pelo diretor-executivo da rede, Michael Klein. A idéia era lançar o portal quando a empresa alcançasse base de 4 milhões de clientes com cartão de crédito com a bandeira da rede, o que justificaria o investimento.


As Casas Bahia, voltada prioritariamente à classe C, já contam com 4,1 milhões de clientes com cartão de crédito da rede, ou 13% do total de consumidores cadastrados. A empresa anuncia que o portal será lançado até o fim deste ano.


O foco da Wal-Mart é na venda de produtos eletroeletrônicos. O mercado aguarda também o portal de vendas do Carrefour, que em junho inaugurou um site para pacotes de viagens da Turismo Carrefour. A empresa não quis se pronunciar.


O bom cenário para as compras pela internet também foi sentido pela Business to World (B2W) Companhia Global de Varejo, resultante da aquisição pela Americanas.com do portal eletrônico Submarino. No primeiro semestre, o crescimento da receita bruta foi de 39%, em relação a igual período em 2007, atingindo R$ 2,1 bilhões. A Americanas iniciou entrada no e-commerce em 1999 e hoje conta com 10 milhões de usuários e 20 mil empresas.


Sua atuação abrange três portais de comércio eletrônico: Americanas.com; Shoptime e Submarino. Em apresentação dos resultados da empresa, o diretor financeiro e de relações com investidores, José Timóteo Barros, disse que o crescimento de vendas decorre basicamente da combinação de dois fatores: uma entrada forte de novos clientes, e o trabalho para ampliar a freqüência de uso do serviço na base de usuários.


Barros comentou que os resultados vieram ‘ligeiramente acima’ do esperado e que não espera desaceleração no ritmo de vendas para o segundo semestre, mesmo num cenário com taxas de juros mais elevadas. ‘Das nossas vendas, 80% são no cartão de crédito e 20% à vista. Desses 80%, de 90% a 95% são compras feitas sem juros’, disse. Para ele, mudanças na taxa de juros não modificam as boas perspectivas da companhia com as compras pela internet para os próximos meses.


A Globex Utilidades S.A., da rede Ponto Frio, também está atenta ao desenvolvimento das vendas eletrônicas. No início deste mês, anunciou uma reestruturação das atividades de comércio eletrônico. Todas as atividades nesse setor serão exercidas por uma empresa independente chamada Pontofrio.com Comércio Eletrônico S.A., ou Pontofrio.com, da qual a Globex deterá quase a totalidade do capital social. Desde 1997 a empresa atua em venda online.


Segundo o diretor-presidente da Pontofrio.com, German Quiroga, a decisão visa o desenvolvimento das atividades de comércio eletrônico da empresa. No primeiro semestre, a receita bruta do Ponto Frio com vendas na internet subiu 15,9% ante igual período de 2007, alcançando R$ 92,4 milhões. ‘O caminho multicanal de vendas passa pela Internet’, disse.


NÚMEROS


11,5 milhões o total de internautas que comprou pela internet este ano


R$ 324 é o valor médio individual gasto com compras online no primeiro semestre


25 % dos internautas fazem compras virtuais’


 


 


FUTURO DO JORNALISMO
Marili Ribeiro


‘Os jornais impressos têm vida longa’


‘O 7º Congresso Brasileiro de Jornais, promovido pela Associação Nacional de Jornais (ANJ), reúne hoje e amanhã em São Paulo executivos e profissionais para debater questões essenciais à atividade. o tema do evento é ‘O Brasil e a indústria jornalística em 2020’. Entre os palestrantes estão estudiosos do modelo de negócios dos jornais que, nos últimos anos, sofreram profundas mudanças sob o impacto das mídias digitais. Earl Wilkinson, diretor da International Newsmedia Association, dos EUA, aborda as tendências para os jornais nos próximos dez anos. Rosental Calmon Alves, diretor do Knight Center for Journalism in the Americas, da Universidade do Texas, fala sobre a reconstrução do jornal na era digital.


Carioca de nascimento mas de família capixaba como gosta de lembrar, Alves construiu carreira trabalhando em empresas jornalísticas no Brasil. Há 12 anos está nos EUA e dedica-se à vida acadêmica, formando novas gerações de profissionais. É membro do Knight Chair in Journalism & Unesco Chair in Communication, além de diretor da Universidade do Texas. A pedido do Estado, ele antecipou pontos que apresentará durante o congresso. Para ele, não há saída fácil para as mudanças em andamento, mesmo que a atual circulação dos jornais cresça no Brasil. O padrão desse negócio será outro nos próximos anos. Em sua opinião, é melhor começar a discutir mudanças no período de bonança do que esperar a tempestade.


Durante o Congresso, também será anunciado o novo presidente da entidade para 2008/2010. Nelson Sirotsky, presidente do grupo RBS, no cargo nas duas últimas gestões, passará o posto para Judith Brito, superintendente da Folha de S.Paulo. Sirotsty permanece na cúpula da Associação Mundial dos Jornais, cargo que ocupa desde junho.


O tema de sua palestra é a reconstrução do jornal para era digital. O que vem a ser essa reconstrução?


O jornal da era industrial, aquele que conhecemos e estávamos acostumados, está morto. Ou agonizante. O que não quer dizer que o jornal esteja morto. Muito pelo contrário. O jornal ainda tem vida longa. Vejo a edição em papel resistindo em 2020. Mas, a empresa jornalística vai estar bastante diferente. A versão em papel não vai mais representar a atividade central desse negócio. As plataformas digitais, em alguns mercados, estão empurrando o papel, sobretudo onde a penetração da internet é maior, para um pouco mais ao lado. Essas plataformas digitais estão tomando o centro da atividade dessa indústria. O mundo está mudando. Não da maneira como sempre mudou. Mas mudando de forma radical. E o cenário de mídia muda de maneira drástica. A reconstrução do jornal deve partir de uma avaliação de uma série de atividades que o jornal faz ou fazia, à luz desse mundo novo que está emergindo.


Por quanto tempo a discussão sobre a sobrevivência do jornal impresso vai continuar em cartaz?


Por muito tempo. O jornal que não acordar para essa discussão e não se adaptar – e não é uma adaptação simples, porque envolve a essência desse negócio -, vai desaparecer. É uma adaptação que terá vítimas: serão os que não entenderem a profundidade da mudança. A estrutura atual dos jornais, feita para atender um produto manufaturado, produzido uma vez por dia e entregue, no dia seguinte, para uma audiência interessada em ler as notícias do dia anterior em profundidade não sobreviverá.


No Brasil, a circulação dos jornais cresce.


As mudanças vão acontecer até mesmo em países como Brasil, Índia e China, onde a circulação dos jornais vem aumentado nos últimos anos. Por isso, terei dificuldades em reter a atenção do público sobre o que virá. E, acredite, vem uma tempestade. É fácil falar isso aqui nos EUA, onde essa indústria vive um verdadeiro massacre, com a circulação dos jornais decrescendo e o valor das empresas caindo. Eu brinco que a euforia vivida pelos mercados emergentes, como o Brasil, é uma espécie de ‘baile da ilha fiscal’. Era o império celebrando, enquanto o regime já tinha ruído.


Existem pesquisas mostrando a velocidade de migração de leitores dos jornais para o meio digital?


