Thursday, 26 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Jornalistas ou carniceiros?

Mensalão já virou show há muito tempo. Já tem gente cobrando ingresso para assistir ao maior clássico da política nacional: governo (PT) x oposição (todos os outros partidos políticos que não fazem coligação com o PT). Digo clássico porque é jogo de futebol. Tem juiz, jogadores, e torcida! O Supremo Tribunal é o Maracanã. A única coisa que falta, como no esporte, é craque. E as coincidências não param por aí.

Lendo a edição de terça-feira (7/8) do jornal Folha de S.Paulo, percebi um fato inusitado: todos os colunistas da página 2, seção Opinião, dedicaram suas colunas ao mensalão: Hélio Schwartsman, Eliane Cantanhêde, Carlos Heitor Cony e Vladimir Safatle. Até aí, tudo bem. O que me chamou atenção foi a repetição das opiniões dos colunistas. Todos dividiam as mesmas perspectivas; ninguém ousou abordar o mensalão de uma forma diferente. Sequer trouxeram algum fato novo. Ou, pelo menos, um detalhe que nós, leitores, não tenhamos visto, uma fala, um furo na roupa, uma metáfora bem elaborada, qualquer coisa que tirasse as colunas da sua imobilidade diante dos fatos, e justificasse ter comprado esse jornal, e não outro, mais barato, escrito por estagiários inexperientes, que custam quatro vezes menos. É opinião, perspectiva subjetiva, necessita de uma dose de criatividade. Um dos colunistas é escritor renomado. Mas, não. Eles preferiram mais do mesmo.

A página 2 da Folha de S.Paulo, hoje, bem poderia se chamar “Pleonasmos de uma elite preguiçosa”. Ou, mais poético: “Ecos do vazio”. Deu na televisão, ele abusam dos eufemismos e publicam, ou são publicados (tanto faz).

Outros casos

Mais ridículo ainda é ver jornalistas experientes caírem em armadilhas tão óbvias, que a força da experiência na profissão já deveria tê-los ensinado a fugir. A opinião pública (se é que ela existe, pois acho que é outra paranoia dos meios de comunicação – aqui – para justificarem outra paranoia: a sua) e a mídia oficial julgam o “mensalão” como o maior caso de corrupção da história do Brasil. Vladimir Safatle afirmou isso hoje em sua coluna no Folha.

Após sete anos de investigação e mais de 50 mil páginas de processo com inquirição de cerca de 600 testemunhas, peritos oficiais conseguiram mapear o tamanho do mensalão, esquema político de pagamento de propina a parlamentares da base do governo Lula. O chamado valerioduto, que o Ministério Público diz ter sido comandado pelo ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu, desviou pelo menos R$ 101,6 milhões. O número foi apurado por investigadores da Polícia Federal, do Ministério Público Federal e do Tribunal de Contas da União (TCU) (O Globo, publicado por Fábio Góes, em 29/07/2012).

Brasileiro não tem memória.

Só para citar dois casos: O “caso Jorgina de Freitas”, uma ex-advogada brasileira, procuradora previdenciária, que organizou um esquema de desvio de verbas de aposentadorias em 1992. A ex-procuradora do INSS foi condenada em 1992 por comandar uma quadrilha que desviou 310 milhões do referido órgão (dos quais apenas 82 milhões foram reavidos). Podemos citar também o “esquema PC”, que movimentou mais de US$ 1 bilhão dos cofres públicos, também na década de 90. Comparando os casos de desvio de verba, o mensalão não chega nem no chulé desses outros dois.

O problema do esquecimento

Para mim, ficou claro: os abutres encontraram uma carniça mais rechonchuda. Lembrem-se que a carniça que mais se comia era o caso “Cachoeira”, que julgo ser mais podre. Mas, que a essa altura, nem fede mais. Afinal, brasileiro não tem memória!

Obs.: O caso PC causou até o primeiro processo de impeachment da América Latina, em 1992. Um mensalão está sendo explorado por uma mídia raquítica, que vive sua crise, e atingiu seu paroxismo atávico.

Sugiro que os cursos de História integrem Comunicação – com especialização em jornalismo como matéria. Ia me esquecendo: o caso não é de conhecimento, é de memória. Então que inventem nos cursos de Jornalismo uma nova matéria: Memoração da História política do Brasil. Assim, ameniza o problema do esquecimento e a maioria dos alunos continua sem precisar aprender! Não é assim desde o ensino fundamental?

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[Marcos Antonio Improta Sampaio é blogueiro, estudante de Jornalismo e poeta, Mogi das Cruzes, SP]