Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Livro usa papéis da CPI do Banestado contra tucanos

Com 15 mil exemplares vendidos em menos de uma semana, segundo a editora Geração Editoria, o livro A Privataria Tucana, do jornalista Amaury Ribeiro Jr., revela documentos inéditos da antiga CPI do Banestado que apontam supostas movimentações irregulares de recursos por pessoas próximas ao ex-governador José Serra (PSDB).

Segundo os papéis da CPI – que investigou, entre 2003 e 2004, um esquema de evasão de divisas do Brasil –, o empresário Gregório Marin Preciado, casado com uma prima de Serra, utilizou-se de uma conta operada por doleiros em Nova York para enviar US$ 1,2 milhão para a empresa Franton Interprises, que seria ligada ao ex-diretor do Banco do Brasil Ricardo Sérgio de Oliveira.

Indicado por Serra para o Banco do Brasil no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, Ricardo Sérgio é apontado na obra como suposto articulador da formação de consórcios que participaram do processo de privatização, graças a sua influência na Previ, fundo de pensão dos funcionários do banco estatal.

O autor do livro foi indiciado no ano passado pela Polícia Federal por supostamente participar da violação do sigilo bancário de parentes e pessoas próximas a Serra, então candidato à Presidência. O objetivo seria a montagem de um dossiê contra tucanos. Ribeiro Jr. nega e acusa o deputado Rui Falcão (PT), então coordenador da campanha de Dilma Rousseff, de ter furtado dados sobre Serra de seu computador.

O jornalista diz, no livro, que Ricardo Sérgio controlava empresas em paraísos fiscais que teriam recebido supostas propinas de beneficiados pelo processo de privatização, entre eles o próprio Preciado, representante da espanhola Iberdrola na época em que a empresa comprou três estatais de energia no Brasil.

O elo entre a Franton Interprises e Ricardo Sérgio, segundo o autor, é uma “doação” de R$ 131 mil feita à empresa pelo ex-diretor do BB, em 1998. A operação é citada em documento da CPI do Banestado reproduzido no livro.

A mesma empresa Franton recebeu US$ 410 mil de uma empresa pertencente ao grupo La Fonte, de Carlos Jereissati, que adquiriu o controle da Telemar (atual Oi) durante a privatização da antiga Telebrás.

A CPI mista terminou em dezembro de 2004 sem que o relatório final fosse votado. Relator da comissão na época, o deputado José Mentor (PT-SP) afirmou que os dados que constam do livro fazem parte de um relatório parcial sobre Ricardo Sérgio, feito a pedido da Justiça Federal. “O repórter obteve os papéis na Justiça”, disse Mentor. “Jamais vazei documentos.” O presidente da CPI era o tucano Antero Paes de Barros, que se desentendeu com Mentor ao longo das investigações. Todos os documentos obtidos pela CPI, na época, foram enviados ao Ministério Público Federal.

Dívidas

Ao descrever laços entre personagens do processo de privatizações ocorrido nos anos 90, Ribeiro Jr. também recupera episódios já publicados pela imprensa, como a redução de dívidas de empresas de Marin Preciado no Banco do Brasil quando Ricardo Sérgio era diretor.

Entre 1995 e 1998, segundo o Ministério Público Federal, duas empresas de Preciado obtiveram desconto de cerca de R$ 73 milhões em um empréstimo que, originalmente, era de US$ 2,5 milhões. O valor final da dívida, segundo o livro, chegou a pouco mais de R$ 4 milhões.

“O autor não tem idoneidade nem qualificação para escrever o que foi apresentado”, disse o advogado Wagner Alberto, que defende Preciado. “Esses dois casos (remessas de recursos e desconto nas dívidas) já foram amplamente debatidos e analisados pela Justiça, que os considerou improcedentes. Recomendo que a imprensa analise os autos dos processos do Banco do Brasil e as decisões das instâncias em Brasília, Bahia, São Paulo e São Bernardo do Campo, algo que o autor não fez.” O Estado procurou ouvir a versão de Ricardo Sérgio e deixou recados em sua empresa, mas não houve resposta.

A Privataria Tucana também aborda a sociedade entre Verônica Serra, filha do ex-governador, e Verônica Dantas, irmã do banqueiro Daniel Dantas, na empresa Decidir.com, sediada em Miami. De acordo com o autor, a empresa foi transformada em uma offshore nas Ilhas Virgens Britânicas e, de lá, injetou recursos em uma empresa brasileira que tinha Verônica Serra como vice-presidente, a Decidir do Brasil.

Ribeiro Jr. afirma na obra que começou a pesquisar o entorno do ex-governador no final de 2007, quando recebeu do jornal onde trabalhava, o Estado de Minas, a incumbência de descobrir quem eram “os arapongas que estavam no encalço do governador de Minas, Aécio Neves”, que então disputava com Serra a indicação para concorrer à Presidência pelo PSDB. Segundo o repórter, os passos de Aécio eram seguidos por um grupo de inteligência a serviço de seu adversário paulista.

Procurado para comentar o conteúdo do livro, José Serra não se manifestou. Na terça-feira, em Brasília, ele qualificou a obra como “lixo”. O Estado também procurou o deputado Rui Falcão, sem obter resposta.

A Geração Editorial informou que 30 mil exemplares do livro devem chegar hoje às lojas.

