Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Globo e Record aliadas contra TVs públicas

Se na disputa por direitos esportivos Globo e Record estão em lados opostos, na discussão da cessão destes direitos para emissoras de TVs públicas as duas empresas alinham os argumentos. A oportunidade para a convergência de idéias surgiu na audiência pública realizada na quarta-feira (19/11), na Comissão de Turismo e Desporto da Câmara, que debateu o Projeto de Lei 1878/03. Trata-se do projeto que estabelece a cessão gratuita de eventos envolvendo seleções e atletas que representem o Brasil e que não serão exibidos na TV comercial para emissoras públicas.


Marcelo Campos Pinto, diretor da Globo para a área esportiva, se disse preocupado com a abrangência e alcance do projeto. ‘Hoje há no país 193 geradoras, sem falar das 597 retransmissoras, que são, em parte, pseudo-educativas, porque não produzem conteúdo educativo, usam estes canais para proselitismo, fazem comercialização publicitária fora da Lei’, afirmou. ‘Será que é exatamente isso que nós queremos? Será que é a essas educativas que queremos dar esse conteúdo?’. Indiretamente, Campos Pinto fez uma denúncia de mau uso das outorgas educativas. De fato, muitas emissoras educativas acabam tendo uso político ou puramente comercial, o que dependeria de fiscalização para não acontecer.


Negociação difícil


Sobre a realidade de negociação desses direitos, Campos Pinto lembrou que hoje existe um jogo de forças entre a TV e os grandes detentores de direitos esportivos. ‘O cenário mudou muito de 10 anos para cá. Naquela época, eu dizia que esporte não vivia sem a TV e vice-versa. Hoje, as TVs são reféns dos grandes eventos esportivos. Os detentores ditam as regras pelas quais as TVs competem na aquisição de direitos’, sintetizou o executivo.


Ele explicou que as cláusulas exigidas pelos detentores dos eventos invariavelmente colocam a exclusividade, porque isso aumenta o preço. Depois, segundo o executivo, a comercialização é feita para todas as mídias. ‘E existe uma obrigatoriedade de exibição de todos estes eventos, em todas as mídias. Não existe muita flexibilidade. Nenhuma empresa hoje compra eventos para não exibi-lo, porque o custo é proibitivo’, explicou.


Responsabilidade


Ele lembra que o comprador original tem a responsabilidade solidária pelos atos praticados pelo cessionário, e é preciso que se apresente uma carta de fiança de todos os cessionários.


‘O que acontece é que a força dos vendedores é tão forte que temos, para levar um evento relevante, levar tantos outros sem interesse de exibir’, disse, lembrando ainda que muitos eventos já chegam com as cotas comerciais dos patrocinadores incluídas e com exibição obrigatória.


Para Eduardo Zebini, diretor de esportes da Record, o problema para o compartilhamento dos eventos com a rede pública de TV é que os contratos exigem condutas rigorosas. ‘São contratos confidenciais que exigem garantias, procedimentos e multas para os casos de desvio. As imagens dos eventos têm, por exemplo, um período de utilização e um vencimento após o evento. Além disso, nós temos que dar garantias contra o vazamento das imagens para fora da área em que somos cessionários’, disse o executivo.


A Record sugere que a TV pública busque eventos alternativos, como Universíadas (Olimpíadas Universitárias), Jogos do Exército, jogos regionais, que hoje não são exibidos. Zebini também sugeriu que a TV Brasil e o COB (Comitê Olímpico Brasileiro) promovam eventos de formação esportiva e competições de divulgação de modalidades pouco difundidas.


Para o deputado Silvio Torres (PSDB-SP), o PL tem o objetivo de permitir à ‘imensa massa’ da população acesso a eventos de seleções que representam o Brasil. ‘Não me parece justo que 90% da população, que não tem TV a cabo ou outras mídias, fique distante destas disputas. Há pontos a serem aperfeiçoados que podem ser discutidos. Não queremos quebrar direitos constituídos. Mas queremos preparar alguma coisa para o futuro que dê alternativas à sociedade e acesso ao bem público da informação e da comunicação’.


Tereza Cruvinel concordou com o deputado e lembrou que se hoje existem excessos dos grandes detentores de direitos, isso deve ser coibido pelas autoridades e pelo Congresso. ‘Afinal, a TV comercial tem função social, é uma concessão pública’. Diante dos pontos colocados, o deputado Gilmar Machado (PT/MG), relator da matéria, decidiu que encaminhará nova versão do substitutivo e depois colocará em votação.


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TV Brasil e Cultura defendem acesso a conteúdos não utilizados


Volta à tona o debate em torno da possibilidade de que eventos esportivos sejam cedidos para a TV Brasil, emissora pública que completa, em dezembro, um ano de vida. A idéia foi discutida na audiência pública realizada na quarta-feira (19/11), na Comissão de Turismo e Desporto da Câmara, que debateu o Projeto de Lei 1878/03. Trata-se do projeto que estabelece a cessão gratuita de eventos envolvendo seleções e atletas que representem o Brasil e que não serão exibidos na TV comercial para emissoras públicas. A maior defensora da idéia hoje é a TV Brasil, que chegou a ter dispositivo semelhante quando foi criada, no começo do ano, mas o artigo foi vetado pelo presidente Lula em decorrência de um acordo político.


Tereza Cruvinel, presidente da TV Brasil, defendeu o projeto. ‘Sabemos que muitas vezes as emissoras adquirem direitos com o objetivo de não exibi-los, seja para privar as concorrentes desse conteúdo, seja por razões de outra natureza’, ponderou a jornalista, sem citar exemplos. ‘É verdade também que existe uma discussão sobre direitos de propriedade. Achamos que a TV pública, se tiver esses direitos, têm que arcar com os custos de transmissão, mas não recomprar os eventos’. Para ela, para que a proposta vá adiante, é preciso definir claramente os prazos para que a TV pública exiba os eventos, os critérios de escolha e o intermediário na operação. ‘Achamos que a EBC pode ser a instância primária, cedendo para as demais TVs públicas os direitos que receber’. Por fim, Cruvinel afirmou que o direito de propriedade deve ser preservado, mas também o direito de comunicação e entretenimento.


Na mesma linha foi Carlos la Bella, diretor da TV Cultura. ‘Achamos que é preciso ter respeito pelo direito de propriedade das empresas que adquiriram os eventos, mas achamos que é preciso respeito também à população que não tem acesso, porque muitas vezes esses direitos vão para a TV paga e para o pay-per-view. Achamos que o que foi adquirido e não será exibido deve ser cedido para a TV pública’, afirmou. (Samuel Possebon)

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Do Tela Viva News