COPA 2006
O gosto amargo da derrota, 3/07/06
‘Acordar de ressaca porque abusou da bebida já é ruim. Imagine quando a ressaca é por causa da derrota humilhante da seleção brasileira? O dia seguinte é sem dúvida o pior. Para o time e para o técnico nem tanto. Pior mesmo é para os milhões de torcedores brasileiros que estavam acreditando piamente no hexa.
Arrisco dizer que essa certeza da vitória começou logo depois do penta, em 2002. A própria mídia se encarregou de incendiar a esperança da torcida. Durante quatro anos, vitórias individuais dos jogadores no exterior iam confirmando nosso favoritismo. Uma brasileira que passava por Barcelona, pouco mais de um mês antes da Copa, ficou impressionada com o prestigio de Ronaldinho Gaúcho. Sua foto estava em outdoors, em jornais e revistas e panfletos distribuídos pela rua. O Barça acabara de conquistar mais um título. De longe, a torcida conterrânea vibrava com o sucesso de seus ídolos. E por unanimidade o Brasil já era considerado hexa campeão.
A conquista da Copa das Confederações, há um ano, com uma vitória esmagadora sobre a Argentina, com um placar campeão de 4 a 1, aumentou a sensação de que a nossa seleção era a melhor do planeta. Agora era só aguardar o momento supremo de ver a taça sendo levantada uma vez mais pelo Cafú e mandar imprimir a sexta estrela nas camisetas verde-amarelas. O clima do ‘já ganhou’ tomou conta de tudo e de todos.
Os dias que antecederam o início da Copa foi só festa. A Globo, com sua ‘exclusividade’, anunciava em todos os jornais e revistas que levaria para a Alemanha um exército de quase 200 pessoas entre produtores, técnicos e jornalistas, para proporcionar um espetáculo a altura do que ela chamava de ‘a maior Copa de todos os tempos’.
E os profissionais da emissora cumpriram à risca seus papéis, inflando o ego dos jogadores em reportagens e entrevistas massificantes, numa total alegria e intimidade entre jornalistas e atletas. O sorriso congelado dos apresentadores da Globo só mudou no dia da morte de Bussunda. No dia seguinte, voltaram a euforia e o ufanismo exagerado. A exclusividade da transmissão pode ser uma faca de dois gumes, pois a emissora vira referência e acabam sobrando para ela os respingos do fracasso.
A seleção foi mal no primeiro jogo contra a Croácia, sofreu para derrotar a Austrália e teve alguns lampejos contra o Japão. E finalmente a atuação medíocre contra Gana, apesar dos três a zero. Todo mundo estava pressentindo o desastre, até Pelé, menos o otimista Galvão Bueno. No final de um desses jogos, o locutor virou-se para a câmera e disse: ‘E então, gostou do jogo? No dia tal tem mais, aqui na Globo…prepare sua festa com seus amigos, sua família…’
O gosto amargo da derrota chegou ontem, um sábado vergonhoso para a seleção que era cantada em verso e prosa como a melhor de todos os tempos. A genialidade de Ronaldinho, os gols do Fenômeno, a pedalada de Robinho, a patada atômica de Roberto Carlos não funcionaram. Devem ter ficado esquecidos em seus clubes estrangeiros. Um a zero foi pouco para o vexame dado por nossos craques. Acho que o elegante Zidane que, aos 34 anos, à beira da aposentadoria, comandou o show dos franceses, ficou com pena da nossa desajeitada e desmotivada equipe.
O sonho acabou. Agora só resta esperar mais quatro anos para ver se a estrela brasileira volta a brilhar nos campos da África do Sul. Ninguém sabe quem vai ficar ou sair desse time, o que se sabe é que a torcida brasileira merecia mais respeito, mais garra e menos estrelismo dessa seleção de ‘estrelas estrangeiras’.’
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