A circulação dos jornais nos EUA vem caindo há uns 40 anos em relação ao crescimento da população. Não é um fenômeno que acaba de acontecer. A audiência dos telejornais também registra queda. A questão é que temos uma lógica nova. A lógica da sociedade da informação, que substituiu a sociedade industrial. Uma lógica que se acelerou nos EUA porque os anunciantes estão saindo mais rapidamente dos meios tradicionais, já que encontram outras formas de atingir os consumidores por meio das plataformas digitais. E a fuga dessa receita está rompendo o modelo de negócio que os jornais mantinham. Era um modelo muito lucrativo, com margens superiores a 30% ao ano. Agora, há jornais operando no vermelho.


Como se reconstrói esse negócio no mundo online?


O negócio online cresce mais aceleradamente do que a queda do negócio impresso. O crescimento do online é de 30% ao ano em faturamento, mas parte de uma base pequena. Já a queda do faturamento do impresso é mais lenta, em torno de 4% ao ano, mas de uma base muito maior. A receita dos jornais está mudando de padrão e não dá para custear a atual infra-estrutura afeita ao modelo anterior, voltada para a edição em papel. É hora de reorganizar a rotina de trabalho. Entender o novo fluxo da informação e rever tudo à luz de que a operação de internet vai crescer e a do papel vai diminuir. As empresas serão inevitavelmente multimídia. A lógica de trabalho mudou e os profissionais precisam incorporar os novos códigos. A habilidade mais relevante para meus alunos hoje em dia é saber fazer vídeos.


Quem é Rosental Calmon – É jornalista nascido no Rio e diretor do Knight Center for Journalism in the Americas, da Universidade do Texas, nos EUA, onde mora há 12 anos. É membro do Knight Chair in Journalism & UNESCO, Chair in Communication. No Brasil, trabalhou durante 23 anos como repórter, redator, editor e chegou a diretor do Jornal do Brasil’


 


 


MÍDIA / EUA
Robert MacMillan


Tribune contrata executivo de TV


‘A empresa de comunicação Tribune Company, de Chicago, nomeou o ex-presidente-executivo do provedor de televisão por satélite DirectTV como publisher do Los Angeles Times, afirmou o jornal californiano em sua edição de sábado.


Eddy Hartenstein tomará conta do maior jornal do grupo Tribune, como parte de uma nova estratégia de trazer talentos de outras indústrias para salvar um negócio doente.


Hartenstein, de 57 anos, vai substituir David Hiller, que renunciou ao cargo de publisher em julho. Executivos do grupo Tribune e do Los Angeles Times, bem como Hartenstein, não estavam disponíveis para comentar a notícia.


O Los Angeles Times, assim como a maioria dos jornais americanos, tem se esforçado para sobreviver em um cenário de queda nas receitas com propaganda, conseqüência dos problemas enfrentados pela economia do país e também da migração de leitores para a internet.


A Tribune – que no começo da semana anunciou uma queda de 15% nas suas receitas com propaganda em jornais – trouxe executivos das áreas de rádio e televisão para dar uma sacudida na empresa e tirá-la de um estado que seu novo dono, Sam Zell, chama de ‘cultura da complacência’.


Magnata do setor imobiliário, Zell levou para a Tribune executivos como Randy Michaels, ex-presidente executivo da Clear Channel Communications, e Lee Abrams, ex-diretor de criatividade da rádio via satélite XM.


Zell adquiriu as ações da Tribune no ano passado, em um negócio de US$ 8,2 bilhões que resultou no fechamento do capital da companhia e a deixou bastante endividada. De acordo com os resultados financeiros do segundo trimestre, divulgados na semana passada, o endividamento do grupo é de US$ 12,5 bilhões.


Para equacionar essa dívida, o grupo Tribune tenta vender ativos como o time de beisebol Chicago Cubs e também a casa onde fica a sede do clube, Wrigley Field. O grupo já vendeu 97% das ações do diário Newsday, de Long Island, New York, para a Cablevision Systems Corp, que tem sede em Long Island.


Até o momento, a companhia não revelou o que fará com o jornal Los Angeles Times. De acordo com a imprensa americana, dentre os possíveis interessados em comprar o jornal está o produtor cultural David Geffen, mas fontes no grupo Tribune indicam que Zell deverá manter o jornal.


Enquanto isso, o Tribune enfrenta a queda nas receitas com demissões. Em fevereiro, o grupo anunciou um corte de pessoal de 400 a 500 pessoas, equivalente a 2% dos funcionários do grupo. Os cortes atingiram o pessoal administrativo e as redações dos jornais. Com as demissões, o Tribune segue os passos de outras empresas de mídia, que recentemente realizaram cortes: Gannett Co Inc, The New York Times e The Washington Post Co.


Tida como a maior empresa de mídia americana que tem os seus empregados como sócios, a Tribune possui negócios nas áreas de editoração (jornais), interatividade (internet) e telecomunicação. Ao todo são nove jornais, incluindo Los Angeles Times e Chicago Tribune, e 23 canais de televisão, rádios e o clube de beisebol Chicago Cubs.’


 


 


 


TELEVISÃO
Gustavo Miller


Legislativo na mira: Bianchi satiriza votações na Câmara


‘Conhecido pelos trabalhos envolvendo futebol com humor ou apenas o deboche nonsense, o comediante Marco Bianchi acaba de criar na internet uma série que mostra uma faceta sua até então desconhecida do público: a de crítico político.


Batizada de Câmera dos Deturpados, ele atua, dirige, produz e escreve o programa que satiriza as votações de leis do Congresso Nacional. Os episódios não costumam ter mais que três minutos de duração. ‘É um protesto à paralisia do Legislativo. Há votações pendentes ali há décadas’, diz.


O formato dos quadros tem a cara da TV Senado e ele cria personagens inspirados em figurões da política brasileira. ‘Adoro ver TV Câmara. Aquilo é matéria-prima para meu trabalho’, ri.


Até agora foram gravados oito episódios, que podem ser vistos no FizTV (www.fiztv.com.br) ou no site dele, o www.marcobianchi.com.br.


Bianchi diz que tinha a idéia desse programa engavetada havia muito tempo e, graças à internet, achou um espaço de liberdade de expressão importantíssimo.


‘Televisão tem sempre o rabo preso. Não me vejo fazendo um programa assim nela’, cutuca.


Afetação


Xuxa Lopes gravou em Sampa cenas para Negócio da China, novela das 6 que Miguel Falabella escreve para substituir Ciranda de Pedra. Perua rica e vaidosa (parece, mas não é necessariamente pleonasmo), ela terá Natália do Valle como rival e Herson Capri como ex.


Entre-linhas


Vida Alves, presidente da Pró-TV, vai hoje ao sofá da Hebe para falar sobre a quase realização do Museu da TV brasileira, que chegou a ter a Casa das Retortas, no Brás, anunciada como futura sede, e voltou ao papel em poucos dias, em função, segundo a atriz, de um mal-entendido.


Sai a mãe, entra a filha. Mônica Torres deixou Ciranda de Pedra – sua personagem morreu – mas sua filha com o ator José Wilker, Isabel Wilker, entrará em breve na trama. Ela seria uma modelo na novela.


Protagonista de novela das 9 na Globo pela primeira vez na vida, Carmo Della Vecchia, o Zé Bob de A Favorita, já se permite pedir aos interessados em entrevistá-lo que mandem perguntas por e-mail. A proposta é feita pela assessoria pessoal do ator.


