Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Jornalismo ambiental e sustentabilidade

O jornalismo vive um momento instigante neste início do século 21. A entrada para valer na Era da Informação, como é conhecido o nosso tempo, faz do jornalismo um suporte para as transformações que vão mudar o comportamento da humanidade nos próximos anos, seja para o bem ou para se adaptar às rigorosas condições ambientais anunciadas. O jornalista desta nova era, no entanto, não é o mesmo tipo de profissional que construiu a história e a tradição do jornalismo no século 20. Chegou a vez de um profissional mais informado, qualificado e preparado para atuar em ambientes de múltiplas variáveis. O melhor exemplo da transversalidade exigida do deste profissional é o exercício do jornalismo ambiental.

É comum se imaginar que o jornalista ambiental é um profissional que tem de estar em dia com fatos da natureza e só. Esta é uma visão simplista num mundo em transformação. O fato é que o jornalista que atua com pautas ambientais deve estar preparado para tratar de temas tão diversos como biodiversidade, efeito estufa, camada de ozônio, agenda marrom, tecnologias ambientais empresariais, água e saneamento, ISO 14.000, indicadores de sustentabilidade, ISO 26.000, energia em todas as suas formas, além de processos de produção dos mais diversos itens industriais, como papel e celulose, e seus impactos sócio-ambientais.

E isto é apenas uma pincelada no universo de conhecimento específico por onde deve transitar esse profissional. A transversalidade que deve existir nas pautas ambientais presentes nos veículos de comunicação começa no jornalista.

Garantir a informação relevante

Portanto, a qualificação é o principal desafio a ser enfrentado por profissionais que pretendem expandir o olhar do jornalismo sustentável sobre todas as pautas. Descobrir a vertente ambiental em qualquer que seja o tema a ser trabalhado. O segundo grande desafio é a construção dos espaços editoriais onde as pautas ambientais transformam-se em matérias. Tanto nas mídias especializadas, como nas mídias tradicionais. Nas redações dos grandes meios, a presença da pauta ambiental começa a ganhar corpo, com dezenas de textos e reportagens de TV todos os dias. No entanto, ainda há uma certa inconsistência na forma de tratar a maioria dos temas. Nem todos os links ambientais que as pautas permitem estão realmente presentes nas matérias. Algumas vezes por falta de interesse, outras, por falta de conhecimento específico.

No caso das mídias especializadas, o desafio é encontrar recursos financeiros para manter os projetos editoriais em pé. O financiamento das mídias ambientais é um debate recorrente entre os editores desta área e está longe de ser resolvido. Muitas das mais importantes publicações ambientais do Brasil existem apenas por teimosia de seus editores, já que não existe de fato um modelo de financiamento à informação no Brasil. E este problema não é apenas das mídias ambientais, mas sim, do modelo de financiamento da informação no Brasil, ou a falta dele.

A Constituição brasileira prevê o direito do cidadão à informação, mas não oferece a contrapartida de garantias a este direito. Existem mecanismos que de certa forma coíbem a censura, mas não existem mecanismos que garantam que uma informação relevante realmente chegue à sociedade. Empresas e governos não têm juízo de valor sobre o tipo de informação que financiam com sua publicidade. E isto precisa ser revisto e repensado, inclusive pela sociedade, enquanto consumidora.

O modelo de desenvolvimento

De uma forma geral, as pautas importantes estão quase todas nas mídias; o que não está é a transversalidade. A inter-relação entre os temas que mostram que a maioria das pautas tem uma vertente ambiental. A mídia ainda tende a trabalhar como se a realidade coubesse em escaninhos. Cada tema vai para uma gavetinha e é tratado separadamente. Quando fala em energia, não se interliga a questão entre o modelo de geração e a utilização da energia, assim como os impactos sócio-ambientais que provocam. Esta ausência está presente no debate sobre a necessidade futura de energia no Brasil para o crescimento econômico.

Não se discute que modelo de desenvolvimento é este que necessita de cada vez mais energia, a ponto de precisar pagar um preço ambiental cada vez mais exorbitante. Ou seja, vamos precisar de energia, mas para quê? Esta resposta genérica ‘para o desenvolvimento’ não pode ser aceita sem questionamentos. É preciso decompor o uso desta energia em suas diversas utilizações e ver se a sociedade precisa ou quer estes usos.

O modelo de desenvolvimento está no cerne da questão ambiental e os jornalistas ainda não estão, em grande parte, preparados para questionar este modelo. Então, se há pautas relevantes que estão fora da mídia são as que questionam de forma consistente o modelo de desenvolvimento que vem sendo mantido e estimulado no Brasil e no restante do mundo, baseado na produção cada vez maior de energia e no uso imoderado de recursos naturais e estimulado por demandas fictícias de necessidades de consumo.

Enxada não decide o cultivo

O jornalismo está em um dos melhores momentos de sua história. Temos tecnologias fantásticas para a difusão de notícias e informações, como a internet e as novas tecnologias de informação digital no rádio e na televisão. Pela primeira vez, o jornalista pode realmente ser um profissional liberal e exercer sua profissão da forma que melhor lhe convier.

O jornalista tem neste cenário de Sociedade da Informação uma vantagem competitiva decisiva: ele está preparado para lidar com a informação. A internet rompeu com todas as fronteiras do planeta e é um dos dois principais ambientes da batalha da informação: TV e a internet.

A parcela da sociedade global que se utiliza da linguagem escrita para obter informação tem na internet seu habitat. Os visuais ficam com a TV. De qualquer forma, quem está preparado para trabalhar com informação são os jornalistas. Que sorte a nossa, viver para presenciar este salto da humanidade. É quase como ser um dos pioneiros que andaram de trem ou de navios a vapor.

Mas tudo isto são apenas ferramentas para se trabalhar. Precisamos saber que modelo de desenvolvimento queremos. A enxada não decide o cultivo.

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Jornalista, foi editor de economia em alguns grandes jornais e revistas e é diretor de Redação da Envolverde