Leia abaixo a seleção de terça-feira para a seção Entre Aspas. ************ Folha de S. Paulo Terça-feira, 18 de maio de 2010 LIBERDADE DE IMPRENSA Reuters Obama eleva pressão sobre países censores ‘O presidente dos EUA, Barack Obama, promulgou ontem lei que aumenta a pressão sobre os países onde há risco para a liberdade de imprensa. O texto foi batizado de Lei Daniel Pearl de Liberdade de Imprensa em homenagem ao jornalista do ‘Wall Street Journal’ que foi sequestrado e decapitado por insurgentes em 2002, no Paquistão, enquanto realizava uma investigação sobre a rede terrorista Al Qaeda. Com a nova lei, o Departamento de Estado americano fica obrigado a listar, no seu relatório anual sobre a situação dos direitos humanos, as nações onde há ameaça à liberdade de informação. Serão listados também os países onde governos participam da repressão a jornalistas.’ TODA MÍDIA Nelson de Sá Obama reluta ‘A reunião de pauta do ‘New York Times’, que agora é postada em vídeo, priorizou ontem pela manhã o acordo no Irã _e descobrir a posição dos EUA. No mesmo ‘NYT’, no fim do dia, em reportagem de oito correspondentes, ‘o acordo negociado por Turquia e Brasil espelha o acordo com o Ocidente em outubro, mas está longe de ficar claro se o governo Obama vai concordar com ele agora’. Fechando o texto, ‘se tiver êxito, o acordo vai ampliar e sublinhar a ascensão da Turquia e do Brasil como forças globais’. O ‘Financial Times’, otimista, apoiou o acordo em editorial, afirmando que pode bem se mostrar a saída para o impasse com o Irã. Já o site do ‘Washington Post’ destacou ‘análise’ crítica, ‘Irã cria ilusão de avanço’, e só. E o ‘Wall Street Journal’ adiantou editorial crítico não só a Brasil, Turquia e Irã, mas aos EUA. Diz que Lula ‘triangulou sua própria solução diplomática’ e, ‘em seu primeiro pôquer de aposta alta, a secretária Hillary Clinton deixa a mesa vestindo só um barril’. POR QUE O BRASIL O Council on Foreign Relations, de NY, a instituição mais influente sobre a política externa dos EUA, destacou no fim do dia a avaliação de que o ‘incompleto’ acordo ‘põe EUA e seus parceiros europeus em situação difícil’, mas ‘a escolha certa para os EUA no fim pode ser receber bem a troca de combustível anunciada’. No segundo destaque do CFR, o acadêmico brasileiro Matias Spektor postou ‘Por que o Brasil é o mediador’, dizendo que ‘a visão em Brasília é que os problemas que antes podiam ser ignorados agora exigem resposta’, num momento em que se ‘redefinem seus interesses nacionais, como é normal para potências em ascensão’. VIRAL A ‘Foreign Policy’ postou nove fotos de Lula fotografando jornalistas e outros em eventos globais e perguntou, aos internautas, ‘o que está acontecendo?’ PARA SEMPRE? A ‘Foreign Policy’ deu três análises sobre o acordo, com imagens de Lula e do primeiro-ministro da Turquia e chamadas como ‘A vingança das potências médias’ e ‘Declínio e queda dos parceiros da América?’. Na terceira e mais destacada, o analista David Rothkopf, sob o título ‘O Brasil e a Turquia acabaram de mudar o Oriente Médio para sempre?’, avalia que a ação pode ter derrubado anos de ‘escolha binária’, entre EUA e a União Soviética e depois EUA e a ‘comunidade internacional’, no conflito para definir os rumos da região. VALE TENTAR… Em posts no ‘Financial Times’, os correspondentes Jonathan Wheatley e David Gardner avaliaram que ‘tudo pode se dissolver’, mas ‘a iniciativa do Brasil pode também evitar guerra com o Irã. Vale a tentativa’. RIR POR ÚLTIMO Em post na Al Jazeera, a correspondente para América Latina Lucia Newman avalia que, sob ataque da cobertura nos EUA e no próprio Brasil, Lula arrancou um ‘gesto de boa vontade’ do Irã -e pode vir a ‘rir por último’. ‘Merece aplausos tanto a iniciativa brasileira como a coragem do ministro Celso Amorim. Todos eles só merecem aplausos. Não há dúvida de que [Lula] desempenhou um papel muito importante. Não há dúvida de que é um grande momento da diplomacia brasileira.’ Do ex-ministro RUBENS RICUPERO, em entrevista ao Terra. EM CAMPANHA O ‘JN’ destacou o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, candidato à reeleição e adversário de Lula, que ‘elogiou esforço do Brasil, mas disse que há falta de confiança no Irã’ O SOCIALISTA O ‘Guardian’ perfilou Romário, destacando que ele agora ‘joga pelo poder político’, candidato pelo PSB e tendo Lula por ídolo político, pois ‘mudou a história do Brasil’ ‘AHEAD’ Sobre a pesquisa Vox Populi do final de semana, no enunciado da agência Reuters, ‘Rousseff à frente’. Da Bloomberg, ‘Rousseff supera Serra’. Da Xinhua, ‘lidera pesquisa’. Também sobre a pesquisa Sensus de ontem, na Dow Jones, ‘Rousseff lidera’. NUNCA ANTES Na manchete do portal iG ao longo do dia, pouco atento ao acordo no Irã, ‘Geração de empregos bate recorde’. Foi ‘o maior volume da história em um mês’ e também ‘o melhor quadrimestre da história’. No G1 da Globo, depois, também em manchete, ‘Criação de empregos bate recorde em abril’.’ CAMPANHA Ana Flor No rádio e na TV, Dilma evita tema polêmico ‘A pré-candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, fez uso ontem da tática de quem quer evitar o confronto e esquivou-se de tomar posição sobre temas espinhosos, como redução da jornada de trabalho, Previdência e a volta de um imposto, como a CPMF, para a saúde. Em São Paulo, Dilma concedeu entrevista pela manhã à Rádio CBN. À tarde, foi ao ‘Programa do Ratinho’ (SBT). Pela manhã, afirmou que uma reforma ampla da Previdência ‘apresentou armadilhas’ em outros países. Ela defendeu ‘ajustes sistemáticos’. A prudência também dominou sua fala ao ser questionada se era a favor da redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais. Dilma disse que a decisão não cabe ao governo federal, mas deve ser discutida entre movimento sindical e empresários. Chegou a dizer que o governo ‘impor uma política’ é ‘voltar à década de 30’. ‘Eu não posso apoiar nem não apoiar porque eu não acredito que isso seja matéria governamental’, disse a petista. Ao falar da saúde, Dilma lamentou a perda de cerca de R$ 40 milhões em recursos para a área que provinham da CPMF -imposto extinto pelo Congresso-, mas negou que proporia a volta da cobrança. Ao ser questionada se era possível aumentar a verba da saúde sem aumentar a carga tributária, disse: ‘A gente deve tentar, não sei se é possível’. À tarde, entretanto, ao falar para o público popular do ‘Programa do Ratinho’, comprometeu-se, se eleita, a simplificar impostos, reduzir a carga tributária sobre energia, remédios e alimentos, além de eliminar tributos da folha de pagamento, um incentivo a criação de empregos e investimentos. Pela manhã, a candidata rebateu a afirmação do principal adversário, o tucano José Serra, de que o PT ‘aparelhou’ o governo. ‘Aqui em São Paulo, o presidente da Agência de Transportes é um deputado federal do PSDB [o ex-deputado Sampaio Dória]. Nem por isso significa que a agência está aparelhada’, disse. Ratinho brincou com o novo corte de cabelo de Dilma. Disse que o cabeleireiro ‘consertou’ o cabelo da ex-ministra. O programa foi ao ar ontem à noite. ‘Esse cabelo bonito da senhora que não tava tão bonito assim? É aquele japonês chato lá do salão? Eu conheço ele. Ele que consertou esse cabelo. Esse cabelo ficou muito mais bonito’, disse o apresentador.’ NEGÓCIOS Reuters compra a ‘Revista dos Tribunais’ ‘A agência de notícias Thompson Reuters comprou a brasileira ‘Revista dos Tribunais’. As empresas não divulgaram detalhes do negócio. ‘A ‘Revista dos Tribunais’ é um forte complemento para nosso portfólio global’, disse Gonzalo Lissarrague, vice-presidente sênior da Reuters, a agências de notícias. De acordo com o empresário, a aquisição da publicação vai conferir vantagem competitiva à agência de notícias ‘no crescente mercado de informação jurídica no Brasil’. A publicação especializada tem 98 anos e é líder do segmento no país.’ TELEVISÃO Andréa Michael Para fechar com a Globo, Fiuk quer tempo livre para música ‘Há pelo menos três semanas a Globo negocia a contratação de Fiuk para o elenco permanente da emissora. O acerto está difícil porque Filipe Galvão, protagonista da 15ª temporada de ‘Malhação ID’, não abre mão de garantir tempo livre para se dedicar à banda Hori, da qual é vocalista. ‘A música é a prioridade dele. Teria que ser muito compensador. Foi com a música que tudo começou, é claro que a TV ajudou – e ele é extremamente agradecido-, mas o sucesso viria’, diz o empresário dele, César Giunti. Conforme o empresário, a Globo, que apresentou a proposta de um contrato por dois ou três anos, desenvolve para Fiuk a ideia de uma série voltada para adolescentes. Algumas alternativas de contrato estão em discussão, segundo Giunti. Por exemplo: fazer negociações por cada trabalho e garantir as sextas e as segundas livres para que o artista possa viajar com a banda. Também é importante para o ator e cantor garantir em seu contrato que poderá estar em outras emissoras com a Hori. Mas, de tudo que está posto, essa é a negociação mais difícil, reconhece Giunti. O contrato de Fiuk, que termina em junho, inclui Malhação e um quadro novo no ‘Fantástico’. Ele será um de cinco jovens que terão seus sonhos, dúvidas e dilemas revelados em uma nova atração do programa, ainda em produção. GLADIADOR 1 A Globosat comprou os direitos da série ‘Spartacus: Blood and Sand’, recorde histórico de audiência no canal Starz (EUA). É baseada no personagem original do longa de 1960 dirigido por Stanley Kubrick. O novo formato mistura o ambiente de ‘Gladiador’ (2000) e os efeitos de ‘Matrix’ (1999). GLADIADOR 2 Será exibida no cana lGlobosat HD em agosto. A ideia é aproveitar o maior número de telespectadores com acesso a aparelhos HD – efeito da Copa. COCORICÓ Depois de 13 anos de programa na TV, 62 mil espectadores no teatro e outros 25 mil nos cinemas, a turma do ‘Cocoricó’ lança o primeiro CD da temporada na cidade. Pela Vidal Record se Cultura Marcas. PÂNICO EM 3D Está confirmado. A Rede TV! fará no próximo domingo a primeira transmissão ao vivo em 3D do país. Será com o ‘Pânico na TV!’, como informado pela coluna na semana passada. LADEIRA 1 ‘Legendários’ (Record) teve em 15/5 seu pior sábado, com seis pontos no Ibope (cerca de 360 mil domicílios ligados na atração na Grande SP). Na estreia, em 10/4, marcou dez pontos. Nem a entrevista com o jogador Neymar salvou. LADEIRA 2 Melhor sorte não foi a de ‘SOS Emergência’ (Globo) anteontem, após o ‘Fantástico’. Registrou 13 pontos (780 mil domicílios ligados no programa na Grande SP), em seu pior domingo. Na estreia, em 4/4, conseguiu 16 pontos.’ Mônica Bergamo Sotaque ‘A TV Globo e a emissora portuguesa SIC firmaram um contrato de coprodução de dramaturgia. O acordo será de dois anos e prevê duas novelas. A primeira, com o nome provisório de ‘Caminho da Felicidade’, terá supervisão de texto de Aguinaldo Silva e está em fase de pré-produção. A trama será gravada em Portugal com atores daquele país.’ ************ O Estado de S. Paulo Terça-feira, 18 de maio de 2010 TELEVISÃO Cristina Padiglione Paixões a toda a velocidade na nova novela da Globo ‘A principal novela do horário nobre da TV virou a página na noite de ontem e não demorou a explicitar quem é do bem, quem é do mal, quem é ninfomaníaco, quem é dissimulado, quem será algoz e quem será vítima pelos cento e tantos capítulos a seguir. Para a Globo, apressada em estancar a sangria de audiência, a estreia de Passione foi perfeita. A nova história de Silvio de Abreu começou com competência para alimentar o imediatismo demandado por uma plateia cada vez mais dispersa entre as mídias. Árdua, mas não impossível, será a tarefa de manter esse ritmo por quase seis meses de programa diário. Conspiram, para tanto, flashes da cidade em movimento. E, no quesito cartões postais paulistanos manjados, um adendo: a ponte Estaiada, que já é cenário dos telejornais locais da Globo, vem se juntar a Masp e cercanias da Paulista para legendar a cidade em cena de novela. Mas, justiça seja feita, a diretora Denise Saraceni não se acanha em estampar um pouco de caos na tela ficcional e nos brinda com imagens aéreas das Marginais em hora de rush. O tempo urge. Se um enterro duraria pelo menos uma semana em novela de Manoel Carlos, anteontem o funeral de Mauro Mendonça foi consumado em menos de um bloco. Ainda que denuncie premência em dizer a que veio, o início de Passione não tropeçou no desfile caricatural. O espectador só toma conhecimento de que Mariana Ximenez não é aquele anjo de candura (ainda que sempre