O diretor Jayme Monjardim mandou trazer dos Estados Unidos cigarros sem nicotina para o ator e diretor paulista Nelson Baskerville, ex-fumante há anos. Nelson participará da minissérie Maysa como Monja, pai da cantora – e, portanto, avô de Jayme.


Cultura Data, voltada para área de pesquisas em comportamento, será anunciada amanhã pela Fundação Padre Anchieta como nova unidade de negócios da TV Cultura.


Lima Duarte voltará ao ar em Caminho das Índias, próxima novela das 9 da Globo. Ele será Shankar, um físico que terá Márcio Garcia, intérprete Bauhan, como filho de criação. A estréia está prevista para janeiro.’


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Folha de S. Paulo


Segunda-feira, 18 de agosto de 2008


 MÍDIA & POLÍTICA
Fernando de Barros e Silva


Farsa de elite


‘De Sérgio Cabral, o capitão Nascimento poderia dizer que é um fanfarrão.


O pedido do governador para que tropas federais venham atuar ‘o mais breve possível’ na cidade do Rio durante o período eleitoral consagra uma política de segurança midiática com resultados desastrosos.


No ofício que enviou ao TSE, o governador diz que ‘Exército, Marinha, Aeronáutica, o que vier será bem-vindo’. E acrescentou que seria ‘um belo presente’ se ficassem na cidade após a campanha.


Entenda-se: Cabral viu na eleição uma brecha para fazer do Rio a capital do estado de emergência permanente. A sugestão de uma operação de guerra sem prazo de validade é oportunista e demagógica. Não visa proteger a população favelada de criminosos, mas oferecer às elites amedrontadas alguma sensação de segurança -ilusória, é claro.


O que fariam no Rio milhares de militares, durante semanas até as eleições? Ninguém sabe. Devemos imaginá-los espalhados pela cidade, como espantalhos verde-oliva a serviço da demofobia que se disseminou pela zona sul?


Ou pretendem que o Exército, sem nenhum treinamento para isso, assuma as funções da polícia e escale o morro para enfrentar o tráfico e as milícias nos locais indicados pela Justiça Eleitoral?


Não espantaria, nessa escalada de efeitos especiais, se o governador pedisse a Lula que as Forças Armadas esticassem até fevereiro para viver sua apoteose na Sapucaí.


Na melhor hipótese, a encenação de Cabral servirá para militarizar a eleição e desmoralizar o Exército. Na pior, estará patrocinando tragédias, como a que se viu há pouco no morro da Providência.


O governador do Rio é um vassalo da mídia hegemônica do seu Estado. Nem ele faz mais questão de disfarçar que subordinou seu governo à pauta das Organizações Globo. Cabral atua como um chefe de província. É simples assim.


Não há então com que se preocupar. A participação do Exército na eleição do Rio tem tudo a ver.’


 


 


Chico Santa Rita


O horário eleitoral faz a diferença


‘EM ARTIGO nesta Folha (‘Tendências/Debates’, 11/8), o consultor político Ney Figueiredo afirma que ‘a influência do horário eleitoral gratuito é cada vez menor, embora ele seja o maior devorador de gastos’.


O consultor é um grande estudioso do tema, um teórico competente, mas talvez lhe falte a prática do dia-a-dia das campanhas, nas quais, Brasil afora, tenho encontrado uma situação exatamente oposta. Não me envolvo nas questões de gastos, mas se sabe que o grande sumidouro de dinheiro está nos ‘acordos’ políticos e nas mobilizações de rua.


A propaganda eletrônica -TV e rádio- fica num plano abaixo e tem custos facilmente dimensionáveis. Quanto à influência que ela exerce, o que vejo nesta eleição, atuando em quatro campanhas, é que ela continua sendo o grande diferencial. Também foi o que vi na eleição anterior, dois anos atrás, em consultorias para eleger dois governadores, uma senadora e vários deputados. E coloco, como testemunho ainda mais eloqüente, o desempenho do ‘Não’ no referendo sobre a venda de armas, campanha que também dirigi.


Ali, o desmanche da mentira de um desarmamento que não desarmaria ninguém ocorreu inteiramente devido ao horário eleitoral gratuito, que abriu oportunidade para que os dois lados apresentassem seus argumentos, antes concentrados na visão unilateral difundida pela Rede Globo -a história completa está no livro ‘Novas Batalhas Eleitorais’ (2008).


Na sua argumentação, Figueiredo coloca como exemplo destacado a campanha de 1990 no Estado de São Paulo, quando Maluf acabou destroçado pelo quase desconhecido Fleury, cujo único trunfo inicial era o apoio de Quércia. Como artesão da campanha vitoriosa, posso garantir que a proeza teve como causa majoritária exatamente a programação do horário eleitoral gratuito.


Até um fato citado no artigo -Maluf levou seu Programa de Governo para ser avalizado pelo então presidente Collor-, que teria sido negativo para o candidato, só teve repercussão porque foi apresentado e discutido no horário eleitoral. No de Maluf, como atitude de união entre governos. No de Fleury, como subserviência de um Estado que, ‘pela sua importância, não se podia curvar, não podia abaixar a cabeça, fosse para quem fosse, até mesmo para o poder central’ -conforme escrevi no livro ‘Batalhas Eleitorais’ (2001). A mídia normal nem participou da polêmica. E outra particularidade dessa campanha foram os movimentos de ir/ não ir aos debates da TV. Mas também aqui o duelo travou-se no horário eleitoral.


A realidade nas campanhas que tenho operado continua a mostrar um país de iletrados, onde a TV acaba sendo o grande veículo de comunicação. E, dentro dela, o horário político eleitoral tem papel preponderante para apresentar as alternativas ao eleitor. A internet e outros meios estão ganhando espaço, mas sua importância é relativa, pois atingem um público em geral com a cabeça feita, orientada em determinada direção.


No início deste mês, em Uberlândia, segunda maior cidade de Minas Gerais, uma pesquisa nos apontou um número de ‘indecisos’ acima do normal. Voltamos às ruas para perguntar a razão da indecisão, e a resposta majoritária não surpreendeu: ‘Nós estamos esperando que os candidatos apresentem suas propostas… nos programas eleitorais do rádio e da televisão’.


Queira ou não, a intelligentsia brasileira, esse espaço cedido aos partidos e candidatos, apesar de muitas aberrações que teimam em acontecer (muitas vezes acobertados por uma legislação eleitoral sabidamente deficiente), foi um importante fator na redemocratização do país, dando vez e voz às chamadas ‘oposições’. Também é ali que a classe média e, principalmente, os mais carentes e desassistidos buscam orientação e informação para guarnecer seu voto. Um voto, aliás, que tem ficado cada vez mais consciente, mais crítico, melhor definido, graças às lições que os acertos e os erros do horário eleitoral transmitem. Ele é o caminho que faz a diferença e que vai nos ajudar, eleição após eleição, através de uma população culturalmente em evolução, a chegar a uma politização mais próxima do ideal.


CHICO SANTA RITA, 63, é consultor em marketing político. Dirigiu mais de cem campanhas, entre elas, a de Fernando Collor de Mello à Presidência da República. Nestas eleições, dirige campanhas nas cidades de Uberlândia (MG), Campo Grande (MS), Macaé (RJ) e Rio das Ostras (RJ).’


