Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A cultura e o nariz de palhaço

Com a grande repercussão do BBB12, foi suscitada na internet uma entrevista realizada em 2011 por Vick Stern com o artista plástico Antonio Veronese onde é evidenciada a indignação do artista devido ao espaço dado no caderno Cultura, do site do jornal O Globo, para a matéria que abordava a masturbação das participantes do BBB. A fala do artista nos faz refletir sobre a massificação e decadência da cultura no Brasil, em todos os âmbitos.

Com a desculpa que o povo gosta de porcaria, vemos e ouvimos, a todo instante, programas e letras de músicas de gosto, digamos assim, duvidoso. Acompanhando esta tendência, recentemente o cantor Latino declarou que está criando a Música Popular Despirocada. O novo estilo foi batizado também pelo cantor de MPD, baseado na hipótese de que é isso que o povo gosta de ouvir. Isso para não falar de outros “sucessos” que invadem as nossas rádios e nossos ouvidos e que estão se alastrando feito praga em outros países. O curioso é que quando é oferecido gratuitamente um show como o do tenor italiano Andrea Bocelli, na Praça da Estação em Belo Horizonte, a população comparece em massa, uma vez que cerca de 100 mil pessoas se aglomeraram para ver o espetáculo.

Acredito que esta é a resposta da população para a desculpa esfarrapada que os programas e músicas de baixa qualidade cultural, produzidos em larga escala em nosso país, correspondem ao que o povo gosta. Ou seja, o povo muitas vezes gosta porque a ele não é dada a oportunidade de conhecer, por meio da TV aberta ou shows gratuitos, coisas de conteúdo que possibilitam uma ampliação de seu olhar sobre o mundo em que vive.

TV tem que ter contrapartida de interesse público

Não há nada demais em ouvir uma música com um ritmo dançante e com letra maliciosa. O que é demais é só ouvir apenas este tipo de música e incomodar ouvidos alheios, nos espaços públicos, com letras que não dizem nada e que muitas vezes colaboram para uma decadência musical com a utilização de termos obscenos e grosseiros e que, na maioria das vezes, se referem às mulheres de forma pejorativa.

Aos que gostam de reality show, também não vejo problema em “dar uma espiadinha”, o que incomoda é só ver isso na mídia, nas redes sociais e nas rodas de bate papo, o que piorou ainda mais com o suposto estupro ocorrido no BBB. E o que incomoda ainda mais é não poder ver neste horário nobre um programa de qualidade, que muitas vezes são exibidos bem mais tarde, quando a maioria da população, que tem que trabalhar cedo no outro dia, está dormindo.

Antonio Veronese ressalta que a televisão é concessão do Estado e tem que ter uma contrapartida de interesse público, mas infelizmente o que vemos é só circo. Com uma breve análise da programação televisiva, isso sem falar nas outras mídias, é fácil perceber que o artista plástico está correto em sua afirmação, sobre o circo que nos é dado todos os dias. Porém, triste é constatar que quem está usando o nariz de palhaço somos nós…

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[Márcia Peçanha é jornalista, bacharel em Direito e assessora de Comunicação no Unileste]