convenha suspeitar de gente tão angelical) porque a câmera nos guia por todos os passos da personagem. Se a vida real fosse assim, um grande Big Brother que nos brindasse com imagens alheias em momentos diversos, é bem capaz que a gente desse de cara com tipos como o de Maitê Proença, que compensa o mau humor do marido caçando belos moços por aí para fazer sexo. Com todo respeito aos cínicos, o prazer em constatar a dualidade humana garante bom entretenimento. Elenco de luxo. A endossar a maestria em apresentar seu enredo em poucos minutos, Passione deu-se ao luxo de botar em cena a maior população de grandes atores nacionais por metro quadrado. Lá estavam Fernanda Montenegro, Mauro Mendonça, Cleyde Yáconis, Leonardo Villar, Tony Ramos, Aracy Balabanian, Elias Gleiser, Daniel Oliveira, Irene Ravache e Leandra Leal, só para citar uns e outros. É cortando da Pauliceia para os campos toscanos que encontramos Tony e Aracy prontos para comover no sotaque da Bota. Não que a irrepreensível performance de ambos seja suficiente para anular nossa lembrança do grego Nikos e da Dona Armênia, criações do mesmo Silvio de Abreu para as mesmas criaturas em folhetins do passado. O que se há de fazer? Há uma proximidade inevitável na dramaticidade presente no dia a dia de gregos, troianos, armênios e italianos, prego! Para pincelar cores mais fortes à dor de Totó, personagem de Tony, a zia vivida por Aracy nos avisa que lá vai ele afogar suas mágoas no ‘bar do napolitano’, com todos os ecos a que uma cantoria do gênero tem direito. A sequência traz o reflexo óbvio do autor cinéfilo que assina Passione: num momento Cinema Paradiso (cujo protagonista também atende por Totó), cenas clássicas de cinema italiano são projetadas em plena pracinha interiorana, ao ar livre, e o Totó de Tony se esvai em lágrimas ao ver Sofia Loren e Marcelo Mastroianni no telão, até o filme ser interrompido por uma chuva cenográfica repentinamente torrencial. A alta tecnologia do Projac às vezes esbarra no exagero. Para arrematar, a abertura passeia pelos ferros consagrados por Silvio de Abreu no passado da sucateira Maria do Carmo (Regina Duarte/Rainha da Sucata) e do pedreiro José Clementino (Tony Ramos/Torre de Babel). Assim, um emaranhado de pneus, porcas e parafusos se redesenha, graças aos efeitos da computação gráfica, para fechar o nome Passione. O nome da novela é honrado por cenas bem mais calientes do que as recatadas novelas vistas nos últimos três anos, provável obra dos efeitos provocados pelas regras da classificação indicativa. Lá estão Reynaldo Gianecchini e Mariana Ximenez sugerindo que também é possível se divertir nas encostas do feioso Minhocão. A audiência foi baixa: com 37 pontos de média em São Paulo, segundo o Ibope, rendeu menos que a estreia de Viver a Vida, dona de 43 pontos. Faça-se a ressalva de que Viver a Vida também deixou para sua sucessora o pior ibope do histórico de novelas do horário.’ Filipe Serrano ‘Lost é uma estrutura’ ‘Para a jornalista Fernanda Furquim, que acompanha séries desde os anos 70 e começou a trabalhar com o tema em 1995, o principal êxito de Lost é ter mantido o mistério por tanto tempo e ter aproveitado as tecnologias do momento para fazer ações paralelas, tudo misturado a uma trama extremamente complicada para a televisão aberta. Fernanda Furquim edita o blog Revista TV Séries, originado da primeira revista sobre o tema no País, criada por ela, — diz não ser uma fã de Lost, apesar de gostar da série — e é autora do livro As Maravilhosas Mulheres das Séries de TV. Abaixo, a entrevista completa. Hoje existem muitos sites e blogs sobre séries, não só Lost, e maioria surgiu depois de Lost. Por que isso aconteceu? Eu costumo dizer que, pelo menos no Brasil, Friends e Lost foram as duas séries que alavancaram o fandom brasileiro. Já existia um público grande de série, mas eles não costumavam a se manifestar. Primeiro, porque não existia nenhum veículo pra se manifestar, e segundo porque muitas vezes não tinha motivo para se criar esse auê. Quando o Friends começou, eram muitos adolescentes que assistiam. E adolescente sempre fez barulho quando se une e sai pra conversar. Eles eram