 


 


Laura Mattos


‘Fazer campanhas iguais é eticamente constrangedor’


‘O publicitário Washington Olivetto nunca aceitou fazer campanha política e, por isso, foi chamado para criar a campanha do Tribunal Superior Eleitoral deste ano. À Folha ele critica o horário eleitoral, que estréia amanhã, fala da entrada da internet na política e do escândalo com o colega Duda Mendonça.


FOLHA – Por que o sr. nunca trabalhou em campanhas políticas?


WASHINGTON OLIVETTO – Primeiro por questão geracional. Quando comecei a trabalhar, o Brasil vivia uma ditadura, obviamente não me identificava com isso e resolvi não fazer campanhas. Aí, me voltei para a iniciativa privada. Dependo tanto da decisão profissional, que, possivelmente, se fosse fazer campanhas políticas, faria mal. São comitês que resolvem tudo, tem um cara que dá palpite aqui, o outro quer agradar aquele… Não convivo bem com as áreas políticas. Horário político obrigatório… Essa palavra, obrigatório, me incomoda loucamente. Se fosse bom, não seria obrigatório. No público mais jovem, coisas impositivas são pouco eficientes.


FOLHA – Apesar disso, o sr. acredita que o horário político na televisão ainda tem impacto forte?


OLIVETTO – Claro que, num país de dimensões continentais como o Brasil, seja numa campanha política, seja na de um produto de consumo altamente popular, a força da TV aberta ainda é enorme, fundamental. O horário eleitoral, particularmente no jovem e no formador de opinião, tem um ranço grande e em alguns momentos é até desprezado ou ironizado. Mas em algumas camadas da população ainda funciona. Minha curiosidade é ver como os candidatos vão tentar renovar a linguagem. Quatro anos é muito tempo e muita coisa mudou desde a última eleição em termos de mídia, hábitos de consumo, ambições, senso crítico. Mas uma coisa não vai mudar nunca: seja qual for a mídia, da mais digitalizada até um simples panfleto, se não houver a grande idéia não acontece nada. A comunicação sempre será um negócio de forte conteúdo. A forma é a maneira de expressar esse conteúdo. Quando é utilizada para esconder a falta de conteúdo, normalmente é ineficiente. Em eleições passadas, quando começou um acesso maior à tecnologia, havia coisas que se fazia com comunicação, mostrar na TV trens que não iam existir, que deslumbravam um pouco. Nos últimos anos, o acesso à forma se generalizou, acho que haverá a revalorização do conteúdo.


FOLHA – Que outras expectativas há em relação ao horário eleitoral?


OLIVETTO – Depois dos problemas todos, [escândalos sobre] sobras de campanha, possivelmente essas campanhas tenham menos investimento na forma, porque terão menos dinheiro para produzir [programas eleitorais]. Mais controle e menos dinheiro para superproduções. Voltamos à valorização do conteúdo, o que seria bom.


FOLHA – Ainda que as campanhas possam ter menos dinheiro, não haja superprodução nos programas eleitorais e que o senso crítico da população possa estar mais apurado, o marketing continua capaz de alavancar candidatos sem carisma?


OLIVETTO – Isso tem se tornado mais inviável. E, por outro lado, conceitos de carisma estão mudando. Isso tem a ver com a experiência que o Brasil adquiriu de votar. Cada vez mais, felizmente, o que é mais parecido com a verdade é mais efetivo. Pode se dar bem o que se comunicar e se comportar como na vida real. Por um bom tempo, o marketing determinava: ‘agora você é sério, é isso, é aquilo’.


FOLHA – Essa onda de escândalos, operações da PF, tende a afastar mais o eleitor do horário eleitoral?


OLIVETTO – Sim, isso afasta. As pessoas estão um pouco entediadas com o excesso de más notícias, de discussões. O denuncismo, que em outra época era característica de momentos de campanhas eleitorais, hoje está presente no cotidiano, o que torna o horário eleitoral mais cansativo. E hoje a propaganda precisa ter entretenimento. O horário eleitoral poderia passar honestidade, afetividade, senso de humor.


FOLHA – Que outros fatores tornam o horário eleitoral entediante?


OLIVETTO – Não tem capacidade de surpreender, não tem diversidade. Muitas vezes interrompe um momento de prazer do público. Sou contra a obrigatoriedade. O eleitor deveria escolher o candidato pela cobertura da imprensa. E veículos de comunicação deveriam declarar de que partido são. Acho bacana, como na imprensa internacional, um jornal dizer ‘sou democrata’ ou ‘sou republicano’. É aberto e traz uma isenção.


FOLHA – Como o sr. avalia a uniformização das campanhas, com marqueteiros fazendo slogans iguais para diferentes candidatos e pasteurizando até as propostas?


OLIVETTO – Parece um prêt-à-porter. Isso é eticamente constrangedor. Você tem que desconfiar da proposta de gestão que surja de plano de marketing. Vai depender do senso crítico do eleitor. E isso não é determinado por poder aquisitivo ou formação intelectual -o intuitivo julga muito bem.


FOLHA – Nestas eleições no Brasil, a internet terá algum eco ou estamos muito distantes do que está havendo na disputa norte-americana?


OLIVETTO – No caso do Obama, o público jovem está sendo atingido por novas mídias. Isso, na realidade americana é maior, mas aqui está acontecendo. As pessoas se encantam com falibilidade, alguém mais coloquial, menos perfeito. Possivelmente, há a percepção de ‘isso parece mais verdade’. Essa é a grande mudança na comunicação. A relação, que antes era monólogo, agora é diálogo. Quem antes era receptor agora é discutidor e até produtor de mensagem. No Brasil, isso terá algum eco, apesar de que sempre achei nossos políticos muito antigos, defasados. Especialmente em uma eleição municipal, não sei se os candidatos são tão aparelhados a ponto de se modernizar no discurso. Mas algumas manifestações deverão acontecer, apesar de que a internet, nesta eleição, ainda terá mais impacto na formação de opinião do que no voto.


FOLHA – Apesar disso, os candidatos principais estão tentando investir nessa área. Por quê?


OLIVETTO – Se você não investir nisso, demonstra uma anticontemporaneidade, que contamina todo o resto da sua proposta. Como você será um dirigente no mundo moderno se não está atrelado ao mundo moderno? É uma questão de atitude, mais do que o resultado palpável que possa ter com isso em votos.


FOLHA – O que o sr. achou da decisão do TSE de buscar um controle do conteúdo eleitoral na internet?


OLIVETTO – Eles podem até se propor a fazer isso, mas conseguir é praticamente inviável.


FOLHA – Que prejuízos os escândalos do mensalão ligando agências publicitárias a lavagem de dinheiro e caixa dois trouxeram ao setor?


OLIVETTO – A propaganda, como qualquer atividade, é feita por pessoas e tem as que não se comportam de maneira correta. Acho que a maioria é direita, e obviamente há as exceções. Esses mecanismos ficaram tão mal pilotados, de como as agências são remuneradas em campanhas, que os que optam por trabalhar nelas podem ser desde cúmplices até vítimas. E não vou julgar ninguém. Sempre optei por nunca me meter com isso exatamente por essas coisas. Mas a atividade foi contaminada em termos de imagem, mas felizmente a publicidade brasileira tem prestígio e acho que isso já foi superado.


