Faz 50 anos que o cientista e divulgador de ciência José Reis(1907-2002), um dos fundadores da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, escreveu os conselhos a seguir. Ele não o fez na forma de conselhos propriamente ditos, mas como críticas e recomendações contidas no prefácio do livro didático Iniciação à ciência, de E.N da C. Andradee Julian Huxley, do qual foi o tradutor.
Publicada no país em 1962 pelo então Ministério da Educação e Cultura, a obra foi uma importante iniciativa para melhorar o ensino de ciência no país. Surpreende ainda hoje por sua “linguagem simples, desprovida de terminologia especializada”, como disse José Reis, e por sua concepção de ensino de ciência baseada no “experimentar para aprender”.
Para quem se propõe a ensinar e divulgar ciência e tem o livro – uma raridade – à mão, vale a pena ler o texto de José Reis. Vale também sempre ter em mente as suas recomendações preciosas para o dia a dia em sala de aula.
Conheça abaixo algumas delas:
Incentivar a dúvida e a curiosidade
"Ciência é, no fundo, originalidade, é iniciativa de investigar.”
Incutir a ideia de que ciência é processo
“Menos que o simples propagar de um corpo estático de conhecimento – que é o que entre nós se costuma fazer, e ainda assim mal – interessa incutir no aluno, pela experiência, a ideia de ciência como ‘processo’.”
Permitir a aproximação com a natureza
“[…] O que na verdade importa não é conhecer exemplos – não é citar a sapucaia, em vez do carvalho, que é europeu; ou a onça em lugar do tigre; ou um minério brasileiro em lugar do alemão –, mas aproximar o estudante da natureza e fazer com que ele aprenda, naturalmente, a usar o método científico na solução dos problemas…”
Tornar natural o uso do método científico na solução de problemas
"[…] Aprender a usar o método científico é aplicá-lo. Não apenas ouvir o mestre explicar em que ele consiste.”
Apresentar a ciência que interessa à formação do homem, à estrutura de seu pensamento
"Muito mais sentido tem em sua execução familiarizar com o hábito de pensar cientificamente do que sobrecarregar com ‘ideias inertes’, isto é, com fatos cujo sentido geral ele [o ensino] não penetrou.”
Partir da experiência diária, do fato, do concreto, dos fenômenos locais
“Não adiantar [ensinar] nenhum conceito sem antes haver chegado a ele pela experiência.”
Usar linguagem despida de termos técnicos, despojada de solenidades
“O uso de terminologia rigorosamente específica e técnica é para especialista. Insistir nela, no ensino elementar, é favorecer a tendência para confundir o nome com o conhecimento da coisa.”
“O que verdadeiramente importa é conhecer as coisas e não as palavras com que tantas vezes douramos a própria ignorância.”
"Não se deve permitir que o excesso de precisão prejudique a naturalidade do ensino."
“A linguagem pode parecer até imprecisa, mas precisa ser viva.”
Não pecar por excesso de pormenores
“[…] O professor precisa ter a coragem de ser simples, de suprimir a matéria que não lhe pareça fundamental.”
“[…] Ensinar pouco não é ensinar mal, e nem ensinar muito é ensinar bem. O que importa é ensinar bem; e ensinar bem, num determinado momento do aprendizado, é ensinar precisamente aquele quantum que o aluno não se sente disposto a esquecer passado o exame.”
Ensinar a admirar-se diante das coisas
"Quanta coisa se pode observar diretamente com os olhos.”
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[Vera Rita da Costa, do Ciência Hoje/ SP]