Como lembrar os 50 anos da fundação de Brasília – como um momento épico, glorioso e único da nossa história ou, ao contrário, como um dos maiores vexames políticos?
Comemorar efemérides é salutar, mas antes convém precaver-se. Podem se transformar em perigosas armadilhas quando se ignora a dinâmica do presente e nos entregamos passivamente ao passado.
Ninguém poderia imaginar que quatro dias antes das festas do cinqüentenário da nova capital a vaga do governador seria preenchida numa eleição indireta por deputados indiciados pela polícia – e que o antecessor fosse encarcerado por ordem judicial antes mesmo de ser deposto.
Nem poderíamos prever que o lado épico da construção da utopia arquitetônica e urbanística da nova capital fosse soterrado pelas espantosas revelações de suborno e prevaricação na sua administração.
Juízos apressados
Brasília foi concebida e construída como solução para uma série de problemas e hoje, apenas 50 anos depois, tornou-se lamentável símbolo das mazelas que deveria sanar.
Em termos morais, sua modernidade não consegue torná-la diferente de São Luiz do Maranhão ou de Macapá. Esta penosa dualidade refletiu-se nas envergonhadas e mirradas rememorações apresentadas pelos jornais e revistas no último fim de semana.
É possível que os meios de comunicação tenham adiado a divulgação do material festivo para o próprio dia 21 de abril, quarta-feira, separando a nostalgia das glórias passadas das duras realidades do presente. De qualquer forma, a efeméride está definitivamente comprometida, ainda mais pelas evidências de que a solução mais correta e definitiva – a intervenção federal – foi descartada para evitar que o escândalo respingasse no governo central.
Clio, a deusa da história, não aprecia os juízos apressados: é caprichosa, surpreendente e impaciente. A última palavra sobre Brasília talvez só venha a ser conhecida quando completar 60, 70 ou100 anos.