Para PSDB, PT está por trás de livro que denuncia fraudes nas privatizações

Os tucanos começaram a reagir ao livro A Privataria Tucana, de autoria do jornalista Amaury Ribeiro Jr.. Lançado na semana passada, o livro associa o ex-governador de São Paulo, José Serra, a um suposto esquema de cobrança de propinas durante o processo das privatizações, no governo Fernando Henrique Cardoso, do qual Serra foi ministro. Depois do próprio Serra definir o livro como “lixo” e do senador Aécio Neves classificá-la como “literatura menor”, o partido e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso divulgaram notas.

A nota do PSDB, assinada pelo presidente da legenda, Sérgio Guerra, acusa diretamente o PT de estar por trás do livro. “A nova investida ocorre num momento em que o PT está atolado em denúncias de corrupção que já derrubaram seis ministros, e aguarda ansiosamente o julgamento do Mensalão, maior escândalo de corrupção de que se tem notícia na história do Brasil”, afirma a nota. Ainda segundo o texto, a participação de petistas tem sido constante na “fabricação de falsos dossiês”.

Para o PSDB, a obra como “uma eviana tentativa de atribuir irregularidades aos processos de privatização no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso e acusar o Partido e os seus líderes de participar de ações criminosas”. A nota diz ainda que nenhum órgão de controle constatou qualquer irregularidade em todo o processo.

“Infâmia”

A nota publicada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso no site Observador Político não faz ataques diretos, a não ser aoo próprio autor do livro. Ele definiu a obra como “infâmia” e lembrou o caso do “Dossiê Cayman”, em que ele mesmo foi acusado de possuir uma conta milionária na ilha. “Quero deixar registrado meu protesto e minha solidariedade às vítimas da infâmia e pedir à direção do PSDB, seus líderes, militantes e simpatizantes que reajam com indignação. Chega de assassinatos morais de inocentes. Se dúvidas houver, e nós não temos, que se apele à Justiça, nunca à infâmia”, conclui.

A íntegra da nota do PSDB:

“O PSDB repudia veementemente a mais recente e leviana tentativa de atribuir irregularidades aos processos de privatização no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso e acusar o Partido e os seus líderes de participar de ações criminosas.

As privatizações viabilizaram a modernização da economia brasileira, com centenas de bilhões de investimentos em serviços essenciais e a geração de milhares de empregos.

Todo o processo foi exaustivamente auditado pelo Tribunal de Contas da União, Ministério Público Federal e outros órgãos de controle, e nenhuma irregularidade foi constatada.

O livro agora publicado tem as mesmas características de farsas anteriores, desmascaradas pela polícia, como a “Lista de Furnas”, o “Dossiê Cayman” e o caso dos “Aloprados”. Seu autor é um indiciado pela Polícia Federal por quatro crimes, incluindo corrupção ativa e uso de documentos falsos.

Uma constante dessa fabricação de falsos dossiês tem sido a participação de membros e agentes do Partido dos Trabalhadores. Os que não se envolvem diretamente nas falsificações não têm pudor de endossá-las publicamente, protegidos, alguns deles, pela imunidade parlamentar.

A nova investida ocorre num momento em que o PT está atolado em denúncias de corrupção que já derrubaram seis ministros, e aguarda ansiosamente o julgamento do Mensalão, maior escândalo de corrupção de que se tem notícia na história do Brasil.

Serão tomadas medidas judiciais cabíveis contra o autor e os associados às calúnias desse livro.

Brasília, 15 de dezembro de 2011

Deputado SÉRGIO GUERRA

Presidente Nacional do PSDB”

A nota de Fernando Henrique Cardoso

A infâmia, infelizmente, tem sido parte da política partidária. Eu mesmo, junto com eminentes homens públicos do PSDB, fomos vítimas em mais de uma ocasião, a mais notória das quais foi o “Dossiê Cayman”, uma papelada forjada por falsários em Miami para dizer que possuíamos uma conta de centenas de milhões de dólares na referida ilha. Foi preciso que o FBI pusesse na cadeia os malandros que produziram a papelada para que as vozes interessadas em nos desmoralizar se calassem. Ainda nesta semana a imprensa mostrou quem fez a papelada e quem comprou o falso dossiê Cayman para usá-lo em campanhas eleitorais contra os tucanos. Esse foi o primeiro. Quem não se lembra, também, do “Dossiê dos Aloprados” e do “Dossiê de Furnas”, desmascarado nestes dias?

Na mesma tecla da infâmia, um jornalista indiciado pela Polícia Federal por haver armado outro dossiê contra o candidato do PSDB na campanha de 2010, fabrica agora “acusações”, especialmente, mas não só, contra José Serra. Na audácia de quem já tem experiência em fabricar “documentos” não se peja em atacar familiares, como o genro e a filha do alvo principal, que, sem ter culpa nenhuma no cartório, acabam por sofrer as conseqüências da calúnia organizada, inclusive na sua vida profissional.

Por estas razões, quero deixar registrado meu protesto e minha solidariedade às vítimas da infâmia e pedir à direção do PSDB, seus líderes, militantes e simpatizantes que reajam com indignação. Chega de assassinatos morais de inocentes. Se dúvidas houver, e nós não temos, que se apele à Justiça, nunca à infâmia.

São Paulo, 15 de dezembro de 2011

Fernando Henrique Cardoso

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[Daniel Bramatti é jornalista do O Estado de S.Paulo]