No começo, era uma grande idéia. Exortar os fiéis a entrarem com ações em juizados especiais contra uma jornalista que pratica o preconceito religioso em suas matérias. E melhor: fazer isso pelo país todo, de forma a impedir que a ré possa estar em mais de uma audiência ao mesmo tempo. Com isso, alguns processos seriam julgados à revelia, e a jornalista ficaria intimidada. Deixaria de escrever besteiras e tal.
Pois essa foi a estratégia montada pela Igreja Universal do Reino de Deus em reação a reportagens que a repórter Elvira Lobato vinha publicando desde o ano passado na Folha de S.Paulo (para entender, clique aqui).
Semana passada, alguns movimentos no tabuleiro contribuíram para a estratégia começar a fazer água. Primeiro, a suspensão de 22 dispositivos da Lei de Imprensa pelo STF; e segundo, a derrota de algumas ações judiciais impetradas por fiéis.
Por partes.
O que manda a lei
A decisão – provisória! – do STF não atinge diretamente a ofensiva da Universal contra a Folha, A Tarde e o Extra. Não atinge porque o rebanho de Edir Macedo entrou com ações que têm como base não a Lei de Imprensa, mas os Códigos Civil e Penal. Logo, com o canetaço do STF, as ações não foram arquivadas. No entanto, o golpe é indireto: a liminar do STF chama a atenção da sociedade para a mídia, e mais simbolicamente para a liberdade de imprensa. Veja o que alegou o ministro do STF, Carlos Ayres Britto, que assinou o despacho:
‘A imprensa e a democracia são irmãs siamesas. Por isso que, em nosso país, a liberdade de expressão é a maior expressão da liberdade porquanto o que quer que seja pode ser dito por quem quer que seja.’
O que quero dizer é que o lance do STF ressalta a importância e o papel social que podem desempenhar os meios de comunicação na democracia. (O Estado de S.Paulo preparou um material bem didático sobre o que está sendo discutido com a Lei de Imprensa; clique aqui para ler. Aproveite e leia a esta matéria, aberta parcialmente para não-assinantes.)
Por outro lado, esses dias, mais duas ações de fiéis contra a Folha caíram por terra. Uma no Acre e outra no Paraná. E ambas foram rejeitadas por um argumento muito semelhante que pode ajudar a derrubar todas as demais ações: os fiéis que moveram as ações não têm legitimidade nelas. A matéria de Elvira Lobato não ofendeu os fiéis, mas se concentrou na forma como a Universal vem construindo seu imenso patrimônio e influência política.
Trocando em miúdos: os fiéis se queixam de algo que não aconteceu, logo a ação mingua… A jurisprudência está aí. Basta que outros juízes que não caem no joguinho universal sigam o que manda a lei. (Para se ter uma idéia, cerca de 60 ações foram ajuizadas pelo rebanho de Macedo em todo o país).
Ruim de trato
Na semana passada, os meios de comunicação ligados à Universal (Portal Arca Universal e Rede Record, por exemplo) alardearam declaração do presidente Lula que surtiu como uma defesa da igreja: ‘As pessoas escrevem o que querem, depois ouvem o que não querem’. Nenhuma novidade nisso: só é preciso lembrar que o vice de Lula, José Alencar, deixou o PL para entrar no Partido Republicano Brasileiro. Adivinhe de quem é o partido? Da Universal.
O que vem a seguir?
1.
A Universal vai perder mais ações nas próximas semanas.2.
Outras ações devem ser impetradas, agora com nova sustentação, tentando dar nova força à ofensiva.3.
Folha de S.Paulo e os demais réus vão dar uma tripudiada com suas vitórias parciais.4.
No Congresso Nacional, o PDT vai capitalizar forças para derrubar de vez a Lei de Imprensa.5.
Se o PRB for esperto, vai ser aliado de Miro Teixeira. (Com isso, traz o PDT na sua cruzada…)6.
O PT – paquidérmico e ruim de trato com a mídia – vai ficar olhando a coisa e coçando o queixo.******
Jornalista, doutor em Comunicação e professor de Legislação e Ética Jornalística da Universidade do Vale do Itajaí (Univali), responsável pelo sítio Monitor de Mídia