FOLHA – Duda Mendonça, que admitiu caixa dois e remessas ao exterior, é vítima ou cúmplice?


OLIVETTO – Sinceramente não dá para analisar como foi, se para receber ele teve que… Aí, eu não sei. Acho muito estranho. Ele tinha trabalhos de reconhecimento e ficar com a pecha disso… Ele fez aquela campanha ‘não basta ser pai, tem que participar’. Acho mais bacana para a vida dele ser lembrado por isso. É uma pena…’


 


 


ELEIÇÕES / EUA
Folha de S. Paulo


Encontro na igreja foi formatado como show de TV


‘DE NOVA YORK – Barack Obama e John McCain disseram ter deixado a produção do encontro de sábado totalmente na mãos da igreja californiana Saddleback para evitar negociações com emissoras de TV, que poderiam transformar a conversa religiosa em um show.


Na tela, contudo, o resultado lembrava um programa de auditório, no qual o pastor Rick Warren fazia até pausas para que os canais que transmitiam o evento ao vivo (como CNN e Fox News) pudessem chamar intervalos comerciais.


Um terço dos 3.000 assentos do templo foi cedido para acomodar com espaço de sobra a imprensa nacional e estrangeira. Por fim, também como na TV, McCain fora confinado em uma sala isolada do som da entrevista de Obama, para manter a surpresa nas perguntas e deixar a sabatina mais justa.


Considerado o evangélico mais influente dos EUA por revistas como a ‘Time’, Warren, 54, reúne semanalmente 22 mil fiéis em sua igreja, em Lake Forest, no condado de Orange (a sigla local, O.C., deu nome ao seriado televisivo ambientado ali). Trata-se de uma das porções mais conservadoras do país e, portanto, mais favoráveis ao Partido Republicano. No conjunto da Califórnia, contudo, a vitória democrata é dada como certa neste ano.


Warren já fez pregações em 185 países, inclusive no Brasil. Ele é também conhecido como escritor de sucesso, com títulos como ‘Uma Vida com Propósitos’, disponível em português.


Ao pedir a Obama que definisse o conceito de ‘rico’ (para falar sobre cobrança de impostos), o candidato brincou: ‘Bem, se você tem vendas de livros de US$ 25 milhões, você se enquadra’.


Em seguida, o democrata respondeu a sério: para ele, rico é quem ganha mais de US$ 250 mil por ano, e que terá um aumento ‘modesto’ de impostos, para compensar o alívio dos pobres e da classe média.


Já McCain se recusou a estabelecer valores e disse que não aumentará impostos para ninguém, e sim cortará gastos do governo -citou pesquisas com DNA de ursos no Estado de Montana como exemplo de desperdício.’


 


IMPRENSA NORTE-AMERICANA
Claudia Antunes


Mídia dos EUA perpetua era Bush


‘Nomes do establishment da política externa americana já vieram a público anunciar que estamos em um mundo ‘apolar’. Outros falam em ‘multipolaridade’, alguns ainda em era ‘pós-americana’. Os Estados Unidos, dizem em coro, continuam a ser uma potência econômica e militar sem igual, mas perderam poder relativo.


Era evidente que, nessas circunstâncias, o avanço americano em regiões que os russos consideram parte de sua ‘zona de segurança’ encontraria resposta, nem que fosse sob a forma de mais uma guerra por procuração, como a que ocorre no Cáucaso.


Mas boa parte da imprensa americana e a imensa maioria dos seus chamados formadores de opinião parecem não ter sido avisados disso. Do ‘New York Times’ à CNN, houve pressão contínua sobre o governo Bush para que fossem tomadas medidas de força contra a Rússia.


Os âncoras e jornalistas estão excitados por terem reencontrado em Vladimir Putin um inimigo menos ubíquo do que Bin Laden. A volta, como se possível, à bipolaridade da Guerra Fria, afinal tão simples, é uma perspectiva saudada com indisfarçável frenesi.


Encurralado em uma entrevista coletiva, o secretário da Defesa Robert Gates, veterano do combate ao ‘império do mal’ soviético, teve de acrescentar um ‘fui claro?’ quando questionado pela terceira vez se mandaria tropas para expulsar os russos do país ao qual os americanos prometeram o ingresso na Otan e que, em troca, forneceu 2.000 homens para a ocupação do Iraque.


Quem mais tenta tirar partido desse clima é John McCain, que elevou sua retórica a tal ponto que teve que soltar um comunicado para dizer que não, ele não mandaria soldados americanos para lutar contra o urso renascido.


Um artigo na página on-line da revista esquerdista ‘The Nation’, de leitura marginal e que apóia Barack Obama, levantou a possibilidade de que McCain, cujo principal assessor de política externa foi lobista do governo georgiano, tenha estimulado o pequeno país a provocar a Rússia, sabendo que a volta do fantasma da Guerra Fria poderia favorecê-lo contra o democrata.


Essa é, aliás, a mesma teoria conspiratória que corre entre oposicionistas na Geórgia, que se preparam para dar o bote no presidente pró-ocidental. Do ponto de vista de Moscou, seria um fecho de ouro para a operação que mimetizou a ofensiva dos EUA contra o ditador sérvio Slobodan Milosevic, nos anos 90.


Confrontados de passagem com as analogias do Iraque e da Sérvia, em debate na CNN, o neoconservador Robert Kagan e o conservador moderado Michael O’Hanlon, do Instituto Brookings, logo as puseram de lado argumentando que tanto Saddam quanto Milosevic eram déspotas, enquanto o georgiano Mikhail Saakashvili é um democrata formado em Harvard.


A imprecisão do elogio ao georgiano, que vinha se firmando como mais um autocrata, confirma que recorrer a imperativos morais para justificar jogos de poder é terreno pantanoso. A Rússia alega que avançou sobre a Geórgia para proteger os separatistas da Ossétia do Sul e da Abkházia das ações do ‘lunático’ Saakashvili. Quem acreditaria em tamanho desprendimento?


É verdade que é possível pescar na cobertura americana reflexões sobre a eventual indisponibilidade de soldados para combater no Cáucaso, quando há 200 mil no Afeganistão e no Iraque, ou sobre a oposição de França e Alemanha a um confronto com a Rússia. Mas elas ficaram soterradas sob a linha-dura midiática. A guerra no Cáucaso transformou em pó a idéia de que o fim do governo Bush enterraria os instintos mais messiânicos de uma era de ilusões unipolares que ele levou ao paroxismo.’


 


 


TODA MÍDIA
Nelson de Sá


O começo do fim


‘Em perfil no ‘New York Times’ e reportagem no ‘Financial Times’, o economista Nouriel Roubini está de volta. Foi ele o profeta, dois anos atrás, da crise financeira americana. A crise acaba de fazer um ano -e a semana passada evidenciou, no dizer de Roubini, que ‘todas as economias do G7 estão a caminho de uma dura aterrissagem recessiva’.


Sobre os EUA, país que agora ‘depende da bondade de estranhos’, credor que é do financiamento de China, Rússia e países do Golfo: ‘Este pode ser o começo do fim do império americano’. Prevê que ele se arrasta pela crise até ‘emergir como uma nação diferente, com um lugar diferente no mundo’.


