A discussão de um marco regulatório para o setor da comunicação depara com um episódio que pode influenciar ainda mais o debate entre ativistas e Ministério das Comunicações. O caso envolvendo o reality show Big Brother Brasil, da TV Globo, que foi palco de um suposto estupro cometido por um dos participantes, inclusive com depoimento à polícia, expõe a necessidade da ação de um órgão regulador para o setor, uma das frentes defendidas por ativistas para compor uma nova legislação.
O integrante do Coletivo Intervozes João Brant adverte que, se o país contasse com um conselho de comunicação, o órgão teria poder para aplicar imediatamente uma sanção ou mesmo uma punição pelo episódio à emissora de TV detentora da concessão pública. Segundo ele, o conselho poderia obrigar a uma possível retratação e dar também o direito de resposta a grupos de mulheres atingidas pela questão. “Para que tenha um efeito pedagógico. Não apenas punitivo”, pontua.
Uma nota conjunta divulgada pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), a Rede Mulher e Mídia e outras entidades pede a responsabilização da TV Globo sobre o suposto crime. Ademais, a nota sugere a necessidade de mecanismos de regulação democrática capazes de apurar e providenciar ações imediatas para lidar com infrações cometidas em concessões públicas de radiodifusão.
Os ativistas signatários da nota classificam a legislação atual sobre o setor como ineficiente e sem regras claras para apontar a responsabilidade de atos criminosos. Lamentam também a inexistência de qualquer tipo de monitoramento e fiscalização, o que poderia ficar a cargo de um possível Conselho Nacional de Comunicação ou órgãos reguladores.
Segundo Brant, o caso do episódio do Big Brother Brasil não é apenas um problema de afronta à moral familiar ou aos chamados bons costumes, mas sim uma conivência da emissora com o delito que pode ser considerado criminoso.
Ele lembra que há um artigo da atual legislação que regulamenta a concessão de rádio e TV que afirma que as concessionárias têm o dever de zelar pelo conteúdo moral de seus programas. “O decreto fala também em não transmitir programas que atentem contra o sentimento público, expondo pessoas a situações constrangedoras. Se isso (os artigos da lei) fosse aplicado, seria o caso de proibiir o BBB inteiro”, ressalta.
Responsabilização
“Sobre o caso BBB, independentemente do que apontarem as investigações criminais, é preciso apurar a responsabilidade da emissora. Essa é a mensagem que uma concessionária pública de TV manda para o país diante de um assunto tão sério como a violência sexual contra mulheres?”, questionou o deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP), em seu twitter.
Valente criticou também a pressão que a empresa exerce sobre parlamentares. “Nós poucos que tentamos fazer isso no Congresso somos atropelados pelo lobby das emissoras. Mas é preciso enfrentar essa pauta já”, ressaltou o deputado, que faz parte da Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão e o Direito à Comunicação.
Em nota à Rede Brasil Atual, o Ministério das Comunicações afirmou que para haver punição em casos considerados abusos de exercício deve-se levar em conta a “gravidade da falta, os antecedentes da entidade faltosa e as possíveis reincidências nessa mesma falta”. No caso em que a apuração do ministério resulte em processo de cassação é necessário, então, que a Advocacia Geral da União (AGU) entre com ação da Justiça e somente após a decisão a pena poderá ser aplicada.
Na quarta-feira (18/1), o próprio Ministério das Comunicações e também a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), ligada ao ministério, afirmaram que irão apurar as imagens e debater se houve abuso por parte da Globo. João Brant, entretanto, avalia que apenas “analisar fitas é insuficiente. O ministério deveria agir mais energicamente”.
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[Virginia Toledo é jornalista]