o público alvo. Então dificilmente ia passar despercebido. E quando veio o Lost, uniu também muitas pessoas mais velhas por causa do tema e da proposta. No Friends era mais adolescente. Lost é uma estrutura, uma abordagem maior. Mas de certa forma o mesmo público que assistia a Friends passou a ver Lost. É, o público envelheceu. Mas independente desse pessoal, a série também agregou outros públicos, de 40 anos para cima. Por isso costumo dizer que são as duas séries que alavancaram o formato de seriado no Brasil. Algum elemento fez com que Lost abrangesse todas essas faixas de idade? Independente de Lost, abranger todas as idades, todas as faixas culturais e diferenças, é difícil na TV aberta. É como um funil. Se você está em cima, atinge mais gente. Se começa a verticalizar a história, vai perdendo. Tanto é que Lost foi perdendo a audiência. Ele tem fama, é popular, porque foi mais conhecido na primeira temporada e herdou essa fama, depois perdeu muito público porque começou a ficar mais difícil de acompanhar a história. Na primeira temporada era um proposta mais simples em relação ao que ela se tornou hoje. Era mais fácil acompanhar a primeira temporada e a segunda. E qualquer proposta de mistério bem elaborada sempre estimula o interesse de público. Se o roteiro segurar bem até o final, OK. Se falhar no meio do caminho, perde público. Não só o tema (tem mistério), mas em relação aos próprios personagens. Você não sabia quem era quem. A história começa num ponto em que você tem um monte de personagens entregues no seu colo, sem ter absolutamente nenhuma noção de quem é quem, e quem vai ficar. Isso é uma novidade na TV? Não posso te afirmar completamente, mas em relação a minisséries, você nunca sabe quem são os personagens realmente. Esse tipo de introdução eu considero uma novidade. Pode ter séries que tenham feito isso, mas não se tornaram tão conhecidas. Todas as séries que ficam muito famosas, você pode ter certeza que houve uma (série) experimental antes dela. Até a própria trama ali na ilha fica em segundo plano. Acaba sendo mais instigante saber o passado dos personagens, o futuro e agora, a realidade alternativa. Eu chamo o Lost de colcha de retalhos no bom sentido. Falo isso porque Lost agregou dezenas de elementos que já tinham sido explorados individualmente (na televisão). Então, numa única série, ela introduziu elementos já comprovadamente interessantes ou que davam certo, e colocou numa série só. A questão da linha paralela entre o presente e o passado surgiu nos anos 70. Já existia antes, mas, digo, como tema fixo. Onde? Que eu saiba o Kung Fu foi a primeira, em 1972. Porque você tem um personagem, que era o David Carradine, um chinês que aparece no meio do faroeste, do nada. Você não sabe a história dele. Nesse sentido, se você pensar em relação a Lost, é a mesma introdução. Um acidente aéreo. E no Kung Fu, você tinha de repente um personagem, que vivia sozinho, falava pouco o inglês, não tinha amigos. Geralmente os personagens fazem amizade com alguém e pela conversa você descobre quem ele é. No Kung Fu não tinha isso. Ele não conversava com as pessoas sobre quem ele era e sobre o passado dele. A única forma que a gente tinha de descobrir quem era esse personagem, é quando entravam as lembranças dele do passado. Ele aparecia no templo, conversando com o mestre dele, revelando as dúvidas em relação a vida, e você tinha uma ideia de quem ele era a partir dessas cenas. Nesse sentido o Lost fez a mesma coisa. Mas em vez um personagem só, de uma só pessoa, Lost botou uma dezena de pessoas ali passando pela mesma situação que o personagem do Kung Fu viveu. A linguagem que Lost explorou faz parte de linguagem atual, mais contemporanea e misturada com a tecnologia, de que a vida não é tão linear, mas um quebra-cabeça de experiências e informações que aparecem com o tempo? Não vou entrar tanto em linguagem, mas em termos de indústria, a TV a cabo americana estava dando um banho nos canais abertos. A partir de 2000, a TV a cabo deu um salto muito grande, em função da Família Soprano, do OZ, do Sex And the City. Apesar de muita gente não gostar, foi uma série que deu um impulso na