Perfilado como ‘Dr. Doom’, Sr. Apocalipse, diz que ‘esse desastre do mundo desenvolvido vai encerrar o avanço dos Brics’. Sobre o Brasil, o problema maior seria a queda das commodities.


‘THE OIL IS OURS’


Esta Folha publicou que, ‘para tentar vencer as resistências’, Lula já ‘admite estrangeiros no pré-sal’. E o site do ‘FT’ abriu ataque à bandeira ‘The oil is ours’, o petróleo é nosso, e vê como ‘o maior perigo’ que ‘o nacionalismo cresce novamente’ por aqui.


Por outro lado, meses após a recriação da 4ª Frota pelos EUA, a Reuters deu no final da semana que ‘a Marinha do Brasil planeja manobras para defender nova descoberta de petróleo’. Não que exista ‘um inimigo provável’, diz o almirante que vai comandar as manobras. ‘Numa visão moderna de planejamento, você envia um sinal à comunidade internacional: ‘Eu estou preparado’.


NA COSTA


A Record visitou na sexta ‘um dos mais modernos navios da Marinha’, com seus ‘sensores e sistemas de armas de última geração’ -e ‘sempre preparada a defender a costa nacional’


NA BAÍA


A Globo fez ao menos três visitas em apenas quatro meses a navios americanos como o ‘superporta-aviões preparado para usar armamento atômico’ exibido pelos EUA na baía da Guanabara


AÉCIO VS. LULA


Semana passada, Aécio Neves, enquanto FHC se reunia com Geraldo Alckmin, saía a atacar Lula por todo lado, criticando os gastos do governo. Mas veio sexta na Globo e Alckmin surgiu 15 pontos atrás de Marta Suplicy. Veio domingo e, na manchete de ‘O Estado de S. Paulo’ e no topo da busca de Brasil no Yahoo! News, ‘Gastos federais cresceram menos do que o PIB’.


De outra parte, o blog de José Dirceu passou a atacar Aécio Neves, em meio a posts dos Jogos de Pequim, onde está ‘a negócios’, segundo a ‘Veja’.


DO CHOQUE AO FIASCO


Diego Hypólito e Daiane dos Santos erraram e os sites daqui passaram a usar expressões tipo ‘decepção’, ‘fiasco’ -e a criticar a ginástica que volta ‘sem medalhas’.


Mas ecoou o ouro de César Cielo, com ‘China Daily’ dando ‘parabéns a este jovem e ao Brasil!’. Do site oficial feito pelo Google chinês, o Sohu, à BBC, foi ‘um choque’. Já a imprensa australiana lamentou por seu favorito.


DESELEGÂNCIA


Nem na Globo gostaram. Do blog de Patrícia Kogut: ‘Galvão foi deselegante com Gustavo Borges. Quando comentava a vitória de Cielo, ele fez comparações com Gustavo, que foi prata’.


E Cielo, postou o blog dos enviados do UOL, ‘não conseguiu acordar no domingo chinês para estar ao vivo no ‘JN’. A produção ficou mais raivosa porque ele também desmarcou ida à Muralha’.’


 


 


OLIMPÍADAS DE PEQUIM
Sérgio Dávila


Veja que maravilha


‘É IMPOSSÍVEL narrar eventos com mais de duas horas na TV e manter a inteligência, seja qual for o evento, seja qual for a TV.


Essa é a conclusão a que esse telespectador chegou depois de assistir às quatro horas de cerimônia de abertura e outras disputas intermináveis da Olimpíada, exibida aqui pela NBC.


Não é um telespectador qualquer. Ele foi vacinado no Carnaval carioca, em madrugadas insones, ao som de bravos narradores, que tentavam ao mesmo tempo descrever o significado do carro alegórico ‘Saci- Pererê encanta Iracema na Corte de Luís 15’ e manter acordados os que estavam em casa e a eles próprios, depois da entrada da enésima ala da enésima escola de samba.


Foi com alívio, então, que vi o Âncora Matt Lauer, o jornalista Esportivo BobCostas e o analista de assuntos chineses Joshua Cooper Ramo duelarem ao esgrimir frases como ‘essa pode e deve ser uma das Olimpíadas mais polêmicas dos últimos anos,mas veja que maravilha!’.


Era o equivalente gringo do nosso ‘repare a leveza do mestre- sala, um dos membros mais queridos da comunidade!’. Desde então, devo dizer que a internet vem dando um banho na cobertura. Primeiro, porque você vê o que quer na hora que escolhe-naTV,mesmo os gravadores digitais deixam janelas muito extensas quando se programa um jogo específico. Depois porque a maior parte dos narradores está aqui ao lado, em Nova York, num estúdio emprestado pelo programa ‘Saturday Night Live’, e não em Pequim, como pode acreditar o telespectador mais desavisado ou menos atento.


Por fim, uma suspeita chata empanou o trio de jornalistas da cerimônia da abertura: discute- se se sabiam ou não sobre os ‘auxílios’ visuais digitais usados pelo cineasta Zhang Yimou e não revelados ao telespectador.


Se sabiam e ficaram quietos, colaboraram na encenação. Se não sabiam, tomaram gol no meio das pernas…’


 


 


Raul Juste Lores


TV para chinês ver


‘O SEGUNDO maior edifício de escritórios do mundo, depois do Pentágono, será inaugurado em Pequim no ano que vem. São duas torres inclinadas de 49 andares e 234 metros de altura, conectadas no topo e no térreo, a 90 graus, por pontes que criam esquinas suspensas.


Parece uma moldura distorcida, com um grande vão no meio. Mas o povo apelidou o prédio de ‘calças gigantes’.


O moderno arranha-céu vai abrigar a nova sede da Televisão Central da China (CCTV). Espera-se que o vanguardismo da construção, de R$ 1,3 bilhão, inspire a rede estatal.


Criada há 50 anos, a CCTV tem 16 canais. O visual é de SBT. Os apresentadores ostentam o penteado vim-de-moto que Jassa celebrizou em Sílvio Santos. Mas imensos broches das apresentadoras distraem o espectador de qualquer cabelo.


O telejornal das 19h, com meia hora de duração, é o mais visto da China. Lembra o antigo ‘A semana do presidente’ – imagens dos líderes comunistas recebendo convidados estrangeiros são alternadas com cenas de calamidades ocorridas no exterior.


A CCTV só começou a noticiar com destaque o terremoto de maio passado seis horas após a tragédia -ela precisava esperar ordens do Departamento de Propaganda.


Depois da abertura da Olimpíada, vista por 842 milhões de chineses, o programa de maior audiência é a Gala do fim de ano chinês. São 16 horas de danças folclóricas, humoristas e números musicais em homenagem aos chefões do Partido.


Tirando ‘Escrava Isaura’, novelas brasileiras são desconhecidas. Qualquer cena de sexo é vetada. O politicamente correto não chegou -quadros humorísticos que fazem piada com os migrantes rurais, com maquiagem de dentes cariados nos atores, são bem populares.


Mas, assim como no Ocidente, a audiência está diminuindo. Os jovens preferem navegar horas na internet.’


 


 


TELEVISÃO
Daniel Castro


Ibope culpa trânsito e web por queda da TV


‘Relatório inédito do Ibope aponta os congestionamentos e o crescimento da internet como responsáveis pela queda de audiência das TVs paga e aberta, registrada de 2006 para cá.


