Cerca de 20 tanques e dezenas de soldados do Exército protegem a frente do edifício redondo da rádio e TV estatal, na beira do Rio Nilo, a menos de um quilômetro da Praça Tahrir. Ao lado, o prédio do Ministério das Relações Exteriores parece bem menos vital para o regime: ‘apenas’ seis tanques. No começo dos protestos, dia 25, os manifestantes tentaram tomar a TV – um alvo clássico nas insurreições. E falam em tentar de novo.
A guerra no Egito luta-se com slogans, pedras, jatos d’água, gás lacrimogêneo e munição real, mas é também uma guerra de informação.
O Estado possui nove canais de TV – um para cada província, mas todos captados nacionalmente – e um número equivalente de emissoras de rádio. Não existe canal privado de TV aberta. Mas elas estão nas frequências captadas com antena parabólica – que custa cerca de 500 libras egípcias (US$ 83) e muitos egípcios têm. Não é preciso pagar assinatura.
A entrevista dada na segunda-feira (7/2) a um deles, a Dream TV, pelo diretor de Marketing do Google para o Oriente Médio, Wael Ghonim, preso durante 12 dias, serve de combustível novo para as manifestações na praça.
Dos seis principais jornais do país, três pertencem ao governo – Al-Ahram (A Pirâmide) e Al-Akhbar (A Notícia) e Al-Gomhouria (A República) – e três são independentes – Al-Masry al-Youm (O Egito Hoje), Al-Dustour (A Constituição) e Al-Shorouk (O Amanhecer).
Suas manchetes de quarta-feira (9/2) dizem tudo sobre suas tendências. Al-Ahram e Al-Akhbar saíram com títulos praticamente iguais, citando uma declaração do vice-presidente Omar Suleiman: ‘Negociações ou insurreição’. E acrescentavam nos subtítulos: ‘A primeira nos tira da crise; a segunda é imprevisível, e queremos evitar.’
Já o Al-Masry al-Youm destacou: ‘Praça Tahrir lotada; manifestantes cercam o Parlamento.’ O subtítulo diz: ‘Formado comitê para supervisionar mudanças na Constituição.’ A manchete do Al-Dustour foi: ‘Impedido de entrar no prédio do Conselho de Ministros, primeiro-ministro Ahmed Shafik sai do Parlamento disfarçado.’
E há as emissoras de TV internacionais e os sites de notícias na internet. A escolha da fonte de informação define a posição de cada egípcio no conflito.
Fontes alternativas
‘Eu me informo pelos sites da BBC, da CNN e das agências internacionais de notícias, e pela TV Al-Jazira’, conta o estudante de engenharia Mohamed el-Zaieri, de 20 anos, que apoia as manifestações na Praça Tahrir. ‘Não dou atenção à TV estatal.’
Ele diz que o custo mensal da conexão de internet não é um problema: 30 libras egípcias (US$ 5), e um computador top de linha sai por US$ 500 no Egito, onde o imposto de importação é baixo.
Já Nadia Abdel Moty, de 55 anos, afirma que assiste à TV estatal ‘o tempo todo’, e acredita ‘em tudo o que ela diz’. Dona de uma loja de roupas populares num mercado no centro do Cairo, ela que prefere destinar o dinheiro que custa um jornal – 1,25 libra egípcia (US$ 0,21) – a ‘coisas mais importantes, como pão’.
Além do noticiário, Nadia gosta de assistir às novelas na TV, mas ficou chocada com a última, ‘Zohra’, sobre uma mulher que se casou cinco vezes e ‘não se vestia de forma apropriada’. A comerciante acha que o governo já fez muitas concessões e os manifestantes da Praça Tahrir devem voltar para casa.
Magdi el-Prince, de 57 anos, dono de uma butique de roupas femininas, pensa o contrário: ‘Não podemos desistir agora. Mudanças só ocorrem uma vez na vida. Estou muito feliz porque os jovens fizeram o que minha geração nunca conseguiu fazer.’ Ele lia o Al-Akhbar durante a manhã de ontem [9/2], mas disse que o jornal do governo ‘só traz mentiras’.
Prince declarou que se informa principalmente pelo canal de TV saudita Al-Arabiya, preferido por muitos que consideram que a Al-Jazira se tornou tendenciosa demais em favor da oposição.
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Cinco razões para…
Explicar a revolta do mundo árabe
1. Há um conflito de gerações entre os velhos governantes e a maioria jovem. Atualmente, cerca de 65% dos egípcios têm menos de 30 anos.
2. A riqueza adquirida de recursos naturais não poderá continuar a ter o mesmo efeito legitimador para regimes árabes no futuro.
3. A carta ‘teológica/teocrática’ usada para difamar islâmicos vem se desgastando porque muitos se mostraram menos radicais que o governo.
4. Todo o questionamento de agora não teria sido possível sem o impacto da tecnologia que conectouos muçulmanos ao mundo.
5. Os egípcios vivem um tempo de crescente enfraquecimento do ímpeto das ideologias não democráticas dos anos 1950 e 1960.