televisão fechada. E ela estava ameaçando a TV aberta, que segue as regras de público. Para a TV a cabo importava mais oo conteúdo. Então o Lost surgiu da necessidade da TV aberta se renovar? A TV aberta sempre precisa se renovar. Não que tenha menos audiência do que a TV a cabo, mas credibilidade e interesse. A TV aberta tem interesse em inovar, em modificar, se não fica monótono até para eles. Então começaram a procurar algo diferente da rotina do que normalmente é produzido. Isso porque o público mudou também, não? Com certeza, porque se outros veículos estão inovando, o público está sendo influenciado por eles também, não é só a televisão. Antes era a TV aberta que provocava as mudanças. Não era o público que pedia. As séries que promoveram a revolução da programação seriada surgiram foi por insistência da televisão, não pela aceitação do público. O público acabou aceitando pela continuidade delas. Mas a maioria das séries consideradas revolucionárias tinha baixa audiência quando estreiou. Foi porque a TV insistiu, renovou, continuou exibindo, divulgando e fazendo propaganda que elas pegaram. Hoje eles não fazem mais isso. Se não pegar na primeira, raramente dão continuidade. Séries de história contínua são muito perigosas para a TV aberta porque se o público perde um ou outro episódio, ou se não entende o que está acontecendo, vão perdendo audiência. É um risco. E a emissora tem de vender para reprise, e uma história muito longa, contínua, muito dependente um episódio do outro, compromete a venda. Por isso a TV americana passou a transmitir pela internet também? Nesse momento de período da exibição original, que desperta o grande interesse do público, eles têm a obrigação e a necessidade de explorar todos os veículos. É necessário. O canal não sabe se depois que for revelado o final, a série ainda vai dar lucro (com reprises e DVDs). Você tem de explorar todas oportunidades agora para compensar tudo o que foi gasto e fazer valer a fama que ganhou. É uma necessidade, é uma questão administrativa. Seria burrice se não fizessem isso. E porque também os próprios fãs criaram esse movimento sobre a série na internet. Depois de Lost, as pessoas parecem ter tido mais contato com a cultura de séries na internet, aprendendo a baixar os episódios e legendas. O que acha disso? Acho que isso aconteceu porque a produção de séries com histórias contínuas está maior agora do que no fim da década de 90. Cresceu muito nessa década, e não sei se é na próxima década vai continuar, porque geralmente a década seguinte sempre é meio que o inverso da outra. Não dá para puxar demais o elástico, senão arrebenta. Uma hora ninguém mais vai aguentar acompanhar tantas temporadas e tantos episódios. Ou pior, a série é cancelada e você fica sem saber o que acontece. Isso tudo prejudica a continuidade de produções com esse tipo de narrativa. Tanto é que hoje há um número cada vez maior de séries de histórias contínuas que se fecham no fim da temporada. Aí o mesmo elenco de personagens vai para a temporada seguinte com um outro tema. Dexter, Damage, Californication fazem isso. São séries que a cada temporada têm um tema, um objetivo. Porque se for cancelada, o objetivo foi fechado. Como começou o movimento de séries com histórias contínuas nesta década? É praticamente com a evolução dos anos 80 que foi o boom das novelas noturnas, a moda, a grande coqueluche dos anos 80, embora as séries policiais também tivessem já histórias contínuas. Elas deram continuidade para as séries dramáticas dos anos 90, e influenciaram programas familiares e policiais. A chegada da TV a cabo, o aumento da produção de séries na TV a cabo também foi outra influência. Eu acho que o Família Sopranos foi muito mais relevante do que Lost, no sentido de importância de séries contínuas. Lost veio depois. Sopranos é de 1999. Não que foi a primeira produção, mas, da década de hoje, a série que influenciou a produção de histórias contínuas foi Família Sopranos. O impacto dela colocou a TV a cabo americana no mapa. Antes dela, existiam produções, mas 90% da população não conhecia. E isso é muito mais importante que Lost para o movimento de histórias