O estudo não teve pretensão de ser ‘conclusivo’, mas de ‘indicar pistas para a análise da mudança de hábito no consumo de TV’. Foi encomendado pela ABTA, a associação das empresas de TV paga, preocupada com a queda de audiência na TV por assinatura, de 17% de maio de 2007 a maio de 2008, apesar do aumento de clientes.


‘Nos grandes centros urbanos, há um aumento nos congestionamentos que pode ter efeito na diminuição do tempo disponível para o lazer. Além disso, nota-se, empiricamente, que as pessoas têm permanecido mais tempo no trabalho’, afirma o relatório.


O estudo aponta também como prováveis causas da queda da TV paga ‘a ação das operadoras contra a pirataria’, as ‘constantes repetições de programas’ e o excesso de comerciais -que dobraram de 2005 para o final de 2007.


Impulsionada pela venda de banda larga pelas operadoras de cabo, a internet, reconhece o Ibope, já ‘rivaliza’ com os canais pagos, ao exibir seriados.


O Ibope sugere ainda que a TV, principalmente a aberta, estaria perdendo audiência para os DVDs. Em sua amostra, o número de aparelhos de DVD e de videocassete aumentou 37% em dois anos (2005/2007).


REPLAY 1


O próximo título da sessão ‘Vale a Pena Ver de Novo’, da Globo, deverá ser uma novela das oito. Na emissora, diante do sucesso de ‘Pantanal’ no SBT, cresce o apoio à reprise de novelas antigas, dos anos 80 e 90, algo que a cúpula ainda rejeita.


REPLAY 2


A inovadora ‘Que Rei Sou Eu?’, exibida às 19h em 1989, é a mais pedida, para reprise, na central de atendimento ao telespectador da Globo.


DÚVIDA


A Globo ainda não bateu o martelo sobre a exibição da microssérie ‘Capitu’. O ideal para a emissora seria apresentá-la no final de setembro, quando se completam cem anos da morte de Machado de Assis. Mas a tendência é emplacar como especial de fim de ano.


TORCIDA 1


O setor de pay-per-view da Globosat prepara-se para atingir ainda neste mês a marca de 500 mil pacotes vendidos da Série A do Brasileirão de 2008, 133 mil a mais do que 2007.


TORCIDA 2


O crescimento do pay-per-view é atribuído à mudança nas vendas (agora, o assinante paga mensalidade) e à transmissão de todos os jogos. Para comemorar, será lançado um livro de arte com fotos de torcedores.


TROCA


A Globo mudou o personagem que seria de Tony Ramos em ‘Caminho das Índias’. Shankar, pai de criação do intocável Bahuan (Márcio Garcia) será agora interpretado por Lima Duarte. Ramos fará Otash. Defensor dos costumes indianos, rivalizará com Duarte.’


 


Bruna Bittencourt


Lobão comanda auditório na MTV


‘Depois de apresentar o ‘MTV Debate’, às 22h, Lobão volta à tela do canal, às 23h30, para a estréia de ‘Código MTV’. Se no primeiro programa ele exercita seu talento natural para a discussão -e para alguma polêmica-, em ‘Código’ comanda um programa de auditório, com um pouco mais de humor. A proposta de ‘Código MTV’ é reunir nomes que dividam influência de um mesmo gênero e, entre as apresentações dos grupos, ‘decodificar os genes musicais das bandas brasileiras’, diz o apresentador. Na estréia, Lobão recebe o Faichecleres, de Curitiba, e o Cachorro Grande, de Porto Alegre, que bebem no ‘mod’. Abreviação para ‘modern’ (moderno), o gênero sessentista britânico tem entre seu maiores representantes o The Who. ‘Era um tipo de gangue de classe média baixa do Reino Unido que adorava ternos finos’, afirma Lobão, sobre a ligação do ‘mod’ com a moda, que as bandas brasileiras seguem à risca. O músico apresenta um vídeo explicativo, lembra do Ira!, também influenciado pelo gênero, e, no final do programa, toca com os dois grupos ‘My Generation’, do The Who, devolvendo à MTV um pouco da sua vocação original: a (boa) música.


CÓDIGO MTV


Quando: estréia hoje, às 23h30


Onde: na MTV


Classificação indicativa: não informada’


 


 


QUADRINHOS
Pedro Cirne


HQ mostra Zé do Caixão na cadeia


‘José Mojica Marins criou o Zé do Caixão para uma trilogia de filmes que começou com ‘À Meia-Noite Levarei sua Alma’, de 1964, seguiu com ‘Esta Noite Encarnarei no teu Cadáver’, de 1967, e continuou mais de quatro décadas depois, com o recém-lançado ‘Encarnação do Demônio’. Mas por onde o personagem andou nesse longo período? A resposta está na HQ ‘Prontuário 666 – Os Anos de Cárcere de Zé do Caixão’, publicada neste mês como um ‘interlúdio’ entre o segundo filme e o último. Como o subtítulo da HQ denuncia, Josefel Zanatas (nome do Zé do Caixão) esteve preso. E o clima da penitenciária em São Paulo que recebeu o personagem foi um dos desafios do quadrinista Samuel Casal, que deu vida à história. ‘Havia muitos elementos que eu tinha de utilizar’, conta o quadrinista gaúcho. ‘Por exemplo, Paulo [Sacramento, diretor de ‘Encarnação do Demônio’] me dizia que queria uma penitenciária brasileira, não norte-americana.’ Assim, foram pesquisados situações e termos usados em cadeias nacionais, como ‘lagarto’ -preso que assume a culpa por crimes cometidos por outros prisioneiros.


Visual antitropical


Além do clima da prisão, Casal deveria incluir na história elementos como o conceito visual do personagem (capa preta, cartola, unhas compridas) e suas fixações, como a busca pela ‘mulher perfeita’, capaz de gerar seu filho e, assim, proporcionar sua ‘imortalidade’. ‘Ele é visualmente riquíssimo’, afirma Casal. ‘Em um país tropical, de samba e alegria, aparece aquele personagem sombrio, soturno, único, que parece deslocado.’ O quadrinista buscava uma HQ que trouxesse, além da força do personagem, sua marca de autor. ‘Eu queria que tivesse não só a minha arte, mas a minha identidade’, conta. Casal escreveu o roteiro a partir de argumentos de Adriana Brunstein, que conversou com Mojica sobre a abordagem para a história. ‘A proposta é sintonizar o que se passa entre um filme e outro’, conta Mojica. A saga do Zé do Caixão não acaba com o lançamento do filme e de ‘Prontuário 666’. Afinal, conta Mojica, a HQ aborda 30 anos do personagem na cadeia, mas faltam os dez que ele passou no manicômio. ‘A idéia é contar essa história, pode ser uma HQ, no ano que vem. Talvez uma série para a TV. Tudo nasce assim: a partir de idéias.’


PRONTUÁRIO 666 – OS ANOS DE CÁRCERE DE ZÉ DO CAIXÃO


Autores: Samuel Casal (roteiro e arte) e Adriana Brunstein (argumento)


Editora: Conrad


Quanto: R$ 24 (120 págs.)’