contínuas. Alguns mistérios de Lost só são revelados em produções paralelas, como sites e websódios. Isso foi a grande marca da série? Não. Isso é dos anos 90. O Life on the Street, do David Simon, foi a primeira a ganhar uma websérie paralela. Depois teve Arquivo X, que teve um movimento muito grande na internet, não só de fãs, mas a própria Fox utilizava a internet. A diferença é a proporção porque hoje a tecnologia permite isso. Tanto que daqui uma década, Lost não vai ser nada. Vai ter outras séries fazendo três vezes mais do que Lost em relação a novas mídias, que a gente nem sabe quais serão. Não estou querendo diminuir a importância, mas é para desmistificar a ideia de que Lost criou alguma coisa. Não vou dizer que não criou nada, mas para não ganhar fama de ter criado o que ela não criou. Quando eu falo colcha de retalhos, é neste sentido. Ela agregou vários elementos que já existiam separadamente: a internet, o mistério, a história não linear. Isso de enfiar muitos elementos, é uma novidade — se Lost teve alguma novidade. O que sempre foi regra na televisão é: ‘não complica as coisas porque o povo não gosta de coisa complicada’. Se achassem que o público ia ter dificuldade de acompanhar uma série, ela não era produzida ou recebia modificações no enredo para facilitar a compreensão. Lost não fez isso. Provou que dava para fazer. Exato. Se eu fosse eleger uma novidade de Lost, seria o fato de a televisão aberta, a ABC, ter apostado em algo com esta complexidade. Até os anos 90 a única complicação que se permitia era ter uma única trama, tipo Arquivo X, que você tem uma única trama em torno da irmã do Mulder e etc, mas era sempre em cima daquilo, não tinha complicações paralelas na trama. A TV aberta permitiu exibir uma história extremamente complicada e que provavelmente vai terminar sem uma explicação satisfatória para a grande maioria. A única série americana que até então tinha conseguido isso foi Twin Peaks. Quando ela terminou, muita gente continuou com um ponto de interrogação na cabeça. Até hoje, tem gente que não entendeu o que o autor quis dizer. Esse tipo de trama é raro ver na televisão. Não é inédito em relação a Lost, mas é inédito em relação à quantidade de tramas paralelas complicadas. Então o que Lost deixa para o futuro da televisão? Eu diria que ela deixaria como uma proposta. Não acredito que vá gerar muitas produções nesse mesmo nível de tramas complicadas porque é difícil vender esse tipo de produto. De 1994 até 2001 se via tanta série copiada do Arquivo X até não poder mais. Não acredito que Lost vá conseguir produzir a mesma quantidade de cópias. O máximo que se consegue fazer é o que já existia. Uma trama complicada, mas única. Nesse tipo de tramas paralelas, ao longo de várias temporadas, 5, 6 anos, acho que vai demorar muito para aparecer de novo. Isso também é minha opinião. Afinal de contas o próprio J.J. Abrams está aí. Ele já fez uma vez, e vá saber o que ele vai fazer no futuro. Ele é o eu chamo de Midas da vez. O Chris Carter foi, o Stephen J. Cannell foi, o Dick Wolf foi, agora é ele. E depois dele vai vir outro. Não que ele vá deixar de produzir, mas (o formato) vai virar ‘feijão com arroz’. Hoje você vê uma produção do Dick Wolf já sabe que é uma história policial. Se ver do David Kelly, sabe que ele vem com uma história de tribunal. Se for o J.J. Abrams, já sabe que é alguma coisa de mistério.’ Cancelada ‘Flashforward’, a série que substituiria ‘Lost’ ‘As redes de televisão ABC e NBC anunciaram nesta segunda, 17, o cancelamento de duas de suas grandes apostas: FlashForward e Heroes, devido a uma perda de interesse entre os espectadores norte-americanos, segundo a mídia especializada. As duas séries geraram muita especulação quando apareceram na telinha, conquistando bons índices de audiência e respaldo da crítica, apesar das mudanças internas nas equipes de produção e problemas de roteiro. FlashForward, uma série que estreou em 2009 com a aspiração de ser a herdeira de Lost na mesma ABC, que transmite o seriado de sucesso, termina após sua primeira temporada, segundo informou hoje a Variety. A ABC, no entanto, deu aval para a produção de novos capítulos do remake de V, que atualmente está terminando sua primeira temporada nos EUA. Já Heroes, que estreou em 2006 e foi um acerto da NBC tanto nos EUA como no mercado internacional, chegando até a ser comparada com a série de sucesso Lost da ABC, será encerrada. Segundo a revista The Hollywood Reporter, a rede tinha previsto colocar um fim na série com sua curta temporada e encerrar a trama com um último capítulo de várias horas, mas optou por encerrar Heroes sem isso.’ INTERNET Carla Peralva Por que sair do Facebook ‘Daniel Yoder, vice presidente de engenharia da startup Border Stylo na Califórnia, pensou um pouco e decidiu deletar sua conta no Facebook e encorajar os outros a fazerem o mesmo. Tomada a decisão, escreveu um texto com dez motivos para que as pessoas saiam do Facebook, o publicou em seu blog, o Rocket.ly, e licenciou no texto como Creative Commons. A lista está rodando a internet em um movimento parte altruísta, parte egoísta, como ele mesmo define. Altruísta porque ele acredita que a empresa se Zuckerberg é antiética. Egoísta porque ele admite que gostaria que seus contatos saíssem do Facebook para que ele não ficasse por fora de nada. Leia abaixo a entrevista que Yoder deu ao Link: Houve algum evento específico que te motivou a deixar o Facebook? Sim, os anúncios feitos na conferência de desenvolvedores F8. As garantias de privacidade dadas pelo Facebook foram me corroendo durante algum tempo, isso foi a gota d’água. Alguém mais deixou o Facebook com você? Eu acredito que sim, mas não posso afirmar com certeza, já que eu mesmo não estou mais no Facebook. Muitas pessoas que comentaram no meu blog disseram que excluíram suas contas ou que estavam pensando seriamente em fazer isso. Eu também recebi muitos tweets e e-mails falando o mesmo. Você estava esperando tanta repercussão? Não. Eu escrevi aquele post para convencer meu próprio círculo social a sair do Facebook e para ter certeza de que eles entenderiam porque estava excluindo minha conta. Eu queria ter certeza que não perderia nenhuma festa boa! Até a semana passada, eu tinha bem poucos leitores no blog, mas um dos meus colegas de trabalho postou o texto no HN – Hacker News, um site em que muitos desenvolvedores usam para se informar – e, de lá, ele decolou pela internet. O que você acha que os usuários podem fazer para proteger seus dados nas redes sociais? Como as coisas vão hoje, não muito. Muitas empresas de comunicação social não dão boas garantias de privacidade, mas, pelo menos, elas estão pensando nessa questão. Por exemplo, todo mundo sabe que o que se posta no Twitter, no Flickr ou no YouTube é, por definição, público. Você sabe que está publicando o quer que você poste lá. O Facebook criou uma expectativa diferente e não conseguiu fazer jus a isso. E, sem dúvidas, eles premeditaram coletar a maior quantidade de dados possível. . No futuro, eu espero que nós estejamos um pouco mais céticos em relação às companhias que fazem esse tipo de ação. Você poderia ser chamado de ‘o anti-Facebook’? Eu imagino que eu possa se chamado de qualquer coisa (e eu fui, nos comentários do meu blog), mas eu realmente preferiria ser conhecido por alguma outra coisa. Eu trabalho arduamente para ajudar a criar uma nova geração de experiência nas redes sociais e, idealmente, é a isso que serei associado. Você acha que a privacidade é um problema das redes sociais em geral ou só o Facebook realmente não liga para isso? Isso é realmente um desafio para a comunicação social em geral. Eu acho que o Facebook chegou à conclusão que é melhor para seu modelo de receita se eles tornarem os dados pessoais de todo mundo disponíveis para seus parceiros comerciais. E eles estão apostando que não irão perder muitos membros durante essa transição. Você costuma colocar seus textos em licença Creative Commons? Gosta desse serviço? Eu gosto do Creative Commons porque ele dá uma boa gama de opções de licença com a qual todos podem trabalhar. Ele torna ainda mais fácil, por exemplo, que um texto em um blog como o meu possa ser republicado. Já que o meu objetivo com meu blog é, principalmente, compartilhar ideias, ele funciona bem para mim.’ ************