 


 


FOTOGRAFIA
Thiago Ney


Ciclo de palestras debate a fotografia hoje no mundo


‘Por que fotografamos? É em torno dessa questão que a Semana da Fotografia 2008 percorre São Paulo de hoje a domingo. Com ciclo de palestras e uma exposição (veja texto nesta página), é o grande evento do gênero no Brasil.


A Semana terá como sede principal a Fnac Pinheiros (pça. dos Omaguás, 34, São Paulo; tel. 0/xx/11/3579-2000). A entrada é gratuita.


As conversas terão início às 18h, com lançamento da revista ‘FS/Clix’. Às 19h30, Lesley Martin fala sobre seu trabalho de curadora. Ela foi responsável por mostrar no NY Photo Festival uma exposição com artistas que trabalham com apropriação de imagens.


Amanhã, a artista Giselle Beiguelman comanda mesa sobre imagem na web 2.0 (às 16h30), enquanto a pesquisadora e fotógrafa inglesa Jane Maxwell contextualiza as produções contemporâneas brasileiras e britânicas, ao lado da fotógrafa Rochelle Costi (às 19h).


Eugenio Bucci, Maria Rita Kehl e Patricia Gouvea falam na quarta-feira sobre o tema ‘O Tempo na Imagem’. ‘As Misteriosas Formas de Beleza na Fotografia’ é o assunto da palestra do holandês Hans Aarsman, na quinta (19h). Mais informações: www.fotosite.com.br/ semana2008sp/index.htm.


Para preencher a Semana, foram contratados como curadores Pio Figueroa, Rafael Jacinto e João Kehl, trio que pilota a Cia de Foto. Essa produtora paulistana ficou bastante conhecida por realizar fotos extremamente autorais, mas assinadas com o nome da empresa, não com o nome do fotógrafo.


‘Só na fotografia não existe autoria coletiva. Por quê?’, questiona Figueroa. ‘Esse formato de troca é o mais produtivo tanto comercialmente como no desenvolvimento da linguagem’, afirma Jacinto.


Outro ponto que caracteriza o trabalho da Cia de Foto e que alimentará discussões no evento é a questão da finalidade da fotografia. ‘Queremos contradizer a idéia de que a foto só existe como registro, como documento histórico ou trabalho publicitário. Ela pode ser puro entretenimento, apenas pelo ato fotográfico’, diz Figueroa.


‘[A fotografia] Tem de se impor como linguagem. Ainda aparece bastante ligada a serviços.’ Para Figueroa, sua geração (de 30 e poucos anos) ‘cresceu com uma idéia glamourosa do fotojornalismo’.


‘A aplicação técnica ou de serviço aprisiona nossa noção de fotografia’, aponta Jacinto. ‘A foto brasileira ainda está ligada a uma concepção modernista, de destacar na obra o nome do autor individual.’’


 


 


Eder Chiodetto


Séries remetem à narrativa das imagens


‘Séries que remetem à constituição da fotografia como narrativa, em contraponto à idéia do instantâneo, do momento único flagrado na tentativa de esquadrinhar o mundo a partir do visor da câmera. Esse é um dos motes pelos quais podem ser decifradas as mostras ‘Casasubu’, de Vera Chaves Barcellos, e a coletiva ‘Provas de Contato’, que serão abertas amanhã, na galeria Vermelho, em São Paulo. Barcellos, artista gaúcha que vive em Barcelona, apresenta uma série de 83 fotos alinhadas num mosaico, reapresentando fachadas de casas à beira-mar, em Ubu, na cidade de Anchieta (ES). São casas construídas com toda sorte de materiais, sobras de outras edificações e desenho arquitetônico caótico. A partir da vasta coleção de imagens, Barcellos transgride o código da documentação para intervir sobre as fachadas, eliminando, sobrepondo e trocando elementos entre as casas, em hábeis manipulações pós-fotográficas. As casas reconstruídas convivem com outras, tal como foram fotografadas. Como em um jogo especular, o visitante perde as referências entre o que é real e o que é invenção. Tanto faz. Os elementos falsos se infiltram para legitimar a realidade caótica. A mesma dinâmica de trabalhos feitos em série transborda para ‘Provas de Contato’, que superlotou de obras a sala quatro da galeria Vermelho. Nela, o curador Eduardo Brandão selecionou trabalhos de cerca de 20 artistas da galeria. ‘Mais que trabalhos de fotografia, são sobre fotografia’, salienta, ao apontar trabalhos como os de Rosângela Rennó, Odires Mlászho e Jac Leirner, entre outros, que discutem mais a gênese da fotografia do que a representação feita a partir dela.


CASASUBU e PROVAS DE CONTATO


Quando: abertura amanhã, às 20h; de ter. a sex., das 10h às 19h, e sáb., das 11h às 17h; até 27/9


Quanto: entrada franca Onde: na galeria Vermelho (r. Minas Gerais, 350, tel. 0/xx/ 11/3257-2033


Classificação indicativa: não informada’


 


 


Silas Martí


Acosta cria naturezas artificiais em nova exposição em galeria


‘As últimas 15 folhas virgens de fórmica padrão pau-ferro, popular nos anos 60, estão no ateliê de Daniel Acosta. Filho de marceneiro, o artista gaúcho usa essas lâminas que imitam madeira em quase todas as obras que faz, agora com uma vontade figurativa. Estampam os mosaicos de fórmica que expõe na Casa Triângulo, em São Paulo, um leão, um tigre, um elefante e uma onça -todos copiados de um guarda-sol de um parente que partiu do Rio Grande do Sul em pleno inverno, com o adereço praiano debaixo do braço, para que Acosta pudesse fotografar os bichos aqui. ‘São pequenas naturezas que eu trago para dentro da cidade’, afirma Acosta. ‘Eu faço uma ironia com a idéia de ligar e encomendar uma paisagem portátil por telefone.’ Quem viu a última individual de Lia Chaia na galeria Vermelho talvez tenha a sensação de déjà vu ao ver essas obras. Lá, com fotografia, a artista também questiona a relação do homem com uma natureza domesticada. ‘A gente é muito amigo, temos uma sintonia forte’, reconhece Acosta. Mas os bichos de seu guarda-sol, depois de fotografados, são projetados na fórmica recortada a laser e formam um mosaico, em que cada detalhe corresponde a uma mancha de cor diferente. É um processo semelhante ao da cópia do desenho da embalagem de um bombom em ‘Burningscape’, de 2004. No entanto, agora, ao contrário da abstração de obras anteriores, são bichos reconhecíveis, numa montagem de cores que remetem à natureza codificada pela experiência da cidade -as cores artificiais têm nomes do tipo azul lago, verde bosque. ‘No lugar da madeira, que tem cheiro, poros e insetos, é resina artificial’, conta Acosta. Por isso, chama atenção o que mais se distancia da experiência urbana: o leão selvagem na pose clássica que adota em desenhos infantis e embalagens. Seria como o leão arquetípico da obra de René Magritte, o artista que, além de muitos leões, pintou um cachimbo e escreveu embaixo: ‘Isto não é um cachimbo’.


DANIEL ACOSTA E VALDIRLEI DIAS NUNES


Quando: de ter. a sáb., das 11h às 19h; até 6/9


Onde: Casa Triângulo (r. Paes de Araújo, 77, tel. 0/xx/11/3167-5621; livre)


Quanto: entrada franca’


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